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Borralheira, ou o Sapatinho de Vidro (por Charles Perrault)

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casamento a pessoa a quem este anel sirva». Foi gran<strong>de</strong> a surpresa do rei e da rainha<br />

perante este pedido bizarro, mas ele estava tão mal que não <strong>ou</strong>saram dizer não.<br />

E assim começ<strong>ou</strong> a busca daquela a quem o anel <strong>de</strong>verá conferir,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do sangue, uma tão alta posição. Não há quem não queira vir<br />

apresentar o <strong>de</strong>do, nem quem queira ce<strong>de</strong>r o seu direito a tal.<br />

Tendo corrido o barulho <strong>de</strong> que para preten<strong>de</strong>r ao príncipe há que ter o <strong>de</strong>do<br />

<strong>de</strong>lgado, qualquer charlatão que queira ser bem recebido dirá agora que tem o segredo<br />

<strong>de</strong> tornar <strong>de</strong>dos finos. Uma tal, seguindo um capricho bizarro, raspa o <strong>de</strong>do como se<br />

fosse um rábano; <strong>ou</strong>tra corta ao seu um pedaço; <strong>ou</strong>tra aperta-o, crendo assim diminui-<br />

lo; <strong>ou</strong>tra ainda, usando uma certa água para o apequenar, faz cair-lhe a pele. Enfim,<br />

não há nada a que as damas não recorram para fazerem o seu <strong>de</strong>do ajustar-se ao anel.<br />

O teste foi inaugurado pelas jovens princesas, marquesas e duquesas; mas os seus<br />

<strong>de</strong>dos, embora <strong>de</strong>licados, eram <strong>de</strong>masiado grossos e não entravam. Também as<br />

con<strong>de</strong>ssas, as baronesas e <strong>de</strong>mais pessoas nobres apresentaram a mão, <strong>de</strong>bal<strong>de</strong>.<br />

Em seguida vieram as jovens <strong>de</strong> baixa extracção, cujos belos e pequenos <strong>de</strong>dos<br />

(<strong>por</strong>que há-as muito bem feitas) pareceram <strong>por</strong> vezes ajustarem-se ao anel. Mas este,<br />

sempre <strong>de</strong>masiado pequeno <strong>ou</strong> <strong>de</strong>masiado redondo, todas recusava com um <strong>de</strong>sdém<br />

quase igual.<br />

Foi preciso chegar, enfim, às criadas, cozinheiras, servas rústicas e guardadoras <strong>de</strong><br />

perus — numa palavra, a todo o rebotalho, cujas patas vermelhas e pretas esperavam,<br />

não menos que as mãos <strong>de</strong>licadas, um <strong>de</strong>stino feliz. Apresentaram-se muitas moças<br />

cujo <strong>de</strong>do, gran<strong>de</strong> e compacto, teria tão dificilmente passado no anel do príncipe<br />

como um cabo através duma agulha. Finalmente pens<strong>ou</strong>-se ter concluído, já que<br />

faltava apenas a pobre Pele <strong>de</strong> Burro lá no fundo da cozinha; mas como crer, dizia-se,<br />

que o Céu a <strong>de</strong>stinasse a reinar! O príncipe disse: «E <strong>por</strong>que não? Façam-na vir».<br />

Todos <strong>de</strong>sataram a rir, gritando: «O que é isto <strong>de</strong> fazer entrar aqui essa macaca suja!»<br />

Mas quando ela tir<strong>ou</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>baixo da pele negra uma mãozinha que parecia <strong>de</strong> marfim<br />

levemente tingido <strong>de</strong> púrpura, e o seu <strong>de</strong>dinho foi envolto à justa pelo anel fatal, a<br />

corte caiu numa surpresa insondável.<br />

Levaram-na imediatamente ao rei, mas ela pediu que antes <strong>de</strong> aparecer perante o<br />

seu amo e senhor lhe <strong>de</strong>ssem tempo <strong>de</strong> pôr um <strong>ou</strong>tro vestido. Em boa verda<strong>de</strong>, todos<br />

se preparavam para rir <strong>de</strong>sse vestido. Mas quando ela volt<strong>ou</strong> e atravess<strong>ou</strong> as salas com<br />

a sua r<strong>ou</strong>pa sumptuosa, cujas ricas belezas nunca haviam sido igualadas, então os seus<br />

charmes e graça divina ressaltaram dos seus amáveis cabelos l<strong>ou</strong>ros, em que se

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