2.ª divisão - Post Milenio
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<strong>Post</strong>-Milénio... Às Sextas-feiras, bem pertinho de si! 9 a 15 de Janeiro de 2009 5<br />
Passagem de Ano do Outro Mundo<br />
Continuado da página 3<br />
Verde e, mais tarde, para o<br />
Brasil.<br />
Nos finais do século<br />
XV, com base na exploração<br />
do açúcar, a Madeira<br />
constitui-se como um centro<br />
internacional de negócios,<br />
por aqui passando uma<br />
vaga de forasteiros internacionais,<br />
entre intermediários,<br />
mercadores e<br />
aventureiros, das mais<br />
diferentes origens<br />
europeias. Com base em<br />
capitais alemães, mercadores<br />
italianos e flamengos,<br />
sob a superintendência<br />
da coroa portuguesa, a produção<br />
e distribuição do açúcar<br />
madeirense foi uma das<br />
bases de formação do capitalismo<br />
mercantil internacional<br />
da época moderna.<br />
Neste quadro, o porto<br />
do Funchal conheceu desde<br />
logo um enorme incremento,<br />
por aí passando os interesses<br />
e os agentes económicos<br />
da nova sociedade mercantil,<br />
como foi o caso do<br />
aventureiro Cristóvão<br />
Colombo, então negociante<br />
de açúcar. O futuro almirante<br />
das Índias chegou a<br />
residir no Funchal algum<br />
tempo, tendo casado, entretanto,<br />
com Filipa Moniz,<br />
filha do falecido capitão do<br />
Porto Santo, Bartolomeu<br />
Perestrelo.<br />
A importância do porto<br />
do Funchal no contexto<br />
insular levou a que o<br />
pequeno burgo medieval<br />
fosse objecto de uma muito<br />
especial atenção da coroa<br />
do rei D. Manuel, mesmo<br />
antes de pensar que poderia<br />
vir a ser rei de Portugal.<br />
Nesse quadro, em 1486,<br />
então somente como duque<br />
de Beja, dava ordens para se<br />
construir um núcleo administrativo<br />
central, entre o<br />
burgo medieval de Santa<br />
Maria Maior e a área senhorial<br />
de Santa Catarina e São<br />
Pedro, residência de João<br />
Gonçalves Zarco e seus filhos<br />
e filhas. Para isso cedeu<br />
o “seu” Campo do Duque,<br />
mandando aí construir uma<br />
Câmara, com Paço para os<br />
tabeliães e uma “Igreja<br />
Grande”, que pouco tempo<br />
depois mandou transformar<br />
em sé, para sede do futuro<br />
Bispado.<br />
Tendo a sua mãe, a<br />
infanta D. Beatriz, instituído<br />
as alfândegas insulares,<br />
em 1477, uma no Funchal e<br />
outra em Machico, junto ao<br />
mar e após a sagração da sé<br />
do Funchal, mandou ainda<br />
levantar um importante<br />
edifício para Alfândega.<br />
Com o aumento das<br />
navegações no Atlântico<br />
Norte, a Madeira passou a<br />
desempenhar um importante<br />
papel de referência,<br />
pois dado o regime de ventos,<br />
todas as armadas que<br />
saíam da Europa com destino<br />
ao Atlântico Sul e ao<br />
Índico, passavam pelos<br />
mares madeirenses. Esse<br />
aspecto colocava-se mesmo<br />
para as armadas holandesas<br />
e inglesas com destino à<br />
América Central.<br />
As grandes rotas marítimas<br />
Ao longo dos séculos<br />
XVI e XVII, a ilha da<br />
Madeira, através do seu<br />
porto do Funchal, conseguiu<br />
assegurar a sua<br />
posição estratégica e comercial<br />
no quadro do Atlântico<br />
Norte, então graças a um<br />
novo produto: o vinho da<br />
Madeira. A cultura da vinha<br />
fora introduzida com os<br />
primeiros povoadores e já<br />
em 1455, o navegador<br />
veneziano Luís de<br />
Cadamosto, ao visitar a<br />
Madeira, referia a excelência<br />
das uvas madeirenses e a<br />
exportação dos seus vinhos.<br />
Por meados do século<br />
seguinte, William<br />
Shakespeare fez referência<br />
aos vinhos da Ilha em algumas<br />
das suas peças. A sua<br />
fama seria tão importante,<br />
principalmente o malvasia,<br />
que o dramaturgo descreve<br />
o duque de Clarence, irmão<br />
do rei Eduardo IV, a escolher,<br />
como morte, o ser afogado<br />
num tonel deste vinho.<br />
Nos séculos seguintes,<br />
são atribuídas aos vinhos<br />
madeirenses qualidades terapêuticas<br />
e descobre que a<br />
sua excelência ainda<br />
aumentava com as longas<br />
viagens marítimas, pelo que<br />
as grandes armadas a caminho<br />
das Índias Ocidentais e<br />
Orientais passam quase que<br />
obrigatoriamente pela<br />
Madeira para se abastecer.<br />
A ilha da Madeira tornase<br />
assim uma importante<br />
praça de comércio e, ao<br />
mesmo tempo, estância de<br />
repouso. Surgem então as<br />
chamadas quintas<br />
madeirenses, cujos jardins<br />
contam com plantas indígenas<br />
e importadas, as quais,<br />
através de inúmeras<br />
descrições, passam a ser<br />
referência científica obrigatória.<br />
Registamos assim,<br />
ao longo do século XVIII, a<br />
passagem do almirante<br />
James Cook, quer tripulando<br />
o Endeavour, em 1768,<br />
quer o Resolution, em 1772,<br />
acompanhado de vários<br />
especialistas, que<br />
descrevem depois largamente<br />
a flora e a fauna<br />
encontradas na Madeira.<br />
A importância estratégica<br />
do porto do Funchal era<br />
reconhecida pelo almirantado<br />
Britânico nos meados do<br />
século XVIII, levando a<br />
constantes levantamentos<br />
geo-hidrográficos, parte dos<br />
quais impressos. Perante a<br />
instabilidade política na<br />
Europa, decorrente das<br />
campanhas napoleónicas,<br />
em finais de 1801 uma<br />
importante armada de mais<br />
de 100 navios ocupava a<br />
Madeira. A armada deslocava-se<br />
para as Índias<br />
Ocidentais Inglesas, mas<br />
ancorou os seus cento e<br />
nove navios na larga baía do<br />
Funchal, desembarcando<br />
um contingente militar sob<br />
o comando do general<br />
Henry Clinton, que aqui<br />
permaneceu enquanto<br />
decorriam as negociações<br />
no Continente.<br />
Nova ocupação veio a<br />
ocorrer quando os franceses<br />
invadiram a Península<br />
Ibérica, em finais de 1807.<br />
A corte portuguesa conseguiu<br />
fugir para o Brasil,<br />
não tendo assim ficado à<br />
mercê das forças napoleónicas,<br />
como ocorreu com a<br />
espanhola e a Madeira conheceu<br />
então uma ocupação<br />
mais longa, que se prolongou<br />
mesmo para além dos<br />
tratados de paz.<br />
Pela Madeira, a caminho<br />
do exílio, em Santa<br />
Helena, passou mesmo o<br />
imperador Napoleão<br />
Bonaparte. Aqui foi presenteado<br />
com frutas frescas,<br />
alguns livros e uma pipa de<br />
vinho da Madeira, o que<br />
não se enquadrava bem com<br />
o seu estado de saúde. Mais<br />
tarde, tendo falecido, a pipa<br />
seria reivindicada pelos<br />
comerciantes do Funchal,<br />
tendo voltado à Madeira e<br />
sido o seu conteúdo dividido,<br />
pelo que ainda existem<br />
famílias que se orgulham de<br />
possuir lotes desse vinho.<br />
Ao longo do século XIX<br />
correu também pela Europa<br />
a fama do clima da<br />
Madeira, especialmente<br />
recomendado para terapia<br />
de doenças pulmonares. A<br />
Ilha torna-se então uma<br />
importante estância de veraneio,<br />
por aqui passando<br />
algumas das mais importantes<br />
cabeças coroadas,<br />
como as imperatrizes do<br />
Brasil, as arquiduquesas<br />
Leopoldina da Áustria, em<br />
1817 e Amélia de<br />
Leuchetemberg, em 1852.<br />
Pela Madeira passaram<br />
também, em longas estadias,<br />
a rainha Adelaide de<br />
Inglaterra, em 1847, o<br />
príncipe Maximiliano<br />
Napoleão, duque de<br />
Leuchetemberg, em 1850, e<br />
o futuro imperador<br />
Maximiliano do México e<br />
sua mulher, Carlota da<br />
Bélgica, que aqui passou o<br />
Inverno de 1859-1860.<br />
No entanto, talvez a<br />
figura mais marcante tenha<br />
sido a da imperatriz Isabel<br />
da Áustria, que aqui se<br />
recolhe longos meses entre<br />
1860 e 1861. A imperatriz<br />
Sissi, como ficou conhecida<br />
na bibliografia romântica<br />
do século XIX, nunca<br />
esqueceu os momentos que<br />
passou na Ilha, onde foi<br />
pela primeira vez fotografada,<br />
referindo-os sempre de<br />
forma calorosa e tendo conseguido<br />
voltar à Madeira,<br />
em 1893-94, poucos anos<br />
antes da sua morte, em<br />
1898.<br />
Os Habsburgo haveriam<br />
de ficar para sempre ligados<br />
à Madeira, ali tendo falecido,<br />
no exílio, Carlos de<br />
Áustria, o último imperador,<br />
em 1922. O seu corpo<br />
repousa na igreja matriz de<br />
Nossa Senhora do Monte,<br />
frente à quinta onde passou<br />
os seus últimos dias e sendo<br />
o seu corpo reconhecido<br />
para beatificação em 2004.<br />
Citemos ainda o conde<br />
Alexandre Charles de<br />
Lambert, ajudante de<br />
campo do imperador da<br />
Rússia, que se fixou na Ilha<br />
nos inícios de 1863. Casado<br />
no ano seguinte, ali morreria<br />
antes do nascimento do<br />
seu herdeiro. O conde<br />
Carlos Alexandre de<br />
Lambert, nascido na<br />
Madeira a 30 de Dezembro<br />
do ano de 1865, depois marquês<br />
de Lambert, foi um<br />
dos pioneiros da aviação<br />
francesa, atribuindo-se-lhe<br />
a invenção dos hidroaviões.<br />
Este aspecto não deixa<br />
de ser curioso, pois com o<br />
advento da aviação, o<br />
primeiro raid internacional<br />
sob o Atlântico teve como<br />
destino o porto do Funchal.<br />
O raid ocorreu a 22 de<br />
Março de 1921 e a viagem<br />
Lisboa-Funchal foi feita<br />
pelos pilotos Sacadura<br />
Cabral, Gago Coutinho e<br />
Ortins Bettencourt, acompanhados<br />
do mecânico<br />
Roger Soubiran, num F3,<br />
com motores Rolls-Royce,<br />
e serviu de ensaio para a<br />
que aqueles dois primeiros<br />
pilotos efectuariam no ano<br />
seguinte entre Lisboa e o<br />
Rio de Janeiro.<br />
Com o final da segunda<br />
Guerra Mundial as<br />
primeiras carreiras aéreas<br />
regulares com carácter<br />
turístico foram para a baía<br />
do Funchal. O voo inaugural<br />
da Aquilla Airways ocorreu<br />
a 15 de Março de 1949,<br />
iniciando-se as viagens regulares<br />
e comerciais a partir<br />
de 15 de Maio seguinte,<br />
com hidroaviões que,<br />
procedentes<br />
de<br />
Southampton, amaravam na<br />
baía do Funchal.