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Prefeito restaura censura em Salvador - Revista Metrópole

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mAl u Fo n t e s<br />

Jornalismo do B<strong>em</strong> –<br />

um aleijão provinciano<br />

Num desses programas independentes que nos últimos anos se<br />

multiplicaram nas <strong>em</strong>issoras locais de TV, uma apresentadora que<br />

se pensa toda modernosa e antenada só porque faz apologia dos<br />

produtos jabaculados <strong>em</strong> sua atração, contava que estava superfeliz<br />

com os planos e a moral de sua cria, uma moçoila que havia incursionado<br />

pelos caminhos do jornalismo. A tal justificava sua felicidade<br />

argumentando que a rebenta vive a repetir que, quando se tornar<br />

profissional, só terá interesse <strong>em</strong> fazer “Jornalismo do B<strong>em</strong>”. Taí um<br />

conceito que n<strong>em</strong> os manuais de jornalismo n<strong>em</strong> os estudiosos da<br />

comunicação jamais identificaram <strong>em</strong> suas buscas.<br />

Mas qu<strong>em</strong> mora <strong>em</strong> cidades com um forte sotaque provinciano,<br />

como é o caso de <strong>Salvador</strong>, sabe sim o que é isso: é aquela deformidade<br />

profissional que poderia atender pelo nome de “puxa-saco”.<br />

Jornalismo do B<strong>em</strong> é um tipo de atuação invertebrada, ou seja, o<br />

dublê de jornalista que se adequa a qualquer contexto, dança conforme<br />

a música, ou melhor, conforme o tilintar do caixa de qu<strong>em</strong><br />

quer um espacinho e um aplausinho na mídia.<br />

Em outras palavras, Jornalismo do B<strong>em</strong> é a aquela conversinha<br />

mole, aquele textinho chinfrim que algumas vezes se ouve, vê e lê na<br />

imprensa. Consiste <strong>em</strong> <strong>em</strong>pregar toda a sorte de adjetivos elogiosos<br />

para designar um produto ou uma pessoa. O “B<strong>em</strong>” é tão melhor<br />

praticado nesse jornalismo cor-de-rosa quanto mais alto for o cacife<br />

social ou financeiro do elogiado. Os jabás (pequenos, médios ou<br />

grandes agrados que o elogiado dá ao Jornalista do B<strong>em</strong> para que<br />

este o ponha nas alturas) se sofisticam cada vez mais, sobretudo<br />

<strong>em</strong> t<strong>em</strong>pos <strong>em</strong> que se multiplicam no mercado os tratamentos<br />

médicos e estéticos de rejuvenescimento e que apresentadores e<br />

apresentadoras não são tão privilegiados assim pela genética no<br />

quesito estética. Vale de tudo: umas roupinhas jeitosas das lojas<br />

incensadas da cidade, um d<strong>em</strong>onstrativo de um tratamento médico,<br />

um par de peitos novos, uma t<strong>em</strong>porada no hotel da vez no Litoral<br />

Norte, uma passagenzinha aérea, uma boca-livre, etc.<br />

O fato é que os Jornalistas do B<strong>em</strong> faz<strong>em</strong> “de um tudo” <strong>em</strong> troca de<br />

umas migalhinhas e, a longo prazo, isso acaba por produzir um aleijão<br />

na imag<strong>em</strong> que aquela parte grandona da sociedade, provinciana e<br />

tacanha, faz da imprensa de verdade, aquela que não se identifica n<strong>em</strong><br />

como do b<strong>em</strong> e muito menos como do mal, mas como prestadora de<br />

serviço, como uma indústria que vende um produto específico: notícia,<br />

opinião, informação. Graças aos tais Jornalistas do B<strong>em</strong>, uma camada<br />

de poderosos, ex-poderosos, ricos de fachada e coisas que o valham<br />

acaba se acostumando com o elogio fácil e não suporta ser descrita <strong>em</strong><br />

termos substantivos, de tão acostumada que está aos adjetivos melosos,<br />

comprados - é bom que se diga - de profissionais que não estão no<br />

mercado para outra coisa senão para vendê-los.<br />

Embora uma coisa pareça não ter nada a ver com a outra, a verdade<br />

é que reações como a do prefeito João Henrique Carneiro, de levar aos<br />

tribunais o seu desejo de não ser criticado, encontram no famigerado<br />

Jornalismo do B<strong>em</strong> uma luva. A diferença é que enquanto uma socialite<br />

se deleita de modo ridículo com os elogios feitos por apresentadores ou<br />

colunistas desses que têm tabelas, ela sabe intimamente o quanto esse<br />

mimo público custa e, se o paga, é porque pode e quer e ninguém t<strong>em</strong><br />

nada a ver com isso. Já a um hom<strong>em</strong> público, submetido diariamente<br />

à avaliação popular (o que inclui críticas e elogios), cassa-se o direito de<br />

exigir da imprensa, seja ela qual for, a sua descrição e narração apenas<br />

nas cores e nos tons determinados por si ou sua entourage. Chega a ser<br />

lamentável, como evento constituinte do processo político d<strong>em</strong>ocrático,<br />

a expressão <strong>em</strong> foro jurídico do mero desejo de proibição de qualquer referência<br />

ao próprio nome por parte de qu<strong>em</strong> sobrevive profissionalmente<br />

justamente da aceitação da opinião pública. Como não se pode acreditar<br />

<strong>em</strong> estupidez quando se trata de um personag<strong>em</strong> aboletado d<strong>em</strong>ocraticamente<br />

no poder na terceira capital do País, só sobra mesmo o velho e<br />

pobre diagnóstico: um caso lastimável de aleijão provinciano. •<br />

44 <strong>Revista</strong> <strong>Metrópole</strong> - julho de 2007 5

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