Marcadamente lírico, no texto <strong>de</strong> Andreyev, não há, por parte <strong>de</strong> suas personagens, a busca consciente <strong>de</strong> um objetivo. Assim, não existindo um objeto do querer, <strong>de</strong>saparecem consigo a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> obstáculos. Tais ausências geram, em última análise, um escape do elemento da tensão, próprio das peças bem-feitas ou construídas segundo o mo<strong>de</strong>lo dito aristotélico. Até mesmo a estrutura causa-efeito, em A vida do Homem, dá lugar a um “drama <strong>de</strong> estações” 38 , <strong>de</strong> forte caráter subjetivo, que acentua o lirismo e aponta, além do simbolismo, um traço profundamente expressionista da peça. Afinal, é fundamental lembrar que o gran<strong>de</strong> interesse dos dramaturgos expressionistas estava não “no <strong>de</strong>senvolvimento do enredo ou do personagem, mas na expressão <strong>de</strong> ‘uma alma prenhe <strong>de</strong> tragédia’” (CARLSON, 1997, p. 337). Ou ainda, nas palavras <strong>de</strong> Peter Szondi (2001, p. 126-127): O homem é visto pelo expressionismo, conscientemente, como abstractum. E, com a renúncia altiva às relações intersubjetivas, que <strong>de</strong>vem velar "a imagem do humano", suce<strong>de</strong> a recusa da forma dramática, que para o dramaturgo mo<strong>de</strong>rno se nega a si mesma porque aquelas relações se tornaram frágeis. Na montagem <strong>de</strong> Meyerhold – a que fora assistida por Chagall – o encenador, seguindo uma orientação dada pelo próprio Andreyev em seu texto, buscou construir a cena como um espaço onírico. O cenário, fundado sob um tom majoritariamente cinza, era constituído por poucos móveis <strong>de</strong> dimensões ampliadas. A maquiagem The prologue is followed by five scenes: Man’s birth and Mother’s Suffering, Love, Wedding, Catastrophe (the loss of a child), and Man’s Death” (HARSHAV, 2006, p. 72). 38 O drama <strong>de</strong> estações tem origem com o dramaturgo sueco August Strindberg e caracteriza-se pela “[...] substituição da unida<strong>de</strong> da ação pela unida<strong>de</strong> do eu. A técnica da estação dá conta <strong>de</strong>ssa substituição dissolvendo o continuum da ação em uma série <strong>de</strong> cenas. As diferentes cenas não estão em uma relação causal, não engendram, como no drama, umas às outras. Antes, elas parecem pedras isoladas, enfileiradas no fio da progressão do eu. O caráter estático e a ausência <strong>de</strong> futuro das cenas, que essa técnica epiciza (no sentido <strong>de</strong> Goethe), relacionam-se com sua estrutura, <strong>de</strong>terminada pela contraposição perspectivista do eu e do mundo. A cena dramática extrai sua dinâmica da dialética intersubjetiva, é impelida graças ao momento futuro inerente a essa dialética. Na cena do "drama <strong>de</strong> estação", ao contrário, não se <strong>de</strong>senvolve uma relação recíproca; embora o herói encontre seres humanos, eles lhe permanecem estranhos” (SZONDI, 2001, p. 60). 32
era carregada e, <strong>de</strong>mostrando a clara influência que as artes plásticas exerciam em seu trabalho, Meyerhold buscou inspiração em retratos pintados por Leonardo da Vinci e Goya no que se refere à composição física dos personagens (<strong>de</strong>ssa forma, percebe-se como, em seu trabalho como encenador, Meyerhold procurava trilhar também uma relação com as artes plásticas, buscando o caminho das telas ao palco). A experiência <strong>de</strong> Chagall como espectador <strong>de</strong>ssa montagem provocou consequências que po<strong>de</strong>m ser notadas não apenas na característica cênico teatral <strong>de</strong> O morto, mas por outros aspectos em diversas <strong>de</strong> suas obras. Em Músico, <strong>de</strong> 1922 (ver figura abaixo), por exemplo, há uma clara referência à cena do casamento <strong>de</strong> A vida do Homem, na qual os músicos aparecem com o corpo transformado em seus próprios instrumentos. Fig. 4 – Chagall, Músico, 1922. O professor Benjamin Harshav chega até mesmo a atribuir o clima onírico dos quadros do artista a tal experiência. E ainda vai além ao apontar a influência da peça 33
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ANEXO B Obras da análise ampliadas
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A casa azul, 1917. 174
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O malabarista, 1943. 176
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Os pintores, 1948. 178
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