um abolicionista da plebe ^ A globalização vem d - Centro de ...
um abolicionista da plebe ^ A globalização vem d - Centro de ...
um abolicionista da plebe ^ A globalização vem d - Centro de ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Quinzena N 0 259 - 31/10/97 24 Nacional<br />
<strong>um</strong> voto para elegerem seus represen-<br />
tantes.<br />
No paraíso <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia <strong>de</strong>sapare-<br />
cem as diferenças entre patrões e em-<br />
pregados e a convivência harmoniosa <strong>de</strong><br />
ambos revela-se imprescindível inclusi-<br />
ve para garantir o emprego, elemento<br />
sem o qual não há nenh<strong>um</strong>a possibili<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong> do indivíduo ser elevado ao status <strong>de</strong><br />
ci<strong>da</strong>dão.<br />
Estar empregado, portanto, acaba<br />
sendo sinônimo <strong>de</strong> meio caminho an<strong>da</strong>-<br />
do no esforço <strong>de</strong> alcançar este paraíso.<br />
Por incrível que pareça, ser explorado<br />
passa a ser <strong>um</strong>a vantagem, pois signifi-<br />
ca "ser incluído" no número dos candi-<br />
<strong>da</strong>tos à ci<strong>da</strong>dão, ao passo que os infeli-<br />
zes <strong>de</strong> hoje, os "excluídos", são exata-<br />
mente aqueles que não são explorados<br />
ou que, talvez, nem ser<strong>vem</strong> para serem<br />
explorados.<br />
Reparem todos que, nesse contexto,<br />
<strong>de</strong>saparece totalmente <strong>da</strong> análise <strong>da</strong> re-<br />
ali<strong>da</strong><strong>de</strong> o fato <strong>de</strong> que a produção <strong>da</strong> ri-<br />
queza realiza<strong>da</strong> pelo trabalhador coleti-<br />
vo continua sendo apropria<strong>da</strong> pelo capi-<br />
talista em função <strong>da</strong>s relações sociais<br />
alicerça<strong>da</strong>s na proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> priva<strong>da</strong>, ga-<br />
ranti<strong>da</strong> na lei ou... na marra. E não é por<br />
acaso que isso acontece: na produção as<br />
marcas <strong>da</strong> dominação são in<strong>de</strong>léveis.<br />
No local <strong>de</strong> trabalho não encontra-<br />
mos ci<strong>da</strong>dãos e sim capitalistas e traba-<br />
lhadores assalariados que ocupam posi-<br />
ções bem <strong>de</strong>fini<strong>da</strong>s enquanto explorado-<br />
res e explorados. No interior <strong>da</strong> empre-<br />
sa, quando há espaço para a participa-<br />
ção dos operários ele é limitado àquilo<br />
que proporciona melhores condições <strong>de</strong><br />
lucrativi<strong>da</strong><strong>de</strong> para o capital. Apesar dos<br />
tapinhas nas costas, dos benefícios e dos<br />
incentivos financeiros, em nenh<strong>um</strong> mo-<br />
mento o vampiro coloca-se no lugar do<br />
pescoço ou <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> chupar o sangue <strong>de</strong><br />
suas vitimas que a ele ven<strong>de</strong>m sua força<br />
<strong>de</strong> trabalho coagi<strong>da</strong>s pela necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
garantir o seus sustento. Para além <strong>da</strong>s<br />
aparências, ao nível <strong>da</strong> produção não é<br />
possível nenh<strong>um</strong> acordo <strong>de</strong> paz entre as<br />
vítimas e o seu assassino.<br />
Ao <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar essa reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, a<br />
luta pela ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia oculta exatamente o<br />
alicerce sobre o qual se ergue a domina-<br />
ção <strong>da</strong>s elites <strong>de</strong>ntro e fora dos locais <strong>de</strong><br />
trabalho. Mais, por não relacionar a ques-<br />
tão <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> com a exploração e a pro-<br />
prie<strong>da</strong><strong>de</strong> capitalistas cna a ilusão <strong>de</strong> que.<br />
sob a égi<strong>de</strong> do capital, é possível cons-<br />
truir <strong>um</strong>a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> justa e fraterna ape-<br />
nas levando as massas a redistribuírem<br />
melhor o pouco que têm.<br />
Mas as nossas <strong>de</strong>sgraças não param<br />
por aqui. Uma vez consoli<strong>da</strong><strong>da</strong> a visão<br />
do paraíso, as classes dominantes nos<br />
avisam que chegou a hora <strong>de</strong> visitarmos<br />
os novos ambientes do inferno nos quais<br />
os trabalhadores são chamados a vive-<br />
rem os próximos anos. De fato, se o<br />
emprego é o passaporte para a ci<strong>da</strong><strong>da</strong>-<br />
nia, trata-se <strong>de</strong> ver agora até a que pon-<br />
to a lei, que <strong>de</strong>fine o espaço do ci<strong>da</strong>dão,<br />
está se tomando <strong>um</strong> empecilho á cria-<br />
ção <strong>de</strong> novos postos <strong>de</strong> trabalho e, por<br />
conseqüência, acaba inviabilizando a re-<br />
alização <strong>da</strong> própria ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia por ela pro-<br />
posta. Se o objetivo é transformar o bra-<br />
sileiro em ci<strong>da</strong>dão, faz-se necessário<br />
flexibilizar a lei naquelas poucas regras<br />
que, ao protegerem os trabalhadores,<br />
estariam negando na prática o acesso ao<br />
trabalho a <strong>um</strong>a parcela significativa do<br />
povo simples.<br />
Em outras palavras, o primeiro passo<br />
para alcançar a ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia não seria a<br />
manutenção e a realização dos poucos<br />
direitos já existentes, e sim a redução<br />
<strong>de</strong>stes como condição para, olhem só,<br />
alcançar o bem com<strong>um</strong>. Como dizem os<br />
patrões e seus intelectuais, é melhor que<br />
todos (os trabalhadores) ganhem <strong>um</strong> pou-<br />
co menos, mas que, ao reduzir o <strong>de</strong>sem-<br />
prego, <strong>um</strong> número maior <strong>de</strong> pessoas pos-<br />
sa, <strong>um</strong> dia, ser ci<strong>da</strong>dão. Não se trata,<br />
portanto, <strong>de</strong> dividir a riqueza ac<strong>um</strong>ula<strong>da</strong><br />
às custas do suor dos operários, nem,<br />
muito menos, <strong>de</strong> questionar a proprie<strong>da</strong>-<br />
<strong>de</strong> priva<strong>da</strong> dos meios <strong>de</strong> produção, mas<br />
apenas <strong>de</strong> administrar melhor a miséria<br />
já que os números <strong>de</strong> candi<strong>da</strong>tos a ela<br />
vai a<strong>um</strong>entar.<br />
Mas isso não é <strong>de</strong> se estranhar, pois<br />
o que alimenta o vampiro é <strong>um</strong>a maior<br />
quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> sangue <strong>de</strong> suas vítimas.<br />
O que preocupa mesmo é que ao longo<br />
<strong>de</strong>stes anos o senso com<strong>um</strong> do povo sim-<br />
ples, que vê como ba<strong>de</strong>rna qualquer<br />
ameaça á or<strong>de</strong>m existente e espera dos<br />
<strong>de</strong> cima a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> viver <strong>um</strong> fu-<br />
turo melhor, foi extremamente fortaleci-<br />
do pela ação <strong>de</strong> <strong>um</strong> número significativo<br />
<strong>de</strong> intelectuais e dirigentes <strong>de</strong> esquer<strong>da</strong>.<br />
Sob a ban<strong>de</strong>ira <strong>da</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia que traz<br />
em suas cores a legitimação dos limites<br />
do sistema, consciente ou inconsciente-<br />
mente, estes senhores aju<strong>da</strong>ram, e aju-<br />
<strong>da</strong>m, a direita a domesticar as formas <strong>de</strong><br />
resistência e <strong>de</strong> rebeldia <strong>da</strong>s massas, que<br />
representam os primeiros passos r<strong>um</strong>o a<br />
vôos maiores.<br />
Ao fazer refluir a ação para <strong>um</strong> campo<br />
on<strong>de</strong> as forças do capital tem melhores<br />
condições <strong>de</strong> trilhar os caminhos <strong>de</strong> sua<br />
dominação, longe <strong>de</strong> levar as classes tra-<br />
balhadoras ao paraíso, estão contribuin-<br />
do para prolongar a sua permanência no<br />
inferno <strong>da</strong> exploração. Os vampiros,<br />
emocionados, agra<strong>de</strong>cem.<br />
(') Em, Vários Autores,<br />
Brasileiro: Ci<strong>da</strong>dão?,<br />
Cultura Editores Associados,<br />
SãoPaulo, l992,Pág. 248.<br />
"Temos que lutar para mu<strong>da</strong>r o mundo.<br />
Depois disso temos que mu<strong>da</strong>r o mundo mu<strong>da</strong>do'<br />
*EmUio Gennari<br />
NEP 13 <strong>de</strong> Maio