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Revista Curinga Edição 27

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Alessandro Magno, graduado em História pela

Ufop, é morador de Ouro Preto, e, segundo ele, o

tombamento patrimonial do município supervalorizou

uma arquitetura de herança portuguesa enquanto a

herança de afrodescendentes ficou em segundo plano.

O centro se manteve preservado dentro de uma visão

eurocêntrica, enquanto a paisagem de outras áreas se

modificou com a chegada de famílias que venderam seus

casarões por não conseguirem mantê-los.

No cenário atual, muitos moradores da cidade

reclamam que os altos preços dos aluguéis de imóveis

e dos produtos do mercado não os atendem, que os

eventos culturais são excludentes e que o turismo

tem, de certa forma, causado danos à identidade

local e ao patrimônio. “Em Mariana e Ouro Preto é

comum a pichação “é da humanidade mas não é da

comunidade”. Tudo isso é muito simbólico, não só

sobre o turismo mas sobre os usos que são feitos do

patrimônio cultural, da sua transformação em objeto

de consumo”, afirma a professora Luana.

Então, podemos dizer que a gentrificação reflete na

cidade nos dias de hoje? Para o Secretário Municipal

Felipe, não. Para ele, “o problema não é de gentrificação.

Aqui o morador consegue vir no centro histórico,

consegue pagar um preço acessível no comércio, não são

excluídos desse processo”. Para Luana, mesmo que Ouro

Preto tenha vivido experiências diferentes do Pelourinho,

“é inegável que há um aburguesamento do acesso à

moradia, à oferta de restaurantes e outros serviços, é

evidente que a vida no centro histórico de Ouro Preto é

mais cara que nos bairros periféricos, por exemplo”.

Rodney Maiah, de 32 anos, é museólogo, trabalha há

cinco anos com turismo na cidade, e diz que somente

uma parte dos moradores frequentam os eventos que

acontecem no município enquanto outros não têm acesso

às festividades, nem ao menos sabem que, na maioria das

vezes, se trata de eventos gratuitos. “Os ouropretanos têm

acesso liberado aos museus em certos dias da semana,

não pagam como os turistas para visitar as igrejas, porém

muitos desconhecem esses benefícios”, afirma Maiah.

Alessandro ressalta que, durante os finais de semana,

o rigor na visitação de alguns espaços aumenta, por

consequência da maior movimentação de turistas, com

isso “o morador nunca sabe se vai ser reconhecido, se

precisa levar um comprovante de residência, ou se precisa

ter algum cadastro” para conseguir a entrada. Por conta

disso, muitos ouropretanos não se sentem confortáveis

em visitar os espaços que parecem ter sido elitizados.

Para o museólogo, um dos fatores que causam esse

contraste é a falta de divulgação: “as informações que

são disponibilizadas nas redes sociais e outros veículos

de comunicação não chegam para todas as pessoas da

mesma forma, e os mais afetados são os moradores dos

bairros mais afastados da região central do município”.

Rodney morou no bairro Saramenha de Ouro Preto

(localizado a pouco mais de 3 km do centro), há quatro

anos mudou-se para o centro da cidade e tem notado uma

diferença na forma como os moradores das duas áreas

consomem esses espaços urbanos, os eventos e os bens

culturais ali inserido. Por ter vivido as duas realidades ele

afirma que grande parte dos eventos e atividades oficiais

voltados para a cultura se concentra no centro.

Investir nessa divulgação é dever dos órgãos

públicos. De alguma forma, as informações precisam

chegar aos bairros periféricos, assim como chegam aos

turistas e aos moradores do centro histórico. O Secretário

de Turismo, não concorda que o problema seja a falta

de comunicação e sim um problema de inclusão social,

que acontece tanto em Ouro Preto, como em outras

cidades. “Os ouropretanos sabem dos eventos, sabem

onde acontece, mas não se sentem parte, isso é uma

coisa muito séria e necessita de educação patrimonial,

eles tem muito orgulho daqui, mas ainda se sentem à

margem de muita coisa”, afirma Felipe, que completa:

“precisamos trabalhar essa válvula melhor”.

A Secretaria de Turismo (Setur) de Ouro Preto criou

em 2015 o Departamento de Turismo Pedagógico para

trabalhar as questões de pertencimento, inclusão social

e a preservação patrimonial. Mais a frente, em 2017,

as Secretarias de Turismo e Educação desenvolveram

um Programa de Educação para apresentar a história

de Ouro Preto às crianças e levá-las aos monumentos.

Felipe acredita que “qualquer mudança começa pela

educação, que é a base”.

EDIÇÃO 27 | CURINGA 63

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