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Enfim, num desses fins de semana em que os dois saíram juntos,<br />
chegou a hora de se separarem (para não perder o hábito, Jayme tinha que ir à<br />
Búzios com amigos e parentes), de repente ele disse:<br />
– Por que você não vem comigo?<br />
O mais interessante de tudo é que Liza aceitou pronta e naturalmente,<br />
mas sem demonstrar alguma surpresa. Era assim, tudo o que diziam e faziam<br />
vinha com a maior naturalidade, funcionava algum tipo de comunicação em que<br />
as coisas se sucediam sem maiores formalidades – e também sem a<br />
interferência daquele Destino sobrenatural que fadas, deuses e bruxas<br />
desenham especialmente para cada ser humano, como fato pré-determinado.<br />
Jayme e Liza formaram o casal do verão. Para ela principalmente, foi<br />
como um milagre, porque de repente se viu tratada de modo especial, num<br />
ambiente cuja paisagem era típica de reportagens sociais, pano de fundo para<br />
enredo e estrelas de novelas, no meio de gente que só via em revistas. Praias<br />
famosas, locais que só gente muito especial tinha acesso, as praias e lagos do<br />
norte, o mar excessivamente verde e límpido da baía de Angra dos Reis, ilhas<br />
paradisíacas muito particulares com aeroporto próprio, jatinhos, iates, refeições<br />
servidas em bufês.<br />
Nem precisa dizer que foi apenas questão de tempo e em pouco o casal<br />
estava vivendo juntos, dividindo um apartamento que não era de nenhum dos<br />
dois, mas só porque Liza cismou de não morar na casa de Jayme. De certo<br />
modo o ambiente dizia que ela tinha alguma razão: se vivessem na residência<br />
própria de Jayme a balança invisível que mede o peso do relacionamento iria<br />
pender para o lado dele. E isso ela não queria, como também não aceitava o<br />
contrário. Ambos concordaram tão rapidamente que nem chegou a ter alguma<br />
discussão. Jayme certamente estava se divertindo ao resolver morar só com<br />
ela, mas sobrava também uma sensação de liberdade que ele nunca tinha<br />
experimentado. Ali nem a sua família nem os amigos iriam chegar de surpresa<br />
entrando de supetão como faziam em sua casa. Havia necessidade de um<br />
telefonema prévio, recados na secretária, combinação antecipada, coisas<br />
assim que agora soava a ele como uma risada de independência.<br />
Vocês devem estar pensando que Liza sumiu, desapareceu. Que Jayme<br />
Bonjardim se transformou no principal suspeito, que a família vive lançando<br />
apelos desesperados pela TV – toda essa matéria que sai nos jornais<br />
diariamente. É bastante compreensível que pensem assim, ainda mais quando<br />
se vive numa cidade como São Paulo, Nova York ou Xangai e nunca se tem<br />
tempo de ouvir Brahms... Mas, acreditem, não foi nada disso. Pelo menos até<br />
agora nada de grave ou anormal ocorreu: eles estão casados e lá se vão seis<br />
anos, sem dar mostra de que vão se separar. Quem os vê juntos, quem se<br />
relaciona com o casal, velhos e novos amigos, todos, todos acabam por se<br />
entregar à simplicidade, à alegria e muitos passam a crer absolutamente que a<br />
felicidade existe. É uma religiosidade como outra qualquer, como ouvir<br />
Beethoven, por exemplo... Ou Brahms, sabe lá!<br />
Ora...