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2.ª divisão - Post Milenio

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<strong>Post</strong>-Milénio... Às Sextas-feiras, bem pertinho de si! 9 a 15 de Janeiro de 2009 9<br />

Anexos sem nexo<br />

Ligar o computador, assim que me levanto, passou<br />

a ser mais um acto de rotina no meu quotidiano.<br />

Outro logo a seguir, e sem o qual nunca inicio a<br />

minha higiene matinal, é abrir a caixa de mensagens para<br />

verificar se há alguma que exija uma resposta urgente. Hoje<br />

em dia, dar o endereço electrónico a alguém que se acaba<br />

de conhecer é uma prática mais corrente do que, antigamente,<br />

facultar o número do telefone.<br />

Como escreveu Gabriela Silva no texto de apresentação<br />

do meu segundo livro: «Ao longo da minha vida, ouvi<br />

centenas de frases sobre a amizade. Recebi muitas, em<br />

discretas mensagens de telemóvel, li outras em “power<br />

points”, mais ou menos elaborados com românticas<br />

músicas de fundo, adequadas a quem sofre de solidão e<br />

bebe num “forward” tudo o que a amizade parece ter de<br />

espantoso e belo. A vida de todos nós aparece hoje<br />

cruzada por pessoas que não conhecemos pessoalmente,<br />

mas que nos enviam mensagens que falam de amor, de<br />

amizade, da necessidade de alguém, do desespero, da<br />

solidão. São as novas formas, as formas do nosso tempo,<br />

para encontrarmos de novo um paraíso de afectos perdidos».<br />

Já nem é sequer discutível que os computadores, via<br />

Internet, se transformaram nas modernas caixas de afectos.<br />

São confessionários, onde é fácil encontrar um amigo de<br />

serviço a quem confiar os nossos pecados e as nossas<br />

mágoas. São a praça pública da alcovitice, onde se encontra<br />

sempre alguém com quem trocar textos de maldizer<br />

sobre este ou aquele de quem gostamos menos. São o<br />

álbum das fotografias que percorrem mundo sem nunca sair<br />

das estantes virtuais do nosso ambiente de trabalho. São a<br />

voz solidária que prontamente responde a um apelo desesperado.<br />

São os braços que nos mimam, em forma de<br />

palavras, sempre que precisamos de um gesto de ternura.<br />

Mas podem ser também portas abertas a anexos intrusos<br />

que - por mais que peçamos que não os enviem - teimam<br />

em cair diariamente na nossa caixa do correio.<br />

No início, confesso, também eu achei piada a um ou<br />

outro que recebia. Mas isso foi já quase há duas décadas,<br />

quando a troca deste tipo de mensagens era ainda privilégio<br />

de um reduzido número de pessoas que tinha a possibilidade<br />

de estar on-line. Se bem se lembram, a internet<br />

começou por funcionar ligada à rede telefónica, em sistema<br />

de modem exterior, e o tempo contabilizado por períodos à<br />

semelhança das chamadas telefónicas. Quando se estava<br />

em rede, ficava-se impossibilitado de ter acesso ao telefone.<br />

Pior: quando estávamos ligados, se alguém telefonasse caía<br />

a ligação. Por isso, já passei por todas as fases: deslumbramento<br />

pelo “NetMeeting”, “webcam”, auscultadores,<br />

microfone e tudo o mais que se exigia a quem quisesse ser<br />

considerado um internauta esclarecido. Agora, acabou! Até<br />

o “Messenger” está sempre calado. Deixei de ter pachorra<br />

para estar a trabalhar e, em simultâneo, ouvir aquele ruído<br />

incomodativo de mais alguém que acaba de entrar e me pergunta<br />

se estou aqui. É como sentir bater à porta de cada vez<br />

que quero recolhimento.<br />

Apesar dos meus avisos e respeitosos pedidos “sempre<br />

muito encarecidos”, há quem não entenda e continue a<br />

despejar-me lixo, muito bem empilhado em imagens acompanhadas<br />

de uma música de encantar Ulisses, não estivesse<br />

ele amarrado ao mastro do navio. Pois eu, solta nesta liberdade<br />

que me permite iniciar o dia a dizer meia dúzia de<br />

AIDA BAPTISTA<br />

aidabatista@sapo.pt<br />

impropérios, só lavo os dentes depois de esfregar a boca<br />

com uma escova de asneiras, de cada vez que me entra<br />

mais um anexo destes. Eu já falei deste tema a várias pessoas<br />

amigas, já escrevi duas crónicas sobre o assunto, mas<br />

vou iniciar o ano com mais esta porque, pelos vistos, ainda<br />

há quem não perceba a linguagem da boa educação. Às<br />

vezes, sinto-me mesmo tentada a responder de forma mais<br />

áspera, não fora ser esta a semana de Reis e estarmos ainda<br />

sob a magia do espírito da quadra.<br />

oje, tinha apenas o seguinte texto numa das mensagens:<br />

“Bom Ano de 2009”. Assim mesmo: seco, sem dedicatória,<br />

nem palavras de despedida. Já sei, sou mais um nome na<br />

“Associação dos Endereços Anónimos”, como um alcoólico<br />

ou um drogado que não queira ser identificado. Por conhecer<br />

a remetente, abri. Pensei que se tratava de alguma<br />

coisa interessante. Mais do mesmo: paisagens paradisíacas,<br />

com montanhas, lagos e cascatas, a deslizarem ao som das<br />

teclas de um piano, como que a convidarem-nos a um<br />

recolhimento consentido. Depois os textos, maravilhosos<br />

pela sua originalidade! Ora vejam pela amostra da primeira<br />

página: ENCONTREI-TE. Meu Deus, poupai-me!<br />

Parece que volto à infância e estou no jogo da apanhada. As<br />

páginas seguem-se segundo o traço vertical com que aqui<br />

as sinalizo: “Quem é especial fica/ Dizem que se leva um<br />

minuto para se conhecer uma pessoa especial/ uma<br />

hora para apreciá-la/ um dia para amá-la/ e mais do<br />

que uma vida inteira para esquecê-la/ manda este PPS<br />

para as pessoas que nunca esquecerás e lembra-te de<br />

mandá-la também para a pessoa que te enviou/ É<br />

pequena a mensagem mas mostrará que nunca esquecerás/<br />

Se não enviares para ninguém/ Significa que<br />

estás com pressa/ e esqueceste os teus amigos/ Aproveita<br />

para viver!/ É bom ter amigos!... Eles fazem-nos sentir<br />

felizes/ E ao sermos felizes encontramos a paz”.<br />

Terminam as imagens e é dum fundo negro que saltam<br />

letras (uma de cada vez) até formarem a mensagem:<br />

“Nunca nos devemos esquecer: é no dar que se<br />

recebe!!... Dá alegria a um amigo enviando-lhe este<br />

PPS”.<br />

A sério, interrogo-me se a<br />

Internet não estará a aparvalhar<br />

uma série de pessoas que<br />

regridem até à fase da adolescência,<br />

em que se namorava<br />

trocando bilhetinhos com<br />

uma série de banalidades. A<br />

única diferença é que, à receita<br />

existente, foram acrescentados<br />

os condimentos da<br />

imagem e do som.<br />

A estas mensagens de<br />

amizade responderia<br />

Fernando Pessoa “são<br />

ridículas”.<br />

Para que eu tenha um<br />

bom 2009, por favor, não me<br />

mandem anexos!<br />

Canadá:<br />

Canadiana acusada do assassínio<br />

premeditado dos três filhos<br />

Uma mãe de família do<br />

Quebeque foi formalmente<br />

acusada do assassínio<br />

dos três filhos assim como<br />

de ter ajudado ao suicídio do cônjuge<br />

com quem terá celebrado<br />

um pacto nesse sentido,<br />

provavelmente devido a importantes<br />

dívidas.<br />

Cathy Gauthier-Lachance foi acusada<br />

do triplo assassínio premeditado dos filhos<br />

Joelle, 12 anos, Marc-Ange, 7 anos, e<br />

Louis-Philipe, 4 anos, descobertos sem vida<br />

na noite de 01 para 02 de Janeiro na sua<br />

casa em Saguenay (200 km a Norte do<br />

Quebeque), precisou Richard Gagné, portavoz<br />

da Segurança do Quebeque (SQ, polícia<br />

provincial).Esta mulher de 36 anos foi<br />

hoje ouvida ao telefone por um juiz a partir<br />

do seu leito de hospital porque ela própria<br />

está ferida. É também acusada de ter ajudado<br />

o marido a morrer. O casal fez um pacto<br />

de suicídio, disse a polícia depois da<br />

descoberta dos corpos. Foi ela própria que<br />

avisou as autoridades na noite do drama.<br />

Segundo a imprensa canadiana, as dívidas,<br />

estimadas em 85 mil dólares canadianos<br />

pelo diário Globe and Mail, foram a<br />

razão deste gesto. Decorre nesta altura a<br />

autópsia das três crianças e do pai.<br />

O corpo do cônjuge da acusada tinha<br />

marcas de facadas mas as três crianças não<br />

parecem ter sofrido violência, segundo a<br />

polícia, o que levou alguns jornais a admitir<br />

a hipótese de envenenamento.<br />

TM.

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