O Verbo e a Carne
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O <strong>Verbo</strong> e a <strong>Carne</strong> – 2 Análises do Roustainguismo ______________________________________________ 25<br />
Ravel, girando em parafuso para levar o leitor ao fundo de um poço. Mas lá não<br />
se encontra a Verdade em sua nudez lendária e sim o dragão 23 de boca chamejante.<br />
Toda a força obsessiva de Roustaing, que primeiro o tragou para depois<br />
tragar os outros, está nesse processo alucinador. Veja-se este slogan repetido do primeiro<br />
ao quarto volume: segundo a letra, sob a capa do mistério, sob o prestígio do milagre.<br />
O leitor o lê e ouve pela primeira vez no prefácio. E dali por diante não deixa<br />
mais de vê-lo e ouvi-lo. É a técnica umbralina da obsessão, segundo o método hipnótico.<br />
Repetir, repetir e rodar sem parar. A mente adormece e o espírito se entrega.<br />
Isso explica a recomendação dos pregoeiros do roustainguismo: voltar à<br />
posição zero antes de iniciar a leitura da obra, desprevenir a mente, abandonar-se ao<br />
relax consciencial, abdicar do julgamento. Só assim o leitor se porá em condições de<br />
abrir o terceiro olho que enriqueceu Lobsang Rampa. E ao abrir esse olho demoníaco<br />
fechará para sempre os dois que Deus lhe deu para ver com clareza e precisão.<br />
O tom místico da obra, não do Misticismo elevado 24 que leva ao êxtase,<br />
mas do misticismo fanático que arrasta à fascinação, pode ser facilmente<br />
exemplificado por este breve trecho em que a humildade e a arrogância, a ingenuidade e<br />
a esperteza, a reverência e a malícia se revezam na movimentação do circuito<br />
obsessivo. Roustaing, o Revelador, o novo Messias, conta primeiro o que recebeu:<br />
"Em maio de 1865 todos os materiais estavam preparados, tanto a<br />
respeito dos Evangelhos como dos Mandamentos. O aviso de dar a conhecer aos<br />
homens, de publicar a obra da revelação me foi espontânea e mediunicamente<br />
transmitido em termos precisos”.<br />
E a seguir desencadeia as forças emocionais do caos, que vão num crescendo<br />
da humildade até à onipotência. Atrás dele estão Moisés, os evangelistas e os apóstolos:<br />
"Mero instrumento, cumpri meu dever executando tal ordem,<br />
entregando à publicidade esta, obra, que põe em foco a essência de<br />
tudo o que há de sublime na bondade e na paternidade de Deus; tudo<br />
o que há de devotamento, de abnegação e de sentimentos fraternais em<br />
Jesus, chamado o Cristo, que tão bem mereceu o título de salvador do<br />
mundo, de protetor da Terra".<br />
"A meus irmãos, quaisquer que eles sejam, quaisquer que sejam suas<br />
crenças, o culto exterior que professem, corre o dever de não se<br />
pronunciarem sobre esta obra senão depois de a terem lido<br />
integralmente e de terem seriamente meditado na explicação dos<br />
Evangelhos e dos Mandamentos. Indivisível no conjunto, suas diversas<br />
partes são solidárias e mutuamente se apoiam".<br />
Temos a impressão de ouvir, nesse ritmo solene, o próprio Moisés advertindo<br />
o povo ou Maomé proclamando a supremacia do Alcorão. Qual o espírito ingênuo e<br />
ansioso de superação de si mesmo, quem não se emocionará com esse tom de súplica<br />
e de ordenação ao mesmo tempo? As cabeças se curvam ante a vontade do<br />
Eterno. Os corações batem descompassados. É a hora em que as correntes de<br />
fluídos estrondam como trovões e arrebentam em raios no alto do Sinai, segundo a<br />
explicação final do livro. A hora em que a tábua das leis vai cair sobre Israel. A<br />
liberdade cristã é uma promessa distante, mas os espíritos crédulos a esperarão através<br />
23 “... e adoraram o dragão, porque deu à besta a sua autoridade; e adoraram a besta, dizendo: Quem é semelhante à<br />
besta? quem poderá batalhar contra ela?” (Apocalipse; 13:4).<br />
24 Armstrong, K. Uma História de Deus, cap. 7.