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Editorial
Três anos após o rompimento da Barragem de Fundão, das mineradoras
Samarco e Vale, em Mariana (MG), considerado o maior crime ambiental
do país, ocorrido em novembro de 2015, o Brasil é surpreendido com
mais um desastre. Dessa vez, Brumadinho, cidade localizada na região
metropolitana de Belo Horizonte, vivenciou, em janeiro deste ano, outro
crime de rompimento de barragem, também pertencente à Vale, que
deixou, até então, 240 pessoas mortas e 32 desaparecidas. Além disso, 125
hectares de florestas foram devastados, ou seja, mais de um milhão de
metros quadrados de mata nativa foram embora com a enxurrada de lama.
Todos esses acontecimentos, atrelados à falta de fiscalização que
colocam em risco a vida de milhares de trabalhadores e moradores das
regiões de mineração, evidenciam as preocupações geradas a partir da
cultura extrativista que se encontra intrínseca na sociedade. Para além
dessas situações, nascem preocupações acerca da vivência dos cidadãos do
nosso país, das leis e reformas que atingem os trabalhadores, da rotina
trabalhista e, principalmente, da conservação e sustento do meio ambiente.
A edição 27 da Curinga surge, então, em Mariana, berço de um dos
maiores crimes ambientais do mundo. Nasce na cidade que convive com
os grandes impactos sociais e demográficos devido ao rompimento de
uma barragem de rejeitos de minérios. E, foi vendo esta realidade de
perto, que entendemos a importância de se discutir, refletir e debater os
efeitos do extrativismo no nosso cotidiano. Afinal, tudo o que usamos
e fazemos, direta ou indiretamente, faz parte dessa cultura construída
ao longo dos anos. Erguer a consciência de que vivemos sob uma lógica
extrativista se mostrou um desafio, mas se fez um exercício necessário
para compreendermos o método de funcionamento de muita das coisas
que nos regem enquanto comunidade.
Em razão disso, as páginas deste dossiê, por meio de um redesenho
do projeto gráfico da Curinga, te convidam a pensar nesse tema que se
faz tão presente nos dias de hoje, mesmo sendo tão antigo. Te convidam
a refletir sobre força do trabalho, exploração do corpo humano e
as consequências da rotina laboral. Te convidam a discutir sobre as
ideias de movimento e deslocamento de estruturas sociais, políticas e
econômicas. Por fim, te convidam a conhecer a força da resistência e
como ela ainda permanece presente hoje.
A partir do cerne do conceito de extrativismo, percebemos que ele
atua na vida das pessoas muito além da perspectiva ambiental. Dessa
forma, descobrimos e documentamos que a prática toca em questões
como a apropriação cultural, a exploração do trabalho humano e do
turismo histórico, o uso do corpo da mulher no contexto da prostituição,
a superdependência da extração de minérios, a atuação dos ativistas
ambientais, o slow-fashion como alternativa para a massiva produção
de roupas, dentre outros contextos.
Assim, colocamos em evidência em cada uma das nove reportagens,
da entrevista e do perfil, o nosso foco e atenção nas pessoas com as quais
conversamos, debatemos e, acima de tudo, aprendemos, pois o ofício do
jornalismo nos permite, além de transmitir informações, que aprendamos
com o próximo. E é isso que desejamos a vocês. Boa leitura!