Kellen Nogueira Vilhena - Biblioteca Digital de Teses e ...
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Na charge, velho e novo se confrontam: um velho senhor e o jovem guarda, um velho<br />
modo <strong>de</strong> vida e o apelo ao novo. Os elementos da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> – o bon<strong>de</strong> e as roupas<br />
acasacadas dos transeuntes (ainda que a postura corporal pouco alinhada <strong>de</strong>nuncie sua<br />
incorporação superficial) – convivem paralelamente com o estilo mo<strong>de</strong>sto <strong>de</strong> um senhor, com<br />
suas roupas xadrezes e remendadas <strong>de</strong>sconcertado com esse cenário.<br />
O tempo pacato e bucólico agora <strong>de</strong>veria dar lugar aos hábitos mo<strong>de</strong>rnos e<br />
cosmopolitas. Era difícil imaginar aquela população circulando naquele espaço surreal; e é<br />
com a monumentalida<strong>de</strong> que a República e a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> se afirmam.<br />
Desse modo, a nova capital do Estado <strong>de</strong>veria ser a concretu<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa<br />
monumentalida<strong>de</strong>: as ruas, os edifícios públicos, as novas casas e também os novos<br />
comportamentos <strong>de</strong> seus habitantes. Uma crônica, publicada três anos após a inauguração,<br />
exprime esses i<strong>de</strong>ais que orientaram esse projeto <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>:<br />
Quando uma cida<strong>de</strong> se preza <strong>de</strong> tal nome e tem, além <strong>de</strong> tudo, a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ser uma capital, há umas tantas necessida<strong>de</strong>s que se lhe impõem como documento<br />
<strong>de</strong> seu progresso e cuja realização <strong>de</strong>ve merecer-lhe os maiores e mais <strong>de</strong>cididos<br />
esforços.<br />
Nesse caso não estão apenas as necessida<strong>de</strong>s rigorosamente materiaes – a<br />
illuminação brilhante, as canalizações aperfeiçoadas, as construcções caprichosas,<br />
as conducções commodas; mas necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m moral, <strong>de</strong> feição intellectual<br />
e artística que se põem tanto quanto as outras, pela simples razão <strong>de</strong> que a vida<br />
civilizada não se resume nas manifestações mechanicas do individuo ou povo.<br />
Viver é antes <strong>de</strong> tudo pensar, sentir; ou – dizendo melhor – é vibrar. 40<br />
As dificulda<strong>de</strong>s advindas <strong>de</strong>ssas profundas transformações foram previstas por<br />
Camarate em sua crônica (sob pseudônimo <strong>de</strong> Alfredo Riancho), que, consi<strong>de</strong>rando os<br />
“muitos <strong>de</strong>feitos na educação” do povo mineiro, reconhece a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> medidas duras<br />
por parte do engenheiro-chefe da Comissão no período <strong>de</strong> construção da cida<strong>de</strong>, carecendo<br />
para isso, que logo fosse estabelecido um código <strong>de</strong> posturas em que:<br />
[...] marque lugares para cada coisa e se não o fizer teremos: Jacás <strong>de</strong> toucinho<br />
arreado na escadaria dos palácios; burros presos às colunas <strong>de</strong> mármore ou <strong>de</strong><br />
granito, como se fossem mourões <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira; conclaves e reuniões populares, aos<br />
domingos <strong>de</strong> tar<strong>de</strong>, nos peristilos e vestíbulos dos edifícios públicos, como agora<br />
nas vendas e outras infrações por todos os cantos e, para escon<strong>de</strong>rijo das quais o<br />
homem não tem a previdência do gato bem ensinado! 41<br />
40 Diário <strong>de</strong> Minas, 29-09-1900, p. 1.<br />
41 Crônica publicada no jornal Minas Gerais, em 25-10-1894, p. 2 e organizada juntamente com as outras da<br />
série na Revista do Arquivo Público Mineiro em 1985, pp. 169-172.<br />
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