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Revista Curinga Edição 27

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Cultura Extrativista

Entrevista

uma justa compensação pelo que aconteceu. E

agora, esse ano, veio Brumadinho. Já havia um alerta

que havia questões erradas e, novamente, se repete.

Mesmo com esses dois casos super graves que

aconteceram, há uma insistência muito grande de

mineração e esse é um dos motivos que me levaram

a propor uma pena mais severa. Afinal, a minha

proposta com a PL 570 é justamente tornar crime

hediondo esse tipo de prática quando coloca em

risco o ecossistema e a saúde humana. No Projeto

de Lei, a saúde humana foi pensada, tanto nos que

perderam suas vidas, quanto nas comunidades

indígenas. Isso porque em Mariana teve os Krenak,

e em Brumadinho os Pataxó Hã-Hã-Hãe, que foram

removidos e hoje não estão ali. Nessa linha, é preciso

tornar visível esse tipo de discussão. Eu não concordo

com mineração, principalmente em terras indígenas.

Mariana e Brumadinho já são casos concretos, fato

acontecido. A gente precisa repensar a exploração

dos recursos hídricos e nos procedimentos que a

lei ainda inclui. E também nesses retrocessos em

termos da política ambiental, onde vemos cada vez

mais flexibilizações dos licenciamentos ambientais

para esses empreendimentos.

E quais medidas deveriam ser tomadas?

Eu acredito que a gente precisa pensar em termos

de uma fiscalização mais permanente sobre as

atuações das empresas e ter um olhar especial

para a população que depende delas. A questão

dos recursos hídricos me interessa um pouco mais

porque eu sempre tenho em mente que a água

não fica parada em determinada área. A água se

vai. Então muitos acreditam que o problema é só

aquele lá de Brumadinho e pronto, mas pessoas

que estão ali mais próximas e também mais

distantes vão ser atingidas por essa contaminação,

pelo rejeito. E a gente não pode deixar a impunidade

correr. A gente não pode deixar injustiças. Tem que

dar assistência aos trabalhadores e às vítimas. É

um dever do Estado intervir e não deixar outros

desastres. A gente tá vendo os profissionais da

área, os engenheiros, pessoas que são peritas no

assunto e o alerta que eles deixaram em Mariana.

Tudo isso está alertando agora pra Brumadinho.

Outras barragens podem se romper, então ações

devem ser tomadas de imediato.

Atualmente, vemos, na Amazônia principalmente,

um extrativismo travestido de progresso. Como

você vê e quais são os riscos para Amazônia?

Eu não chamaria isso de extrativismo, eu chamaria

de uma degradação crescente. Uma exploração

em relação aos recursos hídricos. Porque, no

extrativismo, você coleta e você deixa a árvore

em pé. É isso que eu entendo por extrativismo. Os

indígenas são extrativistas por natureza. Há povos,

por exemplo, os Waiwai, que vivem da questão da

castanha, que era castanha-do-pará, hoje castanhado-brasil,

e que se tira, usa, troca, vende, mas

mantém em pé a árvore. Esse projeto para explorar

os recursos da Amazônia incentiva o desmatamento

e outros impactos ambientais. A Amazônia tem sido

vista com um olhar em relação à exploração, sem

conservação. Exemplo disso é quando se constrói

uma hidrelétrica, que provoca vários e sérios danos

ambientais, não somente para biodiversidade, mas

para os seres humanos também. Além da questão

da mineração, que sempre tem tido uma tentativa

de regularizar, principalmente em terras indígenas.

Até agora, as mudanças do Código Florestal são

tentativas de anistiar os que provocam os danos

ambientais, dando prêmios para eles. É desvalorizar

aquele que protege, o extrativista, o que conserva, e

valorizar e perdoar aquele que já provocou o dano,

que não pode ser mensurado e tampouco reparado.

Então, a gente vê uma inversão dos valores na

política de preservação da Amazônia.

E como pensar alternativas?

A gente não enxerga alternativas. Nós [o país]

não vemos que a Amazônia pode, sim, ser uma

estratégia de economia. Temos um vasto potencial

em relação à diversidade que não é conhecida ainda,

tampouco explorada e valorizada. Nós temos vários

conhecimentos dos povos tradicionais indígenas

e o turismo ecológico. Não há investimento, não

há uma discussão. Não existe alternativa, inclusive,

na questão energética. Temos fontes de energias

renováveis, energias mais limpas, como a eólica, e

não é valorizada. Não protegem mais mananciais,

não discutem sobre matas ciliares, florestamento e

sobre proteção das áreas de conservação naturais.

Só querem ver inundação, acabar a biodiversidade,

assim, daqui a pouco não tem nem mais água potável,

que é o grande potencial da Amazônia. Enfim, existe

uma desvalorização em termos disso.

A cultura dos indígenas é, muitas vezes, usada

como fantasia em momentos como o carnaval.

Como você vê essa apropriação, principalmente

por parte do capitalismo?

Não fazendo uma imagem pejorativa, não

deturpando a história, não colocando o indígena

numa situação pejorativa, tentando levar maior

discriminação, eu não vejo problema de usar

plumas, que não seja de animais, lógico. Até gostaria

que contassem a história real dos povos indígenas.

8

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