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Ficção e Autobiografia: - Série Produção Acadêmica Premiada

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<strong>Série</strong>: <strong>Produção</strong> <strong>Acadêmica</strong> <strong>Premiada</strong><br />

Para o autor narração ficcional e factual não se distinguem, por exemplo, quanto à<br />

ordem em que os fatos são apresentados, sendo a ordem cronológica ou não uma ferramenta<br />

para ambos os tipos de texto; nem no tocante ao conceito por ele chamado de vitesse<br />

haveria distinção: velocidade sincrônica à da História ou dos fatos, não é postulado<br />

de nenhum tipo específico de narração, sendo a escolha de fidelidade ao tempo do fato<br />

narrado condicionada às leis de economia e eficácia, bem como pela importância dada<br />

pelo narrador a certos episódios. Mesmo assim admite como índice de ficcionalidade a<br />

presença de cenas detalhadas e diálogos relatados por extenso e literalmente, pois tais<br />

procedimentos excedem de certa forma a verossimilhança e dão ao leitor a impressão de<br />

ficcionalização. Além disso, o autor afirma em outro momento (Figures III) parecer ser<br />

típico de uma autobiografia a alternância entre cena e sumário, entre o que chama de<br />

“récit itératif” – narração que conta uma vez, de forma condensada, o que se produziu<br />

inúmeras vezes – e “récit singulativ” – narração que conta uma vez o que se produziu<br />

também uma única vez. Tal escolha não seria, a priori, particular a um tipo de texto, no<br />

entanto, admite que Lejeune teria razão, em análise de Proust, ao ver o uso massivo do<br />

“récit iteratif” como mais comum em textos autobiográficos, ao menos desde Rousseau<br />

e suas “Confissões” (Lejeune 1975: 114), ao passo que textos ficcionais se detêm mais<br />

no episódio singular – no caso de Proust, se trata de um romance autobiográfico cujo<br />

enfoque central é a questão da memória autobiográfica.<br />

A chave da diferenciação entre textos factuais e ficcionais estaria mesmo na categoria<br />

chamada por Genette de mode: o acesso direto à subjetividade do outro, o uso,<br />

sem justificativa, de verbos de pensamento e sentimento atribuídos a terceiros, o uso do<br />

discurso indireto-livre, enfim, usando nomenclatura própria de Genette, a focalização<br />

interna de outros personagens num texto homodiegético seria possível apenas na ficção.<br />

A uma narração factual não estariam, porém, vedadas explicações psicológicas, mas estas<br />

devem ser justificadas pela indicação da fonte ou por marcas de incerteza e suposição.<br />

Com esta análise o autor conclui dever-se atenuar a hipótese da diferenciação<br />

de regimes baseada, a priori, em elementos textuais, no entanto, um pouco de forma<br />

a conciliar as opiniões divergentes listadas em seu texto, aponta a existência de índices<br />

textuais, não só de ordem temática (como o caso óbvio de conteúdos impossíveis), mas<br />

também, como visto, na construção textual, mais recorrentes em alguns tipos de texto.<br />

O panorama da crítica autobiográfica é bastante amplo e divergente, como se pode<br />

apreender do brevíssimo esboço apresentado neste capítulo, bastante sucinto frente à<br />

complexidade do tema. De forma geral foi possível observar que as discussões baseiam-se<br />

usualmente em problemas temáticos, na dificuldade em representar-se o “eu”: especialmente<br />

a crítica da primeira metade do século passado procura analisar os problemas de<br />

se representar uma personalidade no texto. Discussões quanto às especificidades formais<br />

do gênero autobiográfico, particularmente quando comparado ao romance em primeira<br />

pessoa, surgem principalmente a partir das décadas de 60 e 70 e são dessas posições que<br />

se aproxima este trabalho. Nesta dissertação procura-se aliar a investigação das características<br />

da estrutura textual, ou seja, o modo como o conteúdo autobiográfico é constelado<br />

num texto, a outras duas questões também produtivas quando se trata de autobiografia,

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