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Saúde em novo Paradigma
uma perturbação que nos coloca num estado de estranheza de nosso ser no
mundo. Como Canguilhem (1990, p. 67) argumenta, “ser doente é, realmente,
para o homem, viver uma vida diferente, mesmo no sentido biológico da
palavra. A doença é uma forma diferente de vida”.
Se a saúde é ligada a uma normalidade cotidiana, ter saúde é justamente
uma potência que nos joga com vitalidade na vida, no cotidiano. Assim, não
seria estranho além de perguntar o que é saúde, ou como é estar saudável,
também perguntar para quê ter saúde? Saúde não pode ser tida como um fim
em si mesmo, pois ninguém quer ter saúde para ter saúde simplesmente, mas,
pelo contrário, ter saúde é meio, uma condição que permite possibilidades no
mundo da vida. Como bem colocou Caponi, ter saúde tem sentido apenas com
a possibilidade de “abusar da saúde”. Assim, cuidar da saúde sempre nos remete
a uma busca de expandir possibilidades de ser no mundo, na integralidade
da vida enquanto ser no espírito, no corpo e na utopia, articulando limites
e imperativos. Nessa perspectiva, saúde pode ser entendida como potência
que nos joga na experimentação de nossas possibilidades mais próprias, em
relação imbricada aos desafios vitais e existenciais. Talvez por isso mesmo, a
medicina moderna seja acusada de não conseguir dar conta do objeto saúde,
pois mutila a saúde da vida dos sujeitos, mutilando junto a dimensão éticopolítica-existencial
do ter (ser) saúde, já que falar de ser saudável é também
falar de ser no mundo.
Com isso, saúde é algo desde sempre dado, mas não explícito, pois
somente podemos experimentá-la no vivenciar das possibilidades que ela
nos permite, em meio às faticidades da existência. É assim que, por exemplo,
um evento fatídico e trágico é passível de superação, como a perda de um
membro em um acidente, que apesar do trauma, conseguimos com o tempo
encontrar novos sentidos e possibilidades de ser; são sentidos e possibilidades
impossíveis de serem objeto de uma ciência metódica, pois encontram sentido
somente na vida prática dos sujeitos reais. Isso nos traz a compreensão da
natureza misteriosa do estar saudável, o que Gadamer chamou caráter oculto
da saúde. Eis que a expressão da saúde nunca se mostra por ela mesma,
mas enquanto potência para algo; torna-se fenômeno apenas nesse algo,
pois apenas se pode conceber saúde numa relação de conformidade com
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