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A noite ia límpida e bela — as virações corriam medo no deslizar das ondas.<br />
Fazia-se tarde — só se ouvia às vezes o estalar das águas no cair dos remos<br />
reluzentes de umidez, dalguma gôndola solitária, passando muda e negra nas<br />
águas.<br />
A noite ia-se límpida e bela. — O ar respirava a bafagem dos laranjais em flor.<br />
Entre o ramalhar das folhas, ao sussurrar das ondas, exalava-se às vezes a<br />
cantilena monótona do barqueiro — ou o descante ao longe de alguma barca<br />
iluminada.<br />
VI<br />
O céu se escurecia sob o crepe das nuvens que avultavam no horizonte, em<br />
ondas negras. A lua sumira seu fantasma ebúrneo sob as cortinas da escuridão.<br />
Gotas mornas de chuva começavam a cair…<br />
Davam nesse instante 10 horas em S. Marcos.<br />
Os dois vultos — o da janela e o da escadaria permaneciam ansiosos.<br />
Uma gôndola escura dobrou o canal — e aproximava-se lenta como uma ave<br />
negra aquática, com a cabeça sob a asa, resvalando em seu dormir pelo vidro das<br />
águas.<br />
A gôndola vinha sempre — o mancebo permanecia imóvel na escada.<br />
A gôndola parou no cais defronte do palácio<br />
— Aí — aí — disse uma voz argentina de mulher. .<br />
O conde ficou imóvel como bebendo a doçura daquela voz — o Árabe como<br />
despertado por ela foi até o cais…<br />
Nesse momento uma forma peregrina de mulher saltava em terra com seus<br />
pés mimosos nuns mágicos e curtos sapatos de cetim, envolta numa manta de seda,<br />
cujas franjas lhe cobriam o rosto como uma máscara, mas não tanto que algumas<br />
doiradas mechas de cabelo lhe não sobressaíssem entre elas…<br />
— É ela — disse o moço pálido, desaparecendo da janela.<br />
— Não é ela — murmurou em sua língua bárbara o selvagem filho do deserto,<br />
voltando a embuçar-se no albornoz e a recostar a fronte escura no frio das pilastras<br />
de pedra.<br />
— Ide — disse ela ao gondoleiro, atirando-lhe uma moeda de oiro. . .<br />
A gôndola partia quando ela passava o peristilo do palácio.<br />
— Adeus, Ali — disse ela, batendo-lhe com o leque. — Não falas, estátua?<br />
A face queimada do estrangeiro não se moveu.<br />
Sonhava? Esperava?<br />
Talvez ambas as coisas.<br />
FIM<br />
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