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2.ª divisão - Post Milenio

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<strong>Post</strong>-Milénio... Às Sextas-feiras, bem pertinho de si!<br />

9 a 15 de Janeiro de 2009 23<br />

2008 Balanço:<br />

Um ano para viver o "impossível",<br />

de Obama à crise financeira<br />

Na história norte-americana, 2008 foi um ano para se viver o "impossível".<br />

Foi o ano em que, com a eleição de Barack Obama<br />

para a presidência, caíu a última barreira racial no<br />

país e foi também o ano em que um sistema financeiro<br />

baseado na desregulamentação e "impossível" de cair se<br />

desmoronou.<br />

Por isso, quando, a 20 de Janeiro, Barack Hussein<br />

Obama prestar juramento como presidente dos Estados<br />

Unidos, os norte-americanos irão sem dúvida olhar para<br />

ele não só como a encarnação do optimismo de uma nação<br />

“onde tudo é possivel”, mas também com a apreensão das<br />

incertezas económicas imediatas.<br />

Mas, ao prestar juramento, Obama será mais do que<br />

isso. Estará não só a demonstrar o que descreveu como “o<br />

poder da democracia”, mas também a força de uma campanha<br />

excepcionalmente disciplinada que soube<br />

aproveitar a onda de descontentamento com o status quo e<br />

as incertezas do futuro imediato para criar uma força<br />

política “pós-racial e trans-partidária” que sob o slogan<br />

vago de “mudança” surpreendeu o país e o mundo.<br />

É irónico que o primeiro presidente negro dos Estados<br />

Unidos só tenha conseguido começar a ganhar o apoio de<br />

figuras negras proeminentes do país e mesmo do eleitorado<br />

negro quando provou que podia ganhar eleiçoes junto<br />

do eleitorado branco.<br />

Até lá, Barack Obama era para muitos negros norteamericanos<br />

algo de estranho. Filho de pai queniano, criado<br />

por uma família branca, Obama não era produto da<br />

história dos negros norte-americanos, herdeiros do pecado<br />

original da democracia americana, a escravatura.<br />

Era, no dizer de muitos, “não suficientemente negro”,<br />

ou em palavras mais duras “preto por fora, branco por dentro”.<br />

Paradoxalmente, mas talvez também deliberadamente,<br />

Obama e a sua disciplinada campanha escolheram sempre<br />

ignorar a raça como questão em causa nestas eleições.<br />

Cronell Belcher, que trabalhou em sondagens para a<br />

campanha de Obama, disse que desde o início todos<br />

estavam cientes de que “seria difícil para um africanoamericano<br />

ser eleito presidente”, mas as sondagens indicavam<br />

tambem que “não seria difícil para um indivíduo<br />

extraordinário que por acaso fosse também africano-americano<br />

ganhar as eleições”.<br />

Obama abandonou então a identidade racial (e com<br />

isso abandonou os tradicionais líderes negros norte-americanos<br />

como Jesse Jackson) para exaltar o pluralismo e a<br />

sinergia trans-racial, trans-partidaria e trans-geracional.<br />

Conseguiu derrotar Hillary Clinton nas primárias<br />

numa campanha amarga em que, em mais um paradoxo<br />

Obama, o candidato negro que por definição racial deveria<br />

ser o desfavorecido socialmente, foi caracterizado<br />

pelos seus opositores como um “elitista”, desligado da<br />

“verdadeira América” e das “classes trabalhadoras”.<br />

Hillary Clinton, a milionária, era a mulher do povo<br />

bebendo cerveja e whisky em bares; Barack Obama era o<br />

homem de Harvard, dos restaurantes italianos e do bom<br />

vinho, que descreveu os americanos trabalhadores como<br />

“agarrados às suas armas e à sua religião”. Foi algo que o<br />

seu opositor Republicano tentou também usar sem sucesso.<br />

“Não há partes verdadeiras ou falsas da América”<br />

respondeu Obama. “Somos todos uma nação, todos orgulhosos<br />

de ser americanos, todos patriotas”. Obama reclassificou-se<br />

assim como aquele que lutava contra o “establishment”<br />

de Washington, encarnado primeiro em Hillary<br />

Clinton e depois em John McCain.<br />

A sua capacidade de angariar fundos para a campanha<br />

bateu todos os recordes, permitindo-lhe nas últimas semanas<br />

das eleições afogar a campanha de McCain com quatro<br />

anúncios de televisão para cada um do seu adversário<br />

Republicano.<br />

Permitiu-lhe também levar a campanha a estados considerados<br />

intocáveis para os Democratas, vencer em<br />

alguns e forçar o seu adversário a gastar fundos que não<br />

pensava gastar. Mais uma ironia destas eleições é que foi<br />

Barack Obama, um Democrata, quem silenciou as campanhas<br />

lideradas sempre pelos Democratas para se reformar<br />

o sistema de financiamento<br />

privado das eleições considerado<br />

corrupto ou um convite<br />

à corrupção<br />

A sua organização meticulosa,<br />

fazendo uso de voluntários<br />

e de fundos para pagar a<br />

trabalhadores, permitiu-lhe ter<br />

escritórios de campanha em<br />

todos os cantos da América,<br />

numa lição de disciplina que<br />

os analistas norte-americanos<br />

continuam a estudar.<br />

Os primeiros indícios são<br />

que o colapso financeiro vai<br />

servir para Obama seguir a via<br />

que diz ter prometido. Não é<br />

de esquerda, não é de direita, é<br />

“pela competência das pessoas,<br />

por escolher os melhores<br />

entre os melhores”.<br />

Conservadores e liberais<br />

dizem-se já confundidos mas,<br />

claro, por razões diferentes.<br />

O que reflecte o facto de<br />

muitos analistas terem afirmado<br />

que “não há qualquer indicação<br />

de que a ideologia tenha<br />

jogado um papel nas eleições”.<br />

“Foi o descontentamento<br />

com o status quo que produziu<br />

o resultado,” disse Kohut ao<br />

Washington <strong>Post</strong>.<br />

Obama teve uma vitória<br />

histórica e de grande<br />

importância, e está consciente<br />

disso. Obteve um mandato<br />

para a “mudança”. O colapso<br />

financeiro vai - mais uma vez<br />

paradoxalmente - tornar mais<br />

fácil introduzir “mudanças”. O<br />

tipo de mudanças que vão ser<br />

introduzidas pode tornar 2009<br />

no ano da surpresa.

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