17.04.2013 Views

imagens de memória/esquecimento na contemporaneidade

imagens de memória/esquecimento na contemporaneidade

imagens de memória/esquecimento na contemporaneidade

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

[...] as condições <strong>de</strong> arquivamento implicam todas as tensões, contradições ou<br />

aporias [...], especialmente aquelas que esboçam um movimento <strong>de</strong> promessa ou <strong>de</strong><br />

futuro não menos que <strong>de</strong> registro do passado, o conceito <strong>de</strong> arquivo não po<strong>de</strong> evitar<br />

conter em si mesmo, como todo e qualquer conceito, um certo peso <strong>de</strong> impensado.<br />

[...] Envolve a história do conceito, articula o <strong>de</strong>sejo ou o mal <strong>de</strong> arquivo, sua<br />

abertura para o futuro, sua <strong>de</strong>pendência em relação ao que está por vir, em suma,<br />

tudo o que liga o saber e a <strong>memória</strong> à promessa. (DERRIDA, 2001, p. 44-45)<br />

Muito embora a palavra e a noção <strong>de</strong> arquivo pareçam, numa primeira abordagem,<br />

apontar para o passado, remeter aos índices da <strong>memória</strong> consig<strong>na</strong>da, lembrar a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> da<br />

tradição, Ŗmais que uma coisa do passado, antes <strong>de</strong>la, o arquivo <strong>de</strong>veria pôr em questão a<br />

chegada do futuroŗ (DERRIDA, 2001, p. 47- 48), ou, em um termo que ele prefere, <strong>de</strong> um<br />

por-vir 22 . Se o arquivo e a <strong>memória</strong> são uma repetição, somos tentados a associar essa<br />

repetição a um passado, Ŗmas aqui trata-se do futuro e do arquivo como experiência<br />

irredutível do futuroŗ (DERRIDA, 2001, p. 88). O trabalho do historiador nos arquivos então,<br />

se tor<strong>na</strong> a sua garantia mais segura. Segundo Ricœur (2007, p.156), com o qual não po<strong>de</strong>mos<br />

discordar, Ŗé bom que assim seja, ao menos para <strong>de</strong>sarmar os negacionistas dos gran<strong>de</strong>s<br />

crimes, que <strong>de</strong>vem encontrar sua <strong>de</strong>rrota nos arquivosŗ; porém, como ele mesmo observa,<br />

também surgirão razões fortes para duvidar Ŗ[...] nos estágios seguintes da operação<br />

historiográfica para não comemorar a vitória sobre o arbitrário que faz a glória do trabalho<br />

nos arquivosŗ.<br />

Esta gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>sconfiança quanto aos arquivos ressurge no século XX com os<br />

testemunhos. O confronto entre os tipos <strong>de</strong> documentação é um dos principais recursos.<br />

Memórias literárias daqueles que sobreviveram à Shoah suscitam uma crise do testemunho,<br />

tendo em vista que foram escritos <strong>na</strong> dor <strong>de</strong> experiências extremas e cujo arquivamento é por<br />

isso questio<strong>na</strong>do, e parece até i<strong>na</strong>propriado, pois feriria, entre outros, o princípio judaico <strong>de</strong><br />

contar as experiências vividas para as gerações que suce<strong>de</strong>m. ŖAssim é antecipado um<br />

problema que só encontrará sua ple<strong>na</strong> expressão no fim do percurso das operações<br />

historiográficas, o da representação historiadora e <strong>de</strong> seus limitesŗ (RICŒUR, 2007, p. 187).<br />

Crise da representação sofrida não só pela historiografia, mas também no campo literário e<br />

artístico. A dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação ocorre principalmente porque a testemunha foi vítima<br />

da situação extrema da Shoah, da qual nós, enquanto receptores, também dificilmente<br />

alcançaremos toda a potência <strong>de</strong>ssa linguagem. Levi (1994 apud RICŒUR, 2007, p. 187) se<br />

22 A questão do arquivo como Ŗpenhor do futuroŗ é ainda reafirmada em vários outros pontos <strong>de</strong> Mal <strong>de</strong> Arquivo:<br />

"[...] a questão do arquivo não é, repetimos, uma questão do passado. [...] Trata-se do futuro, a própria questão<br />

do futuro, a questão <strong>de</strong> uma resposta, <strong>de</strong> uma promessa e <strong>de</strong> uma responsabilida<strong>de</strong> para amanhã. O arquivo, se<br />

queremos saber o que isto teria querido dizer, nós só o saberemos num tempo por vir. Talvez. Não amanhã, mas<br />

num tempo por vir, daqui a pouco ou talvez nuncaŗ (DERRIDA, 2001, p. 50-51).<br />

46

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!