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LITERATURA<br />
FOTOS EVERTON AMARO/FUNDAÇÃO MAURÍCIO GRABOIS<br />
Camila Lanes, estava lá. Ficou feliz com<br />
o encontro entre a jovem de 19 anos e o<br />
poeta de 90, “muito consciente e simpático”.<br />
Ela conta que já conhecia um pouco<br />
da obra de Thiago na escola e por amigos<br />
que gostam de poesia. No primeiro ano<br />
<strong>do</strong> ensino médio, fez um trabalho com<br />
base no poema Faz Escuro Mas eu Canto.<br />
“Thiago de Mello conviveu com uma<br />
parte muito grande da história <strong>do</strong> país”,<br />
diz Camila. Para ela, o atual momento<br />
politico, conturba<strong>do</strong>, ajuda a refletir sobre<br />
o papel de cada pessoa como cidadão.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, acrescenta, Thiago é<br />
referência, “por sua militância, na poesia<br />
e na vida”.<br />
Em sua dissertação, Pollyana Furta<strong>do</strong><br />
Lima destaca o fato de Thiago de Mello<br />
não ter permaneci<strong>do</strong> em seu esta<strong>do</strong> de<br />
origem. “Sem esse deslocamento geográfico<br />
e as estratégias a<strong>do</strong>tadas pelo escritor,<br />
seria pouco provável a repercussão<br />
de sua obra. Da mesma forma, a atividade<br />
diplomática no Chile e na Bolívia, as<br />
perseguições políticas no perío<strong>do</strong> militar,<br />
o refúgio nos países da América Latina<br />
segui<strong>do</strong> de exílio na Europa, foram<br />
acontecimentos de sua vida que tiveram<br />
efeito sobre a sua visão de mun<strong>do</strong>, a sua<br />
criação literária e, sobretu<strong>do</strong>, a circulação<br />
de sua obra em países considera<strong>do</strong>s centros<br />
literários mundiais, como a França<br />
e a Alemanha.”<br />
E se porventura a dermos<br />
ao mun<strong>do</strong>, tal como a flor<br />
que se oferta – humilde luz –,<br />
teremos então cumpri<strong>do</strong><br />
a missão que é dada ao poeta.<br />
E como são onda e mar,<br />
seremos homem e palavra.<br />
(Silêncio e Palavra, 1951)<br />
Em 1951, aos 25 anos, Thiago lançou<br />
o seu primeiro livro, Silêncio e Palavra.<br />
O mais recente, e segun<strong>do</strong> ele o último,<br />
é de 2015: Ajuste de Contas. Entre um e<br />
outro, duas dezenas de obras. Desde a poética<br />
engajada de Faz Escuro Mas Eu Canto<br />
(1965) e Poesia Comprometida com a<br />
Minha e a Tua Vida (1975), há publicações<br />
sobre o escritor argentino Jorge Luis<br />
Borges e até sobre uma paixão de infância,<br />
Arte e Ciência de Empinar Papagaio.<br />
Faz Escuro Mas eu Canto é também o<br />
nome de um show, dirigi<strong>do</strong> por Flávio<br />
Rangel, em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s anos 1970, com<br />
Thiago declaman<strong>do</strong> e Sérgio Ricar<strong>do</strong><br />
cantan<strong>do</strong>. Estreou no Teatro Opinião,<br />
no Rio de Janeiro, e correu o país. Eles<br />
conseguiram liberar o espetáculo, mas a<br />
censura vetou parte <strong>do</strong>s textos.<br />
“Foi um momento heróico da nossa vida”,<br />
lembra Sérgio Ricar<strong>do</strong>, que inicialmente<br />
procurou, além de Thiago, o também<br />
poeta Ferreira Gullar, que acabou<br />
não entran<strong>do</strong> no projeto. “Foi um convívio<br />
maravilhoso, sem nenhum atrito,<br />
um trabalho meio épico. Cada lugar que<br />
a gente passava, deixava uma marca.” Segun<strong>do</strong><br />
ele, mesmo obras censuradas acabavam<br />
entran<strong>do</strong> no roteiro. “Em alguns<br />
lugares a gente driblava, fazia mesmo o<br />
que estava proibi<strong>do</strong>. Era uma contravenção<br />
total”, diz, rin<strong>do</strong>.<br />
Para o cantor, compositor, cineasta e<br />
artista plástico, aquele foi, talvez, o show<br />
mais importante de sua vida. “Não era<br />
entretenimento, era guerrilha mesmo.<br />
Uma guerrilha cultural. Éramos <strong>do</strong>is pagãos<br />
pelo <strong>Brasil</strong>”, afirma, consideran<strong>do</strong><br />
Thiago um grande artista de palco. “Ele<br />
declaman<strong>do</strong> os poemas é uma coisa arrepiante”,<br />
diz Sérgio Ricar<strong>do</strong>.<br />
38 ABRIL 2016 REVISTA DO BRASIL