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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE ...

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Mas agradeço a você.” (GAIMAN, p. 182) O Sonho não é Próspero, mas sim a<br />

própria magia que nele habita e que se manifesta por toda a ilha que ele, “ao seu<br />

modo”, é. Quanto a Shakespeare, que ao longo da história discute seu real valor<br />

enquanto criador, questionando a diferença entre “arte” e “técnica”, desconfiado<br />

de sua função uma vez que reconhece estar servindo como um instrumento para<br />

uma “entidade” com quem fizera um pacto e que, mesmo depois de tanto tempo,<br />

ainda cultiva dúvidas sobre se não cometera um pecado grave ao entrar em co­<br />

mércio com uma criatura possivelmente pagã, ao final da composição de sua pe­<br />

ça, este também se reconhece em sua obra e compreende que seu trabalho tam­<br />

bém é um uso de magia, e que ele próprio é Próspero. Não apenas Próspero,<br />

mas tudo o mais que existe dentro de sua obra. Ele se assume um criador, um<br />

autor, ao responder a indagação do Sonho:<br />

SONHO: Diga­me, Will: você se vê refletido em sua história?<br />

WI LIAM: Eu seria um tolo se nega se. Sou Próspero, certa­<br />

mente; e confio que serei. Mas também sou Ariel... um espírito<br />

incandescente, crepitando como um relâmpago no céu. E sou o<br />

rústico Calibã. E sou o taciturno Antônio, sempre fazendo planos.<br />

E o velho Gonzalo, dando conselhos ingênuos. E sou Trínculo, o<br />

bufão, e Estéfano, o criado, pois eles são palhaços e tolos, e eu<br />

também sou um palhaço e um tolo. E, às vezes, ébrio como e­<br />

les. (GAIMAN, 2008, p. 175­176)<br />

Terminada a sua obrigação com o Sonho, este o deixa livre para dar a sua<br />

“conclusão” à peça, e assim William Shakespeare compõe o texto final de Próspe­<br />

ro, personagem já apaziguado, cajado partido e livros de magia abandonado, as­<br />

sumindo­se enfim como um humano comum; Shakespeare então se assume igual<br />

à sua criatura e pode, afinal, aposentar­se, abandonando a pena e o papel e fale­<br />

cendo anos depois, aos cinqüenta e dois anos de idade.<br />

Mais do que uma homenagem a um dos principais vultos da literatura<br />

mundial, um “inventor do humano” como o saúda Harold Bloom, que o coloca co­<br />

mo epicentro de toda a criação artística posterior a si (e com certeza o senhor<br />

Bloom o consideraria pai da literatura o que o precedeu, porém a decência deve<br />

refreá­lo às vezes – se bem o próprio dá a entender que acredita claramente que<br />

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