19.04.2013 Views

e-journal of children's literature - Biblioteca Digital - Universidade do ...

e-journal of children's literature - Biblioteca Digital - Universidade do ...

e-journal of children's literature - Biblioteca Digital - Universidade do ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

[E‐F@BULATIONS / E‐F@BULAÇÕES ] 6 / NOV 2010<br />

É que a Glória não via mais nada nem tinha mãos para nada a não ser... a<br />

desgraçada só teve tempo de salvar daquele pato desajeita<strong>do</strong> o galo de barro garri<strong>do</strong><br />

que um dia trouxera da feira de Barcelos para <strong>of</strong>erecer à patroa. “Traz sorte, menina!”<br />

explicou ela à mãe <strong>do</strong>s garotos, enquanto se afanava a lavar o galo na banca para<br />

depois o colocar num sítio bem visível! E assim, quan<strong>do</strong> parecia ter chega<strong>do</strong> a hora <strong>do</strong><br />

galo virar um monte de cacos, eis que surge a mão providencial da sua mais zelosa<br />

defensora e guardiã: “Ah, mesmo a tempo! Salvei-te por pouco, seu galarote!”<br />

exclamou o anjo-da-guarda chama<strong>do</strong> Glória, soltan<strong>do</strong> um longo suspiro de alívio. E<br />

enquanto se benzia com uma mão, a direita, com a esquerda a Glória enxotava o pato,<br />

como quem enxota o diabo. “Vai de retro, vai de retro, mafarrico!” repetia a mulher,<br />

“mais um bocadinho e lá ia também o Sto. António, benza-o Deus! Ah, mas esse está<br />

lá bem no alto, para ninguém lhe chegar... senão já estava escaca<strong>do</strong> há que séculos!<br />

Priva<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu esconderijo atrás <strong>do</strong> galo de Barcelos e sem poder chegar à<br />

protecção de Sto. António, também de barro pinta<strong>do</strong>, com uma carinha bem saudável<br />

mas de ar um tanto infeliz, o pato não pensou duas vezes para se empoleirar em cima<br />

<strong>do</strong> micro-ondas. O cão também não perdeu tempo nenhum e seguiu-o de imediato,<br />

desta vez às patadas contra a porta <strong>do</strong> forno. A Glória não teve meias medidas. Sabia<br />

muito bem de que é que o Leão tinha muito me<strong>do</strong>, ai se não sabia. Bastava-lhe dizer<br />

que o patrão estava aí a chegar e ameaçá-lo no focinho com um pedaço de jornal<br />

enrola<strong>do</strong>, para o cão desarvorar dali para fora, meti<strong>do</strong> em respeito! Por que é que não<br />

se lembrara disso antes? A sua cabeça já não era a mesma... também, tanta<br />

atrapalhação... era demais, era demais! Sem o pai nem a mãe a impor disciplina, os<br />

<strong>do</strong>is salafrários pintavam a manta! E tu<strong>do</strong> por causa <strong>do</strong> pato... mas logo havia de<br />

lembrar ao Manezinho de pegar na bicicleta da Nini e enfiar o pato no cesto!<br />

Eis como tu<strong>do</strong> aconteceu. A Nini, que a essa hora estava entretidíssima a<br />

pintar-se toda para ‘subir ao palco’, com risco preto, sombra turquesa, baton e rouge<br />

(como dizia a Glória), apercebeu-se <strong>do</strong> que se passava através janela <strong>do</strong> quarto de<br />

banho <strong>do</strong>s pais, tal era a balbúrdia <strong>do</strong> Mané, <strong>do</strong> pato e <strong>do</strong> cão, lá fora no pátio da<br />

cozinha! É evidente que a pequena não queria ser incomodada, muito menos<br />

descoberta... o teatrinho e, ainda mais, as pinturas, eram segre<strong>do</strong>, porque se a mãe<br />

soubesse, ela tinha de se haver com uma deprecada daquelas, para já não falar <strong>do</strong><br />

sermão <strong>do</strong> pai cheio de ideias sobre a natureza, a ecologia e as regras de saúde<br />

infantil! A mãe era igual: as pinturas diárias eram um contra-senso, completamente<br />

anti-naturais, desaconselhadíssimas para crianças! A filha não fazia a menor ideia<br />

porque é que ela tinha aquela tralha toda para se pintar se nunca punha nada na cara,<br />

ao contrário de algumas mães das suas amigas que se arranjavam todas, punham<br />

roupas fixes e pintavam-se! A mãe era até tão bonita... mas não ligava nenhuma a<br />

75

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!