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perguntas, tirar uma dúvida ou dar um tapinha nas costas que fosse.<br />
Ultimamente até se lembravam de trazer-lhe um charuto e houve quem, com<br />
orgulho, transferisse a ele um legítimo Havana ganho de presente. Os<br />
empregados passavam e comentavam alguma coisa, geralmente lamentos,<br />
queixas. Armando dava também uma palavrinha: “Não é motivo para que perca<br />
a vontade de vencer. Esperança, esperança, a esperança é a meninice do<br />
mundo”...<br />
O garçom que o servia só para não passar o encontro em branco e para<br />
dizer alguma coisa falou das dificuldades da vida, casado com um par de filhos<br />
pequenos, difícil de sustentar, alimentos, escolas... Estranhou que Armando<br />
não sentenciasse a lamentação com uma frase bonita, mas ele pensou, só<br />
para consigo, um murmúrio interno: “Tudo é viver, tudo é vida... e sair deste<br />
mundo o mais tarde que se puder.”<br />
Estava a manhã chuvosa e o restaurante sem a freqüência habitual,<br />
pequeno de gente, sem o burburinho comum. Nesse dia Armando ainda<br />
chegou a pedir a terceira cerveja preta. Servida, ficou ali a tulipa de repouso,<br />
esquentando, perdendo a espuma, o charuto deitado no cinzeiro soltando a<br />
fumaça azul no rumo do teto.<br />
De repente Armando sentiu umas flutuações estranhas no peito e<br />
desentranhou aquele silêncio que se fez repentino sem nenhum gesto. Será<br />
que todos já se foram? – perguntou para si mesmo. Ainda recordou a frase que<br />
não disse: “... viver a vida e sair deste mundo o mais tarde que puder.”<br />
Lamentou que Yzolina estivesse demorando tanto. Sentiu um sono cansado,<br />
fechou os olhos, arriou a cabeça. Os garçons limpavam os pratos, secavam as<br />
tulipas, outros colocavam as cadeiras sobre as mesas para limpar o chão.