dissertacao completa - FaJe
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então o discurso é justo, e sua aparente mentira deve ser julgada como resultado de uma<br />
retórica bem intencionada, ainda que não-persuasiva; (iii) se o discurso parece e é verdadeiro,<br />
então o discurso é justo e sua verdade deve ser julgada como resultado de uma retórica bem<br />
intencionada e persuasiva; (iv) se o discurso parece e é falso, então o discurso é injusto, e sua<br />
mentira deve ser julgada como resultado de uma retórica mal intencionada e não-persuasiva.<br />
Desde o exórdio e ao longo da Apologia, torna-se óbvio que Platão apresenta o<br />
discurso de Sócrates como um discurso verdadeiro e justo, resultado de uma retórica bem<br />
intencionada e persuasiva, ou seja, o discurso de Sócrates se enquadraria no que chamamos de<br />
retórica da verdade. Em contrapartida, Platão apresenta o discurso dos acusadores como um<br />
discurso aparentemente verdadeiro, mas mentiroso, portanto injusto; assim, sendo esta uma<br />
retórica mal intencionada, ainda que persuasiva, ela se enquadraria no que chamamos de<br />
retórica das aparências. Contudo, o fato é que Sócrates foi condenado e, portanto, o seu<br />
discurso, verdadeiro ou não, não persuadiu os juízes, não foi eficaz; ao passo que o discurso de<br />
seus acusadores, não sendo verdadeiro, foi, contudo, bastante eficiente. Em outras palavras, o<br />
fracasso da apología socrática é um fato; assim como também é um fato o sucesso do discurso<br />
dos acusadores. Como então reenquadrar, tanto o discurso de Sócrates, quanto o discurso de<br />
seus acusadores, em relação ao fracasso factual do discurso de um e ao sucesso factual do<br />
discurso dos outros? Seria, então, o fracasso de Sócrates fruto de uma retórica bem<br />
intencionada, porém não persuasiva? Ou seu fracasso seria fruto de um juízo injusto por parte<br />
de seus juízes? Pois, se a verdade é o critério para se inferir a justiça de um discurso e, se a<br />
excelência do juiz é julgar segundo a justiça; então, o juíz justo é aquele que se deixa afetar<br />
somente pela retórica da verdade, enquanto o juiz injusto é aquele que se deixa afetar pela<br />
retórica das aparências. Um juiz justo não se deixaria persuadir pela aparência de um discurso<br />
a despeito da justiça, pois sendo justo é excelente, e a excelência própria do juiz é justamente<br />
julgar segundo a justiça, portanto, segundo a verdade e não segundo as aparências. Em<br />
contrapartida, o juiz injusto julgaria pelas aparências, podendo incorrer em erro em seus<br />
juízos. Sendo assim, a que atribuir o fracasso factual da apología socrática: a uma retórica<br />
bem intencionada, mas não-persuasiva, ou a um juízo injusto?<br />
Tais respostas, ou ao menos as respostas de Platão, só serão esclarecidas ao longo da<br />
Apologia, mas principalmente no terceiro discurso quando Sócrates se dirigirá aos juízes, tanto<br />
aos que lhe absolveram, quanto aos que lhe condenaram, e discorrerá então sobre a razão de<br />
sua condenação. Contudo, desde já e até lá, fica patente a oposição entre ser e parecer como o<br />
horizonte último para se estabelecer a verdade e a justiça de um discurso.<br />
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