Revista Junho 04 final
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Junho 2017
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<strong>Junho</strong> 2017
A Mariana - <strong>Revista</strong> Histórica e Cultural é<br />
uma publicação eletrônica da Associação<br />
Memória, Arte, Comunicação e Cultural de<br />
Mariana. O periódico tem o objetivo divulgar<br />
artigos, entrevistas sobre a cidade de Mariana.<br />
A revista é uma vitrine para publicação de trabalhos<br />
de pesquisadores. Mostrar a cultura de uma<br />
forma leve, histórias e curiosidades que marcaram<br />
estes 321 anos da primeira cidade de Minas.<br />
Mariana - <strong>Revista</strong> Histórica e Cultural é um<br />
passo importante para a divulgação e pesquisa<br />
de conteúdos sobre a cidade de Mariana.<br />
Esperamos que os textos publicados contribuam<br />
para a formação de uma consciência de preservação<br />
e incentivem a pesquisa.<br />
Os conceitos e afirmações contidos nos artigos<br />
são de inteira responsabilidade dos autores.<br />
Colaboradores:<br />
Prof. Cristiano Casimiro.<br />
Prof. Vitor Gomes.<br />
Agradecimentos:<br />
Arquivo Histórico da Câmara de Mariana<br />
IPHAN - Escritório Mariana<br />
Arquivo Fotográfico Marezza / Itafoto<br />
Museu da Música de Mariana,<br />
Fundarq- Órgão da Sé de Mariana<br />
Fotografias:<br />
Cristiano Casimiro, Marezza e Vitor Gomes<br />
Diagramação e Artes: Cristiano Casimiro.<br />
Capa: Detalhe do Altar-Mor da Igreja N.S.do Rosário<br />
Foto: Cristiano Casimiro<br />
Associação Memória Arte Comunicação e Cultura<br />
CNPJ: 06.002.739/0001-19<br />
Rua Senador Bawden, 122, casa 02
Capa<br />
História<br />
Festa do Divino Espirito Santo em Mariana<br />
Cristiano Casimiro<br />
Quartel de Dragões da Vila de Nossa do Carmo<br />
Cristiano Casimiro<br />
Nossa Música<br />
Restauro<br />
Uma escuta guiada do acervo do Museu da Música de Mariana<br />
Vitor Gomes<br />
Restauro dos elementos artísticos da Igreja do Rosário de<br />
Mariana. Cristiano Casimiro<br />
Causos,Contos e Prosa<br />
O fantasma no Órgão da Sé.Cristiano Casimiro<br />
<strong>04</strong><br />
22<br />
26<br />
34<br />
38<br />
3
Mariana 2017<br />
Detalhe o Estandate do Divino.<br />
<strong>04</strong>
05<br />
O culto do Espírito Santo, de acordo com<br />
o historiador português Moisés do<br />
E s p í r i t o S a n t o , t e m o r i g e m n a<br />
Antigüidade. Entre os israelitas, a Festa<br />
de Pentecostes era celebrada cinqüenta<br />
dias (sete semanas) depois da Páscoa,<br />
sendo uma das quatro festas importantes<br />
do calendário judaico: Páscoa, Omar,<br />
Pentecostes e Colheitas.<br />
Ela era conhecida, ainda, com nomes<br />
diferentes: das Ceifas, das Semanas, do<br />
Dom da Lei, e outros, tendo sido,<br />
primitivamente, uma festa agrária dos<br />
cananeus .<br />
Entre os hebreus, o termo shabüoth faz<br />
referência à festa que começa cinqüenta<br />
dias depois da Páscoa e marca o fim da<br />
colheita do trigo. “A Festa do Divino é um<br />
eco das remotas festividades das<br />
colheitas”.<br />
Já o culto ao Espírito Santo, sob a forma<br />
de festividade, no sentido que iria adquirir<br />
mais tarde, se cristaliza no início da Baixa<br />
Idade Média, na Itália, com um<br />
contemporâneo de São Francisco de<br />
Assis, o abade Joachim de Fiori (morto<br />
em 1202), que ensinava que a última fase<br />
da história seria a do Espírito Santo.<br />
Suas idéias chegaram a Alemanha e<br />
espalharam-se pela Europa.<br />
Em Portugal, no séc. XIV, a festa do<br />
Divino já se encontrava incorporada à<br />
Igreja, como festividade religiosa. A<br />
responsável por essa institucionalização<br />
da festa em solo português foi a rainha D.<br />
Isabel, esposa do Rei D. Diniz (1.279 –<br />
1.325), canonizada como Santa Isabel<br />
de Portugal, que mandou construir a<br />
Igreja do Espírito Santo, em Alenquer .<br />
Em solo português, ela seria fortemente<br />
marcada por influências de tradições<br />
judaicas, muitas das quais chegaram até<br />
nós.<br />
Com o início da colonização, ela foi<br />
introduzida no Brasil, provavelmente<br />
desde o século XVII. A figura do<br />
Imperador do Divino – criança ou adulto –<br />
era o escolhido para presidir a festa. Aqui<br />
ela sempre foi uma festa de caráter<br />
popular, não figurando entre as quatro<br />
festas oficiais celebradas por ordem da<br />
Coroa, no período colonial. Mas seu<br />
prestígio no início do século XIX era<br />
tanto, que em 1822, segundo Luís da<br />
Câmara Cascudo, o ministro José<br />
Bonifácio escolheu para Pedro I o título<br />
de Imperador, em vez de Rei, porque era<br />
muito grande a popularidade do<br />
Imperador do Divino . Em certas cidades<br />
ou vilas do interior, o Imperador do<br />
Divino, com sua corte solene, dava<br />
a u d i ê n c i a n o I m p é r i o , c o m a s<br />
reverências privativas de um soberano .<br />
Decoração da Igreja da Arquiconfraria:<br />
Pomba Símbolo do Divino Espirito Santo
Em Minas, como em outros estados<br />
brasileiros, não são todos os municípios<br />
que mantêm a tradição do Cortejo do<br />
Império do Divino e dos folguedos como<br />
a Guarda de Marujos ou Marujada, os<br />
Catopés, Caboclos ou qualquer outro<br />
folguedo que puxe o Cortejo do Império.<br />
O período de festas é em sua maioria,<br />
móvel, pois depende da data festiva de<br />
Pentecostes.<br />
Em Mariana, a festa com mais de<br />
duzentos anos de fé, beleza e história. A<br />
comunidade católica , através da<br />
Confraria do Divino Espirito Santos,<br />
celebra a Festa do Divino, cujo destaque<br />
são missas, cortejo e outros ritos<br />
que remontam aos tempos coloniais. Na<br />
Igreja da Arquiconfraria de São<br />
Francisco dos Cordões, os féis participaram<br />
de sexta-feira 26 de maio até<br />
sábado 03 de junho da Novena Espírito<br />
Santo.<br />
No dia 28/05 foi aberta a exposição<br />
Fotográfica “ Festa do Divino espirito<br />
santo 2016” na igreja da Confraria. No<br />
sábado dia 03/06, foi realizado a Festa<br />
da Bandeira do Divino – X Encontro de<br />
Congados de Mariana. Uma festividade<br />
cultural com a participação de 14 grupos<br />
de congados de várias cidades mineiras<br />
c o m o : M a r i a n a , O u r o P r e t o ,<br />
Conselheiro Lafaiete, São João Del Rei,<br />
Santa Barbara, Congonhas entre<br />
outras. Na tarde, do sábado, os grupos<br />
se apresentaram na Praça Minas<br />
Gerais, que estava toda enfeitada com<br />
motivos da festa, com a chegada da<br />
noite iniciou-se a Procissão Luminosa<br />
da Bandeira do Divino, formada pelo<br />
Imperador do Divino, Sr Marco Mol, sua<br />
esposa, familiares, membros da<br />
Confraria do Divino Espirito Santos,<br />
devidamente paramentados, os grupos<br />
de congados e por fieis.
A Rua Dom Silvério, que liga a Praça<br />
Minas Gerais à igreja da Confraria, foi<br />
toda enfeitada com estandartes, bandeirolas<br />
e com lanternas de bambú para<br />
iluminar a passagem da procissão. As<br />
sacadas e janelas dos casarões coloniais<br />
foram decoradas com tolhas vermelhas<br />
e flores. O Alferes da Bandeira,<br />
Sebastião Fernandes e Janilson<br />
Pitombeira, junto com outros membros<br />
da Confraria do Divino Espírito Santos<br />
escoltaram a Bandeira do Divino da<br />
Praça Minas Gerais até da igreja da<br />
Confraria (centro histórico de Mariana).<br />
A batidas dos tambores e os cânticos<br />
dos grupos de congados deram o ritmo<br />
das procissão. A bandeira entrou na<br />
igreja acompanhada pelos grupos de<br />
Congados, foi reverenciada por todos<br />
os grupos e colocada no altar. Os<br />
grupos de congados se retiraram da<br />
Igreja e houve o último dia da Novena.<br />
Após a novena, no adro da Igreja da<br />
Confraria, os Confrades do Divino,<br />
liderados por Marcio Guadalupe<br />
Valentim (mordomo do Mastro da<br />
Bandeira), ergueram a bandeira com o<br />
Mastro em frente à Igreja. “Reza a lenda<br />
que a bandeira ira rodar no entorno do<br />
mastro e para a direção que ela apontar<br />
será de onde virá novo Imperador do<br />
Divino” disse Rhelman Queiroz imperador<br />
do divino em 1998. Após o levantamento<br />
do Mastro da Bandeira, como a<br />
tradição manda, houve o tradicional<br />
leilão e retreta, neste ano, a Corporação<br />
Musical São Vicente de Paulo de<br />
Passagem de Mariana abrilhantou a<br />
festa.
Os devotos do Divino vão abrir sua morada...
Pra bandeira do menino ser bem-vinda,<br />
ser louvada, ai, ai...
10<br />
Deus nos salve esse devoto pela esmola<br />
em vosso nome...
Dando água a quem tem sede, dando pão<br />
a quem tem fome, ai, ai<br />
Cadeiral da Sé - Caetano Estrucos 11
O Domingo de Pentecoste, dia <strong>04</strong> de<br />
junho, desde as primeiras horas da<br />
manhã um grupo de Confrades do Divino<br />
Espirito Santos, vestindo terno e com<br />
suas opas e capas, já organizavam a<br />
procissão do Divino Espirito Santo –<br />
Cortejo do Imperador, na Praça Minas<br />
Gerais. Anjos, pajens e todos os confrades<br />
do Divino são posicionados em um<br />
grande cortejo que foi guiado pelo<br />
Imperador e sua corte até a Igreja da<br />
Confraria, desta vez a Rua Dom Silvério<br />
já está enfeitada com tapetes de serragem,<br />
como manda a tradição.<br />
O novo Imperador que vai ser coroado<br />
vai à frente do cortejo sem coroa e o<br />
antigo imperador, se posiciona no <strong>final</strong><br />
da Procissão levando a coroa que vai ser<br />
usada na Missa de Pentecostes e coroação<br />
do novo Imperador.<br />
A procissão foi acompanhada pela<br />
corporação musical União XV de<br />
Novembro.<br />
Antes do Início da missa, houve o sorteio<br />
da corte do Divino de 2018,<br />
Na missa solene, conduzida pelo cônego<br />
Nedson, houve,a Benção de Pães e<br />
Medalhas do Divino para distribuição aos<br />
fieis, Coroação do imperador e a<br />
Coroação do sagrado Coração de jesus<br />
pelo novo Imperador.<br />
Após a Missa, no adro da Igreja da<br />
Arquiconfraria, a união XV de novembro<br />
abrilhantou a festa com uma retreta.<br />
A tradicional Festa do Divino Espirito<br />
Santo, em Mariana, reúne elementos da<br />
tradição católica, das tradições afrobrasileira,<br />
sincretismo religioso, fé,<br />
participação popular e devoção. A<br />
dedicação de confrades e pessoas<br />
comuns para que a festa se realize,<br />
mostra que a cultura secular do povo<br />
mineiro, ainda, encontra raízes fortes em<br />
Mariana.<br />
Parabéns a todos que, de uma forma ou<br />
de outra, participaram da Festa do Divino<br />
Coroação do Imperador 2017 - Sr Marco Mol<br />
A festa do Divino Espírito Santo é a<br />
única que comemora o futuro - algo que<br />
ainda vai acontecer. Todas as demais<br />
festas populares comemoram um fato<br />
que já aconteceu - alguma vitória ou<br />
momento marcante de um povo ou<br />
nação ou o feito de alguma pessoa<br />
(santo, herói ou líder). Mas a festa do<br />
Divino é a única que celebra o futuro. A<br />
Coroação de um Novo Imperador<br />
renova a esperança.<br />
"Podemos dizer que é uma festa<br />
profética, que fala de um tempo em que<br />
o mundo será governado pelo Espírito<br />
Santo de Deus, ou seja, será o Reino de<br />
Deus na Terra, por isso será um mundo<br />
justo, bom, belo e verdadeiro".<br />
Prof. Cláudia Pacheco<br />
12
Igreja da Arquiconfraria
Capela de Nossa Senhora Rainha dos Anjos<br />
Coube à Arquiconfraria do Cordão de<br />
São Francisco, fundada em 1760, a<br />
construção da primitiva capela,<br />
provavelmente transformada em capelamor<br />
do templo definitivo, cuja construção<br />
se deu a partir de 1784, data em que a<br />
A r q u i c o n f r a r i a f o i c o n s t i t u í d a<br />
f o r m a l m e n t e . A i n e x i s t ê n c i a d e<br />
documentação no arquivo da Igreja<br />
relativa à sua época de construção,<br />
impossibilita o devido esclarecimento<br />
sobre os artistas que ali trabalharam,<br />
bem como as etapas de evolução e<br />
conclusão das obras.. Pode-se, todavia,<br />
a partir de estudos comparativos,<br />
suspeitar da participação dos artistas<br />
Romão de Abreu, José Antônio de Brito e<br />
Manuel da Costa Athaíde nos trabalhos<br />
d a i g r e j a . E m 1 8 4 3 , d i a n t e d a<br />
necessidade de reedificação do templo,<br />
a Assembléia Legislativa Provincial<br />
autorizou a concessão de duas loterias<br />
para a realização das obras. Estas,<br />
entretanto, parece que só tiveram início<br />
em 1853, conforme indica o Livro de<br />
Receita e Despesa da Arquiconfraria.<br />
Pelo mesmo documento, pode-se inferir<br />
que as obras se prolongaram até<br />
1874/1875 e compreenderam a reforma<br />
do frontispício, reconstrução da torre,<br />
obras na capela-mor, no coro e nos<br />
corredores, telhado, forro, assoalho e<br />
grades. De acordo com o levantamento<br />
feito pelo IPHAN, em 1949, todas as<br />
paredes da capela-mor são de alvenaria,<br />
com as cimalhas em pedra lavrada do<br />
arco-cruzeiro para cima. A nave é de<br />
adobe, até o telhado, com as cimalhas de<br />
madeira, marcos e folha de caixotões,<br />
com vidraças nas partes externas. A<br />
c a p e l a , o c o r r e d o r d i r e i t o e a<br />
d e p e n d ê n c i a d o s f u n d o s s ã o<br />
assoalhados, enquanto a sacristia e o<br />
corredor esquerdo são em cimento e<br />
ladrilhos. Os marcos da sacristia são em<br />
pedra e folha de almofada, o mesmo<br />
ocorrendo com a capela do Santíssimo,<br />
enquanto a capela-mor apresenta óculos<br />
de pedra com vidros. O arco-cruzeiro é<br />
todo de madeira. A torre, também de<br />
adobe e com os pés direito em madeira,<br />
é encimada por uma cruz de ferro.<br />
Quanto à pintura, a capela apresentava<br />
as seguintes características à época do<br />
levantamento: as paredes externas<br />
amarelas, a cal e ocre; as internas da<br />
nave e corredores brancas, a cal; a<br />
capela-mor com pintura a óleo, imitando<br />
mosaicos; marcos, folhas e barras a<br />
óleo, em cores variadas; altar-mor<br />
dourado a purpurina; altares laterais<br />
brancos, com fundo azul claro; capela do<br />
Santíssimo com teto branco e paredes a<br />
óleo, já desbotadas. Segundo o<br />
historiador Salomão de Vasconcelos,<br />
esta capela é a única de Mariana que<br />
obedece ao tipo especializado de<br />
frontispício quebrado em três planos, a<br />
exemplo de Sabará, Santa Bárbara,<br />
Caeté, Catas Altas, Conceição do Serro<br />
e outras cidades mineiras. Apresenta<br />
interior simples, com altares compostos<br />
de colunas retas, arcos, capitéis e<br />
rendilhado acompanhando o estilo das<br />
colunas. Verifica-se, entretanto,<br />
distinção entre o desenho dos altares,<br />
podendo-se supor, ou que foram<br />
executados em épocas diversas, ou<br />
obedeceram ao gosto particular de cada<br />
Irmão a quem tenha sido confiada a<br />
decoração. O altar-mor é composto por<br />
bela talha e abriga uma imagem antiga<br />
de Nossa Senhora dos Anjos. Nos nichos<br />
l a t e r a i s e n c o n t r a m - s e i m a g e n s<br />
igualmente antigas de São Francisco e<br />
São Domingos. Na sacristia, pintura a<br />
óleo de excelente qualidade retratando<br />
Nossa Senhora. Cabe destacar ainda,<br />
quadro bastante expressivo, pela<br />
concepção e execução artística,<br />
representando São Francisco na<br />
meditação e no êxtase, junto ao símbolo<br />
da Sagrada Paixão e Morte de Cristo. Ao<br />
lado direito e esquerdo da Igreja fica o<br />
cemitério, onde estão enterrados os<br />
Irmãos pertencentes à Irmandade.<br />
A Confraria do Divino Espirito Santos é<br />
responsável por todas as festividades de<br />
Pentecostes, no distrito sede da cidade<br />
de Mariana, as atividades são realizadas<br />
no interior da Igreja e ruas adjacentes .<br />
14
Detalhe Órgão da Sé<br />
Interior da Igreja da Confraria.
Encontro de Congado em Mariana<br />
X - Encontro de Congado em 2017
Dentro da Festa do Divino Espirito<br />
Santo, no sábado que antecede o Dia<br />
de Pentencoste, acontece em<br />
Mariana o encontro de congados.<br />
este ano ocorreu a decima edição,<br />
c o m m a i s d e 1 4 g r u p o s d e<br />
Congados.<br />
A história da Congada no Brasil vem<br />
desde os tempos do Brasil Colônia e<br />
escravocrata e constitui-se no<br />
intercâmbio de elementos da religião<br />
africana com elementos portugueses<br />
difundidos no Brasil. A Congada é<br />
c l a s s i fi c a d a e n t r e o s d i v e r s o s<br />
folguedos: brincadeiras, divertimentos,<br />
danças e cantos de improvisos<br />
existentes na cultura brasileira.<br />
Constitui-se como um folguedo de<br />
formação afrobrasileira e destaca-se<br />
pelas tradições históricas e míticas do<br />
Congo. A prática desse folguedo é<br />
c o m p o s t a p o r v á r i o s g r u p o s<br />
afrobrasileiros: Congos, Marinheiros,<br />
Moçambique, Vilões e Catopés, que<br />
comumente são chamados de ternos.<br />
Na Congada, os grupos, por meio de<br />
danças e cantos, representam a<br />
coroação de um rei do Congo. Essas<br />
manifestações são realizadas em<br />
espaço público e nos adros das igrejas,<br />
muitas vezes contando com a presença<br />
do padre no ato da coroação. Luís da<br />
Câmara Cascudo classifica a Congada<br />
como um fenômeno genuinamente<br />
brasileiro quando afirma: “A Congada<br />
nunca existiu na África”.<br />
O congado tem uma origem luso-afrobrasileira,<br />
uma vez que o catolicismo de<br />
Portugal forneceu os elementos<br />
europeus da devoção à Senhora do<br />
Rosário, a Igreja no Brasil reforçou<br />
essa crença, enquanto os negros, de<br />
posse desses ingredientes, deram<br />
forma ao culto e à festa.<br />
X - Encontro de Congado em 2017
19<br />
Grande parte do Brasil, a devoção à N.<br />
Sra. do Rosário, Santa Ifigênia e São<br />
Benedito é a característica do catolicismo<br />
das Irmandades do Rosário em<br />
Minas Gerais, vivenciada com certos<br />
rituais africanos como a coroação de<br />
reis e rainhas, uso de instrumentos de<br />
percussão e execução de danças e<br />
embaixadas. Na realidade mineira,<br />
tem-se transformações e adaptações<br />
decorrentes do processo histórico das<br />
Irmandades. As Irmandades de N.<br />
Sra. do Rosário exerciam um papel<br />
importante durante todo o período<br />
colonial , pois absorvia os negros e<br />
era suscetível a introdução de rituais<br />
não católicos em sua atividades. Por<br />
isto que 90% dos congados no país<br />
são dedicado a Nos do Rosário.<br />
Quanto a diferênças é evidente que há<br />
: no batido dos tambores, nos cantos e<br />
ladainhas, nas vestimentas e cores<br />
entre outros. Há um ponto a destacar:<br />
O congado NS Rosário da Barroca é<br />
u m a a t i v i d a d e t r a d i c i o n a l d a<br />
Comunidade da Barroca ( Criado em<br />
19<strong>04</strong> na Cidade de piranga e depois<br />
em 1940 levado para a Barroca), já o<br />
Congado Nossa Senhora do Rosário e<br />
São Sebastião foi criado a três anos e<br />
ainda esta se afirmando como um<br />
movimento cultural em Mariana.<br />
Em Mariana, a tradição da congada foi<br />
mantida pelo Congado de Nossa<br />
Senhora do Rosário do sub-distrito de<br />
Santo Antônio da Barroca, também<br />
conhecido por Congado da Barroca.<br />
Segundo as tradições em que se<br />
baseia o congado de Nossa Senhora<br />
do Rosário transmitida pelo depoimento<br />
do Sr. Carbonato, este congado<br />
originou-se no atual município de<br />
Piranga. De acordo com ele, o José da<br />
Silva Oliveira, morador daquele local,<br />
em uma de suas visitas à Ouro Preto<br />
como funcionário de um fazendeiro da<br />
região, presenciou uma apresentação<br />
do Congado de Chico rei.<br />
Encantado com o ritual, José da Silva<br />
Oliveira rogou que lhe ensinassem as<br />
danças e embaixadas, levando para<br />
sua terra aqueles saberes e fundando,<br />
posteriormente, o congado em<br />
Piranga.<br />
Dando continuidade à história do<br />
Congado do sub-distrito de Barroca,<br />
conforme a tradição oral, após a<br />
formação da folgança em Piranga,<br />
Dona Paula da Cruz, avó do Sr.<br />
Carbonato e então residente neste<br />
município, foi escolhida para ocupar o<br />
cargo de rainha, em 19<strong>04</strong>, no qual<br />
permaneceu até o ano de 1940,<br />
quando mudou-se para o povoado de<br />
Santo Antônio da Barroca com toda<br />
sua família e diversos outros moradores<br />
daquela cidade. Dona Paula da<br />
Cruz e seu compadre Antônio Pedro<br />
decidiram organizar o congado na<br />
localidade. Antônio Pedro também<br />
participava do folguedo em Piranga e<br />
acabara de se mudar para Barroca,<br />
tornando-se o primeiro mestre de<br />
congado do local. O congado foi<br />
fundado em 1942 formado por vinte e<br />
sete componentes.<br />
O Congado de Nossa Senhora do<br />
Rosário se apresenta essencialmente<br />
em festas religiosas da região de<br />
Mariana, principalmente nos festejos<br />
em homenagem aos santos padroeiros<br />
das localidades vizinhas.<br />
Eventualmente o grupo se manifesta<br />
no dia de Nossa Senhora do Rosário.<br />
Contudo suas apresentações concentram-se<br />
no mês de maio e início de<br />
junho, quando o folguedo acontece<br />
todos os sábados e domingos, até o<br />
<strong>final</strong> da festa de Santo Antônio (13 de<br />
junho), padroeiro do sub-distrito de<br />
Barroca. Portanto, as atividades do<br />
Congado de Nossa Senhora do<br />
Rosário estão diretamente relacionadas<br />
à celebração do dia do santo<br />
padroeiro do seu local de origem.<br />
Hoje em Mariana, há outro grupo de<br />
congado, o Congado de Nossa<br />
Senhora do Rosário e São Sebastião<br />
que surgiu a pouco tem, mas mantem<br />
a tradição dos Congados de Minas.
Tambores, cantos e ritmo
Cânticos e devoção
14<br />
Arte Quartel de Dragões NS do Carmo - Cristiano Casimiro
23<br />
Um dragão era um tipo de soldado que<br />
se caraterizava por se deslocar a cavalo,<br />
mas combater a pé. Inicialmente e até<br />
meados do século XVIII, as unidades de<br />
dragões constituíam assim uma espécie<br />
de infantaria montada. Contudo, posteriormente,<br />
os dragões transformaram-se,<br />
passando de infantaria montada a tropas<br />
de genuína cavalaria.<br />
Hoje em dia, a designação "dragões" é<br />
mantida como título honorífico de<br />
algumas unidades cerimoniais.<br />
História:<br />
Talvez o antepassado mais remoto do<br />
que viria a ser o dragão tenha sido o<br />
dímaco (dimakhēs em grego) da antiga<br />
Macedónia. O dímaco era um tipo de<br />
soldado de cavalaria pesada que também<br />
lutava a pé quando era necessário.<br />
O termo "dragão" - como designação de<br />
um tipo de soldado - teria aparecido em<br />
meados do século XVI para se referir aos<br />
membros do corpo de arcabuzeiros que<br />
combatiam a pé e se deslocavam a<br />
cavalo, criados em 1554 pelo marechal<br />
de França Carlos 1º de Cossé, conde de<br />
Brissac para servir no Exército do<br />
Piemonte. A origem do termo é, contudo,<br />
incerta, pensando-se que se pode referir<br />
aos supostos dragões contidos nos<br />
estandartes das tropas do conde de<br />
Brissac ou a uma espécie arcabuz curto<br />
ou carabina usada pelas mesmas e que<br />
era então chamada "dragão". Também é<br />
referida ocasionalmente a hipótese do<br />
termo se ter originado do fato de um<br />
soldado de infantaria a galope - com a<br />
sua casaca solta e a mecha a arder ao<br />
vento - se parecer com um dragão.<br />
Quando, no início do século XVII, o Rei<br />
Gustavo II Adolfo da Suécia introduziu os<br />
dragões no seu Exército, dotou-os de um<br />
conjunto multifuncional de armas que<br />
incluía um sabre, um machado e um<br />
arcabuz.<br />
Estas primeiras tropas de dragões não<br />
eram ainda consideradas parte da<br />
cavalaria, mas sim infantaria montada.<br />
Assim, as unidades de dragões mantinham<br />
os atributos e características da<br />
infantaria, por exemplo, usando tambores<br />
em vez dos clarins e trombetas<br />
típicos da cavalaria e sendo enquadradas<br />
por oficiais de infantaria. Por outro<br />
lado, a flexibilidade que os dragões<br />
tinham como infantaria montada tornava-os<br />
na arma ideal para servir como<br />
uma espécie de gendarmaria em missões<br />
de segurança interna, incluindo a<br />
perseguição de contrabandistas, o<br />
patrulhamento das estradas e a repressão<br />
de desordens públicas. Sendo<br />
providos de cavalos de qualidade inferior<br />
e de equipamento mais básico, os<br />
regimentos de dragões eram muito mais<br />
fáceis de levantar e manter que as<br />
dispendiosas unidades de cavalaria de<br />
linha.<br />
Contudo, os dragões estavam em desvantagem<br />
quando enfretavam a genuína<br />
cavalaria. Assim, procuraram sempre<br />
obter melhores condições em termos de<br />
equitação, armamento e estatuto social.<br />
Na transição do século XVIII para o XIX,<br />
na maioria dos exércitos europeus, os<br />
dragões tinham evoluído já de tropas de<br />
infantaria montada para verdadeiras<br />
tropas cavalaria. Nesta altura, as antigas<br />
missões de exploração e funções de<br />
piquete anteriormente atribuídas aos<br />
dragões tinham sido já assumidas pelos<br />
hussardos, caçadores a cavalo e outras<br />
unidades de cavalaria ligeira em exércitos<br />
como os da Áustria, França e<br />
Prússia. Os exércitos de Espanha e<br />
Portugal chegam mesmo a abolir os<br />
dragões transformando-os em regimentos<br />
de cavalaria de linha. Inversamente,<br />
com o objetivo de reduzir os seus gastos<br />
militares, o Exército Britânico transforma<br />
todos os seus regimentos de cavalaria<br />
em unidades de dragões, que no entanto,<br />
desempenham funções de cavalaria<br />
de linha. Uma exceção foi o Exército da<br />
Rússia, onde - devido à existência dos<br />
cossacos - os dragões mantiveram as<br />
suas missões originais.
Desenho do Quartel de Dragões da Vila de nossa Senhora do Carmo<br />
Autor : Capitão de Dragões Joseph Ruiz de Oliveira - 15 de dezembro 1722<br />
Arquivo Histórico Ultramarino de Portugal<br />
A planta do forte apresentava a forma clássica das fortificações Portuguesas: um<br />
polígono estrelado, com o ângulo reentrante . De suas torres poderiam ter uma visão<br />
plena do Ribeirão do Carmo, das lavras de Mineração e das estradas , de um lado, para<br />
Vila Rica e de outro para Itaverava.<br />
24
O emprego da Cavalaria no Brasil durante<br />
o período colonial restringiu-se,<br />
inicialmente, à limitada atuação das<br />
forças milicianas durante os séculos XVI<br />
e XVII, em face da grande dificuldade<br />
para a manutenção de unidades a cavalo<br />
nos primórdios de nossa história. Este<br />
quadro seria alterado no século XVIII<br />
com a criação das unidades de Dragões<br />
e da Cavalaria Auxiliar. No ano de 1719<br />
Governador Pedro Miguel de Almeida - o<br />
Conde de Assumar, recorre ao Rei de<br />
Portugal, solicitando tropas de Dragões.<br />
O Rei de portugal por Carta Régia de 24<br />
de junho de 1719 cria na Vila de Nossa<br />
Senhora do Carmo (Mariana) Minas<br />
Gerais duas Companhias de Dragões,<br />
estas companhias são constituídas<br />
como tropa regular e disciplinada, encarregada<br />
dos serviços de guarda, dos<br />
registros, patrulhas, destacamentos e<br />
para outros serviços diversos e, sobretudo,<br />
para fazer respeitar as leis e a autoridade<br />
do governo, devendo marchar em<br />
caso de guerra, para onde este socorro<br />
fosse preciso. Com, as revoltas a <strong>final</strong>idade<br />
de impedir a sonegação de impostos<br />
e a institucionalização da violência,<br />
bem como erradicar o clima de agitação<br />
ora instalado na Capitania das Minas<br />
Gerais. O Quartel da Companhia de<br />
Dragões da Vila de Nossa Senhora do<br />
Carmo primeiro Quartel de Dragões da<br />
Capitania de Minas Gerais foi construído<br />
em Mariana localizado na atual Praça<br />
Minas Gerais para abrigar as referidas<br />
Companhias de Cavalaria, sendo a que a<br />
pastagem para os animais estendia até a<br />
fazenda do Bucão. (Praça Minas Gerais<br />
/Rua Dom Silvério e Colina do São<br />
Pedro) O pátio de cavalhada e adestramento<br />
de animais localizava-se na atual<br />
praça Gomes Freire. O quartel construído<br />
aos moldes da arquitetura militar<br />
portuguesa tinha sua frente voltada para<br />
o ribeirão do Carmo e torres de guarda<br />
para o leste e oeste. Esta fortificação foi<br />
demolida quando Villa N S.do Carmo foi<br />
elevada a cidade de Mariana em 1745, e<br />
o tração urbano foi alterado. As Terras<br />
onde se localizava o Quartel dos<br />
Dragões são adquiridas pela Câmara<br />
Municipal de Mariana para construção<br />
da atual Praça Minas Geral.<br />
O batismo de fogo se deu em janeiro de<br />
1720 em Pitangui (MG) quando ajudaram<br />
a debelar o motim promovido pelo<br />
revoltoso Domingos Rodrigues do Prado<br />
(Feu de Carvalho - Ocorrências em<br />
Pitangui).<br />
Outras ação dos Dragões da vila de<br />
Nossa Senhora do Carmo, que também<br />
eram conhecidos co Dragões do Conde<br />
de Assumar foi sufocar a Revolta de Vila<br />
Rica, também conhecida como Revolta<br />
de Filipe dos Santos em 1720. A revolta<br />
contou com a participação de vários<br />
integrantes do povo (principalmente<br />
pessoas mais pobres e da classe média<br />
de Vila Rica). Os revoltosos pegaram em<br />
armas e ocuparam alguns pontos de<br />
Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar do<br />
Ouro Preto (atual Ouro Preto, Minas<br />
Gerais). O líder, Filipe dos Santos, foi<br />
condenado e executado. O líder, Filipe<br />
dos Santos, foi condenado e executado.<br />
A Câmara Municipal de Mariana, no mês<br />
de junho, homenageia a membros da<br />
policia Militar de Minas Gerais, com a<br />
Comenda Quartel de Dragões da Vila de<br />
Nossa Senhora do Carmo. Este o evento<br />
ocorrerá no dia 22 de <strong>Junho</strong> no Cine<br />
teatro Municipal (teatro - Sesi) , às 18:30.<br />
Desenho do Quartel de Dragões de NS do Carmo<br />
25
A Escrita da Música e da Memória<br />
Uma escuta guiada do acervo do<br />
Museu da Música de Mariana
As discussões sobre o entendimento de<br />
patrimônio e memória tem se tornado<br />
cada vez mais abrangentes, sendo<br />
incluídas as práticas musicais.<br />
Podemos vê-las como manifestação<br />
artística, religiosa, de entretenimento,<br />
dentre outras presentes no cotidiano.<br />
Como prática representativa das condições<br />
humanas, pode trazer à tona<br />
aspectos de interesse central sobre a<br />
nossa cultura.<br />
Na contemporaneidade o fator ‘diversidade’<br />
tem nos exigido cada vez mais<br />
atenção à visão das identidades. Diante<br />
disso, uma das maneiras de se desenvolver<br />
uma auto percepção é, certamente,<br />
a capacidade de reconhecer a<br />
nossa própria história. A maneira como<br />
consumimos a música pode contribuir<br />
em muito para criar e recriar representações<br />
sociais. Não há um som que, ao ser<br />
registrado, não tenha sido revestido por<br />
alguma intenção. De alguma maneira,<br />
provavelmente, faremos seu uso no<br />
convívio interpessoal.<br />
O encontro com a História da Música de<br />
qualquer lugar, incluindo a brasileira,<br />
pode propiciar, de muitas maneiras, que<br />
se cruzem as histórias das pessoas.<br />
Para se cumprir esta condição são<br />
necessárias fontes, seja pelo acesso<br />
multimídia, através da transferência de<br />
dados, utilizando redes, ou MP3, CDs,<br />
k7, Vinis, seja pela música escrita no<br />
papel, enfim, mais do que as fontes, é<br />
necessário que se desenvolvam métodos<br />
consistentes para o seu trato e<br />
entendimento. Há aí a condição de<br />
acesso à uma preciosa prática cultural –<br />
aprender sobre como outras pessoas,<br />
com o passar do tempo, fizeram usos<br />
distintos para as notas e durações<br />
musicais, como foram feitas as combinações<br />
para simbolizar os sentimentos,<br />
os conflitos, e as sensibilidades pertinentes<br />
ao seu tempo.<br />
O Museu da Música de Mariana é uma<br />
instituição na qual se realizam trabalhos<br />
além da guarda da documentação. Visa<br />
propiciar a mediação do seu acervo por<br />
meio de estratégias dinâmicas, o que<br />
faz com que se ultrapasse a <strong>final</strong>idade<br />
tradicional dos museus criados no<br />
século passado, que se limitavam a<br />
exibir, sem práticas de comunicação<br />
eficientes, os objetos de seu acervo. Em<br />
função da criação destas estratégias<br />
para abordagens didáticas, visando o<br />
público não especialista, a instituição<br />
tem sido visitada como um espaço onde<br />
as práticas da guarda, manutenção e<br />
difusão da memória são realizadas de<br />
maneira interessante e acessível. Ao<br />
receber visitantes de diversas faixas<br />
etárias, têm se desenvolvido metodologia<br />
para despertar o seu potencial<br />
afetivo/cognitivo. É proposta que os<br />
ouvintes percebam as obras além da<br />
função social atribuída pelo autor, que<br />
sejam instigados a construírem suas<br />
próprias representações, seu próprio<br />
sentido e escuta da música em exposição.<br />
Visita guia ao Museu<br />
27
No caso da apropriação do Museu da<br />
Música como laboratório, a materialidade<br />
do fazer musical, ao ser explanada,<br />
é capturada pelo sentido da audição na<br />
apreciação musical. As exposições<br />
garantem uma chance maior de termos<br />
presentes ouvintes atentos, curiosos<br />
pelas <strong>final</strong>idades e usos das fontes<br />
documentais, potencializando a transmissão<br />
do conhecimento. Fala-se de<br />
antigas formas de se tocar a música<br />
que soam como absoluta novidade.<br />
Nessas incursões pelo tempo, que<br />
usam a música como fio condutor,<br />
incluem-se grupos de visitantes de<br />
quaisquer faixas etárias que busquem<br />
compreender o que se desenvolve em<br />
termos de prática de pesquisa no<br />
cotidiano da instituição. Seguem,<br />
assim, um roteiro de práticas musicológicas<br />
para demonstrar outros “pontos<br />
de escuta”.<br />
A ideia das exposições como laboratórios<br />
se deu em decorrência da própria<br />
demanda pelo conhecimento vinda dos<br />
consulentes, por meio da concepção<br />
museal que norteia o trabalho desenvolvido<br />
no MMM. Trata-se de laboratórios<br />
visitáveis, uma concepção museográfica<br />
vista pelo prisma educativo,<br />
concebido pelo caráter informacional e<br />
comunicacional da visitação.<br />
Alana Lopes - aluna da E.E. Gomes Freire de Mariana<br />
28
O conceito de informação é abordado<br />
como um processo de produção de<br />
sentido, que envolve intencionalidade,<br />
comunicação, contexto e concepção de<br />
mundo. Neste caso, um determinado<br />
emissor tem a intenção de transmitir uma<br />
mensagem que reflete seu sistema de<br />
valores e códigos com o objetivo de<br />
produzir um efeito multiplicador no<br />
sistema do receptor. (ROCHA, 1999. P.<br />
12)<br />
Os visitantes podem acompanhar o<br />
processo de planificação e higienização<br />
dos documentos feitos por um profissional<br />
da instituição. Vista de perto, é<br />
demonstrada a importância das técnicas<br />
de higienização para estabilizar os<br />
documentos. Esta fase é considerada<br />
essencial para remoção das sujidades,<br />
pois há partículas que, quando depositadas<br />
na superfície dos papéis, favorecem<br />
várias formas de deterioração do suporte.<br />
O agravo da situação pode ir desde o<br />
aumento da umidade, ao desenvolvimento<br />
de microorganismos, contaminações<br />
atmosféricas, surgimento de oxidações<br />
e acidificação.<br />
Há uma série de problemas que podem<br />
ser evitados com o processo de remover<br />
o material que, de maneira geral, se<br />
acumula como pó na superfície do<br />
documento.<br />
Em outro momento é apresentado aos<br />
visitantes os principais tipos de deterioração,<br />
tomando como exemplo, as fontes<br />
do próprio acervo, ressaltando-se a<br />
poeira, gorduras, manchas, ferrugem,<br />
cola, deformações, rupturas, auréolas,<br />
amarelecimento, biodeterioração, dentre<br />
outras. Todos os processos exibidos são<br />
precedidos pela demonstração das<br />
reações físico/químicas que se desenrolam<br />
em cada situação prejudicial ao<br />
documento o que nos coloca diante de<br />
uma abordagem multidisciplinar, tornando<br />
possível o diálogo entre o conteúdo<br />
abordado na exposição museográfica e<br />
às discussões realizadas no tratamento<br />
das fontes em laboratório.<br />
Outro aspecto importante desta etapa –<br />
por ser o primeiro contato do pesquisador<br />
com o documento – é quando se tem<br />
noção das condições em que se encontravam<br />
antes de chegar à instituição. É<br />
onde se tem início as questões em volta<br />
das origens e <strong>final</strong>idades do documento,<br />
tomando por base serem fontes manuscritas.<br />
Eis a primeira centelha para<br />
alcançar as suas dimensões históricas,<br />
tendo em vista que toda fonte primária<br />
tem o seu trajeto temporal pregresso.<br />
Instância indissociável da sua própria<br />
existência.<br />
Nem toda partitura é partitura!!!<br />
Partitura é a unidade documental que<br />
contém, superpostas, todas as vozes e<br />
instrumentos de uma determinada<br />
composição, enquanto parte cavada é a<br />
unidade documental que contém a<br />
música de uma determinada voz, instrumento<br />
ou naipe.<br />
Buscamos sempre analisar obras cujas<br />
representações estejam nos registros do<br />
nosso acervo, demonstrado o limite, por<br />
vezes sensível, entre o documento e a<br />
representação, ou manifestação de uma<br />
obra. No caso, as partes cavadas de um<br />
hino para a procissão do Corpus Christi,<br />
pelo qual é possível inferirmos vários<br />
aspectos relacionados à prática musical<br />
referente a esta celebração católica<br />
29
Em 1264 teria havido um fato considerado<br />
milagre na cidade de Bolsena, no<br />
qual a hóstia sagrada teria derramado<br />
sangue no corporal (pano litúrgico que<br />
apóia o cálice e a patena durante a<br />
Missa). A partir do ocorrido Milagre de<br />
Bolsena, passados poucos meses foi<br />
instituída a festa de Corpus Christi pelo<br />
papa Urbano IV. Como a hóstia simboliza<br />
o Corpo de Cristo, a festa tomou esse<br />
nome, tornando-se uma das mais<br />
populares do calendário litúrgico, incluindo-se,<br />
no Brasil, a cidade de Mariana,<br />
onde se instituiu a primeira diocese<br />
mineira.<br />
Desde seu surgimento a música cristã é<br />
uma oração cantada, que buscaria ser<br />
realizada de forma pura e imaterial, com<br />
devoção. O texto seria a razão de ser do<br />
canto gregoriano, baseado no princípio<br />
de Santo Agostinho de que “quem canta,<br />
ora duas vezes”. O tom solene da celebração<br />
do Corpus Christi baseou-se,<br />
como de praxe, nessa forma musical. No<br />
esteio da tradição, os textos tornaramse<br />
também a razão da criação musical<br />
dos compositores mineiros, que compunham<br />
música sacra nos séculos XVIII e<br />
XIX.<br />
A imagem abaixo demonstra uma<br />
página contendo a notação de um trecho<br />
da música dessa cerimônia, na maneira<br />
como se apresentava em livros impressos<br />
ou manuscritos daquele período,<br />
cujo objetivo seria organizar, sistematizar<br />
e guiar as celebrações católicas.<br />
Uma das práticas de aprendizagem<br />
musical mais importantes desse contexto<br />
foi, sem dúvida, o uso da cópia<br />
manuscrita. Há vários manuscritos<br />
musicais no acervo do Museu da Música<br />
em que constam textos associados a<br />
esses livros litúrgicos sendo eles principalmente<br />
o “Gradual” (livro que reúne os<br />
itens musicais da missa, diferenciandose<br />
do “Missal” por excluir os trechos<br />
cantados) e, em especial o “Teatro<br />
Eclesiástico”, da pena de Frei<br />
Domingos do Rosário, um dos livros de<br />
Cantochão mais difundidos no Reino<br />
Português entre 1743 e 1883.<br />
Dentre vários documentos manuscritos<br />
do acervo do Museu, feitos por copistas<br />
que que se utilizaram dos textos destes<br />
livros, encontra-se, em especial uma<br />
cópia, possivelmente feita na segunda<br />
metade do século XIX em Mariana. O<br />
documento escrito em papel pentagramado<br />
industrial possui 17,0 x 27,0 cm.<br />
Há pequenas manchas de tinta e,<br />
embora sejam visíveis marcas do uso, o<br />
documento apresenta excelentes<br />
condições de conservação.<br />
Esta cópia não possui ainda a atribuição<br />
nenhum um autor,em lugar ao título há<br />
apenas indicação de um 1ª, deixandonos<br />
deduzir que trata-se de uma primeira<br />
voz, e que houve outras, embora a<br />
cópia não esteja presente no mesmo<br />
conjunto documental. A escrita,<br />
demonstra domínio da pena, pulso firme<br />
e caligrafia clara para o texto<br />
30
31<br />
Estrofe 1:<br />
Sacris solemnis juncta sint gaudia,<br />
Et ex praecordiis sonent praeconia:<br />
Recedant vetera, nova sint omnia,<br />
corda, voces et opera<br />
Estrofe 4:<br />
Dedit fragilibus corporis ferculum,<br />
Dedit et tristibus sanguinis poculum...<br />
O restante desta estrofe não consta<br />
no manuscrito musical:<br />
Dicens: accipite quod trado vasculum,<br />
Omnes ex eo bibite.<br />
Estrofe 1:<br />
A esta sagrada solenidade unamonos<br />
pela alegria<br />
E da nossa alma irrompe o pregão da<br />
vitória.<br />
Morram os velhos hábitos, tudo seja<br />
novo:<br />
Corações, vozes e obras.<br />
Estrofe 4:<br />
A nossa fraqueza com a Sua própria<br />
Carne, quis fortalecer<br />
E suavizar a tristeza com a bebida do<br />
Seu Sangue,<br />
Restante da estrofe que não consta<br />
no manuscrito musical:<br />
“dizendo: tomai este cálice que Vos<br />
deixo<br />
E bebei todo dele.”
32<br />
A celebração solene, da qual este texto musicado faz parte, ainda acontece<br />
frente à igreja da Sé de Mariana e mantém o forte apelo popular, como<br />
podemos ver na foto abaixo, com a presença do Arcebispo Dom Geraldo Lyrio<br />
Rocha. Esta peça, provavelmente não soa mais nas comemorações, mas dá<br />
mostra da riqueza da sonoridade de outros tempos, onde a música seria<br />
sustentada em composições polifônicas para coro e orquestra, com<br />
envolvimento da comunidade, demonstrando outros sentidos para sua função<br />
artística e religiosa, nas práticas devocionais e sociais desse povo.
Museu da Musica de Mariana<br />
Rua Cônego Amando,161- Bairro São José<br />
www.mmmariana.com.br<br />
31 3557 2778<br />
33
Restauro dos Elementos Artísticos da Igreja do Rosário de Mariana<br />
Teto da Igreja do Rosário - Obra do Mestre Athaíde
Iinicialmente uma devoção dominicana,<br />
a partir do século XVI, o Rosário passa a<br />
ser um dos principais meios de conquista<br />
e conversão para com os chamados gentios.<br />
Esse destaque que a devoção do<br />
Rosário toma dentro das ordens missionárias<br />
pode explicar, em um primeiro<br />
momento, o sucesso alcançado por esta<br />
invocação entre os convertidos. Mais<br />
tarde os africanos colonizados e descendentes<br />
parecem ter encontrado nas<br />
irmandades dedicadas à Nossa Senhora<br />
do Rosário um espaço próprio, reservado<br />
a seu povo. As irmandades foram um<br />
fenômeno típico do século XVIII e tiveram<br />
especial abrangência no território<br />
mineiro, tendo em vista a proibição das<br />
Ordens Religiosas no território. Instituídas<br />
nas matrizes, com seus santos<br />
padroeiros entronizados nos altares laterais<br />
das naves, as irmandades foram aos<br />
poucos alcançando autonomia financeira<br />
para construção de igreja própria. Curiosamente,<br />
as irmandades de Nossa<br />
Senhora do Rosário, são sempre as primeiras<br />
a sair das matrizes e suas capelas<br />
são construídas em locais afastados,<br />
revelando a polarização inicial das populações<br />
entre os brancos proprietários, ou<br />
comerciantes, e os negros escravos. As<br />
igrejas de Nossa Senhora do Rosário e<br />
São Pedro dos Clérigos são exemplos de<br />
igrejas mais recentes ocupando novas<br />
áreas de expansão urbana no topo dos<br />
morros.<br />
Localizada na Praça do Rosário, a Igreja<br />
Nossa Senhora dos Pretos de Mariana<br />
foi construída entre 1752 e 1758 por iniciativa<br />
das irmandades de São Benedito,<br />
de Santa Ifigênia e do Rosário. Erguida<br />
em alvenaria, ela pertence à terceira fase<br />
do barroco mineiro, o estilo rococó. O<br />
templo foi construído em alvenaria de<br />
pedra. Os destaques internos vão para<br />
as obras do pintor Ataíde e do escultor e<br />
entalhador Servas.<br />
Durante as obras de restauro da Igreja<br />
que se iniciaram em 4 de janeiro de 2016,<br />
contratadas pelo Instituto do Patrimônio<br />
Histórico e Artístico Nacional, com recursos<br />
do Programa de Aceleração do Crescimento<br />
(PAC) das Cidades Históricas,<br />
um anjo segurando uma guirlanda de<br />
flores foi revelado. A tinta, que cobriu a<br />
arte por anos, foi cuidadosamente removida<br />
pela equipe de restauradores. A pintura<br />
do século XIX foi localizada no retábulo<br />
esquerdo, no fundo do camarim do<br />
altar, e é atribuída, inicialmente, a Francisco<br />
de Assis Pacífico da Conceição,<br />
filho do Mestre Ataíde.<br />
A obra foi executada pela Prefeitura de<br />
Mariana, com recursos de R$ 1,6 milhão<br />
do governo federal, valoriza os elementos<br />
artíticos no interior da igreja, os altares<br />
esculpidos pelo português Francisco<br />
Vieira Servas (1720-1811) e o forro da<br />
capela-mor de autoria de Manuel da<br />
Costa Ataíde (1762-1830), o Mestre Ataíde.<br />
‟Quando da minha participação nos trabalhos<br />
pastorais na Igreja do Rosário, percebi<br />
que alguns desenhos coloridos na parte<br />
interna do altar de São Benedito, mas<br />
nunca poderia imaginar que seriam estas<br />
pinturas maravilhosa.”<br />
Sérgio Clarindo Teixeira :<br />
Membro da Equipe de Liturgia. (foto)<br />
35
22<br />
Altar de Santa Ifigênia
Altar de São Benedito<br />
Altar de São Benedito23
Causos, Contos e Prosa<br />
Nesta edição um ‟causos” da nossa terra. Este conto é<br />
dedicado ao público infantil, mas muito adulto vai gostar.<br />
38
O fantasma no Órgão da Sé<br />
* Cristiano Casimiro<br />
Esta história se passou na Catedral da<br />
Se de Mariana, numa época que a<br />
cidade que dormia cedo, junto com as<br />
primeiras estrelas, ou logo depois da<br />
missa da noite e o sino da corrida.<br />
Tudo começou quando o Rei de Portugal<br />
Dom João VI deu de presente a Catedral<br />
da Sé um Órgão. Este Órgão construído<br />
n a A l e m a n h a , f o i d e s m o n t a d o ,<br />
encaixotado e mandado para o Rio de<br />
Janeiro, de navio, e depois em lombo de<br />
burro até Mariana. A chegada do<br />
instrumento foi de grande alegria,<br />
curiosidade e festejo na cidade.<br />
O Órgão depois de montado, coisa que<br />
deu muito trabalho, foi uma grande<br />
atração nas missas e festejos religiosos<br />
na Catedral da Se. O som do Órgão ficou<br />
famoso em todas as Minas Gerais.<br />
Com o passar dos anos o Órgão<br />
estragou, e não tinha nenhuma pessoa,<br />
em Minas Gerais e no Brasil, que<br />
pudesse concertar o instrumento...<br />
Sendo assim o órgão, parou de tocar nas<br />
missas e festejos religiosos não tiveram<br />
a participação do órgão. Então<br />
instrumento passou a ser uma peça de<br />
decoração na Catedral da Sé.<br />
Numa noite, de muita chuva, após a<br />
Missa. João Sacristão estava limpando e<br />
arrumando os bancos da igreja quando<br />
escutou um barulho que vinha lá do alto,<br />
de perto do órgão, o barulho era mais ou<br />
menos assim: PRUMM PRUMM<br />
PRUMM PRUMMMMM.<br />
João Sacristão olhou para cima, meio<br />
desconfiado, e disse:<br />
- Quem tá ai ?<br />
Ninguém respondeu.<br />
João perguntou novamente, com a voz<br />
trêmula:<br />
- Quem tá aí em cima ?<br />
A Igreja ficou em um grande silêncio, e<br />
dava para escutar até um mosquito<br />
voando.<br />
João voltou a sua tarefa de limpeza e<br />
quando ele estava limpado o último<br />
banco o barulho voltou com um som forte<br />
que parecia sair do tubo mais grosso do<br />
órgão...um barulho grave mais o menos<br />
assim PRUUUMMMM PRUUUMMMM<br />
PRUUUMMM.<br />
João já tremendo de medo, se benzeu<br />
duas vezes, pediu aos santos proteção e<br />
gritou:<br />
- Quem está tocando o órgão ? É Anjo?<br />
O som do tubo do órgão ficou ainda mais<br />
forte e toucou mais uma vez:<br />
PRUUUM PRUUMM.<br />
João não pensou duas vezes, mesmo<br />
com suas pernas tremendo como vara<br />
verde em noite de ventania, saiu<br />
correndo pela porta principal da igreja<br />
gritando: FANTASNMA ! FANTASMA!<br />
João entrou pela rua direita , passou a<br />
ponte de areia , sem olhar para trás ,sem<br />
respirara direito, a única coisa que ele<br />
fazia a l é m d e c o r r e r e r a g r i tar<br />
FANTASMA ! FANTASMA NO ÓRGÃO<br />
DA SÉ !<br />
Subiu o morro do São Gonçalo, onde<br />
morava o Padre Divino, o pároco da Sé,<br />
como se fosse um cavalo a galope.<br />
Bateu na porta da casa do padre e<br />
relatou os fatos ao pároco, aos gritos e<br />
bastante assuntado. O padre achou<br />
muito estranho aquilo tudo...<br />
Cristiano Casimiro<br />
39
40<br />
Órgão Arp Schnitger - Sé de Mariana - Marezza
O Padre vestiu a batina e desceu com a<br />
João até a Igreja da Sé. Chegando na Sé<br />
os dois entraram bem devagar, pela<br />
nave da igreja, o padre na frente com o<br />
crucifixo na mão e João Sacristão<br />
agarrado na batina do Padre Divino.<br />
Quando eles chegaram no meio da<br />
Igreja o padre deu uma boa olhada em<br />
tudo, virou a cabeça em direção a órgão<br />
e gritou:<br />
- Quem está ai ? (Não houve resposta)<br />
O Padre levantou o crucifixo que levava<br />
na mão e gritou com voz firme:<br />
-Em nome do Cristo Crucificado, quem<br />
está ai em cima?<br />
Não houve resposta e nem barulho<br />
nenhum no órgão.<br />
O padre virou para João Sacristão e<br />
disse com uma voz muito áspera:<br />
- Senhor João, isto é algum tipo de<br />
brincadeira de mau gosto? O senhor<br />
está querendo brincar comigo?<br />
João com a cabeça baixa e os olhos<br />
cheios de lágrimas disse :<br />
Não Sô Padre...O órgão tocou sim. Juro<br />
por todos os Santos e pela alma da<br />
minha falecida mãe.<br />
O padre já nervoso com o ocorrido,<br />
disse:<br />
- Jurar em falso vai lhe levar para<br />
profundezas do inferno seu infeliz.<br />
Vamos embora que já está tarde.<br />
Quando os dois já se preparavam para<br />
sair da Igreja, o Órgão fez um barulho<br />
assim:<br />
PRUMMM PRUUMMM PRUMMM.<br />
João Sacristão já saiu correndo e nem<br />
olhou para trás. O padre arrepiou todos<br />
os cabelos do corpo e começou a tremer<br />
e, também, saiu correndo para fora da<br />
Igreja.<br />
Os dois só param no <strong>final</strong> da rua direita.<br />
O Padre branco como uma cera e com<br />
os olhos arregalados e João Sacristão<br />
quase sem fala e com os cabelos em pé.<br />
Passado o susto, João virou para o<br />
padre e disse:<br />
- É mentira? É mentira? O senhor não<br />
ouviu com seus próprios ouvidos? Tem<br />
ou não tem um fantasma que toca o<br />
órgão?<br />
- É João você tem razão (disse o Padre)<br />
tem alguma coisa muito estranha<br />
naquele órgão e o eu acho que não é<br />
deste mundo. Vou contar tudo para o<br />
Bispo amanhã bem cedo. Agora vamos<br />
dormir pois já está tarde.<br />
João perguntou ao padre:<br />
- Sô Padre, A Igreja vai ficar aberta?<br />
O padre respondeu:<br />
- Vai, pois a esta hora da noite ninguém<br />
vai querer ir lá, e se for vai ter uma bela<br />
surpresa!<br />
No outro dia pela manhã, João sacristão<br />
já tinha contado para todo mundo sobre<br />
o fantasma, e o assunto se espalhou por<br />
toda cidade.<br />
O padre relatou o ocorrido ao Bispo e<br />
aos outros padres.<br />
O Bispo mandou fazer uma vigília de<br />
sete dias na Igreja da Sé e a cada duas<br />
horas fosse rezada uma missa para as<br />
almas dos mortos.<br />
E assim foi feito durante uma semana.<br />
Mas não adiantou muita coisa, pois<br />
todas as noites o barulho grave do tubo<br />
principal do órgão era escutados:<br />
PRUUMMM PRUUMMM PRUUMM<br />
PRUUMMM<br />
Quando acabou a vigília de sete dias o<br />
Bispo reuniu -se com todos os padres,<br />
pois o órgão ainda continuava tocando e<br />
muitas histórias estavam sendo<br />
contadas sobre as causas do órgão<br />
tocar toda noite. O Bispo perguntou aos<br />
padres qual seria o motivo do órgão<br />
estar tocando.<br />
Uns disseram que era uma maldição de<br />
um padre que morreu na Sé, outros<br />
falaram que era o espírito do Arp<br />
Schnigter que veio buscar o órgão e<br />
ainda havia uma grande parte dos<br />
padres que afirmava que o fantasma<br />
estava ali , pois o órgão tinha pinturas<br />
que não eram da religião católica,<br />
pinturas chinesas, e que estas pinturas<br />
vermelhas e douradas , eram coisa do<br />
capeta e atraiam maus espíritos.<br />
Bem depois de muita conversa o bispo<br />
decidiu que as missas iriam continuar a<br />
celebradas de duas vezes ao dia para<br />
tentar livrar a Igreja do fantasma e que o<br />
órgão deveria ser pintado de branco<br />
para espantar os maus espíritos.<br />
41
O Padre Divino e João Sacristão foram<br />
incumbidos da missão de pintar o órgão<br />
de branco, e assim o fizeram: montaram<br />
um andaime dentro da Igreja, misturam a<br />
cal com água para fazer a tinta... Nesta<br />
mistura João Sacristão pôs um pouco de<br />
água benta para que a tinta tivesse mais<br />
poder.<br />
Em três dias o órgão recebeu duas<br />
demão de tinta e tudo ficou branquinho<br />
como nuvem , nenhuma pintura chinesa<br />
podia ser vista, foi tudo coberto por tinta<br />
branca.<br />
Depois da pintura, o órgão ficou sem<br />
fazer barulho, não ouvia o PRUUMM<br />
PRUUM mais. Todos pesaram que o<br />
fantasma tinha indo embora e que tudo<br />
estava em paz.<br />
Já se passavam quatro dias sem barulho<br />
no órgão , João Sacristão e Padre Divino<br />
arrumavam o andor de Nossa Senhora<br />
depois da missa,quando o Órgão fez<br />
dois barulhos um forte com sempre<br />
PRUUMMM PRUUMM PRUUMM e<br />
outro fino PRIIIMM PRIIMMM PRIIMMM.<br />
Um olhou para o outro, gritaram e<br />
saíram correndo derrubando tudo que<br />
tinha pela frente e só pararam de correr<br />
no <strong>final</strong> da rua direita.Os dois brancos<br />
como cera, não conseguiam nem falar.<br />
Sentaram na ponte de areia até tomar<br />
fôlego...<br />
O Padre divino murmurou :<br />
- Agora não é um fantasma são dois.<br />
- E acho que e pai e filho, pois o barulho<br />
de um é forte e o outro é fraquinho (disse<br />
João sacristão)<br />
Passando pela ponte de areia com suas<br />
mulas de cargas estava Tião Tropeiro se<br />
espantou com o padre e sacristão àquela<br />
hora da noite sentados na ponte e com<br />
cara de quem havia visto capeta. Tião<br />
perguntou aos dois:<br />
- O que é que vocês estão fazendo aqui<br />
a esta hora e com cara que viram “ O<br />
coisa Ruim”?<br />
O Padre contou todo ocorrido para Tião.<br />
Tião propôs ao Padre e João voltar à<br />
Igreja e procurar o fantasma .<br />
A princípio o padre relutou em voltar,<br />
João não queria voltar de maneira<br />
nenhuma.<br />
Tião Tropeiro, homem muito valente e,<br />
conhecedor de muitas simpatias contar<br />
maus espíritos, disse:<br />
- Eu vou lá ver este tal de fantasma. E<br />
vocês?<br />
O padre disse com uma voz firme:<br />
-Nós também vamos (E segurou o braço<br />
de João Sacristão, que tentava fugir).<br />
Somos homens de FÉ e quem está com<br />
DEUS não pode ter medo de nada.<br />
João Sacristão murmurou:<br />
- Um é valentão o outro é homem de<br />
Deus... Esta confusão vai sobrar para<br />
mim.<br />
Quando os três chegaram à Igreja<br />
parecia que havia um concerto lá dentro.<br />
E r a P R R R U M M M P R R U U M M<br />
P R R R U U M M p r a c á , P R R IIIMM<br />
PRRRIIIMMM pra lá.<br />
Tião Tropeiro disse:<br />
- Para este órgão parar de tocar e só tirar<br />
os tubos... E aí eu quero ver como este<br />
fantasma vai tocar sem som. Vamos lá<br />
em cima tirar os tubos!!???<br />
O padre que já estava rezando desde<br />
quando entrou na Igreja disse:<br />
- Pelo Cristo Crucificado vamos.<br />
João Sacristão respondeu:<br />
- Posso ficar lá fora esperando par ver se<br />
chega alguém ?<br />
Fotografia do Órgão pintado de branco<br />
42
Tião deu um puxão em João Sacristão e<br />
os três subiram as escadas em caracol<br />
até o côro, Tião na frente com um candelabro<br />
na mão , o padre com um crucifixo e<br />
água benta e João atrás com uma vela.<br />
Quando chegaram no coro da Igreja o<br />
b a r u l h o e r a e n s u r d e c e d o r :<br />
P R R R U U M M M P R R R I I M M M<br />
PRRUUUUUUUUUUUUUUUMMMMM<br />
PRRRIIIIIMMMMM PRRUUUMMMM<br />
RRIIIIIIMMMMMM.<br />
O Padre divino começou a rezar o terço e<br />
jogar água benta no órgão, João Sacristão<br />
começou a rezar junto com o padre,<br />
Tião Tropeiro pulou a grade de madeira,<br />
que cercava o órgão, e começou a arrancar<br />
os tubos.<br />
Quanto mais força o Tião fazia para<br />
arrancar os tubos mais o som ficava alto :<br />
P R R U U U U M M M P R R R U U M M M<br />
P R R R R I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I I M M M<br />
P R R U U U U U U M M M M M M<br />
PRRRIIIIIMMMMM PRRUUUMMMM<br />
RRIIIIIIMMMMMM.<br />
Até que ele conseguiu arrancar o tubo<br />
mais alto do órgão. Neste momento o<br />
som parou e todos olharam no buraco<br />
deixado pelo grande tubo ... Lá dentro<br />
dois grandes olhos vermelhos apareceram...Os<br />
três se afastaram e um grande<br />
vulto preto começou a sair pelo buraco<br />
deixado pelo tubo. Todos se abaixaram e<br />
esconderam no coro....o medo na cara<br />
de cada um era muito grande, parecia<br />
que os três estavam vendo o “coisa<br />
ruim”.<br />
A Igreja ficou em um silêncio profundo...<br />
De dentro do órgão um par de asas cinzas<br />
saiu voando e deu a volta por toda<br />
igreja ... logo depois outro par de asas<br />
,menor, saiu do mesmo lugar e também<br />
voou pela Igreja... Os dois bichos saíram<br />
pela porta principal que João Sacristão<br />
deixou aberta.<br />
Tião Tropeiro virou e disse:<br />
- Vocês viram o tamanho dela ? E do<br />
filhote?<br />
O padre meio sem graça disse:<br />
- Não, eu estava com olho fechado<br />
-João Sacristão pergunta Dela o que?<br />
Da Coruja com seu filhote, era uma coruja<br />
criada, das bitelas, devia estar aqui a<br />
muito tempo, pois, até ninho fez e criou<br />
filhote.<br />
Depois de verificar todo órgão e de pôr o<br />
tubo no lugar o mistério do fantasma do<br />
órgão foi solucionado. Era apenas uma<br />
coruja que fez o ninho dentro do órgão e<br />
criou seu filhote. O barulho era, simplesmente<br />
,o som produzido pela coruja, que<br />
passava nos tubos do órgão. Assim na<br />
Igreja acabou os barulhos no órgão da<br />
Sé.<br />
Mas dizem que em noite de lua cheia,<br />
no período de quaresmas se ouve vários<br />
acordes no órgão ... PRUMM<br />
PRUMM PRUMM...<br />
Cristiano Casimiro<br />
43