Sage 2012 It's Easy! - Vida Económica
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44 SEXTA-FEIRA, 7 DE SETEMBRO <strong>2012</strong><br />
EM FOCO<br />
Portugal está longe<br />
de ser um destino<br />
gastronómico. Centralizar<br />
todas as ações para<br />
promover a gastronomia<br />
e vinhos portugueses<br />
num Ministério da<br />
Alimentação e promover<br />
cinco ícones eleitos da<br />
gastronomia portuguesa<br />
são algumas das propostas<br />
de José Bento dos Santos,<br />
gastrónomo conhecedor<br />
das realidades nacional e<br />
internacional, presidente<br />
da Academia Portuguesa<br />
de Gastronomia (APG) e<br />
coordenador do Programa<br />
Prove Portugal.<br />
DORA TRONCÃO<br />
agenda@vidaecomica.pt<br />
<strong>Vida</strong> <strong>Económica</strong> - Que estratégia<br />
foi delineada para dar a conhecer<br />
ao mundo a gastronomia<br />
portuguesa?<br />
José Bento dos Santos - A estratégia<br />
oficial de desenvolvimento<br />
e promoção da gastronomia<br />
portuguesa está inscrita no PENT<br />
(Programa Estratégia Nacional de<br />
Turismo) e é considerada um dos<br />
dez produtos turísticos estratégicos<br />
a desenvolver (a par do golfe,<br />
turismo náutico, turismo da<br />
natureza, city brake) e como um<br />
dos que devem ter maior crescimento<br />
anual. Quase todos os países-destino<br />
turísticos se posicionaram<br />
nesta área, alguns como a<br />
Espanha, a Dinamarca, Marrocos,<br />
Peru, com resultados muito<br />
interessantes, vide espetaculares.<br />
Em Portugal existe a intenção de<br />
desenvolver e promover o país<br />
como destino gastronómico e<br />
muitas ações dispersas e discretas<br />
são levadas a cabo: desde os importantíssimos<br />
“Peixe em Lisboa”<br />
da ATL, “Tributo a Cláudia” e<br />
“Rota das Estrelas”, passando por<br />
vários festivais e feiras gastronómicas<br />
(Vinhais, Queijo da Serra,<br />
Santarém...). O Turismo de Portugal<br />
desenvolve múltiplas ações<br />
desde as Escolas de Hotelaria que<br />
têm programas modernos e adequados<br />
ao atual mercado até, por<br />
exemplo, à formação de taxistas,<br />
com grande sucesso. Mas existem<br />
dificuldades de coordenação destes<br />
esforços, até porque muitos<br />
são levados a cabo por entidades<br />
muito diferentes (Ministérios da<br />
Economia e Turismo, da Agricultura<br />
e Pescas, dos Negócios Estrangeiros<br />
e Embaixadas, autarquias,<br />
entidades privadas) e tem-se a sensação<br />
que a resultante prática fica<br />
aquém do que desejaríamos.<br />
VE - Quais os ex-líbris na gastronomia<br />
portuguesa e de que<br />
forma se poderão tornar uma<br />
fonte de rentabilidade dentro e<br />
fora de Portugal?<br />
JBS – Em Portugal há uma<br />
grande e muito rica diversidade de<br />
produtos alimentares, um receituário<br />
com história e um conjunto<br />
importantíssimo de Chefs que<br />
constituem um património cultural<br />
gastronómico notável. Mas<br />
não podemos ter veleidades em<br />
promover tudo ao mesmo tempo.<br />
A APG propôs no programa<br />
Prove Portugal cinco “ex-líbris” ou<br />
ícones da nossa gastronomia, passíveis<br />
de fazer a diferença para uma<br />
promoção eficaz: o nosso peixe,<br />
que intitulámos “o melhor peixe<br />
do mundo”, já que assim é considerado<br />
por Chefs internacionais<br />
de topo, poderá constituir uma<br />
fantástica “marca” para o nosso<br />
país; a “cataplana”, razoavelmente<br />
conhecida no estrangeiro, utensílio<br />
de cozinha de rara beleza, único<br />
e associado a uma cozinha saborosíssima<br />
e saudável (dieta mediterrânica);<br />
o “pastel de nata”, símbolo<br />
da nossa maravilhosa doçaria e que<br />
já conquistou o mundo; o “vinho<br />
do Porto” e, por acréscimo, os<br />
nossos vinhos de mesa, por forma<br />
a sermos reconhecidos como<br />
produtores de vinhos de altíssima<br />
qualidade, e os nossos Chefs, dos<br />
quais teremos de promover os<br />
mais capazes de serem reconhecidos<br />
ao topo do ranking mundial,<br />
pois serão eles que mais atrairão os<br />
turistas gastronómicos.<br />
VE - A gastronomia é uma<br />
fonte de receitas nos países que<br />
nela apostam como componente<br />
da sua identidade?<br />
JBS - Dos 57 milhões de turistas<br />
que visitam a Espanha, cerca de 10<br />
milhões já se deslocam expressamente<br />
para saborearem a culinária<br />
espanhola. Não será o caso de Portugal,<br />
onde a percentagem de turistas<br />
gastronómicos será mínima, pois<br />
a nossa gastronomia/vinhos não é<br />
suficientemente reconhecida lá fora.<br />
Temos a consolação de muitos turistas<br />
referirem que gostaram muito<br />
do que comeram por cá, um dado<br />
que importa reconhecer e explorar.<br />
VE - Gastronomia, Vinhos e<br />
Turismo são a trilogia que pode<br />
ajudar Portugal a sair da crise?<br />
JBS - Em termos gastronómicos,<br />
a questão da (boa) alimentação<br />
é vital e Portugal poderia ser<br />
um exemplo pela positiva (o que,<br />
aliás, já está a acontecer com a<br />
escolha maciça pelos consumidores<br />
de produtos portugueses, em<br />
detrimento dos estrangeiros). A<br />
questão passa ainda pela educação<br />
do gosto (escolas, media) que trave<br />
a queda para o recurso a uma<br />
alimentação pouco saudável (e<br />
pouco saborosa) que conduz às<br />
doenças resultantes; daí que há<br />
muitas razões para o turista visitar<br />
um país ou uma região – a natureza,<br />
os monumentos, a praia, o<br />
desporto, as compras – , mas todo<br />
o turista tem de comer e beber e<br />
China pronta a comprar dívida europeia<br />
A China está em posição de adquirir obrigações da União Europeia,<br />
numa altura em que a crise da dívida está a ter impacto no crescimento<br />
mundial. Aquele país dá um apoio incondicional à Zona Euro. É<br />
um facto que a crise da dívida europeia está a ter uma forte influência<br />
no abrandamento das exportações e no crescimento chineses.<br />
JOSÉ BENTO DOS SANTOS, PRESIDENTE DA ACADEMIA PORTUGUESA DE GASTRONOMIA, FRISA<br />
“Gastronomia e vinhos portugueses<br />
precisam de plano estratégico de promoção”<br />
José Bento dos Santos, engenheiro químico industrial, proprietário e produtor<br />
de vinhos da Quinta do Monte D’ Oiro (Alenquer), presidente da Academia<br />
Portuguesa de Gastronomia e coordenador do Programa Prove Portugal<br />
destinado à promoção dos vinhos e gastronomia portugueses.<br />
quanto melhor o fizer, melhor será<br />
a sua memória (a memória mais<br />
presente de qualquer viagem é<br />
sempre a da comida). Os esforços<br />
para atingir os desideratos para a<br />
promoção da nossa gastronomia<br />
passam pela definição de uma estratégia<br />
nacional que seja aceite e<br />
participada por todas as entidades<br />
(Ministérios da Agricultura e da<br />
Economia, mas também da Educação,<br />
da Saúde, Negócios Estrangeiros<br />
e S.E. Cultura, autarquias e<br />
entidades privadas).<br />
VE – Considera que a gastronomia<br />
deveria ter um estatuto<br />
de proteção, divulgação e investimento,<br />
equivalente a um símbolo<br />
nacional?<br />
JBS - A “gastronomia” tem<br />
acérrimos defensores nos aspetos<br />
Iniciativa privada é principal alcândora de vinho português<br />
“Portugal produz vinhos cuja qualidade está<br />
ao nível dos vinhos que fizeram famosos outros<br />
países. Essa qualidade de topo não é reconhecida<br />
internacionalmente. Portugal não está na “lista” dos<br />
indubitáveis países produtores de grandes vinhos.<br />
Fomos até ultrapassados pelos “newcomers” - África<br />
do Sul, Argentina, Chile, Austrália - quando temos<br />
mais que potencial para ser tão bons ou melhores”,<br />
sustenta José Bento dos Santos. O presidente da<br />
APG reconhece que “foram feitos investimentos”<br />
de promoção infelizmente com “resultados fracos”.<br />
Portugal tem que “provar que produz vinhos<br />
extraordinários” e, caso não o faça já, “seremos<br />
ultrapassados pelas roménias, bulgárias e outros”.<br />
“Existem dificuldades<br />
de coordenação destes<br />
esforços, até porque<br />
muitos são levados a<br />
cabo por entidades<br />
muito dife rentes”<br />
Ficam as sugestões de Bento dos Santos: “apostar<br />
na alta qualidade; convidar grandes críticos como<br />
Parker ou Bettane; organizar provas de impacto<br />
mediático que surpreendam a crítica internacional”.<br />
“A ação que mais contribuiu para alcandorar o vinho<br />
português foi feita por privados, os “Douro Boys”,<br />
a quem todos os produtores portugueses deverão<br />
estar agradecidos. O caso da (minha) região de<br />
Lisboa é paradigmático. O nome “Lisboa” é uma<br />
marca extraordinária, tem um património histórico<br />
invejável (no séc. XIX o “Lisbon Wine” era talvez a<br />
mais reconhecida marca portuguesa de vinhos no<br />
estrangeiro), temos vinhos de altíssima qualidade,<br />
mas falta uma estratégia para a sua promoção.<br />
políticos, económicos e sociais e<br />
há um ponto onde os portugueses<br />
estão de acordo: “temos a melhor<br />
gastronomia do mundo!”. Só que<br />
lá fora ninguém nos reconhece essa<br />
afirmação tão convicta. A “gastronomia”<br />
já foi elevada a “património<br />
nacional” e depois disso pouco se<br />
passou. A condição de comermos<br />
pelo menos três vezes por dia não<br />
faz de nós gastrónomos e muito<br />
menos especialistas em Turismo<br />
Culinário. No nosso país dividimo-nos<br />
entre “tradicionalistas”,<br />
que só consideram como louvável<br />
a cozinha tradicional/clássica, e<br />
outros que arriscam tudo na modernidade<br />
da cozinha (confundindo<br />
espumas com fusões e tatakis<br />
com moleculares).Para estar por<br />
dentro do que se passa no mundo<br />
da culinária há que conhecer esse<br />
mundo, visitar, comparar, estudar,<br />
participar e aprender, e, se possível,<br />
de forma modesta e não exibicionista<br />
(o que é uma tentação quase<br />
universal nesta matéria). A Gastronomia<br />
e os Vinhos deviam ter um<br />
grupo de especialistas capazes de<br />
traçar um plano estratégico a prazo,<br />
discutido e aceite pelo maior<br />
número possível de interessados,<br />
a que se subordinassem as ações<br />
que, neste campo, são diariamente<br />
executadas. A entidade mais apta<br />
para o fazer seria o Ministério da<br />
Alimentação. Não existe. Talvez<br />
esse seja mesmo o nosso problema.<br />
Esta entrevista pode ser lida na íntegra em<br />
www.vidaeconomica.pt