Jornal da ABI Especial - A Cronologia dos Quadrinhos 2
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REPRODUÇÃO<br />
REPRODUÇÃO<br />
Um <strong>dos</strong> troféus de que Adolfo<br />
Aizen tinha mais orgulho era<br />
a estátua de bronze de<br />
Gutemberg que representava<br />
o Prêmio Paula Brito<br />
conferido à Editora Brasil-<br />
América em 1958 “em<br />
reconhecimento à obra de<br />
nacionalização e melhoria<br />
constante que esta empresa<br />
jornalística vem realizando<br />
no setor <strong>da</strong>s histórias em<br />
quadrinhos”, como informava<br />
a nota publica<strong>da</strong> na revista<br />
Epopéia. Ao lado de Aizen,<br />
aparece o Prefeito Sá Freire<br />
Alvim, que lhe entregou a<br />
estatueta. O prêmio foi<br />
instituído pela Secretaria<br />
Geral de Educação e Cultura<br />
do antigo Distrito Federal.<br />
Uma vista noturna do prédio <strong>da</strong> Ebal numa foto publica<strong>da</strong> na revista comemorativa Chama<strong>da</strong> Geral.<br />
A disputa ain<strong>da</strong> teria capítulos mais<br />
radicais. Em 1939, Roberto Marinho<br />
convence Aroxelas Galvão, representante<br />
do King Features, a transferir to<strong>dos</strong><br />
os personagens que Aizen publicava<br />
no Suplemento Juvenil para O Globo<br />
Juvenil. Aizen, cordialmente, avisa a<br />
seus leitores que continuassem a ler suas<br />
histórias no concorrente. Como resposta,<br />
man<strong>da</strong> registrar o nome e lança o<br />
Lobinho, que, na ver<strong>da</strong>de, era o Globinho<br />
sem a letra “G”, para impedir Marinho<br />
de apoderar-se do título.<br />
“Passa<strong>da</strong> essa fase de disputa de mercado,<br />
já na déca<strong>da</strong> de 1950 os dois se<br />
reaproximaram para combater o preconceito<br />
contra os quadrinhos. No enterro<br />
de Aizen, em 1991, Marinho se<br />
aproximou do caixão, pegou-lhe nas<br />
mãos e disse: ‘Meu amigo, meu grande<br />
amigo’...”, revela Gonçalo.<br />
mente o Adolfo, que em 1934 lançou o<br />
Suplemento Juvenil, com os heróis <strong>da</strong>quele<br />
tempo, que eram novi<strong>da</strong>de por aqui.<br />
Além do caso de O Globo Juvenil, Roberto<br />
Marinho pegou carona em outro lançamento<br />
de Aizen. Ele havia lançado o<br />
Mirim, que já era um tamanho metade<br />
de tablóide. Marinho lançou, então, o<br />
Gibi imitando o concorrente – e o termo<br />
‘gibi’ passou a ser um sinônimo de<br />
revista em quadrinhos”, recor<strong>da</strong> ele,<br />
lembrando ain<strong>da</strong> a experiência de Civita<br />
no setor. “Na déca<strong>da</strong> de 1950, Victor Civita<br />
veio para o Brasil com os direitos do<br />
Disney e lançou o Pato Donald, que foi<br />
a pedra fun<strong>da</strong>mental nesse gigante em<br />
que se transformou a Editora Abril.”<br />
Outro ponto destacado por Álvaro na<br />
trajetória de Adolfo Aizen é, claro, a<br />
Ebal. “Pela Editora Brasil-América Limita<strong>da</strong>,<br />
cria<strong>da</strong> por ele em 1945, lançou as<br />
revistas Super-Homem, Quarteto Fantástico,<br />
Homem-Aranha, Popeye, Fantasma,<br />
Mulher Maravilha, Pernalonga e outros.<br />
Tinha to<strong>dos</strong> os títulos <strong>da</strong> Marvel e <strong>da</strong><br />
DC Comics.”<br />
Em 1975, Aizen recebeu na Bienal<br />
Internacional de <strong>Quadrinhos</strong> de Lucca,<br />
na Itália, o Prêmio Yellow Kid, como<br />
reconhecimento de sua contribuição ao<br />
desenvolvimento <strong>da</strong> ‘Nona arte’, com<br />
a menção de que tinha ‘uma vi<strong>da</strong> dedica<strong>da</strong><br />
aos quadrinhos’. Outra distinção<br />
ao editor ocorreu no Brasil, por iniciativa<br />
<strong>da</strong> União Brasileira de Escritores-<br />
UBE, que instituiu o Prêmio Adolfo<br />
Aizen de Literatura Infantil, que desde<br />
os anos 1990 destaca as melhores publicações<br />
no gênero.<br />
Nas déca<strong>da</strong>s de 1950 e 1960, a Ebal era<br />
líder nas bancas, vendendo anualmente<br />
milhões de revistas e chegando a ter<br />
mais de 40 títulos mensais com tiragens<br />
superiores a 150 mil exemplares. Suas<br />
diversas publicações formaram gerações<br />
de leitores – nobre papel desempenhado<br />
pelos quadrinhos e que sempre fora destacado<br />
por Aizen. E influenciaram diretamente<br />
editores e artistas que surgiam<br />
naquela época. Em seu apogeu, a editora<br />
era dirigi<strong>da</strong>, também, por Paulo Adolfo<br />
Aizen e Naumin Aizen, filhos de Adolfo,<br />
bem como pelo jornalista Fernando<br />
Albagli. O período de crise <strong>da</strong> Ebal teve<br />
início em mea<strong>dos</strong> <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1970.<br />
Após a morte de seu criador, em 1991, a<br />
editora durou apenas quatro anos, publicando<br />
ain<strong>da</strong> um último álbum de luxo<br />
do Príncipe Valente, de Hal Foster.<br />
No prédio que pertencia à Ebal, na Rua<br />
Almério de Moura, em São Cristóvão,<br />
funciona atualmente uma escola particular.<br />
Suas revistas estão na memória de<br />
diversos brasileiros ou entre colecionadores.<br />
E o acervo do Museu <strong>dos</strong> <strong>Quadrinhos</strong>,<br />
que incluía publicações importantes de<br />
outras editoras, foi doado pela família<br />
Aizen à Fun<strong>da</strong>ção Biblioteca Nacional,<br />
que já os colocou em exposição, em 2002<br />
e 2003, na mostra HQ, O Mundo Encan-<br />
Os mais destaca<strong>dos</strong>: Aizen,<br />
Roberto Marinho e Civita<br />
Esse período também é lembrado por<br />
Álvaro de Moya, escritor, ilustrador e<br />
especialista em histórias em quadrinhos.<br />
“Os três nomes mais importantes,<br />
quando falamos de grupos editoriais de<br />
quadrinhos, são Adolfo Aizen, Roberto<br />
Marinho e Victor Civita. Principaltado<br />
<strong>dos</strong> <strong>Quadrinhos</strong>. O fato é que o legado<br />
de Aizen permanece vivo, sendo destacado<br />
por artistas <strong>dos</strong> quadrinhos.<br />
Um grande sonho de<br />
consumo: conhecer a Ebal<br />
“Os leitores como eu sabiam que o<br />
selo <strong>da</strong> Ebal era garantia de quali<strong>da</strong>de.<br />
Para quem teve a infância e adolescência<br />
nos anos 1960, uma visita à Ebal era<br />
o maior sonho de consumo. Aizen abria<br />
as portas para caravanas de visitas escolares<br />
e mostrava a gráfica que imprimia<br />
os gibis – termo que, em seu íntimo,<br />
ele abominava, pois o título pertencia<br />
ao rival Roberto Marinho. Ele <strong>da</strong>va<br />
aos visitantes um pacote de cortesia<br />
com revistas <strong>da</strong> editora. Essa política de<br />
relações públicas lhe rendia bons frutos<br />
e consoli<strong>da</strong>va a marca. Sou muito grato<br />
a Aizen porque, depois do meu pai,<br />
ele foi o primeiro que enxergou a minha<br />
vocação e me deu uma chance de trabalhar<br />
com o que eu mais gostava. Ele via<br />
potencial em mim e disse mais de uma<br />
vez que um dia eu seria ‘o futuro diretor’<br />
<strong>da</strong> editora”, relata o cartunista Ota,<br />
que segue num depoimento emocionado<br />
sobre o mestre e sua maior criação.<br />
“Para um moleque de 15 anos, como<br />
eu, era um sonho trabalhar na Ebal. O<br />
salário era baixo. Começava-se com salário-mínimo<br />
e os aumentos eram comedi<strong>dos</strong>.<br />
Mas isso era compensado<br />
pelas inúmeras vantagens. Além de fazer<br />
aquilo que eu gostava, lia as histórias<br />
antes de todo mundo, fuçava nas<br />
gavetas e encontrava centenas de coisas<br />
interessantes. Tinha acesso às coleções<br />
de tudo que eles publicavam, inclusive<br />
as encadernações do Suplemento<br />
Juvenil e Lobinho. Eu era pago<br />
para ler gibis! Aprendi como funcionava<br />
uma gráfica por dentro, a<br />
mexer com edição e fazia amizade<br />
com os visitantes ilustres que apareciam<br />
de vez em quando – ídolos<br />
de infância como Malba Tahan, Ziraldo,<br />
caravanas de editores estrangeiros<br />
e representantes <strong>dos</strong> personagens<br />
que eram publica<strong>dos</strong>... Vi coisas<br />
acontecendo, negócios sendo fecha<strong>dos</strong>...<br />
Era como um estranho que<br />
caiu nas boas graças <strong>da</strong> família real<br />
de um reino distante. De fato, a Ebal<br />
era um reino. E Aizen a chamava de<br />
O Reino Encantado <strong>da</strong>s Histórias em<br />
<strong>Quadrinhos</strong>”, relembra Ota.<br />
<strong>Jornal</strong> <strong>da</strong> <strong>ABI</strong> 362 Janeiro de 2011<br />
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