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desvelando a participação das mulheres na história de uma - UTFPR

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ<br />

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TECNOLOGIA<br />

JOYCE LUCIANE CORREIA MUZI<br />

DE ESCOLA DE APRENDIZES À UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA:<br />

DESVELANDO A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA HISTÓRIA<br />

DE UMA INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL<br />

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO<br />

CURITIBA<br />

2011


JOYCE LUCIANE CORREIA MUZI<br />

DE ESCOLA DE APRENDIZES À UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA:<br />

DESVELANDO A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA HISTÓRIA<br />

DE UMA INSTITUIÇÃO DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL<br />

Dissertação apresentada como requisito<br />

parcial para obtenção do grau <strong>de</strong> Mestre em<br />

Tecnologia do Programa <strong>de</strong> Pós-Graduação<br />

em Tecnologia da Universida<strong>de</strong> Tecnológica<br />

Fe<strong>de</strong>ral do Paraná. Área <strong>de</strong> concentração:<br />

Tecnologia e Trabalho.<br />

Orientadora: Profª. Drª. Nanci Stancki da Luz<br />

CURITIBA<br />

2011


À memória <strong>de</strong> Olavi<strong>na</strong> Camargo, mãe, avó, mulher.<br />

Às <strong>mulheres</strong> da Escola <strong>de</strong> Aprendizes, do Liceu<br />

Industrial, da Escola Técnica, da Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral,<br />

do Cefet-Pr, da <strong>UTFPR</strong>.


AGRADECIMENTOS<br />

Graças a Deus pu<strong>de</strong> contar com a ajuda <strong>de</strong> muitas pessoas no <strong>de</strong>correr <strong>de</strong>stes dois<br />

anos <strong>de</strong> investigação. A <strong>UTFPR</strong> se tornou minha casa neste período e às pessoas<br />

que a compõem <strong>de</strong>vo muito, em especial:<br />

Aos professores e professoras do Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Comunicação e<br />

Expressão (Dacex), que possibilitaram que eu tivesse maior tranquilida<strong>de</strong> para a<br />

execução <strong>das</strong> discipli<strong>na</strong>s;<br />

Ao Núcleo <strong>de</strong> Documentação Histórica, agora Departamento (Dedhis), <strong>na</strong>s pessoas<br />

da professora Selma, à estagiária Lua<strong>na</strong> e ao estagiário Carlos;<br />

Ao Arquivo Geral, subordi<strong>na</strong>do à Divisão <strong>de</strong> Serviços Gerais, <strong>na</strong> pessoa do Sr.<br />

Carlos e estagiários;<br />

À equipe do Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos, em especial à Lucia e Paulo;<br />

Aos professores e professoras do Programa <strong>de</strong> Pós-graduação em Tecnologia;<br />

Aos funcionários e funcionárias, estagiários e estagiárias que me ajudaram em<br />

vários momentos <strong>de</strong>sta pesquisa;<br />

Às participantes do GeTec;<br />

A todos vocês muito obrigada.<br />

Às professoras Cristi<strong>na</strong> Rocha, Maria Teresa Citeli e ao professor Gilson Queluz que<br />

aceitaram participar e contribuir sobremaneira com este trabalho, meu muito<br />

obrigada.<br />

À professora Nanci Stancki da Luz quero <strong>de</strong>ixar meu reconhecimento: por ter me<br />

escolhido tantas vezes serei eter<strong>na</strong>mente grata.<br />

Nos últimos oito meses, <strong>de</strong>cisivos, fui acolhida e respaldada por <strong>uma</strong> nova<br />

instituição que também possibilitou que concretizasse este sonho: ao Instituto<br />

Fe<strong>de</strong>ral do Paraná, campus Para<strong>na</strong>guá, minha gratidão e promessa <strong>de</strong><br />

compartilhamento.<br />

Àquelas <strong>mulheres</strong> e homens que durante este período se i<strong>de</strong>ntificaram com este<br />

trabalho e que com palavras sábias me incentivaram – muito obrigada.<br />

À minha família que enten<strong>de</strong>u que sem esforços não conquistamos nossos sonhos;<br />

pela paciência, força, confiança, agra<strong>de</strong>ço enormemente, confiando que estarão<br />

sempre comigo.<br />

Às minhas irmãs e irmãos <strong>de</strong> coração, obrigada pelas inúmeras palavras <strong>de</strong><br />

incentivo.<br />

Ao meu marido – sem seu amor e sua força eu não estaria aqui. Você acreditou em<br />

mim mais do que eu mesma e me salvou tantas vezes da falta <strong>de</strong> força, da falta <strong>de</strong><br />

fé. Por todo seu amor e generosida<strong>de</strong> – muitíssimo obrigada.<br />

Agra<strong>de</strong>ço a Deus, em nome <strong>de</strong> seu Filho Jesus Cristo, que <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> sobre minha vida<br />

e garante que as bênçãos estejam nela e em tudo que eu colocar as mãos, se<br />

atentamente guardar seus mandamentos.


Mulher ao Espelho<br />

Cecilia Meireles (1901-1964)<br />

Hoje, que seja esta ou aquela,<br />

pouco me importa.<br />

Quero ape<strong>na</strong>s parecer bela,<br />

pois, seja qual for, estou morta.<br />

Já fui loura, já fui more<strong>na</strong>,<br />

já fui Margarida e Beatriz,<br />

Já fui Maria e Madale<strong>na</strong>.<br />

Só não pu<strong>de</strong> ser como quis.<br />

Que mal fez, essa cor fingida<br />

do meu cabelo, e do meu rosto,<br />

se é tudo tinta: o mundo, a vida,<br />

o contentamento, o <strong>de</strong>sgosto?<br />

Por fora, serei como queira,<br />

a moda, que vai me matando.<br />

Que me levem pele e caveira<br />

ao <strong>na</strong>da, não me importa quando.<br />

Mas quem viu, tão dilacerados,<br />

olhos, braços e sonhos seus,<br />

e morreu pelos seus pecados,<br />

falará com Deus.<br />

Falará, coberta <strong>de</strong> luzes,<br />

do alto penteado ao rubro artelho.<br />

Porque uns expiram sobre cruzes,<br />

outros, buscando-se no espelho.


RESUMO<br />

MUZI, Joyce Luciane Correia. De Escola <strong>de</strong> Aprendizes à Universida<strong>de</strong> Tecnológica:<br />

<strong><strong>de</strong>svelando</strong> a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> história <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> educação<br />

profissio<strong>na</strong>l. 2011. 234 f. Dissertação (Mestrado em Tecnologia) – Programa <strong>de</strong> Pósgraduação<br />

em Tecnologia, Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná. Curitiba,<br />

2011.<br />

O objetivo geral <strong>de</strong>sta pesquisa é a<strong>na</strong>lisar a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong><br />

construção da história da educação profissio<strong>na</strong>l, em especial da construção da<br />

história da Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná. Busca-se verificar em que<br />

áreas as <strong>mulheres</strong> atuaram e qual sua participação atual <strong>na</strong> pesquisa científicotecnológica<br />

<strong>na</strong> instituição. A partir da análise <strong>de</strong> materiais bibliográficos e utilizandose<br />

<strong>de</strong> dados quantitativos, esta pesquisa se caracteriza n<strong>uma</strong> perspectiva histórica,<br />

com ênfase n<strong>uma</strong> abordagem qualitativa. I<strong>de</strong>ntificou-se durante a coleta <strong>de</strong> dados<br />

que a instituição passou por quatro fases, dividi<strong>das</strong> cronologicamente: <strong>na</strong> primeira<br />

fase, que vai da abertura da Escola até aproximadamente 1937 quando a Escola se<br />

transformou em Liceu Industrial, era pequeno o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> por serem<br />

poucas as áreas <strong>de</strong> atuação. Na segunda fase, <strong>de</strong> 1937 até aproximadamente 1970,<br />

ao <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> atuar no nível primário, a Escola proporcionou às <strong>mulheres</strong>, ainda em<br />

número inferior aos homens, que atuassem em outras ativida<strong>de</strong>s, além <strong>de</strong> ter-lhes<br />

dado mais visibilida<strong>de</strong>. A terceira fase, que vai da transformação em Cefet <strong>na</strong><br />

década <strong>de</strong> 1970 até 2005, <strong>de</strong>vido à expansão, possibilitou a atuação femini<strong>na</strong> em<br />

nível <strong>de</strong> graduação e pós-graduação. A quarta e última fase começa em 2005<br />

quando, após a transformação em Universida<strong>de</strong>, se reconhecem novas<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação no que tange à questão da produção científicotecnológica.<br />

Os principais resultados encontrados <strong>na</strong>s quatro fases apontam que as<br />

<strong>mulheres</strong> se mantêm em <strong>de</strong>svantagem numérica em relação aos homens, e que a<br />

<strong>UTFPR</strong> mantém a maioria <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em alg<strong>uma</strong>s áreas do conhecimento<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente atribuí<strong>das</strong> a elas <strong>de</strong>ntro da instituição, como por exemplo a área <strong>de</strong><br />

Desenho Industrial, ou ainda em áreas relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> ao cuidado e <strong>de</strong> apoio,<br />

<strong>de</strong>monstrando que se mantém <strong>uma</strong> divisão sexual do trabalho que segrega e<br />

hierarquiza.<br />

Palavras-chave: <strong>mulheres</strong>, Ciência, Tecnologia, universida<strong>de</strong>.


ABSTRACT<br />

MUZI, Joyce Luciane Correia. From The Learning School to the University of<br />

Technology: unveiling women's participation in the construction of the professio<strong>na</strong>l<br />

education history. 2011. Thesis (Master of Technology) - Postgraduate Program in<br />

Technology, Fe<strong>de</strong>ral Technological University of Paraná, 2011.<br />

The objective of this research is to a<strong>na</strong>lyze the participation of women in building the<br />

history of professio<strong>na</strong>l education, in particular the construction of the history of the<br />

Fe<strong>de</strong>ral Technological University of Para<strong>na</strong>. We intend to verify areas in which<br />

women worked and what their current participation in scientific-technological<br />

research in the institution. From the a<strong>na</strong>lysis of bibliographic materials, and using<br />

quantitative data, this research is characterized by historical standards, with<br />

emphasis on qualitative approach. It was i<strong>de</strong>ntified during the data collection that the<br />

institution has gone through four phases, chronologically divi<strong>de</strong>d: the first one, which<br />

runs from the opening of School until about 1937 when the School became an<br />

Industrial High School; in that moment there were few women because there were<br />

few areas of expertise. In the second phase, from 1937 at about 1970, although<br />

fewer in number than men, the School gave women the opportunity to act in other<br />

activities as the primary level had been closed, this fact gave them more visibility.<br />

The third phase, which changed Industrial High School in Cefet in the 1970s until<br />

2005, due to expansion, it was allowed the female engagement at un<strong>de</strong>rgraduate<br />

and postgraduate level. The fourth and fi<strong>na</strong>l phase begins in 2005 when, after<br />

processing in University, new possibilities of action are recognized regarding the<br />

issue of scientific and technological production. The main findings of the four stages<br />

indicate that women remain outnumbered in relation to men, and that <strong>UTFPR</strong> keeps<br />

most women in some areas of knowledge traditio<strong>na</strong>lly assigned to them within the<br />

institution, such as the Industrial Design area, or in areas related to care and support,<br />

<strong>de</strong>monstrating that sexual division of labor is remained and it segregates and ranks<br />

the work.<br />

Keywords: Women, Science, Technology, University.


LISTA DE TABELAS<br />

TABELA 1 - CURSOS POR MATRÍCULA E SEXO EM 2005 ............................... 79<br />

TABELA 2 -<br />

TABELA 3 -<br />

PESQUISADORES POR SEXO NO BRASIL (%)...............................<br />

MOVIMENTO DE MATRÍCULAS, SEPARADAS POR SEXO, E DE<br />

DIPLOMADOS, ANO A ANO, DA ESCOLA WENCESLAU BRÁS.....<br />

80<br />

112<br />

TABELA 4 - DISTRIBUIÇÃO, POR GÊNERO, DOS DOCENTES NO PERÍODO<br />

DE 1911 A 1919.................................................................................. 144<br />

TABELA 5 - DISTRIBUIÇÃO, POR GÊNERO, DOS DOCENTES NO PERÍODO<br />

DE 1921 A 1930.................................................................................. 144<br />

TABELA 6 - VALORES ABSOLUTOS DO NÚMERO DE HOMENS E<br />

MULHERES NO PERÍODO DE 1931 A 1942 .................................... 154<br />

TABELA 7 - CONTRATAÇÃO DE MULHERES DE 1943 A 1963.......................... 172<br />

TABELA 8 - AS MULHERES NA <strong>UTFPR</strong> – 1979 A 1990 ...................................... 179<br />

TABELA 9 - NÚMERO DE PROFESSORAS NO ENSINO SUPERIOR EM 1985<br />

E 1990................................................................................................. 182<br />

TABELA 10 - NÚMERO DE PROFESSORES(AS) NO CEFET-PR EM 1995 POR<br />

DEPARTAMENTO ACADÊMICO........................................................ 184<br />

TABELA 11 - AS MULHERES NA <strong>UTFPR</strong> – 1995 A 2005....................................... 185<br />

TABELA 12 - AS MULHERES NA <strong>UTFPR</strong> – 2005 A 2010....................................... 188<br />

TABELA 13 - DISTRIBUIÇÃO POR SEXO NOS DEPARTAMENTOS DA <strong>UTFPR</strong><br />

EM 2007.............................................................................................<br />

TABELA 14 - DOCENTES POR DEPARTAMENTOS NA <strong>UTFPR</strong> EM 2007 ...........<br />

190<br />

191<br />

TABELA 15 - DOCENTES POR ÁREA DO CONHECIMENTO NO CAMPUS<br />

CURITIBA EM JANEIRO DE 2010..................................................... 200<br />

TABELA 16 - CRESCIMENTO POR ÁREA DO CONHECIMENTO NO CAMPUS<br />

CURITIBA EM 2010 E 2011............................................................. 202<br />

TABELA 17 - DISTRIBUIÇÃO POR SEXO NOS DEPARTAMENTOS DA <strong>UTFPR</strong><br />

EM 2007 E 2011................................................................................<br />

TABELA 18 - GRUPOS DE PESQUISAS NA <strong>UTFPR</strong> EM 2010...............................<br />

203<br />

205


LISTA DE QUADROS<br />

QUADRO 1 - PRINCIPAIS DATAS DA HISTÓRIA DA <strong>UTFPR</strong> ............................ 136<br />

QUADRO 2 - PROFESSORAS ADMITIDAS NA ESCOLA DE APRENDIZES<br />

ARTÍFICES DE 1910 A 1920 .......................................................... 141<br />

QUADRO 3 - PROFESSORAS QUE INGRESSARAM NA ESCOLA DE<br />

APRENDIZES ARTÍFICES DE 1920 A 1936 ................................... 147<br />

QUADRO 4 - DADOS DO RELATÓRIO DE 1938................................................... 149<br />

QUADRO 5 - PROFESSORAS QUE INGRESSARAM NA INSTITUIÇÃO DE 1937<br />

A 1964 .................................................................................... 156<br />

QUADRO 6 - FUNCIONÁRIAS DE APOIO CONTRATADAS EM 1943 ................ 172<br />

QUADRO 7 - NÚMERO DE ALUNOS/AS MATRICULADOS/AS NOS CURSOS<br />

INDUSTRIAIS EM 1953.....................................................................<br />

QUADRO 8 - AS MULHERES NA ESCOLA TÉCNICA FEDERAL EM 1964.........<br />

174<br />

177


LISTA DE GRÁFICOS<br />

GRÁFICO 1 - PROFESSORES/AS ENVOLVIDOS/AS COM AS CHEFIAS E<br />

ADMINISTRAÇÃO NA <strong>UTFPR</strong>......................................................... 192<br />

GRÁFICO 2 - DOCENTES SEGUNDO SEXO NO CAMPUS CURITIBA EM<br />

JANEIRO DE 2010............................................................................ 199<br />

GRÁFICO 3 - DOCENTES SEGUNDO SEXO NO CAMPUS CURITIBA EM<br />

JANEIRO DE 2011............................................................................ 201


LISTA DE IMAGENS<br />

FOTO 1 - PRIMEIRO QUADRO DE SERVIDORES DA ESCOLA DE<br />

APRENDIZES ARTÍFICES DO PARANÁ.......................................... 140<br />

FOTO 2 - ALILAT MURICY BORGES DOS REIS............................................. 147<br />

FOTO 3 - REUNIÃO DE CONFRATERNIZAÇÃO DO LICEU INDUSTRIAL<br />

DO PARANÁ EM NOVEMBRO DE 1939.......................................... 150<br />

FOTO 4 - PROFESSORA ENAURA GUIMARÃES........................................... 151<br />

FOTO 5 - PROFESSORA HILDA DE OLIVEIRA............................................... 152<br />

FOTO 6 - PROFESSORA AVANÍ ALTÉIA BUZETTI......................................... 152<br />

FOTO 7 - PROFESSORA SOLANGE MARQUES............................................ 153<br />

FOTO 8 - AMALIA ZAZE GOSLAWSKI ............................................................ 159<br />

FOTO 9 - AURORA SARAIVA.......................................................................... 160<br />

FOTO 10 - ANERINA RESSETTI MIRO............................................................. 161<br />

FOTO 11 - RESPOSTA AO PEDIDO DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL DA<br />

PROFESSORA KLEIDE................................................................... 162<br />

FOTO 12 - IRENE EGLE MUZILLO BUSNARDO.............................................. 163<br />

FOTO 13 - NELY SCOLARO PORTELLA......................................................... 164<br />

FOTO 14 - HELENA POSS MIRANDA............................................................... 165<br />

FOTO 15 - RECORTE DE MÍDIA IMPRESSA DO ANO DE 1984 A.................. 195<br />

FOTO 16 - RECORTE DE MÍDIA IMPRESSA DO ANO DE 1984 B................... 195<br />

FOTO 17 - RECORTE DE MÍDIA IMPRESSA DO ANO DE 1984 C................... 196


LISTA DE SIGLAS<br />

BID Banco Interamericano <strong>de</strong> Desenvolvimento<br />

C&T Ciência e Tecnologia<br />

Calem Centro Acadêmico <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>s<br />

CBAI Comissão Brasileiro-America<strong>na</strong> Industrial<br />

Cefet-Pr Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica do Paraná<br />

Cet-Utramig Centro <strong>de</strong> Educação Técnica da Fundação <strong>de</strong> Educação para o<br />

Trabalho <strong>de</strong> Mi<strong>na</strong>s Gerais<br />

CNI Confe<strong>de</strong>ração Nacio<strong>na</strong>l <strong>das</strong> Indústrias<br />

CNPq Conselho Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Desenvolvimento Científico e Tecnológico<br />

Cofop Coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção do Programa Especial <strong>de</strong> Formação Pedagógica<br />

CPTP Centro <strong>de</strong> Pesquisas e Trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> Professores<br />

Dacex Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Comunicação e Expressão<br />

Dalem Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>s<br />

Dedhis Departamento <strong>de</strong> Documentação Histórica<br />

DEI Diretoria do Ensino Industrial<br />

Derhu Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos<br />

DIRPPG Diretoria <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduação da <strong>UTFPR</strong><br />

ETC Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba<br />

ETF-Pr Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná<br />

FAT Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador<br />

Fiocruz Fundação Oswaldo Cruz<br />

GeTec Grupo <strong>de</strong> Estudos e Pesquisas em Relações <strong>de</strong> Gênero e Tecnologia<br />

Inep Instituto Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Estudos e Pesquisas<br />

LDB Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacio<strong>na</strong>l<br />

MCT Ministério da Ciência e Tecnologia<br />

MEC Ministério da Educação<br />

Nudhi Núcleo <strong>de</strong> Documentação Histórica<br />

Nupes Núcleo <strong>de</strong> Pesquisa em Engenharia Simultânea<br />

PPGTE Programa <strong>de</strong> Pós-graduação em Tecnologia<br />

Proeja Programa Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Integração da Educação Profissio<strong>na</strong>l com a<br />

Educação Básica <strong>na</strong> Modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação Jovens e Adultos


Proep<br />

Se<strong>na</strong>c<br />

Se<strong>na</strong>i<br />

Sesi<br />

<strong>UTFPR</strong><br />

Programa <strong>de</strong> Expansão da Educação Profissio<strong>na</strong>l<br />

Serviço Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Aprendizagem Comercial<br />

Serviço Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Aprendizagem Industrial<br />

Serviço Social da Indústria<br />

Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná


SUMÁRIO<br />

1 INTRODUÇÃO............................................................................................. 15<br />

2 MULHERES, CIÊNCIA E TECNOLOGIA................................................... 26<br />

2.1 ORIGEM DA QUESTÃO: A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE<br />

GÊNERO E O “PAPEL” DOS MOVIMENTOS FEMINISTAS...................... 28<br />

2.2 OS MOVIMENTOS FEMINISTAS E A HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA<br />

TECNOLOGIA (C&T)............................................................................... 35<br />

2.2.1 Os campos científico e tecnológico e a presença <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.............. 40<br />

2.2.2 Nesse universo há espaço para elas? Estudos recentes sobre on<strong>de</strong> estão<br />

as <strong>mulheres</strong>.................................................................................................. 55<br />

3 TRABALHO, EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO.......................................... 66<br />

3.1 DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO............................................................. 66<br />

3.1.1 Em que áreas elas estão?........................................................................... 75<br />

3.2 A EDUCAÇÃO DAS MULHERES COMO PROCESSO EMANCIPATÓRIO<br />

E OPORTUNIZADOR DE MUDANÇAS....................................................... 81<br />

3.2.1 A educação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e para <strong>mulheres</strong>................................................ 86<br />

4 ENSINO TÉCNICO, PROFISSIONAL E INDUSTRIAL: ANTECEDENTES<br />

DA CHAMADA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA.......................................... 97<br />

5 UNIVERSIDADE, EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E A HISTÓRIA DAS<br />

MULHERES NA <strong>UTFPR</strong>.............................................................................. 137<br />

5.1 PRIMEIRA FASE (1909-1936): PROFESSORAS ADJUNTAS OU<br />

COADJUVANTES (IN)VISÍVEIS............................................................... 138<br />

5.2 SEGUNDA FASE (1937-1970): AS NORMALISTAS DO LICEU<br />

INDUSTRIAL DO PARANÁ ...................................................................... 148<br />

5.2.1 Cursos “femininos”: nova configuração do corpo discente e do quadro<br />

geral <strong>de</strong> servidoras....................................................................................... 166<br />

5.3 TERCEIRA FASE (1970-2005): A EXPANSÃO FAZ O NÚMERO DE<br />

MULHERES CRESCER........................................................................... 179<br />

5.4 QUARTA FASE (2005-2011): UMA NOVA FASE PARA A<br />

PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES?........................................................ 186<br />

5.5 PESQUISA CIENTÍFICO-TECNOLÓGICA NA <strong>UTFPR</strong>: PORTAS<br />

ABERTAS? ........................................................................................... 193<br />

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 212<br />

ARQUIVOS E FONTES CONSULTADOS.............................................................. 220<br />

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 221<br />

APÊNDICES............................................................................................................... 229<br />

ANEXOS.................................................................................................................... 233


15<br />

1 INTRODUÇÃO<br />

O objetivo geral <strong>de</strong>ssa pesquisa é a<strong>na</strong>lisar a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong><br />

construção da história da educação profissio<strong>na</strong>l, em especial da construção da<br />

história da Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná: em que áreas atuaram e<br />

qual a participação atual <strong>na</strong> pesquisa científico-tecnológica <strong>na</strong> instituição.<br />

Duas foram as palavras que me motivaram a começar esta pesquisa:<br />

curiosida<strong>de</strong> e comprometimento. A primeira talvez seja o motivo primeiro <strong>de</strong> toda e<br />

qualquer pesquisa, mas a segunda nem sempre. Isso porque, além da motivação<br />

por encontrar <strong>uma</strong> ou mais respostas para um problema <strong>de</strong> pesquisa, havia a<br />

questão <strong>de</strong> eu fazer parte da instituição que eu pretendia pesquisar. Meu objeto <strong>de</strong><br />

pesquisa se tornou algo maior do que eu mesma imagi<strong>na</strong>va – ele se tornou parte <strong>de</strong><br />

minha trajetória acadêmica e profissio<strong>na</strong>l. Ao ingressar no Programa <strong>de</strong> Pósgraduação<br />

em Tecnologia <strong>na</strong> Universida<strong>de</strong> Tecnológica com um projeto que tinha <strong>na</strong><br />

categoria gênero o ponto mais forte, buscamos um problema <strong>de</strong> pesquisa importante<br />

para investigar.<br />

Quatro meses após ter ingressado como alu<strong>na</strong>, ingressei também como<br />

professora <strong>na</strong> mesma Universida<strong>de</strong>; agora eu tinha dois papéis a <strong>de</strong>sempenhar: o<br />

<strong>de</strong> alu<strong>na</strong> e o <strong>de</strong> professora. Ao me ver integralmente <strong>de</strong>ntro da Universida<strong>de</strong> num<br />

clima <strong>de</strong> comemoração, já que em 2009 comemoramos 100 anos <strong>de</strong> criação da<br />

instituição, pu<strong>de</strong> ter contato com vários discursos, várias imagens, várias pessoas<br />

que ajudaram a construir essa história centenária. O fato é que imagens e discursos<br />

ficaram presos àquilo que foi sendo reproduzido nos últimos 100 anos – não havia<br />

mudança <strong>de</strong> foco, portanto, quase sempre, o viés foi um só: o que apontava para<br />

<strong>uma</strong> história construída sobre as bases <strong>de</strong> <strong>uma</strong> socieda<strong>de</strong> que se configurou<br />

tradicio<strong>na</strong>lista e conservadora.<br />

Foram muitas as discussões e expla<strong>na</strong>ções a respeito do que foi a trajetória<br />

da instituição <strong>de</strong>s<strong>de</strong> quando era <strong>uma</strong> <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes e Artífices<br />

espalha<strong>das</strong> pelo Brasil, passando a Liceu Industrial, à Escola Técnica e, <strong>na</strong><br />

sequência, a Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica do Paraná (Cefet-Pr) e, por<br />

último, à Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná (<strong>UTFPR</strong>) – as <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ções<br />

fazem sempre referência à educação profissio<strong>na</strong>l. Diante <strong>de</strong>stes fatos e da<br />

importância do ano <strong>de</strong> 2009 para o fechamento <strong>de</strong> um ciclo, <strong>de</strong>parei-me justamente


16<br />

com a indagação: e as <strong>mulheres</strong> participaram disso tudo? Elas estiveram por aqui?<br />

Fazendo o que exatamente?<br />

Na verda<strong>de</strong>, indiscutivelmente elas ocuparam seu espaço <strong>na</strong> instituição, seja<br />

como docente ou como alu<strong>na</strong>; no entanto, o tamanho da instituição em termos<br />

numéricos e geográficos, e a proporção menor <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, não nos <strong>de</strong>ixam ver<br />

que, embora estejamos fazendo história, muitas vezes passamos <strong>de</strong>spercebi<strong>das</strong>.<br />

Com o intuito <strong>de</strong> <strong>de</strong>svelamento da história <strong>das</strong> pioneiras <strong>na</strong> instituição,<br />

<strong>de</strong>stacamos os seguintes objetivos específicos para esta pesquisa:<br />

a) Fazer um levantamento quantitativo do número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que atuaram <strong>na</strong><br />

instituição nos 100 anos <strong>de</strong> existência;<br />

b) Visibilizar a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, revelando nomes femininos que formam<br />

parte importante no processo <strong>de</strong> construção da história da <strong>UTFPR</strong>,<br />

especialmente <strong>na</strong>s cinco primeiras déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> existência;<br />

c) A<strong>na</strong>lisar a participação femini<strong>na</strong> <strong>na</strong> pesquisa da <strong>UTFPR</strong>, bem como as áreas<br />

em que atuam à luz da teoria da divisão sexual do trabalho.<br />

Nossa análise, a partir da <strong>de</strong>limitação <strong>de</strong>sses objetivos, está <strong>na</strong>s condições<br />

para a entrada e permanência <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em <strong>uma</strong> ou outra área <strong>de</strong> conhecimento<br />

e ainda pensando <strong>na</strong> condição que as mantém fazendo <strong>uma</strong> ou outra função, <strong>de</strong><br />

acordo com a perspectiva teórica da divisão sexual do trabalho. Vale <strong>de</strong>stacar que,<br />

ainda que nosso olhar esteja voltado especialmente às <strong>mulheres</strong> que atuaram como<br />

docentes, também trataremos daquelas que estiveram em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> apoio,<br />

auxílio, administrativas e li<strong>de</strong>ranças, já que estas <strong>mulheres</strong> também fazem parte da<br />

história da instituição e muito contribuíram para a consolidação da Universida<strong>de</strong> e da<br />

qualida<strong>de</strong> do ensino. Foram elas também que possibilitaram que a participação<br />

femini<strong>na</strong> atingisse 30% em quase toda a trajetória da instituição.<br />

Nesse sentido, minha preocupação então se voltou em busca <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1909 passaram por esta instituição, que viria a ser <strong>uma</strong> <strong>das</strong> maiores do<br />

Paraná. Nascia aí meu sentimento <strong>de</strong> comprometimento que, maior que o <strong>de</strong><br />

curiosida<strong>de</strong>, me impulsionou a <strong>de</strong>scobrir nomes <strong>de</strong> pessoas, documentos, fotos,<br />

arquivos esquecidos, enfim, tudo aquilo que pu<strong>de</strong>sse trazer pistas a respeito <strong>das</strong><br />

muitas <strong>mulheres</strong> que ajudaram a escrever a história da <strong>UTFPR</strong>.


17<br />

A partir <strong>de</strong> <strong>uma</strong> observação prelimi<strong>na</strong>r dos materiais <strong>de</strong> divulgação histórica<br />

da instituição no ano <strong>de</strong> comemoração do Centenário, duas perguntas foram<br />

elabora<strong>das</strong>: por que tão poucas <strong>mulheres</strong> aparecem nesses materiais? Seria um<br />

problema <strong>de</strong> seleção por parte dos e <strong>das</strong> responsáveis ou seria por que justamente<br />

não havia participação femini<strong>na</strong>? Desse ponto em diante, ao <strong>de</strong>parar-me com um<br />

núcleo responsável por manter gran<strong>de</strong> parte da documentação histórica, iniciei o<br />

processo <strong>de</strong> busca por informações que me levassem ao nome <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que até<br />

então não sabia se iria encontrar.<br />

É fato que 100 anos é um período muito longo para <strong>uma</strong> pesquisa, por isso<br />

acabo por <strong>de</strong>bruçar-me especialmente sobre os anos iniciais da Escola até o ano <strong>de</strong><br />

1963 para a<strong>na</strong>lisar especialmente a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>. O ano <strong>de</strong> 1910 é o<br />

ano inicial porque foi o ano <strong>de</strong> início <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>na</strong> Escola, quando seu objetivo<br />

estava em oferecer o curso primário, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho e formação prática aos “filhos dos<br />

<strong>de</strong>sfavorecidos da sorte” (QUELUZ, 2000); em janeiro <strong>de</strong> 1910 a instituição começa<br />

a funcio<strong>na</strong>r com 10 funcionários <strong>de</strong>ntre eles <strong>uma</strong> mulher. Esta expectativa <strong>de</strong> que o<br />

número ten<strong>de</strong>ria a crescer me motivou e o meu “mergulho” nos arquivos antigos me<br />

convenceu da real importância <strong>de</strong> começarmos este trabalho por aqui.<br />

O ano <strong>de</strong> 1963 foi escolhido como limite em relação a <strong>uma</strong> análise da<br />

situação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Escola; já transformada em Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná (ETF-Pr), a instituição se apresentará <strong>de</strong> maneira diferente em relação à<br />

segunda etapa <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s 1 :<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da década <strong>de</strong> 1960 as escolas técnicas fe<strong>de</strong>rais vão<br />

passando por transformações, tais como a equivalência legal e a permissão<br />

<strong>de</strong> acesso ao ensino superior, estabeleci<strong>das</strong> pela Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases<br />

<strong>de</strong> 1961, que alia<strong>das</strong> a <strong>uma</strong> consi<strong>de</strong>rável melhora <strong>de</strong> suas instalações e do<br />

seu corpo docente, fizeram com que tais instituições passassem a ter suas<br />

vagas disputa<strong>das</strong> por alunos <strong>de</strong> classe média, em busca <strong>de</strong> um ensino<br />

médio gratuito e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> (AMORIM, 2004, p. 17).<br />

1 Amorim (2004) aponta dois limites iniciais da Escola: o primeiro <strong>de</strong> 1910 a 1942, quando a<br />

concepção <strong>de</strong> ensino estava voltada à formação dos “<strong>de</strong>svalidos <strong>de</strong> fortu<strong>na</strong>” em grau menor <strong>de</strong><br />

instrução; e o segundo <strong>de</strong> 1942, ano da Lei Orgânica, a 1963, ano <strong>de</strong> encerramento <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s da<br />

CBAI (Comissão Brasileiro-America<strong>na</strong> Industrial), período que ele apontará como formador <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

aristocracia do trabalho.


18<br />

1963, portanto, se tornou nossa data limite justamente porque a partir daí os<br />

números da Escola não pararam <strong>de</strong> crescer para aten<strong>de</strong>r <strong>uma</strong> nova <strong>de</strong>manda que<br />

se configurava.<br />

Entretanto o método utilizado para apresentar os dados aten<strong>de</strong> à seguinte<br />

perspectiva: i<strong>de</strong>ntificamos durante a coleta <strong>de</strong> dados que a instituição passou pelo<br />

que convencio<strong>na</strong>mos chamar para este trabalho quatro fases. Estas estão dividi<strong>das</strong><br />

cronologicamente:<br />

a primeira fase que surge quando da abertura da Escola até aproximadamente<br />

1937 quando a Escola se transformou em Liceu Industrial;<br />

a segunda fase parte então <strong>de</strong>ste episódio e vai até aproximadamente 1970,<br />

quando se enten<strong>de</strong> que expansão e crescimento serão palavras <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m, <strong>na</strong><br />

dinâmica do ensino profissio<strong>na</strong>l;<br />

a terceira fase se inicia <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1970 e vai até 2005, quando da<br />

transformação em Universida<strong>de</strong>;<br />

após 2005 enten<strong>de</strong>mos que se inicia <strong>uma</strong> quarta e última fase <strong>de</strong> novos rumos<br />

para as configurações <strong>de</strong> gênero <strong>na</strong> instituição.<br />

Muitas foram as dificulda<strong>de</strong>s para encontrar dados relativos aos primeiros<br />

anos da instituição, já que muito não se conservou. Felizmente três foram minhas<br />

principais fontes <strong>de</strong> dados: o Núcleo <strong>de</strong> Documentação Histórica (Nudhi), o<br />

Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos (Derhu) e o Arquivo Geral. O Nudhi, setor<br />

criado em 1986 e transformado em Departamento <strong>de</strong> Documentação Histórica –<br />

Dedhis, em julho <strong>de</strong> 2010, mantém guardados alguns documentos <strong>de</strong> to<strong>das</strong> as<br />

espécies: cartas, memorandos, ofícios, fotos, objetos, informativos, jor<strong>na</strong>is <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

ano <strong>de</strong> 1909; com eles nossa busca pelas <strong>mulheres</strong> acabou se tor<strong>na</strong>ndo um<br />

“mergulho” n<strong>uma</strong> história a que infelizmente poucos têm acesso – a evolução da<br />

educação profissio<strong>na</strong>l no país, as reformas educacio<strong>na</strong>is, mudanças<br />

gover<strong>na</strong>mentais, período ditatorial, realida<strong>de</strong> socioeconômica <strong>de</strong> Curitiba do início do<br />

século, mudanças tecnológicas: o século XX se apresenta por meio da história da<br />

<strong>UTFPR</strong>, mantida viva por pessoas empenha<strong>das</strong> que a organizaram.<br />

Como o Nudhi só foi criado perto dos anos 1990 era bastante previsível que<br />

não encontrássemos toda a documentação necessária relativa ao quadro <strong>de</strong><br />

funcionários e funcionárias da instituição, especialmente nos 50 primeiros anos <strong>de</strong>


19<br />

sua história. Com a pesquisa <strong>de</strong> campo <strong>de</strong>scobrimos que nem toda a documentação<br />

da história da instituição foi preservada, o que nos limitou quanto à perspectiva e<br />

quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dados disponíveis. Para suprir esta dificulda<strong>de</strong> fomos orienta<strong>das</strong> a<br />

pesquisar em outro <strong>de</strong>partamento responsável por armaze<strong>na</strong>r informações.<br />

Chegamos então ao Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos que forneceu os dados<br />

mais recentes: década <strong>de</strong> 80 e 90 do século passado e a primeira década <strong>de</strong>ste; os<br />

dados foram <strong>de</strong> muito valor para que pudéssemos ter um panorama <strong>de</strong> como se<br />

configurou numericamente o quadro funcio<strong>na</strong>l do campus Curitiba <strong>na</strong>s últimas três<br />

déca<strong>das</strong>.<br />

Po<strong>de</strong>-se perceber então que ficamos com um “buraco” que vai <strong>de</strong> 1965 a<br />

1979 e para que chegássemos a estes dados fomos ao Arquivo Geral. O setor, que<br />

é responsável por armaze<strong>na</strong>r dados <strong>de</strong> todos os alunos que passaram pela<br />

instituição, também mantém pastas <strong>de</strong> quase todos os servidores e servidoras<br />

aposentados e i<strong>na</strong>tivos, efetivos ou contratados 2 . Estes dados foram muito valiosos,<br />

pois se complementaram, ratificando e retificando alg<strong>uma</strong>s informações durante toda<br />

a busca.<br />

Tive livre acesso às três fontes: ao Nudhi, ao Derhu e ao Arquivo Geral, e<br />

em todos estes lugares tive auxílio <strong>de</strong> pessoas envolvi<strong>das</strong> com o armaze<strong>na</strong>mento e<br />

conservação dos materiais e dados, o que facilitou minha investigação nos quase<br />

seis meses <strong>de</strong> coleta.<br />

A partir da <strong>de</strong>scoberta da existência <strong>de</strong> documentos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1910 partimos<br />

para <strong>uma</strong> tentativa <strong>de</strong> interpretar o que encontramos, <strong>de</strong> maneira a enten<strong>de</strong>r as<br />

posições ocupa<strong>das</strong> e <strong>de</strong> que maneira estas posições <strong>de</strong>limitaram a dissemi<strong>na</strong>ção <strong>de</strong><br />

informações a respeito da atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>. À medida que enten<strong>de</strong>mos em<br />

quais posições ou espaços elas atuavam, po<strong>de</strong>mos enten<strong>de</strong>r qual o valor dado a<br />

estas posições e espaços <strong>de</strong>ntro da lógica que envolvia a instituição à época.<br />

Quando então se mostrou clara a problematização, atentamos para um<br />

objetivo que norteou minhas buscas a seguir. Os primeiros dias <strong>de</strong> análise <strong>de</strong><br />

documentos esclareceram que sim, elas estiveram sempre presentes <strong>na</strong> história da<br />

instituição, levando-me a questio<strong>na</strong>r então sobre on<strong>de</strong> estavam as <strong>mulheres</strong>;<br />

2 No sistema informatizado do Arquivo Geral os registros mais antigos que localizamos foram do ano<br />

<strong>de</strong> 1938; <strong>de</strong>ntre eles encontramos os nomes <strong>de</strong> duas professoras, <strong>uma</strong> aposentada em 1968 por<br />

ida<strong>de</strong> e outra que faleceu em 1971 enquanto ainda trabalhava <strong>na</strong> instituição.


20<br />

conforme supramencio<strong>na</strong>do, importou-nos o que elas fizeram e o que <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong><br />

contribuição para a instituição.<br />

Destacamos portanto que para alcançar os objetivos propostos foi<br />

necessário <strong>de</strong>limitar alguns caminhos, que nos apontaram para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

fazermos um levantamento quantitativo do número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que atuaram <strong>na</strong><br />

instituição nos vários momentos <strong>de</strong> sua história até os dias <strong>de</strong> hoje. Ainda que os<br />

números não revelem muito por si só, coube que voltássemos nosso olhar para eles<br />

justamente para perceber que a atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> era fato indiscutível.<br />

Em relação à metodologia adotada, nossa pesquisa se configura n<strong>uma</strong><br />

perspectiva histórica, porque estamos interessa<strong>das</strong> em fazer um levantamento que<br />

alcance um nível <strong>de</strong> registro histórico, que preten<strong>de</strong> estudar as transformações<br />

históricas <strong>de</strong>correntes da atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> instituição, impactando <strong>na</strong><br />

história <strong>de</strong>sta e daquelas.<br />

Na mesma tendência atual perseguida por pesquisadores <strong>das</strong> ciências<br />

h<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e sociais <strong>de</strong> estarem preocupa<strong>das</strong> com a inclusão <strong>de</strong> vozes ignora<strong>das</strong>, <strong>de</strong><br />

sujeitos até aqui excluídos(as) da história oficial, preten<strong>de</strong>mos evi<strong>de</strong>nciar que as<br />

<strong>mulheres</strong> fizeram a história da instituição, juntamente com os homens.<br />

Nosso interesse basicamente está em investigar o passado <strong>na</strong> busca por<br />

compreensão, a<strong>na</strong>lisando as fontes históricas como prova da existência <strong>de</strong><br />

participação femini<strong>na</strong>, entre docentes e discentes, técnicos administrativos,<br />

participação esta que acabou contribuindo para que a Escola se transformasse em<br />

Universida<strong>de</strong>. Tampouco per<strong>de</strong>mos <strong>de</strong> vista que nosso interesse é <strong>de</strong>svelar a<br />

história <strong>de</strong> sujeitos, muitas vezes <strong>de</strong>sconhecidos ou esquecidos às gerações que<br />

atualmente constroem esta história, pela qual, ainda que num contexto que pareça<br />

contrário, é possível um entendimento do valor <strong>de</strong> cada um e cada <strong>uma</strong> <strong>de</strong>ntro da<br />

instituição, pensando que a ação coletiva possibilitou <strong>uma</strong> história centenária.<br />

Nossa análise que se centrou <strong>na</strong> leitura <strong>de</strong> documentos e dados disponíveis<br />

em vários núcleos da instituição conforme já expla<strong>na</strong>do, <strong>de</strong>senvolve-se n<strong>uma</strong><br />

perspectiva com prepon<strong>de</strong>rância qualitativa, também a partir <strong>de</strong> dados quantitativos.<br />

Pensando <strong>na</strong> maneira como se configura esta pesquisa, segundo Demo<br />

(1994), é possível dizer que esta pesquisa preten<strong>de</strong> reconstruir quadros <strong>de</strong><br />

referência e levantar condições explicativas da realida<strong>de</strong>. E apesar <strong>de</strong> não intervir


21<br />

diretamente <strong>na</strong> realida<strong>de</strong>, ela tem papel <strong>de</strong>cisivo <strong>na</strong> criação <strong>de</strong> condições para a<br />

intervenção <strong>na</strong> mesma realida<strong>de</strong>.<br />

"O conhecimento teórico a<strong>de</strong>quado acarreta rigor conceitual, análise<br />

acurada, <strong>de</strong>sempenho lógico, argumentação diversificada, capacida<strong>de</strong> explicativa"<br />

(DEMO, 1994, p. 36), que nos levará a enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> que maneira a atualida<strong>de</strong> sofreu<br />

e sofre as ações do passado. Se consi<strong>de</strong>ramos, por outro lado, a perspectiva <strong>de</strong> Gil<br />

(1994), quanto aos nossos objetivos, nossa pesquisa é exploratória, porque procura<br />

<strong>de</strong>senvolver ou mesmo esclarecer conceitos, pensando em construção <strong>de</strong> matéria<br />

para pesquisas futuras. Quanto aos procedimentos técnicos adotados, nossa<br />

pesquisa se configura como documental, já que através <strong>de</strong> documentos faremos o<br />

levantamento e exploração <strong>das</strong> questões concernentes ao nosso problema <strong>de</strong><br />

pesquisa (GIL, 1994).<br />

O embasamento teórico <strong>de</strong>sta pesquisa parte <strong>de</strong> um entendimento da<br />

instituição universida<strong>de</strong> como espaço para produção <strong>de</strong> saberes científicos, on<strong>de</strong> a<br />

Ciência é um dos objetivos <strong>de</strong> sua constituição. Nesse sentido, cabe a nós<br />

enten<strong>de</strong>rmos como se configurou o campo científico, suas características e<br />

particularida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> que maneira começou a ser consi<strong>de</strong>rada a participação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> no fazer científico. A história da Ciência é contada <strong>de</strong> <strong>uma</strong> maneira a<br />

enten<strong>de</strong>rmos como sua compreensão <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> diretamente <strong>de</strong> quem a interpreta.<br />

Além disso coube também <strong>uma</strong> análise <strong>de</strong> como os movimentos feministas<br />

questio<strong>na</strong>ram o fazer científico tido como universal e neutro para possibilitar as<br />

reanálises que recuperaram os nomes <strong>de</strong> muitas <strong>mulheres</strong> cientistas.<br />

Na mesma lógica, enten<strong>de</strong>r como o conceito <strong>de</strong> gênero se articulou para<br />

favorecer os estudos sobre as <strong>mulheres</strong> é <strong>de</strong> extrema relevância, já que através dos<br />

estudos <strong>de</strong> gênero tivemos elevada a causa <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> ao status acadêmico.<br />

Vale <strong>de</strong>stacar a concepção adotada para este trabalho: gênero como relacio<strong>na</strong>l,<br />

constituinte <strong>das</strong> relações sociais que se estabelecem sobre as diferenças entre o<br />

feminino e o masculino.<br />

A divisão sexual do trabalho embasa nossas análises possibilitando leituras<br />

a respeito <strong>das</strong> posições que as <strong>mulheres</strong> atualmente ocupam no mercado <strong>de</strong><br />

trabalho, fator <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte diretamente do acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à educação formal,<br />

tanto em seus níveis mais básicos quanto nos mais elevados.


22<br />

Enten<strong>de</strong>mos que pela educação as <strong>mulheres</strong> têm mais condições <strong>de</strong><br />

mudanças e alter<strong>na</strong>tivas para ingressar <strong>na</strong> carreira acadêmica <strong>de</strong> maneira igualitária<br />

em relação aos homens, inclusive no que diz respeito à escolha <strong>de</strong> quais áreas<br />

seguir. Nesse sentido incluímos aqui <strong>uma</strong> breve retrospectiva do ramo <strong>de</strong> ensino<br />

objeto <strong>de</strong> nossas análises: a história do ensino industrial/profissio<strong>na</strong>l no Brasil nos<br />

interessa porque aparece para contextualizar a criação e a trajetória da Universida<strong>de</strong><br />

Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

Objeto <strong>de</strong> inúmeros estudos e discussões, a questão da educação<br />

profissio<strong>na</strong>l passou recentemente por um novo entendimento que tem no conceito<br />

<strong>de</strong> educação tecnológica o cerne principal. Ao se enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> que se trata a<br />

educação tecnológica e <strong>de</strong> que concepções estão por trás <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição que se<br />

propõe a oferecê-la, tem-se um foco <strong>de</strong> análise e <strong>de</strong> percepção da realida<strong>de</strong> que se<br />

distancia daquilo que acabou se transformando a educação industrial/profissio<strong>na</strong>l no<br />

início do século XX.<br />

O fio condutor <strong>de</strong> nossas reflexões, inseri<strong>das</strong> <strong>na</strong>s discussões que têm as<br />

inter-relações entre Tecnologia, Trabalho, Ciência e Educação como foco, é <strong>uma</strong><br />

conceituação imbricada <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia:<br />

A ciência e a tecnologia são, portanto, construções sociais complexas,<br />

forças intelectuais e materiais do processo <strong>de</strong> produção e reprodução<br />

social. Como processo social, participam e condicio<strong>na</strong>m as mediações<br />

sociais, porém não <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>m por si só a realida<strong>de</strong>, não são autônomas,<br />

nem neutras e nem somente experimentos, técnicas, artefatos ou máqui<strong>na</strong>s;<br />

constituem-se <strong>na</strong> interação ação-reflexão-ação <strong>de</strong> práticas, saberes e<br />

conhecimentos: são, portanto, trabalho, relações sociais objetiva<strong>das</strong> (LIMA<br />

FILHO e QUELUZ, 2005, p. 20).<br />

A partir da década <strong>de</strong> 1990, com as transformações não só <strong>na</strong> educação,<br />

bem como <strong>na</strong> política e economia no Brasil, alguns pesquisadores se concentram<br />

em teorizar a respeito <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> educação técnico-profissio<strong>na</strong>l integrada aos<br />

“novos” arranjos sociais, econômicos, tecnológicos, enfim.<br />

Neste novo momento da educação profissio<strong>na</strong>l no Brasil, autores e autoras<br />

vão re<strong>de</strong>finir o conceito e chegar a <strong>uma</strong> concepção filosófica <strong>de</strong> formação integral do<br />

indivíduo.


23<br />

A educação técnico-profissio<strong>na</strong>l caracteriza-se por manter <strong>uma</strong> base <strong>de</strong><br />

ensino teórico-prático, abrangendo a formação <strong>das</strong> ciências e <strong>das</strong> técnicas,<br />

estabelecendo ainda um círculo completo e dinâmico entre a geração,<br />

transferência e aplicação <strong>de</strong> conhecimentos, além da tentativa, como já foi<br />

ace<strong>na</strong>do, <strong>de</strong> manter <strong>uma</strong> relação mais íntima com o mundo do trabalho e da<br />

produção. Estas características aproximam o ensino técnico-profissio<strong>na</strong>l do<br />

processo <strong>de</strong> evolução da ciência e da tecnologia.<br />

Enquanto processo educativo, está a exigir <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> mudanças <strong>de</strong><br />

comportamentos metodológicos, <strong>de</strong> abordagens técnicas e conceituais,<br />

assim como <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s, usos e costumes culturais que visem ao<br />

enriquecimento da formação individual e sua integração ao mundo real, no<br />

que se refere ao <strong>de</strong>senvolvimento científico e tecnológico (BASTOS, 1991,<br />

p. 16).<br />

No contexto <strong>das</strong> déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 1990 e 2000, Mello et al. (1997, s.p.) afirmam<br />

que a educação tecnológica se evi<strong>de</strong>ncia ao cumprir um importante papel <strong>na</strong><br />

formação técnico-profissio<strong>na</strong>l, não limitada à aplicação <strong>de</strong> conhecimentos, “mas<br />

<strong>de</strong>senvolvendo-os mediante a compreensão <strong>das</strong> transformações científicas e<br />

tecnológicas que marcam nosso século”.<br />

Além disso, Bastos (1998) diz que as pessoas e o entorno são<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ntes para a concretização <strong>das</strong> bases <strong>de</strong> <strong>uma</strong> educação voltada para<br />

formar integralmente, por isso <strong>de</strong>stacamos a importância <strong>de</strong> participação <strong>de</strong> homens<br />

e <strong>mulheres</strong> neste projeto. Nesse sentido o papel do docente da educação<br />

tecnológica aparece ressaltado. Para o autor,<br />

a questão fundamental resi<strong>de</strong> <strong>na</strong> formação do docente. Ele será o gran<strong>de</strong><br />

comunicador <strong>das</strong> transformações tecnológicas que estão ocorrendo no<br />

mundo. Não transmitirá ape<strong>na</strong>s conhecimentos através <strong>de</strong> receitas prontas<br />

para manipular técnicas. O docente é o articulador do diálogo com o aluno<br />

para que este <strong>de</strong>scubra <strong>na</strong> máqui<strong>na</strong> <strong>uma</strong> palavra a ser construída a ser<br />

pronunciada <strong>de</strong> outra maneira como ele a escutou. O docente é o<br />

enten<strong>de</strong>dor <strong>das</strong> tecnologias como um todo, do mundo em que elas estão<br />

inseri<strong>das</strong>, da organização <strong>na</strong> qual elas estão se estruturando e do<br />

trabalhador que irá entendê-las e aplicá-las em realida<strong>de</strong>s bem diferentes e<br />

adversas. O docente da educação tecnológica é o incentivador <strong>de</strong> novos<br />

conhecimentos, não sozinho recluso <strong>na</strong>s suas leituras e reflexões, mas em<br />

parceria com os alunos. Ele fará a gran<strong>de</strong> experiência da geração e a<br />

transferência do saber tecnológico a partir da interação com o aluno. Os<br />

espaços criados pelo docente são as alavancas para o futuro<br />

<strong>de</strong>senvolvimento tecnológico do país (BASTOS, 1998, p. 39).<br />

Neste sentido, cabe avaliarmos se a Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná reservou ou reserva um espaço à atuação <strong>das</strong> professoras como<br />

profissio<strong>na</strong>is importantes <strong>na</strong> construção <strong>de</strong>ste novo mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> educação<br />

profissio<strong>na</strong>l, da Ciência e da Tecnologia no país.


24<br />

Reconhecemos a integração entre educação e qualificação, e concebemos<br />

Ciência e Tecnologia<br />

enquanto processos inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>na</strong> compreensão e construção do<br />

progresso social reproduzidos <strong>na</strong>s esferas do trabalho, da produção e da<br />

organização da socieda<strong>de</strong>. Na verda<strong>de</strong>, educação, trabalho, ciência e<br />

tecnologia exprimem setores diferenciados mas recorrentes <strong>de</strong> produção e<br />

acumulação <strong>de</strong> conhecimento teórico-prático, necessários ao indivíduo no<br />

seu relacio<strong>na</strong>mento com a <strong>na</strong>tureza conforme seus interesses e<br />

necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sobrevivência (BASTOS, 1998, p. 33).<br />

Acrescentamos que as primeiras professoras da Escola <strong>de</strong> Aprendizes<br />

Artífices produziam tecnologia, assim como as que encontramos atualmente <strong>na</strong><br />

Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná. Nesse sentido po<strong>de</strong>-se dizer que<br />

to<strong>das</strong> têm o mesmo valor <strong>na</strong> construção da história da instituição.<br />

Conhecer essa história diz respeito a conhecer 100 anos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> história<br />

ainda maior. Ao longo do século XX, a instituição recebeu inúmeros profissio<strong>na</strong>is<br />

que se ocuparam em construí-la <strong>de</strong> acordo com as necessida<strong>de</strong>s inter<strong>na</strong>s e<br />

exter<strong>na</strong>s. Fi<strong>na</strong>lmente po<strong>de</strong>mos dizer que com o embasamento teórico e enten<strong>de</strong>ndo<br />

o funcio<strong>na</strong>mento tanto da instituição como espaço em que o fazer<br />

científico/tecnológico se concretiza, como do próprio campo da Ciência em relação<br />

com a socieda<strong>de</strong>, chegaremos ao momento <strong>de</strong> conhecermos os nomes, os rostos e<br />

as ações <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s <strong>mulheres</strong> momentaneamente esqueci<strong>das</strong>, mas recupera<strong>das</strong><br />

em tempo.<br />

Em relação à apresentação dos resultados da pesquisa, os capítulos estarão<br />

divididos da seguinte forma: no segundo capítulo falaremos da relação <strong>mulheres</strong>,<br />

Ciência e Tecnologia, do entendimento da categoria gênero como categoria<br />

necessária para <strong>uma</strong> análise histórica, dos caminhos que os feminismos<br />

possibilitaram conhecermos, incluindo a possibilida<strong>de</strong> criada <strong>de</strong> questio<strong>na</strong>rmos os<br />

campos científico e tecnológico. Também teremos <strong>uma</strong> visão do estado da arte dos<br />

estudos sobre <strong>mulheres</strong> e Ciência e a situação atual <strong>de</strong>sse universo.<br />

No capítulo três levantamos a questão do mercado laboral e da divisão<br />

sexual do trabalho para chegarmos à relação participação no mundo do trabalho,<br />

particularmente, em profissões científicas e tecnológicas, e educação. Esta última<br />

será tratada para que possamos refletir sobre <strong>de</strong> que maneira ela foi capaz <strong>de</strong>


25<br />

modificar a situação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no mundo do trabalho formal, como instrumento<br />

<strong>de</strong> luta e, principalmente, <strong>de</strong> emancipação.<br />

No quarto capítulo recuperamos a trajetória da educação profissio<strong>na</strong>l no<br />

Brasil, percebendo que houve <strong>uma</strong> baixa participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> enquanto<br />

discentes neste ramo <strong>de</strong> ensino ao longo dos anos, tendo sido portanto difícil para<br />

elas inserirem-se como docentes nesta modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino, pois tiveram pouco<br />

ou nenhum acesso à formação/qualificação.<br />

No quinto e último capítulo, basea<strong>das</strong> <strong>na</strong> revisão a respeito da educação<br />

profissio<strong>na</strong>l, culmi<strong>na</strong>ndo com a própria história da <strong>UTFPR</strong>, contaremos a história<br />

<strong>de</strong>ssa instituição, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> seu primeiro ano <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento, articulando-a com os<br />

dados encontrados a respeito <strong>das</strong> primeiras <strong>mulheres</strong> trabalhadoras da instituição. O<br />

capítulo fi<strong>na</strong>liza com <strong>uma</strong> discussão sobre a situação da instituição em termos <strong>de</strong><br />

grupos <strong>de</strong> pesquisas li<strong>de</strong>rados por <strong>mulheres</strong>, pensando <strong>na</strong> perspectiva <strong>de</strong><br />

participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> consolidação da Universida<strong>de</strong> <strong>na</strong> pesquisa científicotecnológica.<br />

Destacamos que neste capítulo apresentaremos muitos dados<br />

quantitativos que serão imprescindíveis para visualizarmos as perspectivas <strong>de</strong><br />

mudança e as permanências.<br />

Contar <strong>uma</strong> história é algo que exige um certo rigor mas também é algo<br />

surpreen<strong>de</strong>nte, principalmente se fazemos parte <strong>de</strong>la. É parte <strong>de</strong> nossa história que<br />

começarei a contar.


26<br />

2 MULHERES, CIÊNCIA E TECNOLOGIA<br />

“a dimensão da história tor<strong>na</strong>-se, pois, o elo para nos aproximar dos<br />

cernes <strong>das</strong> técnicas e <strong>das</strong> tecnologias. Estão não são fatos isolados<br />

ou fragmentos <strong>de</strong> peças fragmenta<strong>das</strong>. Tudo é revestido <strong>de</strong> história,<br />

<strong>de</strong> acontecimentos e <strong>de</strong> ação h<strong>uma</strong><strong>na</strong> interpretando a vida e<br />

reconstruindo seu <strong>de</strong>stino. A história aproximará também a educação<br />

da tecnologia, enquanto força propulsora para resgatar a técnica,<br />

situá-la no seu <strong>de</strong>vido lugar e interpretá-la a serviço do bem comum<br />

da socieda<strong>de</strong>. A história oferecerá à educação os meios não só para<br />

enten<strong>de</strong>r mais profundamente as técnicas, mas também os<br />

instrumentos necessários para superar as dificulda<strong>de</strong>s <strong>na</strong><br />

transmissão <strong>de</strong> conhecimentos e <strong>na</strong> sua execução restrita a meras<br />

aplicações” (BASTOS, 1997, s.p.).<br />

A história contada durante muitos anos da Ciência e Tecnologia (C&T)<br />

apontava para pouca ou quase nenh<strong>uma</strong> participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> consolidação<br />

<strong>de</strong>stas áreas. No entanto, o próprio campo da C&T favoreceu esta interpretação,<br />

fazendo-nos acreditar nesta como verda<strong>de</strong>ira, quando <strong>na</strong> verda<strong>de</strong> o que existe é<br />

<strong>uma</strong> baixa visibilida<strong>de</strong> da participação femini<strong>na</strong> <strong>na</strong> produção <strong>de</strong> C&T por conta dos<br />

processos internos que <strong>de</strong>finem o que é Ciência e o que é Tecnologia, para que<br />

servem, quem faz, como faz, para quem faz?<br />

Consi<strong>de</strong>ra-se que no Brasil dos anos 1990, a difusão dos Estudos Sociais da<br />

Ciência e Tecnologia influenciou, <strong>de</strong> certa maneira, a renovação da historiografia<br />

<strong>das</strong> Ciências e da Tecnologia. Infelizmente, no que concerne a <strong>mulheres</strong>, gênero e<br />

C&T, percebe-se que ainda são poucas e dispersas as publicações e os registros<br />

históricos organizados a esse respeito.<br />

As perguntas que ficam a respeito <strong>de</strong>ssa possibilida<strong>de</strong> diferenciada <strong>de</strong><br />

enfoque são: elas não faziam C&T? Por que elas estão ausentes da História oficial?<br />

Como ocorreu o processo <strong>de</strong> exclusão/invisibilida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong>sse universo?<br />

A partir do momento que se <strong>na</strong>rra a história do <strong>de</strong>senvolvimento científico e<br />

tecnológico <strong>de</strong> <strong>uma</strong> maneira que se incluam as <strong>mulheres</strong>, temos <strong>uma</strong> diferença que<br />

possibilita <strong>uma</strong> visibilida<strong>de</strong> que reflete positivamente em todos os âmbitos da nossa<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

Com o movimento <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> e os movimentos feministas se estruturando<br />

po<strong>de</strong>mos ver <strong>uma</strong> reação a essa exclusão ou invisibilida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> vários


27<br />

campos do saber, <strong>de</strong>ntre eles C&T. Além disso, os movimentos posicio<strong>na</strong>ram-se a<br />

favor <strong>de</strong> questio<strong>na</strong>r a valida<strong>de</strong> <strong>das</strong> características <strong>de</strong>fendi<strong>das</strong> pelos “fazedores” <strong>de</strong><br />

C&T, que ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rem que o conhecimento produzido era universal, neutro,<br />

impessoal, ten<strong>de</strong>m a excluir, segregar, domi<strong>na</strong>r.<br />

Alguns movimentos surgiram em favor da visibilização <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong><br />

socieda<strong>de</strong> e em C&T para tentar dissipar a obscurida<strong>de</strong> da questão.<br />

O <strong>na</strong>scimento da história da ciência como discipli<strong>na</strong> acadêmica não supôs<br />

nenh<strong>uma</strong> inovação no terreno dos estudos sobre a mulher. O papel da<br />

mulher <strong>na</strong> ciência seguia sendo relegado, esquecido, por mais que o típico<br />

do novo campo consi<strong>de</strong>rasse a relação existente entre ciência e socieda<strong>de</strong>.<br />

Nem sequer as historiadoras da ciência (Boas, Ornstein ou Stimson)<br />

prestaram atenção à mulher. Tampouco os historiadores encarregados <strong>de</strong><br />

explorar as origens da ciência mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong> incluíram este aspecto em seus<br />

estudos, ainda que tenham se ocupado <strong>de</strong> muitos outros como os<br />

religiosos, <strong>de</strong> classe, <strong>de</strong> ida<strong>de</strong> etc. Para colocar um exemplo, em sua, por<br />

outro lado, esplêndida obra, Ciência, tecnologia e socieda<strong>de</strong> <strong>na</strong> Inglaterra<br />

do século XVII, Merton punha <strong>de</strong> manifesto o fato <strong>de</strong> que 62% dos membros<br />

iniciais da Royal Society foram puritanos, sublinhando a importância da<br />

religião em certas socieda<strong>de</strong>s ou instituições; no entanto, não reparou que<br />

não havia nenh<strong>uma</strong> mulher entre eles. E isso que havia ocorrido <strong>uma</strong><br />

mudança <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong> <strong>na</strong> história da ciência 3 (SEDEÑO, 1995, p. 599. Grifos<br />

nossos.).<br />

As palavras da autora são em favor <strong>de</strong> <strong>uma</strong> visibilização, <strong>de</strong> um olhar atento<br />

a questões latentes, que embora se quisessem obscuras, vêm à to<strong>na</strong> à medida que<br />

nos empenhamos em resgatá-las.<br />

Dentro do movimento histórico cultural que envolveu não só a história da<br />

Ciência, mas também a história da h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong> houve a possibilida<strong>de</strong> do<br />

aparecimento <strong>de</strong> inúmeros “movimentos” que alteraram <strong>de</strong> forma gradual a cultura<br />

contemporânea, incluindo os campos científico e tecnológico. Com esse objetivo<br />

surgiram os estudos sobre <strong>mulheres</strong> e os movimentos feministas, para “mostrar a<br />

3 Tradução livre <strong>de</strong>: “El <strong>na</strong>cimiento <strong>de</strong> la historia <strong>de</strong> la ciencia como discipli<strong>na</strong> académica no supuso<br />

ningu<strong>na</strong> innovación en el terreno <strong>de</strong> los estudios sobre la mujer. El papel <strong>de</strong> la mujer en la ciencia<br />

seguía siendo relegado, olvidado, por más que lo típico <strong>de</strong>l nuevo campo esribara em consi<strong>de</strong>rar la<br />

relación existente entre ciencia y sociedad. Ni siquiera las historiadoras <strong>de</strong> la ciencia (Boas, Ornstein<br />

o Stimson) prestaron atención a la mujer. Tampoco los historiadores encargados <strong>de</strong> explorar los<br />

orígenes <strong>de</strong> la ciencia mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong> incluyeron este aspecto en sus estudios, aunque sí se ocuparon <strong>de</strong><br />

otros muchos como los religiosos, <strong>de</strong> clase, <strong>de</strong> edad etc. Por poner um ejemplo, en su, por outro lado,<br />

espléndida obra, Ciencia, tecnología y sociedad en la Inglaterra <strong>de</strong>l siglo XVII, Merton ponía <strong>de</strong><br />

manifiesto el hecho <strong>de</strong> que el 62% <strong>de</strong> los miembros iniciales <strong>de</strong> la Royal Society fueran puritanos,<br />

subrayando la importancia <strong>de</strong> la religión en ciertas socieda<strong>de</strong>s o instituciones; sin embargo, no reparó<br />

(?!!!) en que no había ni u<strong>na</strong> sola mujer entre ellos. Y eso que sí que había habido un cambio <strong>de</strong><br />

actitud en la historia <strong>de</strong> la ciencia.” (SEDEÑO, 1995, p. 599. Grifos nossos.)


28<br />

participação femini<strong>na</strong> <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong>, tirando as <strong>mulheres</strong> da invisibilida<strong>de</strong>”<br />

(CASAGRANDE, 2005, p. 23). O que nos interessa é perceber como, graças à<br />

emergência <strong>de</strong> estudos feministas sobre as <strong>mulheres</strong>, é hoje possível discutir sua<br />

participação <strong>na</strong> construção da história do fazer científico e tecnológico no Brasil.<br />

2.1 ORIGEM DA QUESTÃO: A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE GÊNERO E O<br />

“PAPEL” DOS MOVIMENTOS FEMINISTAS<br />

A base da socieda<strong>de</strong> oci<strong>de</strong>ntal é patriarcal 4 ; nela temos as <strong>mulheres</strong> como<br />

seres imersos n<strong>uma</strong> cultura que se construiu sobre o masculino como universal, com<br />

base em hierarquias. Nesse contexto, a história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> foi consi<strong>de</strong>rada por<br />

muito tempo como algo que teria ocorrido em separado, à margem.<br />

O patriarcalismo domi<strong>na</strong>nte afeta <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as relações familiares, instituindo<br />

<strong>uma</strong> “família patriarcal”, até a atuação pública <strong>de</strong> homens e <strong>mulheres</strong>, como a<br />

participação no mundo do trabalho, por exemplo. Nesse sentido,<br />

Os relacio<strong>na</strong>mentos interpessoais e, consequentemente, a perso<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>,<br />

também são marcados pela domi<strong>na</strong>ção e violência que têm sua origem <strong>na</strong><br />

cultura e instituições do patriarcalismo. É essencial, porém, tanto do ponto<br />

<strong>de</strong> vista a<strong>na</strong>lítico quanto político, não esquecer o enraizamento do<br />

patriarcalismo <strong>na</strong> estrutura familiar e <strong>na</strong> reprodução sociobiológica da<br />

espécie, contextualizados histórica e culturalmente. Não fosse a família<br />

patriarcal, o patriarcalismo ficaria exposto como domi<strong>na</strong>ção pura e acabaria<br />

esmagado pela revolta da “outra meta<strong>de</strong> do paraíso”, historicamente<br />

mantida em submissão (CASTELLS, 2008, p. 169).<br />

Castells aponta ainda que<br />

Trabalho, família e mercados <strong>de</strong> trabalho passaram por profun<strong>das</strong><br />

transformações neste último quarto <strong>de</strong> século em virtu<strong>de</strong> da incorporação<br />

maciça <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no mercado <strong>de</strong> trabalho remunerado, quase sempre<br />

fora <strong>de</strong> seus lares (CASTELLS, 2008, p. 191. Grifo do autor.).<br />

4 Para Costa (s.d., p. 4.), patriarcado significa a “organização sexual hierárquica da socieda<strong>de</strong> tão<br />

necessária ao domínio político”, <strong>na</strong> qual o masculino predomi<strong>na</strong> sobre o feminino <strong>na</strong> esfera privada,<br />

se pensamos <strong>na</strong> estrutura familiar, e <strong>na</strong> esfera pública, se pensamos <strong>na</strong> lógica organizacio<strong>na</strong>l <strong>das</strong><br />

instituições políticas.


29<br />

O autor <strong>de</strong>clara evi<strong>de</strong>nte que após a instituição <strong>de</strong> leis para a diminuição da<br />

discrimi<strong>na</strong>ção muita coisa melhorou para as <strong>mulheres</strong>. Ele garante que ocorre <strong>uma</strong><br />

“...transformação da economia e do mercado <strong>de</strong> trabalho associada à abertura <strong>de</strong><br />

oportunida<strong>de</strong>s para as <strong>mulheres</strong> no campo da educação” (CASTELLS, 2008, p.<br />

171), porém este fato não garante igualda<strong>de</strong> <strong>na</strong>s relações e a discrimi<strong>na</strong>ção se<br />

mantém em outros níveis.<br />

Além disso, as diferenças existentes entre homens e <strong>mulheres</strong> não po<strong>de</strong>m<br />

ser explica<strong>das</strong> a partir da biologia ou pelo meio ambiente, como querem os que<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m <strong>uma</strong> distinção binária entre os sexos, resultando em papéis que cada um<br />

<strong>de</strong>les teria a <strong>de</strong>sempenhar <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> suas culturas.<br />

Objeto <strong>de</strong> críticas feministas, o <strong>de</strong>terminismo biológico é<br />

o conjunto <strong>de</strong> teorias segundo as quais a posição ocupada por diferentes<br />

grupos <strong>na</strong>s socieda<strong>de</strong>s – ou comportamentos e variações <strong>das</strong> habilida<strong>de</strong>s,<br />

capacida<strong>de</strong>s, padrões cognitivos e sexualida<strong>de</strong> h<strong>uma</strong>nos – <strong>de</strong>rivam <strong>de</strong><br />

limites ou privilégios inscritos <strong>na</strong> constituição biológica (CITELI, 2001, p.<br />

134).<br />

O perigo <strong>de</strong>ssa abordagem está em que não sejam questio<strong>na</strong>dos os<br />

reducionismos prejudiciais à meta<strong>de</strong> da população mundial, como aponta a autora;<br />

com o objetivo <strong>de</strong> evitá-los, ela afirma que<br />

Muitos dos cientistas sociais e dos biólogos que discutem as limitações <strong>das</strong><br />

diversas vertentes do <strong>de</strong>terminismo biológico não estão ape<strong>na</strong>s<br />

preocupados com os “<strong>de</strong>slizes” propriamente científicos do <strong>de</strong>terminismo,<br />

mas com as consequências sociais e políticas que advêm <strong>de</strong>ssas<br />

afirmações (CITELI, 2001, p. 134).<br />

Carvalho (2003, p. 15) afirma que “as diferenças entre homens e <strong>mulheres</strong><br />

passaram a ser mais sistematicamente pensa<strong>das</strong> a partir do feminismo <strong>na</strong> década<br />

<strong>de</strong> 60”, e isso quando ainda o termo gênero não tinha emergido, o que vem a<br />

acontecer justamente por causa do acúmulo <strong>de</strong> esforços dos movimentos<br />

feministas 5 como veremos neste capítulo.<br />

5 Embora se fale em vários momentos em um movimento feminista, é importante consi<strong>de</strong>rar que<br />

<strong>de</strong>ntro da perspectiva feminista tivemos vários movimentos se estruturando, ora convergindo, ora<br />

divergindo, como é o caso do feminismo da diferença e o feminismo liberal. Sobre o tema ver<br />

CASTELLS, Manuel. O po<strong>de</strong>r da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.


30<br />

Enten<strong>de</strong>-se, portanto, ao contrário do que preten<strong>de</strong> o <strong>de</strong>terminismo, que não<br />

são as diferenças sexuais,<br />

mas é a forma como essas características são representa<strong>das</strong> ou<br />

valoriza<strong>das</strong>, aquilo que se diz ou se pensa sobre elas que vai constituir,<br />

efetivamente, o que é feminino ou masculino em <strong>uma</strong> dada socieda<strong>de</strong> e em<br />

um dado momento histórico (LOURO, 2007, p. 21).<br />

A história que culmi<strong>na</strong>rá com a adoção do termo gênero tem início ainda no<br />

século XVIII, no contexto <strong>das</strong> Revoluções Iluminista e Industrial, <strong>na</strong> França e<br />

Inglaterra respectivamente; o período histórico perpassado pelas duas revoluções é<br />

consi<strong>de</strong>rado por Eric Hobsbawn “a maior transformação da história h<strong>uma</strong><strong>na</strong>”,<br />

(HOBSBAWN, 1977, p. 17), e foi responsável por mudanças que atingiram as<br />

questões <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> maneira até então nunca vista 6 . Um movimento em<br />

oposição ao pregado pela “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”<br />

começou a tomar forma e foi marcado pela ação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> francesas e<br />

revolucionárias que<br />

reivindicavam mudanças <strong>na</strong>s leis que as subordi<strong>na</strong>vam aos maridos,<br />

<strong>de</strong>nunciavam a situação da mulher no trabalho, sua <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> com os<br />

homens frente às leis, sua pouca participação política e o alto índice <strong>de</strong><br />

prostituição femini<strong>na</strong> da época (SILVA, 2000, p. 54).<br />

Po<strong>de</strong>mos afirmar que esse momento antece<strong>de</strong>u o que mais tar<strong>de</strong> seria<br />

<strong>de</strong>limitado e instituído como movimento feminista; este vai se mostrar ação<br />

organizada <strong>de</strong> discurso próprio, e com vistas à “abstração do universalismo <strong>de</strong><br />

direitos que, <strong>na</strong> verda<strong>de</strong>, não era universal, pois excluía as <strong>mulheres</strong>” (SILVA, 2000,<br />

p. 55). Esse i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> universalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos do qual se ouve falar também em<br />

nossos dias foi um mito que o movimento, ainda pontual no século XVIII e mais<br />

abrangente e crescente nos dois séculos seguintes, vai tentar bravamente <strong>de</strong>rrubar.<br />

Nesta batalha, vemos que esforços <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> como o <strong>de</strong> Olympe <strong>de</strong> Gouges 7<br />

6 Scott afirma que <strong>de</strong>sse período histórico emerge “o problema” da mulher trabalhadora, e frisa que “A<br />

mulher trabalhadora foi um produto da revolução industrial [...] porque no <strong>de</strong>curso da mesma [sic] ela<br />

se tornou <strong>uma</strong> figura perturbadora e visível” (SCOTT, 1994, p. 443). O capítulo 3 se <strong>de</strong>sti<strong>na</strong> a discutir<br />

exatamente a relação entre <strong>mulheres</strong> e trabalho.<br />

7 Escritora francesa que se encarregará <strong>de</strong> escrever “Os Direitos da Mulher e da Cidadã”, 1971,<br />

documento em “oposição” à Declaração <strong>de</strong> Direitos francesa, ressaltando a exigência para que os


31<br />

(1791) não foram suficientes e acabaram sendo silenciados para <strong>de</strong>spertarem um<br />

século <strong>de</strong>pois com mais força e maior a<strong>de</strong>são.<br />

Vale lembrar que é do século XVIII o marco <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte para o movimento<br />

feminista: a publicação <strong>de</strong> “Vindicação dos Direitos da Mulher”, <strong>de</strong> Mary<br />

Wollstoncraft, no qual a autora <strong>de</strong>spreza “a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que as <strong>mulheres</strong> foram feitas<br />

para agradar aos homens”, além <strong>de</strong> reivindicar “igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>s <strong>na</strong><br />

educação, no trabalho e <strong>na</strong> política” (SILVA, 2000, p. 66).<br />

O século XIX tem como foco o movimento que levará <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> várias<br />

regiões da Europa a reivindicarem educação e, principalmente, o direito ao voto –<br />

são os primeiros esforços sufragistas. Àquela época o movimento, que constituiu o<br />

que se convencionou chamar <strong>de</strong> primeira “onda” do feminismo, tinha preocupações<br />

sociais e políticas. Já no século XX, estas preocupações soma<strong>das</strong> ao fato <strong>de</strong> que a<br />

Primeira Guerra Mundial levou milhares <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> a ingressaram em serviços da<br />

saú<strong>de</strong>, como enfermeiras, e <strong>na</strong>s indústrias, como substitutas para os homens que<br />

haviam ido para a guerra, temos como que <strong>uma</strong> continuida<strong>de</strong> da primeira onda.<br />

Portanto, a partir da primeira onda e <strong>de</strong> seus i<strong>de</strong>ais, e <strong>das</strong> conquistas<br />

obti<strong>das</strong> no início do século, po<strong>de</strong>mos afirmar que muita coisa mudou. Mesmo tendo<br />

havido um período <strong>de</strong> estag<strong>na</strong>ção, que po<strong>de</strong> ser entendido justamente porque<br />

alg<strong>uma</strong>s reivindicações já tinham sido alcança<strong>das</strong>, um novo período tem início,<br />

período este em que as construções teóricas ao redor do tema – <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s<br />

entre homens e <strong>mulheres</strong> – começam a fazer parte <strong>das</strong> preocupações <strong>das</strong><br />

militantes.<br />

As reflexões teóricas começam a se difundir, <strong>de</strong>spertando um interesse<br />

premente <strong>de</strong> fazê-las a<strong>de</strong>ntrar a aca<strong>de</strong>mia, elevando-as a um status <strong>de</strong> científico.<br />

Louro (2007) nos chama a atenção dizendo que esta luta basicamente ficou<br />

restrita às <strong>mulheres</strong> brancas <strong>de</strong> classe média, o que também colaborou para que<br />

menos <strong>mulheres</strong> se i<strong>de</strong>ntificassem com a “causa”, dificultando os ganhos em favor<br />

<strong>das</strong> militantes 8 .<br />

direitos masculinos também fossem garantidos às <strong>mulheres</strong>. Por sua versão dos “Direitos do Homem<br />

e do Cidadão”, a francesa foi <strong>de</strong>capitada dois anos <strong>de</strong>pois, durante a Revolução Francesa.<br />

8 Por este motivo opta-se por tratar <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, no plural, justamente por causa <strong>das</strong> diferenças entre<br />

as <strong>mulheres</strong>. Enten<strong>de</strong>mos que não se trata <strong>de</strong> <strong>uma</strong> só classe, <strong>uma</strong> só etnia, <strong>uma</strong> só geração, para a<br />

qual se reivindica as mesmas causas. A este respeito, Louro <strong>de</strong>staca que os movimentos feministas


32<br />

Segundo Scott (1995), a década <strong>de</strong> 60, e mais especificamente o ano <strong>de</strong><br />

1968, foi o momento <strong>de</strong> legitimação acadêmica dos estudos feministas <strong>na</strong> Europa e<br />

nos Estados Unidos. Nesse momento, vários grupos vão se articular e dar início a<br />

movimentos 9 sem prece<strong>de</strong>ntes <strong>na</strong> história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>. Estes grupos<br />

expressam sua inconformida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sencanto em relação aos tradicio<strong>na</strong>is<br />

arranjos sociais e políticos, às gran<strong>de</strong>s teorias universais, ao vazio<br />

formalismo acadêmico, à discrimi<strong>na</strong>ção, à segregação e ao silenciamento<br />

(LOURO, 2007, p. 16).<br />

Louro (2007, p. 17) diz que as feministas, em geral, faziam esforços pela<br />

visibilização <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, lutando contra a “segregação social e política a que as<br />

<strong>mulheres</strong> foram historicamente conduzi<strong>das</strong> [que teve como consequência] a sua<br />

ampla invisibilida<strong>de</strong> como sujeito – inclusive como sujeito da Ciência”. As feministas<br />

tomaram como ponto <strong>de</strong> partida o fato <strong>de</strong> termos estado tanto tempo ausentes <strong>das</strong><br />

ciências, <strong>das</strong> letras e <strong>das</strong> artes, <strong>de</strong>vido ao fato <strong>de</strong> sermos “controla<strong>das</strong> e dirigi<strong>das</strong><br />

por homens e geralmente representa<strong>das</strong> como secundárias, „<strong>de</strong> apoio‟, <strong>de</strong><br />

assessoria ou auxílio” (LOURO, 2007, p. 17), e quando isso ocorria era<br />

exclusivamente no âmbito privado.<br />

São <strong>de</strong>sta época estudos <strong>de</strong> referência sobre o tema, quase todos partindo<br />

<strong>de</strong> reflexões que se iniciaram anteriormente e especialmente emitindo ecos da<br />

primeira onda do feminismo, bem como <strong>de</strong> obras <strong>de</strong> várias pessoas, como por<br />

exemplo, da escritora francesa e feminista Simone <strong>de</strong> Beauvoir (1908-1986), que já<br />

em 1949, com O segundo sexo, revolucionou o pensamento, propondo novas<br />

relações entre <strong>mulheres</strong> e homens; e <strong>de</strong> Betty Friedan que com A mística femini<strong>na</strong><br />

(1963) <strong>de</strong>u voz a inúmeras <strong>mulheres</strong> que, como ela, estavam cansa<strong>das</strong>, <strong>de</strong>ntre<br />

outras coisas, da vida relegada ao privado.<br />

Interessa-nos também <strong>de</strong>stacar o movimento feminista contemporâneo que<br />

surge durante os anos <strong>de</strong> 1970 <strong>de</strong>vido, principalmente, à entrada <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s<br />

universida<strong>de</strong>s; este fato fez com que emergissem novas discussões em torno do<br />

tema <strong>mulheres</strong>. Lia-se cada vez mais Simone <strong>de</strong> Beauvoir e Betty Friedan, além <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> “elite” buscavam reivindicações em favor <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> classe alta, brancas, <strong>de</strong>ixando aparte<br />

to<strong>das</strong> as outras etnias e classes.<br />

9 Da mesma maneira, o termo movimento não po<strong>de</strong> ser tomado no singular, já que não existia um só<br />

feminismo. Sobre isso ver Scott (1995).


33<br />

escritoras como Kate Millett 10 e outros autores que tratarão <strong>de</strong> maneira ficcio<strong>na</strong>l<br />

especificamente do tema sexualida<strong>de</strong>, como Virgínia Woolf 11 e Lawrence Durrell 12 .<br />

Em relação ao Brasil, <strong>na</strong> mesma década vão surgir “os primeiros grupos<br />

feministas comprometidos em lutar pela igualda<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, pela anistia e pela<br />

abertura <strong>de</strong>mocrática” (SILVA, 2000, s.p.). As <strong>mulheres</strong> vão buscar mais espaço no<br />

mercado <strong>de</strong> trabalho, provocando um interesse pela militância em favor <strong>de</strong> seus<br />

próprios direitos, possibilitada pela a<strong>de</strong>são aos sindicatos (SILVA, 2000).<br />

A partir dos esforços <strong>das</strong> primeiras feministas, estudos <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

começaram a tomar forma e contribuíram para visibilizar aquelas que foram<br />

oculta<strong>das</strong> ou silencia<strong>das</strong>. Num primeiro momento estes estudos “se constituíam,<br />

muitas vezes em <strong>de</strong>scrições <strong>de</strong> vida e <strong>de</strong> trabalho <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> [...] <strong>de</strong>nunciando a<br />

opressão e submetimento feminino” (LOURO, 1997, p. 17). Outras questões<br />

emergem, exce<strong>de</strong>ndo o que se convencionou chamar <strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, cujo<br />

caráter muitas vezes se voltava ao <strong>de</strong>scritivo e reificador da situação da mulher. Há<br />

um interesse pela ampliação da causa e <strong>de</strong> seu tratamento;<br />

nesse sentido era preciso encontrar conceitos que permitissem diferenciar<br />

aquilo que as <strong>mulheres</strong> tinham <strong>de</strong> <strong>na</strong>tural, permanente, e igual em to<strong>das</strong> as<br />

épocas e culturas (o sexo) daquilo que dava base para a discrimi<strong>na</strong>ção e,<br />

por ser socialmente construído, variava <strong>de</strong> socieda<strong>de</strong> para socieda<strong>de</strong> e<br />

podia mudar com o tempo (o gênero) (SIMIÃO, 2006, p. 15).<br />

Louro (2007) afirma que com o uso do termo gênero foi possível discutir o<br />

<strong>de</strong>terminismo biológico que tinha a supremacia em explicar as dicotomias existentes<br />

<strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> pelas diferenças sexuais.<br />

Os estudos <strong>de</strong> gênero adotam como eixo central a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>na</strong>turalização<br />

do que Citeli (2001, p. 132) chamará “hierarquias <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r basea<strong>das</strong> em diferenças<br />

<strong>de</strong> sexo”. A autora cita o ponto central <strong>de</strong>ssa perspectiva:<br />

10 Seu livro Políticas Sexuais, <strong>de</strong> 1969, é o mais famoso.<br />

11 Romancista inglesa. Suas obras mais famosas são Um teto todo seu (1928), Mrs. Dalloway (1925),<br />

As on<strong>das</strong> (1931) e Entre os atos (Between the Acts, 1941, póst<strong>uma</strong>).<br />

12 Escritor nepalense. Além <strong>de</strong> poemas e relatos <strong>de</strong> viagem, escreveu romances. Sua obra mais<br />

famosa O Quarteto <strong>de</strong> Alexandria (livro em 4 volumes, publicados entre 1955 e 1960) retrata intrigas<br />

políticas e sexuais no contexto da 2ª Guerra Mundial.


34<br />

Estabelecer a distinção entre os componentes – <strong>na</strong>tural/biológico em<br />

relação a sexo e social/cultural em relação a gênero – foi, e continua sendo,<br />

um recurso utilizado pelos estudos <strong>de</strong> gênero para <strong>de</strong>stacar essencialismo<br />

<strong>de</strong> toda or<strong>de</strong>m que há séculos sustentam argumentos biologizantes para<br />

<strong>de</strong>squalificar as <strong>mulheres</strong>, corporal, intelectual e moralmente (CITELI, 2001,<br />

p. 132).<br />

Pedro (2005) afirma que a categoria gênero foi criada <strong>na</strong> efervescência da<br />

segunda onda do Feminismo, e aparece formalmente pela primeira vez em 1968 no<br />

livro Sex and Gen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> Robert Stoller, empregada em oposição à palavra “sexo”.<br />

Enten<strong>de</strong>mos que a categoria foi sendo construída <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> aspectos históricos,<br />

sociais e culturais, <strong>na</strong>s relações, levando em conta as diferenças construí<strong>das</strong> e não<br />

as biológicas, <strong>na</strong>s socieda<strong>de</strong>s e nos diversos momentos históricos.<br />

Passamos a perceber que o universo feminino é muito diferente do<br />

masculino, não simplesmente por <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ções biológicas, como propôs o<br />

século XIX, mas sobretudo por experiências históricas marca<strong>das</strong> por<br />

valores, sistemas <strong>de</strong> pensamento, crenças e simbolizações diferencia<strong>das</strong><br />

também sexualmente. O gênero tornou-se um instrumento valioso <strong>de</strong><br />

análise que permite nomear e esclarecer aspectos da vida h<strong>uma</strong><strong>na</strong> (RAGO,<br />

1998, p. 96).<br />

Louro concorda com essa perspectiva e acrescenta que todos os <strong>de</strong>bates<br />

concentrados em torno do que se construiu socialmente sobre os sexos dá espaço a<br />

<strong>uma</strong> nova caracterização expressa por “<strong>uma</strong> nova linguagem <strong>na</strong> qual gênero será<br />

um conceito fundamental” (LOURO, 2007, p. 21. Grifo da autora.). Nesse sentido, o<br />

termo gênero atendia à expectativa da própria aca<strong>de</strong>mia que ainda relutava em abrir<br />

suas portas a estudos sobre as <strong>mulheres</strong> 13 .<br />

Po<strong>de</strong>-se falar que o termo no entanto não teve <strong>uma</strong> concepção única. Costa<br />

(1994) apresenta as inúmeras concepções atribuí<strong>das</strong> ao termo gênero: primeiro<br />

concebido como variável binária, posteriormente como papéis dicotomizados, em<br />

seguida como <strong>uma</strong> variável psicológica e como sistemas culturais, e só mais tar<strong>de</strong> o<br />

termo será entendido como relacio<strong>na</strong>l.<br />

Para Scott (1995, p. 72), gênero é constituinte <strong>das</strong> relações sociais que se<br />

estabelecem sobre as diferenças entre sexo feminino e masculino, e “<strong>uma</strong> forma<br />

primária <strong>de</strong> dar significado às relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r”. Sua concepção traz a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que<br />

13 Acrescentamos que houve alguns casos <strong>de</strong> exceção, como por exemplo o <strong>de</strong> Eva Alterman Blay,<br />

teórica feminista que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 1960 realiza seus estudos a respeito da sociologia do<br />

trabalho, violência contra a mulher, relações sociais <strong>de</strong> gênero, entre outros temas, <strong>de</strong>ntro da<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo.


35<br />

é pelo social que se estabelecem as relações <strong>de</strong> gênero. Além disso enten<strong>de</strong>mos<br />

que o conceito se esten<strong>de</strong> a homens e <strong>mulheres</strong>, e, perpassado pelo social e pelo<br />

histórico, altera-se no espaço e no tempo.<br />

Assim, enten<strong>de</strong>mos esta categoria como parte da socieda<strong>de</strong>, e, portanto,<br />

imersa <strong>na</strong>s instituições sociais, o que implica admitir que a justiça, a escola,<br />

a igreja etc. são “generifica<strong>das</strong>”, ou seja, expressam as relações sociais <strong>de</strong><br />

gênero, embora não somente a partir <strong>de</strong>stas, mas também <strong>das</strong> relações <strong>de</strong><br />

classe, étnicas, etc. (LOURO, 2007, p. 25).<br />

Enfim po<strong>de</strong>mos dizer que as instituições escolares, incluindo a universida<strong>de</strong>,<br />

são locais on<strong>de</strong> se produz C&T e on<strong>de</strong> se formam cidadãos, no qual as relações <strong>de</strong><br />

gênero se fazem presentes.<br />

2.2 OS MOVIMENTOS FEMINISTAS E A HISTÓRIA DA CIÊNCIA E DA<br />

TECNOLOGIA (C&T)<br />

Conforme já apontamos, os movimentos feministas se empenharam em<br />

recuperar a história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e questio<strong>na</strong>r o androcentrismo vigente <strong>na</strong> nossa<br />

socieda<strong>de</strong>, esten<strong>de</strong>ndo-se assim ao campo científico e tecnológico.<br />

Os enfoques <strong>de</strong> gênero emergentes <strong>na</strong> “segunda onda” do feminismo dos<br />

anos „60 aos ‟80 partiam da <strong>de</strong>núncia da escassez <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s<br />

ciências, para logo se <strong>de</strong>ter no caráter androcêntrico do conteúdo <strong>das</strong><br />

ciências e no viés sexista da linguagem. Estes enfoques se orientavam<br />

<strong>de</strong>ste modo até <strong>uma</strong> revisão profunda <strong>das</strong> relações entre ciência e<br />

socieda<strong>de</strong>: “Já não se trata unicamente <strong>de</strong> reformar as instituições e <strong>de</strong><br />

alfabetizar em ciência e tecnologia as <strong>mulheres</strong>, mas <strong>de</strong> reformar a própria<br />

ciência” (GONZÁLEZ GARCÍA, 1999, apud GRAÑA, 2004, p. 13) 14 .<br />

14 Tradução livre <strong>de</strong>:” Los enfoques <strong>de</strong> género emergentes en la „segunda ola‟ <strong>de</strong>l feminismo <strong>de</strong> los<br />

años „60 a los ‟80 partían <strong>de</strong> la <strong>de</strong>nuncia <strong>de</strong> la escasez <strong>de</strong> mujeres en las ciencias, para luego<br />

<strong>de</strong>tenerse en el carácter androcéntrico <strong>de</strong>l contenido <strong>de</strong> las ciencias y en los sesgos sexistas <strong>de</strong>l<br />

lenguaje. Estos enfoques se orientaban <strong>de</strong> este modo hacia u<strong>na</strong> revisión profunda <strong>de</strong> las relaciones<br />

entre ciencia y sociedad: “„Ya no se trata únicamente <strong>de</strong> reformar las instituciones y <strong>de</strong> alfabetizar en<br />

ciencia y tecnología a las mujeres, sino <strong>de</strong> reformar la propia ciencia‟” (GONZÁLEZ GARCÍA, 1999,<br />

apud GRAÑA, 2004, p. 13).


36<br />

A autora frisa que, assim como alg<strong>uma</strong>s estudiosas preten<strong>de</strong>ram apontar,<br />

não serão suficientes as reformas que abriram as portas <strong>das</strong> instituições tradicio<strong>na</strong>is<br />

como a universida<strong>de</strong> ou que se reformem currículos com vistas a <strong>uma</strong> alfabetização<br />

em C&T, mas <strong>uma</strong> reforma <strong>na</strong> própria concepção <strong>de</strong> C&T, que carrega em sua<br />

essência valores que dizem respeito a possíveis características que possibilitariam a<br />

produção <strong>de</strong> conhecimento. Por exemplo, a racio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, a subjetivida<strong>de</strong>, a<br />

neutralida<strong>de</strong>/imparcialida<strong>de</strong> são características historicamente vistas como<br />

essenciais ao fazer científico e tecnológico e atribuí<strong>das</strong> ao masculino, o que<br />

contribuiu para afastar as <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong>stas áreas, por serem a elas atribuí<strong>das</strong><br />

características como emotivida<strong>de</strong> e subjetivida<strong>de</strong>, ti<strong>das</strong> como opostas às<br />

pretendi<strong>das</strong> para os campos citados.<br />

Assim como acontece com a Ciência, enquanto campo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong><br />

conhecimento, a Tecnologia configura-se como<br />

...<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> fortemente masculinizada on<strong>de</strong> se sobressai – assim como<br />

<strong>na</strong>s “ciências duras” – a i<strong>de</strong>ologia da “neutralida<strong>de</strong>” e o conhecimento<br />

socialmente neutro. As investigações assi<strong>na</strong>lam <strong>uma</strong> “cultura técnica<br />

masculi<strong>na</strong>” como um importante componente i<strong>de</strong>ntitário, e simetricamente, a<br />

incompetência técnica, a insegurança e o medo da tecnologia como parte<br />

integrante do estereótipo <strong>de</strong> gênero feminino (GRAÑA, 2004, p. 20) 15 .<br />

A Ciência e Tecnologia portanto se configuram como lugares em que o<br />

homem surge como mais a<strong>de</strong>quado para fazer C&T, estas i<strong>de</strong>aliza<strong>das</strong> como campos<br />

neutros, objetivos, imparciais, universais.<br />

A tentativa <strong>de</strong> aproximação entre o gênero feminino e estes campos foi<br />

durante muito tempo <strong>de</strong>sestimulada. Nesse contexto portanto as <strong>mulheres</strong> não<br />

aparecem como protagonistas do avanço científico e tecnológico, ausência esta<br />

justificada pelo simples fato <strong>de</strong> serem <strong>mulheres</strong>, ou seja, pelo <strong>de</strong>terminismo<br />

biológico, em oposição aos homens que seguem estando no centro do que François<br />

Graña (2004) chama <strong>de</strong> cosmologia, que mostra especificamente a ciência como<br />

“<strong>uma</strong> prática viril ativa e racio<strong>na</strong>l dirigida ao domínio da „mãe <strong>na</strong>tureza‟, consi<strong>de</strong>rada<br />

passiva, emocio<strong>na</strong>l e car<strong>na</strong>l‟” (BONDER, 1996, p. 41), n<strong>uma</strong> perspectiva que associa<br />

15 Tradução livre <strong>de</strong>: “...u<strong>na</strong> actividad fuertemente masculinizada don<strong>de</strong> campea – al igual que en las<br />

“ciencias duras” – la i<strong>de</strong>ología <strong>de</strong> la „neutralidad‟ y el conocimiento socialmente aséptico. Las<br />

investigaciones señalan u<strong>na</strong> „cultura técnica masculi<strong>na</strong>‟ como un importante componente i<strong>de</strong>ntitario, y<br />

simétricamente, la incompetencia técnica, la inseguridad y el miedo a la tecnología como parte<br />

integrante <strong>de</strong>l estereotipo <strong>de</strong> género femenino” (GRAÑA, 2004, p. 20).


37<br />

a Ciência ao homem – que domi<strong>na</strong>, que impõe e impera, e a Natureza à mulher –<br />

que é submissa, gover<strong>na</strong>da, explorada.<br />

Vale <strong>de</strong>stacar que os mo<strong>de</strong>los ou os referentes históricos que estão<br />

disponíveis <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> são masculinos, e estes orientam a ativida<strong>de</strong> científica, <strong>de</strong><br />

modo que pareça que os homens estiveram e sempre estarão em to<strong>das</strong> as or<strong>de</strong>ns<br />

do saber (GRAÑA, 2004). Nesse sentido, a Aca<strong>de</strong>mia como um espaço criado por<br />

homens para formação intelectual e construção masculi<strong>na</strong> do conhecimento, durante<br />

muito tempo contribuiu para a manutenção <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> concentra<strong>das</strong> em<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong> áreas, bem como em áreas <strong>de</strong>svaloriza<strong>das</strong> dos espaços públicos,<br />

<strong>de</strong>vido a pouca ou quase nenh<strong>uma</strong> escolarização.<br />

E se hoje o que se vê é <strong>uma</strong> disparida<strong>de</strong> entre homens e <strong>mulheres</strong> em<br />

relação às posições ocupa<strong>das</strong> <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> em termos <strong>de</strong> produção do<br />

conhecimento, isso se dá justamente <strong>de</strong>vido à entrada tardia <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s<br />

instituições <strong>de</strong> ensino e ao tardio reconhecimento da sua participação <strong>na</strong> produção<br />

da Ciência. González García (1999) <strong>de</strong>staca que <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> universida<strong>de</strong>s e centros<br />

<strong>de</strong> pesquisa a <strong>de</strong>svantagem <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> é algo notório, apontando que houve<br />

...um incremento fulgurante <strong>de</strong> sua participação no último terço do século<br />

XX, contribuições “<strong>de</strong> alto nível em alguns casos”, <strong>uma</strong> mo<strong>de</strong>rada<br />

participação <strong>na</strong> gestão, e em termos gerais, <strong>uma</strong> discrimi<strong>na</strong>ção que<br />

“...segue tendo lugar mas tem adotado formas mais sofistica<strong>das</strong>...” (apud<br />

GRAÑA, 2004, p. 5) 16 .<br />

Embora haja atualmente <strong>uma</strong> significativa participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s<br />

universida<strong>de</strong>s ainda se vê <strong>uma</strong> discrimi<strong>na</strong>ção que encontra a cada dia formas mais<br />

sofistica<strong>das</strong> <strong>de</strong> manifestação:<br />

A discrimi<strong>na</strong>ção no âmbito acadêmico assume frequentemente a forma <strong>de</strong><br />

múltiplas “micro-<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s” que toma<strong>das</strong> <strong>uma</strong> a <strong>uma</strong> parecem<br />

insignificantes, mas que contribuem globalmente à geração <strong>de</strong> certo “clima<br />

hostil” que dissua<strong>de</strong> ou <strong>de</strong>smoraliza as <strong>mulheres</strong> que optaram pela área<br />

científico-tecnológica: “...as <strong>mulheres</strong> são <strong>de</strong>sig<strong>na</strong><strong>das</strong> para os comitês<br />

científicos com menos po<strong>de</strong>r, dispõem <strong>de</strong> menos recursos orçamentários,<br />

lhes é mais difícil obter os serviços <strong>de</strong> pessoal <strong>de</strong> apoio ou são coloca<strong>das</strong><br />

em escritórios que estão longe; carecem <strong>de</strong> acesso às „re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> iniciados‟<br />

16 Tradução livre <strong>de</strong>: “...un incremento fulgurante <strong>de</strong> su participación en el último tercio <strong>de</strong>l siglo XX,<br />

contribuciones „<strong>de</strong> alto nivel en algunos casos‟, u<strong>na</strong> mo<strong>de</strong>rada participación en la gestión, y en<br />

términos generales, u<strong>na</strong> discrimi<strong>na</strong>ción que „...sigue teniendo lugar pero ha adoptado formas más<br />

sofistica<strong>das</strong>...”‟ (apud GRAÑA, 2004, p. 5).


38<br />

para obter informação sobre outras instituições e, diferente dos homens,<br />

não dispõem <strong>de</strong> um grupo equivalente <strong>de</strong> mentores ou <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los a quem<br />

pedir assessoria e apoio” (AGUIRRE e BATTHYÁNY, 2000, apud GRAÑA,<br />

2004, p. 5-6) 17 .<br />

Sabemos que, ainda que explicitamente não haja <strong>na</strong>da que impeça o acesso<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à Ciência e à Tecnologia, há um discurso aparentemente neutro que<br />

permanece <strong>na</strong> lógica da <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> gênero.<br />

Graña afirma que este discurso é androcêntrico e prejudica as <strong>mulheres</strong> e a<br />

própria Ciência;<br />

As <strong>mulheres</strong>, porque lhes obriga a superar <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> barreiras, o que se<br />

começa a chamar a “barreira <strong>de</strong> cristal 18 ”, empregando nisso energias e<br />

inteligência que <strong>de</strong>veriam ser utiliza<strong>das</strong> <strong>na</strong> criação científica. [...] A ciência,<br />

enfim, porque se <strong>de</strong>spreza a mulher, <strong>de</strong>spreza também um conjunto <strong>de</strong><br />

valores imprescindíveis para a criação científica, <strong>uma</strong> parte do patrimônio<br />

cultural da h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>. O progresso h<strong>uma</strong>no e científico se alcançará<br />

melhor integrando as <strong>mulheres</strong> no eixo principal da cultura domi<strong>na</strong>nte<br />

(GRAÑA, 2004, p. 13) 19 .<br />

Em relação à pretensa “neutralida<strong>de</strong>” <strong>de</strong>sse discurso, Graña vai dizer que<br />

ela garantiu seu êxito <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o Re<strong>na</strong>scimento até nossos dias, prevalecendo sobre<br />

qualquer outro discurso – metafísico, religioso ou ético, por exemplo (GRAÑA,<br />

2004).<br />

Importante ressaltar que as críticas ao mo<strong>de</strong>lo que prevalece do que seria o<br />

fazer Ciência ou Tecnologia servem para refletirmos o quão importante é<br />

chamarmos atenção para o que se preten<strong>de</strong>u ao longo <strong>de</strong> déca<strong>das</strong> afirmar – o<br />

17 Tradução livre <strong>de</strong>: “La discrimi<strong>na</strong>ción en el ámbito académico asume a menudo la forma <strong>de</strong><br />

múltiples „micro-<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s‟ que toma<strong>das</strong> <strong>de</strong> u<strong>na</strong> en u<strong>na</strong> parecen insignificantes, pero que<br />

contribuyen globalmente a la generación <strong>de</strong> cierto „clima hostil‟ que disua<strong>de</strong> o <strong>de</strong>smoraliza a las<br />

mujeres que han optado por el área científico-tecnológica: „... las mujeres son asig<strong>na</strong><strong>das</strong> a los comités<br />

científicos con menos po<strong>de</strong>r, disponen <strong>de</strong> menos recursos presupuestarios, les es más difícil obtener<br />

los servicios <strong>de</strong>l perso<strong>na</strong>l <strong>de</strong> apoyo o se las ubica en ofici<strong>na</strong>s que están lejos; carecen <strong>de</strong> acceso a<br />

las „re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> iniciados‟ para obtener información sobre otras instituciones y, a diferencia <strong>de</strong> los<br />

hombres, no disponen <strong>de</strong> un grupo equivalente <strong>de</strong> mentores o <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los a quienes pedir<br />

asesoramiento y apoyo‟” (AGUIRRE e BATTHYÁNY, 2000, apud GRAÑA, 2004, p. 5-6).<br />

18 Muitas teóricas chamarão <strong>de</strong> “teto <strong>de</strong> vidro”. Adiante tocaremos neste tema para tratar da situação<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> que não conseguem ace<strong>de</strong>r aos postos <strong>de</strong> comando.<br />

19 Tradução livre <strong>de</strong>: “A las mujeres, porque les obliga a superar u<strong>na</strong> serie <strong>de</strong> barreras, lo que se<br />

empieza a llamar la “barrera <strong>de</strong> cristal”, empleando en ello u<strong>na</strong>s energías y u<strong>na</strong> inteligencia que<br />

<strong>de</strong>berían utilizarse en la creación científica. [...] A la ciencia, en fin, porque si rechaza a la mujer,<br />

rechaza también un conjunto <strong>de</strong> valores imprescindibles para la creación científica, u<strong>na</strong> parte <strong>de</strong>l<br />

patrimonio cultural <strong>de</strong> la h<strong>uma</strong>nidad. El progreso h<strong>uma</strong>no y científico se logrará mejor integrando a las<br />

mujeres en el eje principal <strong>de</strong> la cultura domi<strong>na</strong>nte” (GRAÑA, 2004, p. 13).


39<br />

conhecimento produzido é objetivo e neutro, características máximas e<br />

sobrepujantes (SEDEÑO, 2000), e que ele se consolida como válido porque o<br />

método utilizado está isento <strong>de</strong> qualquer intervenção subjetiva, distinguindo-se<br />

exatamente pela “busca <strong>de</strong>sinteressada da verda<strong>de</strong> mediante a formulação <strong>de</strong><br />

hipóteses que são contrasta<strong>das</strong> <strong>de</strong>pois mediante técnicas muito elabora<strong>das</strong>”<br />

(SEDEÑO, 2000, s.p. Grifos da autora.) 20 , o que garantiria o valor <strong>de</strong> seu produto<br />

fi<strong>na</strong>l, livre <strong>de</strong> erros.<br />

Se<strong>de</strong>ño, relativizando estas questões, afirma que,<br />

a não ser que se adote o “ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> Deus”, é difícil aceitar que o que<br />

suce<strong>de</strong>u no passado, não voltará a se repetir no futuro e que o que hoje é<br />

“ciência boa”, conhecimento autorizado ou certificado não vá nunca <strong>de</strong>ixar<br />

<strong>de</strong> sê-lo (SEDEÑO, 2000, s.p. Grifos da autora.) 21 .<br />

As críticas feministas portanto servem <strong>de</strong> base para que questionemos a<br />

existência <strong>de</strong> C&T neutras e livres <strong>de</strong> valores, assim como se pretendia que<br />

entendêssemos o conhecimento, este por sua vez entendido como fonte <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r<br />

(SEDEÑO, 2000).<br />

Importante dizer ainda que<br />

...as pensadoras feministas vêm <strong>de</strong> há muito colocando em questio<strong>na</strong>mento<br />

os parâmetros científicos <strong>de</strong>finidores <strong>de</strong> quem po<strong>de</strong> ou não ser sujeito do<br />

conhecimento, do que po<strong>de</strong> consistir como conhecimento, ou mesmo o que<br />

po<strong>de</strong> ser conhecido (SARDENBERG, 2007, s.p.).<br />

Este questio<strong>na</strong>mento só foi possível após longos anos <strong>de</strong> luta e empenho<br />

dos grupos <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> e <strong>das</strong> feministas, que transformaram essa luta em causa<br />

política, que terá no conceito <strong>de</strong> gênero o cerne <strong>das</strong> discussões.<br />

Keller (2006), a respeito do papel do feminismo em seu contexto<br />

estaduni<strong>de</strong>nse acredita que<br />

20 Tradução livre <strong>de</strong>: “búsqueda <strong>de</strong>sinteresada <strong>de</strong> la verdad mediante la formulación <strong>de</strong> hipótesis que<br />

son contrasta<strong>das</strong> <strong>de</strong>spués mediante técnicas muy elabora<strong>das</strong>” (SEDEÑO, 2000, s.p. Grifos da<br />

autora.)<br />

21 Tradução livre <strong>de</strong>: “a no ser que se adopte el „punto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> Dios‟, es difícil aceptar que lo que<br />

sucedió en el pasado, no se volverá a repetir en el futuro y que lo que hoy es „ciencia bue<strong>na</strong>‟,<br />

conocimiento autorizado o certificado no vaya nunca a <strong>de</strong>jar <strong>de</strong> serlo” (SEDEÑO, 2000, s.p. Grifos da<br />

autora.)


40<br />

o feminismo contemporâneo mudou a posição <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> ciência.<br />

Ainda que não possamos afirmar igualda<strong>de</strong> ple<strong>na</strong>, pelo menos nos EUA,<br />

testemunhamos <strong>uma</strong> impressio<strong>na</strong>nte transformação ao longo <strong>das</strong> últimas<br />

três déca<strong>das</strong>. Enquanto que, em 1970, ape<strong>na</strong>s 8% dos doutorados<br />

outorgados <strong>na</strong>s ciências <strong>na</strong>turais iam para <strong>mulheres</strong>, hoje essa cifra atinge<br />

35%. Ainda mais impressio<strong>na</strong>nte é o sucesso subseqüente <strong>de</strong>ssas<br />

<strong>mulheres</strong>, especialmente daquelas que obtiveram seus títulos nos últimos<br />

<strong>de</strong>z anos. Por exemplo: em 1970 era difícil encontrar <strong>mulheres</strong> como<br />

professoras titulares em qualquer <strong>das</strong> discipli<strong>na</strong>s científicas (a maioria dos<br />

<strong>de</strong>partamentos não tinha nenh<strong>uma</strong>). Hoje, em contraste, entre os<br />

professores titulares <strong>na</strong>s ciências <strong>na</strong>turais que obtiveram seus títulos nos<br />

últimos <strong>de</strong>z anos, as <strong>mulheres</strong> são impressio<strong>na</strong>ntes 46% (KELLER, 2006, p.<br />

16-17).<br />

Interessa-nos, fi<strong>na</strong>lmente, refletir se todos os interessados e interessa<strong>das</strong><br />

estão fazendo parte da (re)construção dos campos <strong>de</strong> saberes científicos e<br />

tecnológicos, passando então basicamente pela abordagem que inclui as <strong>mulheres</strong> e<br />

questio<strong>na</strong> práticas perpetua<strong>das</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> nestes campos.<br />

Enten<strong>de</strong>r o lugar <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> nos campos da Ciência e da Tecnologia tal<br />

como os concebemos hoje é <strong>de</strong> extrema importância, porque <strong>uma</strong> visão mais ampla<br />

nos levará a compreen<strong>de</strong>r quais as possibilida<strong>de</strong>s reais que temos <strong>de</strong> recuperar<br />

essa história pouco comentada para enriquecer o momento atual e contribuir <strong>na</strong> luta<br />

pela maior inserção <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> como agentes no cenário científico e tecnológico.<br />

2.2.1 Os campos científico e tecnológico e a presença <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong><br />

Historicamente a Ciência é vista como <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> realizada<br />

predomi<strong>na</strong>ntemente por homens, e, tendo sido contada por eles, pouco se divulga<br />

sobre a atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

O movimento feminista possibilitou que a cada dia mais <strong>mulheres</strong> se<br />

aproximassem dos campos <strong>de</strong> pesquisas, gerando <strong>uma</strong> modificação “da percepção<br />

científica do <strong>na</strong>tural, masculino ou feminino” (LÖWY, 2000, p. 24).<br />

Cruz (2007) e Schiebinger (2001) relatam que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Antiguida<strong>de</strong> houve<br />

contribuição <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à Ciência, embora sua participação não tenha sido<br />

escolhida como verda<strong>de</strong> a ser propagada. Existem registros <strong>de</strong> que Christine <strong>de</strong><br />

Pizan seria a primeira mulher a viver <strong>de</strong> seu trabalho e já em 1405 se questio<strong>na</strong>va a


41<br />

respeito <strong>das</strong> contribuições <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> às artes e Ciências. Schiebinger também<br />

cita que a obra mais sólida sobre <strong>mulheres</strong> e Ciência foi <strong>de</strong> autoria <strong>de</strong> um padre, H.<br />

J. Mozans, em 1913: Women in Science. A partir <strong>de</strong>la, o tema foi explorado meio<br />

que timidamente até mais da meta<strong>de</strong> do século passado quando vemos a<br />

consolidação do movimento <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

Além <strong>de</strong> Mozans diversos enciclopedistas fizeram pesquisas e trouxeram a<br />

público nomes <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que se <strong>de</strong>stacaram no campo científico <strong>de</strong>safiando,<br />

“códigos convencio<strong>na</strong>is que as compelia a confi<strong>na</strong>r suas ativida<strong>de</strong>s às tarefas<br />

rotineiras dos afazeres domésticos” (MOZANS, 1913, apud SCHIEBINGER, 2001, p.<br />

57). Como são poucas as que tiveram tal ousadia, questio<strong>na</strong>mo-nos<br />

frequentemente: on<strong>de</strong> estão as <strong>mulheres</strong>? Por que são tão poucas? 22<br />

Outro aspecto interessante: quando falamos especificamente em fazer<br />

Ciência, no senso comum associa-se a <strong>uma</strong> figura do sexo masculino, com <strong>uma</strong><br />

aparência madura, experiente, ilustrada por cabelos brancos e bigo<strong>de</strong>, trajando um<br />

jaleco branco, <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um laboratório, ro<strong>de</strong>ado por tubos <strong>de</strong> ensaio. Esta é a i<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> “sujeito universal” da Ciência Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>, que segundo Sar<strong>de</strong>nberg (2007) não é<br />

qualquer homem, <strong>de</strong> qualquer parte do globo: é o homem branco oci<strong>de</strong>ntal, padrão<br />

que <strong>de</strong>claradamente exclui as <strong>mulheres</strong> e outros grupos sociais 23 , dificultando-lhes<br />

alg<strong>uma</strong> autorida<strong>de</strong> epistêmica, frequentemente por causa da justificativa <strong>de</strong> que<br />

alg<strong>uma</strong>s características consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> exclusivamente próprias do feminino não<br />

servem ao fazer científico e tecnológico, algo que é dissemi<strong>na</strong>do pelos<br />

representantes do campo e segue consolidando-se no senso comum.<br />

Lires, Angós e Pairó (2003) lembram que é a partir do século XIX que se<br />

institui o discurso que <strong>de</strong>termi<strong>na</strong> quem é o sujeito da Ciência:<br />

22 No texto consi<strong>de</strong>rado marco no campo <strong>de</strong> gênero e Ciência Women in Science: Why so few?:<br />

Social and psychological influences restrict womens‟s choice and pursuit of careers in science,<br />

publicado <strong>na</strong> revista Science, em 28 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 1965 pela socióloga Alice Rossi, a autora falecida<br />

recentemente em novembro <strong>de</strong> 2009 questionou pela primeira vez a questão do número pequeno <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> fazendo Ciência. Mais tar<strong>de</strong> a psicóloga e linguista norteamerica<strong>na</strong> Virginia Valian lança<br />

Why So Slow? The Advancement of Women, questio<strong>na</strong>ndo a lentidão do processo <strong>de</strong> engendramento<br />

da categoria gênero no campo da Ciência.<br />

23 Consi<strong>de</strong>rando as questões <strong>de</strong> classe e etnias, homens e <strong>mulheres</strong> pobres e homens e <strong>mulheres</strong><br />

negros não seriam o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> sujeito da Ciência.


42<br />

Este discurso postulou que o homem branco era o único sujeito universal da<br />

história, negando assim a categoria <strong>de</strong> sujeitos e criadores da civilização<br />

oci<strong>de</strong>ntal, da qual a ciência constitui um elemento importantíssimo, às<br />

<strong>mulheres</strong> e a outros grupos sociais que não entravam <strong>na</strong> categoria <strong>de</strong><br />

homens brancos (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.). 24<br />

Isso ficará marcado <strong>na</strong> história da Ciência: as <strong>mulheres</strong> estariam longe <strong>de</strong><br />

ser o que se espera <strong>de</strong> um sujeito da Ciência. Lires, Angós e Pairó (2003) apontam<br />

o Con<strong>de</strong> <strong>de</strong> Gobineau <strong>na</strong> obra Ensayo sobre la <strong>de</strong>sigualdad <strong>de</strong> las razas h<strong>uma</strong><strong>na</strong>s<br />

(1853) como aquele que consagrou a i<strong>de</strong>ntificação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e <strong>das</strong> “„raças‟ não<br />

brancas” com “„outros‟ inferiores”.<br />

A imagem dissemi<strong>na</strong>da <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> do que é a Ciência se <strong>de</strong>ve à prática,<br />

portanto, dos próprios “donos” da Ciência hegemônica: homens brancos que fazem<br />

parte do campo científico, conceito explicado por autores como Bourdieu,<br />

preocupados pela dissemi<strong>na</strong>ção <strong>de</strong> que fazer Ciência significa estar preocupado<br />

com o bem comum, porém distante do objeto – sendo ela impessoal, objetiva, sem<br />

gênero, superior e acessível a poucos escolhidos. Esta concepção durante anos foi<br />

alimentada no imaginário social, até que alguns teóricos surgem preocupados com a<br />

<strong>de</strong>smistificação <strong>de</strong>ssa Ciência, bem como do que se enten<strong>de</strong> por Tecnologia<br />

(GORZ, 1979).<br />

Prevalece <strong>uma</strong> representação que se fixará para aten<strong>de</strong>r aos interesses do<br />

grupo específico que domi<strong>na</strong> o campo. Representações sociais funcio<strong>na</strong>m<br />

exatamente <strong>de</strong>ssa maneira: segundo Cruz (2007, p. 22), são imagens “construí<strong>das</strong> e<br />

reforça<strong>das</strong> <strong>na</strong> interação com os outros. São constituí<strong>das</strong> <strong>de</strong> um núcleo central,<br />

resistente às mudanças e <strong>de</strong> <strong>uma</strong> periferia, que protege o núcleo central”. Nesses<br />

termos temos <strong>uma</strong> representação do que seja fazer Ciência e Tecnologia, que tem<br />

por trás <strong>uma</strong> representação do que seja um cientista/pesquisador, ambas<br />

construí<strong>das</strong> e reforça<strong>das</strong> por toda <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> que se empenha em ratificar<br />

seus “i<strong>de</strong>ais”.<br />

Segundo An<strong>de</strong>rson (2001), os “donos” <strong>de</strong>ste fazer científico e tecnológico<br />

reconhecido produzem<br />

24 Tradução livre <strong>de</strong>: “Este discurso postuló que el hombre blanco era el único sujeto universal <strong>de</strong> la<br />

historia, negando así la categoría <strong>de</strong> sujetos y creadores <strong>de</strong> la civilización occi<strong>de</strong>ntal, <strong>de</strong> la cual la<br />

ciencia constituye un elemento importantísimo, a las mujeres y a otros grupos sociales que no<br />

entraban en la categoría <strong>de</strong> hombres blancos” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).


43<br />

conhecimentos em Ciência e tecnologia que não ape<strong>na</strong>s não são úteis para<br />

as <strong>mulheres</strong> e outros segmentos subordi<strong>na</strong>dos, como vêm alimentando e<br />

reforçando as hierarquias <strong>de</strong> gênero, bem como outras hierarquias sociais<br />

(apud SARDENBERG, 2007, s.p.).<br />

O prejuízo não está somente <strong>na</strong> produção/concepção <strong>de</strong>stes saberes, mas<br />

inclusive no seu uso ou aproveitamento por aqueles e aquelas que não fizeram parte<br />

do processo <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> maneira. Conclui-se que<br />

a predominância masculi<strong>na</strong> nos meios ditos científico-acadêmicos tem<br />

contribuído para a reprodução do viés androcêntrico <strong>na</strong> escolha e <strong>de</strong>finição<br />

<strong>de</strong> problemas para investigação, bem como no <strong>de</strong>senho metodológico <strong>das</strong><br />

pesquisas e interpretação dos resultados (SARDENBERG, 2007, s.p.).<br />

Nesse caso, questões iniciais como o que pesquisar, que tecnologias usar<br />

ou produzir, não sofriam (ou sofrem) intervenção <strong>de</strong> diferentes sujeitos e suas<br />

especificida<strong>de</strong>s. Se manti<strong>das</strong> nos redutos, aquelas questões dificilmente se<br />

encaixariam em necessida<strong>de</strong>s reais dos sujeitos interessados(as). Isso diz respeito a<br />

não neutralida<strong>de</strong> e impessoalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> C&T, justificando a impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se<br />

conceber os fazeres científicos como sendo neutros, mas sendo sobretudo<br />

ativida<strong>de</strong>s intencio<strong>na</strong>is, visando a interesses <strong>de</strong> <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> específica. Essas<br />

discussões só foram possíveis graças ao que se convencionou chamar Estudos<br />

Sociais da Ciência e Tecnologia, que, <strong>de</strong>ntre outras questões, questionou a<br />

neutralida<strong>de</strong> e o <strong>de</strong>terminismo científico e as características atribuí<strong>das</strong> a estas<br />

áreas 25 .<br />

A ativida<strong>de</strong> científica, <strong>de</strong> forma geral, é apresentada como dotada <strong>de</strong><br />

universalida<strong>de</strong>, neutralida<strong>de</strong>, impessoalida<strong>de</strong>, ignorando que, por ser <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong><br />

feita por pessoas, diz respeito a escolhas. Conforme Winner (1996) e Gorz (1979),<br />

as pessoas são seres sociais e políticos, e ser político implica em escolhas e essas<br />

vão <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ndo os campos científico e tecnológico <strong>de</strong> acordo com seus agentes.<br />

Bourdieu (1983), nessa mesma lógica, <strong>de</strong>screve o campo científico como um<br />

lugar <strong>de</strong> luta política pela domi<strong>na</strong>ção científica, que <strong>de</strong>sig<strong>na</strong> a cada<br />

pesquisador, em função da posição que ele ocupa, seus problemas,<br />

indissociavelmente políticos e científicos, e seus métodos [...]. Não há<br />

“escolha” científica – do campo da pesquisa, dos métodos empregados, do<br />

25 Autores como Bazzo, Linsingen e Teixeira (2003), Cutcliffe (2003), Mackenzie e Wajcman (1996),<br />

Marx e Smith (1996), Gorz (1979) e Winner (1996) se <strong>de</strong>stacaram por tratar do tema.


44<br />

lugar da publicação [...] que não seja <strong>uma</strong> estratégia política <strong>de</strong> investimento<br />

objetivamente orientada para a maximização do lucro propriamente<br />

científico, isto é, a obtenção do reconhecimento dos pares concorrentes<br />

(BOURDIEU, 1983, p. 127).<br />

O autor apresenta o campo científico como aquele em que a domi<strong>na</strong>ção é o<br />

pressuposto <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte da posição ocupada e reconhecida pelos pares. Ele<br />

enten<strong>de</strong> também a luta política como luta científica, <strong>na</strong> qual “os domi<strong>na</strong>ntes são<br />

aqueles que conseguem impor <strong>uma</strong> <strong>de</strong>finição da Ciência segundo a qual a<br />

realização mais perfeita consiste em ter, ser e fazer aquilo que eles têm, são e<br />

fazem” (BOURDIEU, 1983, p. 128), <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> lado e abaixo todos os <strong>de</strong>mais<br />

componentes do campo.<br />

Basicamente, o campo científico <strong>na</strong>da mais é que um “sistema <strong>de</strong> relações<br />

objetivas entre posições adquiri<strong>das</strong> [...] o lugar, o espaço <strong>de</strong> jogo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> luta<br />

concorrencial” (BOURDIEU, 1983, p. 122), <strong>na</strong> qual está em jogo a “autorida<strong>de</strong><br />

científica” (ou “competência científica”) que para Bourdieu é essencialmente a<br />

capacida<strong>de</strong> técnica que se tem junto com o po<strong>de</strong>r social. Ele diz que é um jogo<br />

justamente porque diz respeito a interesses. E acrescenta que<br />

Pelo fato <strong>de</strong> que to<strong>das</strong> as práticas estão orienta<strong>das</strong> para a aquisição <strong>de</strong><br />

autorida<strong>de</strong> científica (prestígio, reconhecimento, celebrida<strong>de</strong> etc.), o que<br />

chamamos comumente <strong>de</strong> “interesse” por <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> científica (<strong>uma</strong><br />

discipli<strong>na</strong>, um setor <strong>de</strong>ssa discipli<strong>na</strong>, um método etc.) tem sempre <strong>uma</strong><br />

dupla face. O mesmo acontece com as estratégias que ten<strong>de</strong>m a assegurar<br />

a satisfação <strong>de</strong>sse interesse (BOURDIEU, 1983, p. 124).<br />

Apesar <strong>de</strong> alguns casos <strong>de</strong> exceção, os agentes que tomam as <strong>de</strong>cisões nos<br />

campos científico e tecnológico, ou seja, tem seus interesses atendidos, são <strong>na</strong><br />

maior parte <strong>das</strong> vezes homens, e as <strong>mulheres</strong>, ainda que façam Ciência e ainda que<br />

sejam atingi<strong>das</strong> por escolhas tecnológicas que vêm para interferir em suas vi<strong>das</strong>, <strong>de</strong><br />

forma geral, ficam alheias às <strong>de</strong>cisões.<br />

Se voltarmos nosso olhar para muito antes do início da Ciência Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>,<br />

vamos ver que <strong>na</strong> Grécia antiga as <strong>mulheres</strong> eram admiti<strong>das</strong> em poucas escolas<br />

filosóficas (por exemplo, <strong>na</strong> platônica ou <strong>na</strong> pitagórica); já <strong>na</strong> Ida<strong>de</strong> Média, em<br />

alguns países, nos conventos era permitida <strong>uma</strong> educação limitada às meni<strong>na</strong>s. Já o<br />

Iluminismo, po<strong>de</strong>-se dizer, não conseguiu que elas chegassem facilmente ao saber;


45<br />

entretanto alg<strong>uma</strong>s poucas conseguiram se <strong>de</strong>stacar como pensadoras e praticantes<br />

da Ciência <strong>na</strong> época (SEDEÑO, 2000).<br />

A respeito do papel <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no <strong>na</strong>scimento e consolidação da Ciência<br />

Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>, Lires, Angós e Pairó (2003) vão dizer que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> antes do século XV as<br />

<strong>mulheres</strong> eram consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> inferiores e excluí<strong>das</strong> da esfera pública. A Querelle <strong>de</strong>s<br />

femmes 26 , no século XV, vai abrir o <strong>de</strong>bate justamente para lhes possibilitar que<br />

tomem parte <strong>das</strong> discussões a respeito do seu próprio valor. Uma <strong>das</strong> peças<br />

principais nesta batalha que se inicia e culmi<strong>na</strong>rá com o movimento sufragista já <strong>na</strong><br />

virada do século XIX para o XX, é o acesso à educação.<br />

Da Querelle participou um número significativo <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, mas o fato é<br />

que nem os argumentos <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, tampouco os dos poucos homens que<br />

também se envolveram, foram capazes <strong>de</strong> modificar <strong>de</strong>finitivamente a or<strong>de</strong>m política<br />

ou social <strong>na</strong>queles primeiros séculos <strong>de</strong> discussões em favor da igualda<strong>de</strong> <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003).<br />

Nos séculos XVII e XVIII, o que embasava a argumentação dos homens<br />

consi<strong>de</strong>rados eruditos era o título <strong>de</strong> “científico”. Como argumento principal estavam<br />

“velhas i<strong>de</strong>ias misógi<strong>na</strong>s 27 , que ressuscitavam antigos preconceitos em nome <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> investigação pretendidamente objetiva e racio<strong>na</strong>l, tais como a i<strong>na</strong>ta<br />

superiorida<strong>de</strong> dos homens” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.) 28 , justificada<br />

frequentemente pela suposta superiorida<strong>de</strong> biológica.<br />

Àquela época, era vedada a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> aos círculos em que<br />

se falava sobre Ciência.<br />

Não obstante suas qualida<strong>de</strong>s e competências, não lhes era permitido o<br />

acesso às intensas e calorosas discussões que aconteciam <strong>na</strong>s socieda<strong>de</strong>s<br />

e aca<strong>de</strong>mias científicas, que se multiplicaram no século XVII por toda a<br />

Europa e tor<strong>na</strong>ram-se as principais instituições <strong>de</strong> referência da ainda<br />

reduzida comunida<strong>de</strong> científica mundial (LETA, 2003, p. 271).<br />

26 Recebe este nome o <strong>de</strong>bate que durou cerca <strong>de</strong> 300 anos (do século XV à meta<strong>de</strong> do XVII,<br />

continuando até o século passado) sobre a “valida<strong>de</strong>” intelectual <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

27 Do grego, misógino é aquele que <strong>de</strong>sprezo ou tem aversão às <strong>mulheres</strong> ou ao contato sexual com<br />

elas (AURÉLIO, versão eletrônica, 1999).<br />

28 Tradução livre <strong>de</strong>: “viejas i<strong>de</strong>as misógi<strong>na</strong>s, que resucitaban antiguos prejuicios en nombre <strong>de</strong> u<strong>na</strong><br />

investigación pretendidamente objetiva y racio<strong>na</strong>l, tales como la in<strong>na</strong>ta superioridad <strong>de</strong> los varones”<br />

(LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.)


46<br />

Esta situação se manteve até a segunda meta<strong>de</strong> do século XX, quando se<br />

po<strong>de</strong> falar <strong>de</strong> um elo entre a atuação dos movimentos feministas e <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, que<br />

contribuirão significativamente para a entrada <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no mercado <strong>de</strong> trabalho<br />

formal, e “a necessida<strong>de</strong> crescente <strong>de</strong> recursos h<strong>uma</strong>nos para ativida<strong>de</strong>s<br />

estratégicas, como a Ciência” (LETA, 2003, p. 271).<br />

O século XVIII com a Revolução Iluminista herda questões do XVII, como<br />

<strong>uma</strong> nova mentalida<strong>de</strong>, que acredita que o trabalho artesão, <strong>de</strong>senvolvido em<br />

gran<strong>de</strong> medida por <strong>mulheres</strong>, contribuía <strong>de</strong> igual maneira que o científico para o<br />

progresso e a “felicida<strong>de</strong>” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003). No entanto, para as<br />

<strong>mulheres</strong> o século <strong>das</strong> Luzes vai estar mais para o<br />

Século <strong>de</strong> Sombras, pois ainda que muitas tenham participado no<br />

movimento intelectual e científico, não sem esforço, muito poucas foram as<br />

que conseguiram o reconhecimento <strong>das</strong> instituições e, no melhor dos casos,<br />

foram consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> como exceções ou casualida<strong>de</strong>s (LIRES, ANGÓS e<br />

PAIRÓ, 2003, s.p.). 29<br />

Po<strong>de</strong>-se perceber que no século XVIII ainda eram poucos os que se<br />

preocupavam com a baixa participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s Ciências; em realida<strong>de</strong> a<br />

maioria falava<br />

em nome da pretendida lógica e racio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> da ciência, [e] continuavam<br />

afirmando, <strong>de</strong> acordo com as mais ancestrais suposições, que as <strong>mulheres</strong><br />

eram inferiores <strong>na</strong> razão e <strong>na</strong> ética, tratando <strong>de</strong> justificar sua subordi<strong>na</strong>ção<br />

e o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> mulher calada, obediente, submissa, mo<strong>de</strong>sta e casta (LIRES,<br />

ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.). 30<br />

Autores como Moli<strong>na</strong> (1994) enten<strong>de</strong>m que os i<strong>de</strong>ais iluministas não<br />

“ilumi<strong>na</strong>ram” alg<strong>uma</strong>s parcelas da socieda<strong>de</strong>.<br />

29 Tradução livre <strong>de</strong>: “Siglo <strong>de</strong> Sombras, pues aunque muchas participaron en el movimiento<br />

intelectual y científico, no sin esfuerzo, muy escasas fueron las que consiguieron el reconocimiento <strong>de</strong><br />

las instituciones y, en el mejor <strong>de</strong> los casos, se las consi<strong>de</strong>ró como excepciones o casualida<strong>de</strong>s”<br />

(LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).<br />

30 Tradução livre <strong>de</strong>: “en nombre <strong>de</strong> la pretendida lógica y racio<strong>na</strong>lidad <strong>de</strong> la ciencia, [e] continuaban<br />

afirmando, <strong>de</strong> acuerdo con los más ancestrales supuestos, que las mujeres eran inferiores en la<br />

razón y en la ética, tratando <strong>de</strong> justificar su subordi<strong>na</strong>ción y el i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> mujer callada, obediente,<br />

sumisa, mo<strong>de</strong>sta y casta” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).


47<br />

A Ilustração não cumpriu suas promessas no que à mulher se refere,<br />

ficando o feminino como aquele reduto que as Luzes não souberam ou não<br />

quiseram ilumi<strong>na</strong>r, abando<strong>na</strong>ndo, portanto, a meta<strong>de</strong> da espécie <strong>na</strong>quele<br />

ângulo sombrio da paixão, da <strong>na</strong>tureza ou do privado (apud LIRES, ANGÓS<br />

e PAIRÓ, 2003, s.p. Grifos <strong>das</strong> autoras). 31<br />

Po<strong>de</strong>mos notar revendo os i<strong>de</strong>ais iluministas que paradoxalmente,<br />

ao mesmo tempo que a nova ciência, com seu pensamento biologicista,<br />

contribuía para perpetuar a opressão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> crítica e<br />

<strong>de</strong> transformação social do pensamento ilustrado lhe obrigava a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o<br />

papel da educação como elemento crucial para tal transformação (LIRES,<br />

ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.). 32<br />

O trecho sugere que a partir <strong>das</strong> i<strong>de</strong>ias iluministas a educação para as<br />

<strong>mulheres</strong> surge como <strong>uma</strong> temática a ser repensada, questão retomada no capítulo<br />

terceiro.<br />

Foi no fi<strong>na</strong>l do século XVIII que surgiram manifestações escritas da luta <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong>. Como exemplo Lires, Angós e Pairó citam “A <strong>de</strong>claração <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e o<br />

Direito <strong>das</strong> cidadãs” <strong>de</strong> Olympe <strong>de</strong> Gouges, já referida aqui, e os “Cua<strong>de</strong>rnos <strong>de</strong><br />

quejas <strong>de</strong> las mujeres” que diziam respeito às i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> vários pensadores, homens<br />

e <strong>mulheres</strong> preocupados com os direitos <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, <strong>de</strong>ntre eles a também<br />

supracitada inglesa Mary Wollstoncraft (“Vindicación <strong>de</strong> los <strong>de</strong>rechos <strong>de</strong> la mujer”, <strong>de</strong><br />

1791), o francês Condorcet, o alemão Theodor Von Hippel (“Sobre el avance <strong>de</strong> las<br />

mujeres”, <strong>de</strong> 1792), a espanhola Josefa Amar y Borbón, os monjes beneditinos<br />

Feijoo (“Teatro Crítico Universal”) e Sarmiento (“Demostración Crítico-Apologética”)<br />

(LIRES, ANGÓS e PAIRÓS, 2003).<br />

As autoras <strong>de</strong>stacam também <strong>uma</strong> obra importante por ser <strong>uma</strong> prova <strong>de</strong><br />

que as discussões a respeito da condição da mulher ainda estavam longe <strong>de</strong> serem<br />

resolvi<strong>das</strong> e começavam inicialmente dizendo respeito à educação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>:<br />

Vicente do Seixo, iluminista, escreveu Discurso Filosófico Económico Político sobre<br />

la capacidad o incapacidad <strong>na</strong>tural <strong>de</strong> las mujeres para las Ciencias y las Artes, y si<br />

31 Tradução livre <strong>de</strong>: “La Ilustración no cumplió sus promesas en lo que a la mujer se refiere,<br />

quedando lo femenino como aquel reducto que las Luces no supieron o no quisieron ilumi<strong>na</strong>r,<br />

abando<strong>na</strong>ndo, por tanto, la mitad <strong>de</strong> la especie en aquel ángulo sombrío <strong>de</strong> la pasión, la <strong>na</strong>turaleza o<br />

lo privado” (MOLINA, 1994 apud LIRES et al, 2003, s.p.).<br />

32 Tradução livre <strong>de</strong>: “...al mismo tiempo que la nueva ciencia, con su pensamiento biologicista,<br />

contribuía a perpetuar la opresión <strong>de</strong> las mujeres, la voluntad <strong>de</strong> crítica y <strong>de</strong> transformación social <strong>de</strong>l<br />

pensamiento ilustrado le obligaba a <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r el papel <strong>de</strong> la educación como elemento crucial para tal<br />

transformación” (LIRES et al, 2003, s.p.).


48<br />

en razón <strong>de</strong> su constitución, o por <strong>de</strong>fecto <strong>de</strong> su potencia intelectual, y organización<br />

física, <strong>de</strong>ben o no tener otras ocupaciones que las <strong>de</strong> la rueca, calceta y aguja,<br />

como preten<strong>de</strong>n algunos hombres, o <strong>de</strong>berá dárseles otra educación que la que se<br />

les da actualmente, y cuál sea ésta 33 (1801). Só pelo título da obra é possível<br />

perceber a preocupação do autor em compreen<strong>de</strong>r o que seria melhor para as<br />

Ciências e Artes 34 – a participação ou não <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e qual o futuro que a elas<br />

seria <strong>de</strong>finido por eles: receber educação e qual educação. Mais <strong>uma</strong> vez alertamos<br />

que esta questão será retomada em tópico específico, quando trataremos<br />

especificamente da condição da educação e o que ela possibilita às <strong>mulheres</strong>.<br />

Da passagem do século XVII para o XVIII temos a escritura da história <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> “nova Ciência” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003), e nesta é possível encontrar<br />

registros <strong>de</strong> um espaço que, ao lado <strong>das</strong> Aca<strong>de</strong>mias europeias <strong>de</strong> Ciência, foi<br />

reservado à difusão da nova Ciência <strong>na</strong> Europa: nos “salones” 35 se discutiam as<br />

concepções e teorias <strong>de</strong> nomes como Descartes e Newton, e neles era permitido a<br />

alg<strong>uma</strong>s privilegia<strong>das</strong> a<strong>de</strong>ntrar; as que recebiam este privilégio eram chama<strong>das</strong><br />

“salonières” ou “damas <strong>de</strong> Ciência”. Elas normalmente iam leva<strong>das</strong> por algum<br />

homem: irmãos, maridos, pais, enfim. Os salones eram lugares muito populares em<br />

que se tinha acesso privilegiado à Ciência, algo estendido inclusive para aquelas<br />

<strong>mulheres</strong> que não tivessem tantos recursos para tal (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ,<br />

2003), e talvez por isso, as Cortes europeias não aceitavam tranquilamente sua<br />

existência.<br />

Vale lembrar que as <strong>mulheres</strong>, ainda que pu<strong>de</strong>ssem ace<strong>de</strong>r aos salones,<br />

não tinham tanta liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação; acreditava-se que não era interessante que<br />

se <strong>de</strong>dicassem à filosofia <strong>na</strong>tural (como a Ciência era chamada) ou às matemáticas.<br />

Ainda assim po<strong>de</strong>-se dizer que este foi um momento <strong>de</strong> muita importância, porque<br />

33 “Discurso Filosófico Econômico Político sobre a capacida<strong>de</strong> ou incapacida<strong>de</strong> <strong>na</strong>tural <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong><br />

para as Ciências e as Artes, e se em razão <strong>de</strong> sua constituição, ou por <strong>de</strong>feito <strong>de</strong> sua potência<br />

intelectual, e organização física, <strong>de</strong>vem ou não ter outras ocupações que as da roca, meia calça e<br />

agulha, como preten<strong>de</strong>m alguns homens, ou <strong>de</strong>verá dar a elas outra educação que a que lhes dá<br />

atualmente, e qual seja esta”.<br />

34 Chamamos atenção para o fato <strong>de</strong> o autor colocar Ciências e Artes lado a lado; se consi<strong>de</strong>ramos o<br />

contexto em que o fez, po<strong>de</strong>mos afirmar que até que se estabelecesse a concepção <strong>de</strong> que as<br />

Ciências estão pauta<strong>das</strong> <strong>na</strong> racio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, a separação entre objetivida<strong>de</strong> e subjetivida<strong>de</strong> da Ciência<br />

e <strong>das</strong> Artes, respectivamente, não estava tão clara para alguns pensadores da época.<br />

35 Garcia e Se<strong>de</strong>ño (s.d.) e Schiebinger (2001) também citam os salones como fundamentais para a<br />

aproximação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>das</strong> discussões científicas.


49<br />

“nunca até então, tantas <strong>mulheres</strong> haviam formado parte <strong>das</strong> comunida<strong>de</strong>s<br />

científicas, estudando e trabalhando, com os meios a seu alcance, nos mais<br />

variados campos” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.). 36<br />

Outra instituição que se <strong>de</strong>stacou ainda no século XVIII <strong>na</strong> Espanha foram<br />

As Socieda<strong>de</strong>s Económicas <strong>de</strong> Amigos <strong>de</strong>l País; elas <strong>de</strong>fendiam as “minorias”:<br />

pobres, margi<strong>na</strong>lizados e as <strong>mulheres</strong>. No entanto, em muitas <strong>de</strong>las as <strong>mulheres</strong><br />

não podiam participar pessoalmente, mas à distância, <strong>de</strong> forma a preservar seu<br />

recato – mesmo entre os que <strong>de</strong>fendiam a causa <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, havia ressalvas com<br />

respeito à educação que elas não <strong>de</strong>veriam receber. E quando fi<strong>na</strong>lmente elas são<br />

aceitas por <strong>de</strong>creto do rei Carlos III <strong>na</strong>s Socieda<strong>de</strong>s Econômicas, elas foram<br />

chama<strong>das</strong> bachilleras 37 , <strong>de</strong> maneira pejorativa. São poucos os registros preservados<br />

a respeito da participação femini<strong>na</strong> <strong>na</strong>s reuniões <strong>das</strong> Socieda<strong>de</strong>s para que<br />

possamos saber exatamente como elas conseguiam atuar 38 .<br />

Vale <strong>de</strong>stacar que curiosamente no século XVIII a Ciência era “feita” nessas<br />

Socieda<strong>de</strong>s Econômicas e nos salones, e não <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s como aconteceria<br />

déca<strong>das</strong> mais tar<strong>de</strong>. Isso colaborou para que muitas <strong>mulheres</strong> contribuíssem com os<br />

avanços da “nova Ciência”, mas ainda assim foram poucas as que conseguiram o<br />

estatuto <strong>de</strong> pesquisadoras, cientistas ou filósofas – alg<strong>uma</strong>s poucas eram<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> “amantes” da Ciência (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).<br />

Muito interessante também é que ainda nos séculos XVII e XVIII a maioria<br />

<strong>das</strong> obras científicas estava em latim e o aprendizado da língua, vedado às<br />

<strong>mulheres</strong> e a um número gran<strong>de</strong> <strong>de</strong> homens, teria dificultado o acesso às obras, até<br />

que alg<strong>uma</strong>s autodidatas ou privilegia<strong>das</strong> por terem tido preceptores ocuparam-se<br />

da tradução daquelas obras antes acessíveis a poucos.<br />

Nesse contexto surgiu a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> divulgação científica efetiva;<br />

as obras começaram a ser escritas <strong>na</strong>s línguas <strong>de</strong> cada país, além <strong>de</strong> serem<br />

36<br />

Tradução livre <strong>de</strong>: “nunca hasta entonces, tantas mujeres habían formado parte <strong>de</strong> las<br />

comunida<strong>de</strong>s científicas, estudiando y trabajando, con los medios a su alcance, en los más variados<br />

campos” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).<br />

37 As intelectuais aceitas <strong>na</strong>s Socieda<strong>de</strong>s Econômicas da Espanha serão chama<strong>das</strong> bachilleras<br />

pejorativamente, contra o que poucas resistiram. No sentido figurado o termo significa “tagarelas”.<br />

38 Lires, Angós e Pairó (2003) trazem nomes <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s estudiosas que se preocuparam por<br />

investigar as Socieda<strong>de</strong>s Econômicas espanholas, <strong>de</strong>ntre elas po<strong>de</strong>mos citar os nomes <strong>de</strong> Mari<br />

Carrillo da Socieda<strong>de</strong> Econômica <strong>de</strong> Santiago <strong>de</strong> Compostela, María Reguera <strong>de</strong> Mondragón da<br />

Socieda<strong>de</strong> Econômica <strong>de</strong> Lugo; e Josefa Amar y Borbón <strong>das</strong> Socieda<strong>de</strong>s Econômicas <strong>de</strong> Madri e<br />

Zaragoza.


50<br />

traduzi<strong>das</strong> ao inglês, francês, alemão e italiano para garantir maior acesso aos<br />

interessados. Neste momento começam a ser escritos livros e periódicos<br />

especificamente voltados para as <strong>mulheres</strong>, justamente porque se via nelas um<br />

grupo propenso a conhecer esta nova Ciência.<br />

Já no século XIX, percebe-se que “De novo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> princípios supostamente<br />

científicos, tenta-se „provar‟ a inferiorida<strong>de</strong> intelectual <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, especialmente<br />

no que se refere ao trabalho científico” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.) 39 . Há<br />

um empenho em comprovar a inferiorida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> para o trabalho científico.<br />

Por outro lado, ainda que a exclusão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> fosse algo muito presente<br />

também durante os i<strong>de</strong>ais do Iluminismo, nesse período, as <strong>mulheres</strong> conseguiram<br />

garantir <strong>uma</strong> participação maior enquanto cidadãs <strong>de</strong> direito.<br />

Segundo Lires, Angós e Pairó (2003), um ponto a ser <strong>de</strong>stacado do século<br />

XIX é o forte discurso que segregou a mulher ao espaço privado, mantendo o<br />

homem no espaço público, configurando a divisão sexual do trabalho que nos<br />

interessará adiante. As <strong>mulheres</strong> foram ao longo dos anos manti<strong>das</strong> longe dos<br />

espaços públicos, ou seja, invisibiliza<strong>das</strong>, mas isso não ocorreu <strong>de</strong> forma passiva 40 .<br />

Além do fato <strong>de</strong> que as que conseguiram ace<strong>de</strong>r à Ciência tenham sido<br />

invisibiliza<strong>das</strong>, <strong>na</strong> maioria dos casos o que se viu foi <strong>uma</strong> exclusão. É lamentável<br />

que do século XVII ao XIX muitas <strong>mulheres</strong> foram impossibilita<strong>das</strong> <strong>de</strong> participar e<br />

tantas outras importantes tenham ficado esqueci<strong>das</strong> e só foram “recupera<strong>das</strong>” por<br />

causa dos estudos feministas e dos estudos <strong>de</strong> Ciência, Tecnologia e Gênero<br />

recentemente, a partir da década <strong>de</strong> 1980.<br />

Ressaltamos que no “mundo da Ciência e da Tecnologia” não há <strong>uma</strong><br />

linearida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ações e interesses – há <strong>uma</strong> divisão inter<strong>na</strong> <strong>de</strong> subordi<strong>na</strong>ção<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte <strong>das</strong> práticas chama<strong>das</strong> científicas; os campos são formados<br />

basicamente por dois grupos: os <strong>de</strong>tentores <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e os “operários” (FOUREZ,<br />

39 Tradução livre <strong>de</strong>: “De nuevo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> principios supuestamente científicos, se intenta „probar‟ la<br />

inferioridad intelectual <strong>de</strong> las mujeres, especialmente en lo referente al trabajo científico” (LIRES,<br />

ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).<br />

40 Ao longo <strong>de</strong> toda a história encontramos exemplos <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que reagiram às imposições.<br />

Po<strong>de</strong>mos citar nomes como o da cientista Hipácia <strong>de</strong> Alexandria que preferiu o paganismo a ren<strong>de</strong>rse<br />

aos dogmas cristãos, e por isso foi espancada até a morte. Destaque também para o livro <strong>de</strong> Joan<br />

Scott A cidadã paradoxal, no qual conhecemos alguns nomes <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> importantes para o<br />

feminismo francês e que acabam mortas por resistirem às regras que pretendiam sua exclusão, como<br />

foi o caso <strong>de</strong> Olympe <strong>de</strong> Gouges, que foi <strong>de</strong>capitada.


51<br />

1995). Os primeiros, com a função <strong>de</strong> “pensar”, são consi<strong>de</strong>rados cientistas, os que<br />

“produzem” Ciência; os operários teriam somente a função <strong>de</strong> executar e por isso<br />

foram excluídos da história da Ciência e Tecnologia e não são consi<strong>de</strong>rados<br />

cientistas.<br />

Nesse caso, po<strong>de</strong>mos ver que em alguns momentos foi permitido o acesso a<br />

alg<strong>uma</strong>s <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> condição <strong>de</strong> “operários”, por serem irmãs ou esposas <strong>de</strong><br />

cientistas, <strong>de</strong>sempenhando ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> “menores”, como, por exemplo,<br />

a contagem, a classificação <strong>de</strong> materiais e <strong>de</strong> substâncias, enfim, em ativida<strong>de</strong>s<br />

para as quais se imagi<strong>na</strong>va não haver gran<strong>de</strong> esforço intelectual.<br />

Inicialmente fazer Ciência, <strong>de</strong> forma geral, significava apren<strong>de</strong>r tudo <strong>na</strong><br />

prática, justamente pelo acesso restrito ao processo <strong>de</strong> escolarização. A Ciência ao<br />

se tor<strong>na</strong>r mais complexa, mais especializada e institucio<strong>na</strong>lizada, a<strong>de</strong>ntrando as<br />

universida<strong>de</strong>s, dificultou a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, pois elas foram durante longo<br />

tempo excluí<strong>das</strong> <strong>de</strong>sse nível e ensino.<br />

Se<strong>de</strong>ño (2000) <strong>de</strong>staca três momentos que dividiriam a situação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Ciência: no primeiro, que vai do Re<strong>na</strong>scimento até a Revolução<br />

Científica (século XVII), quando às <strong>mulheres</strong> era dado o direito ao acesso à<br />

educação básica, que significava saber ler especialmente para ensi<strong>na</strong>r os filhos. No<br />

segundo momento, que vai até a segunda meta<strong>de</strong> do século XIX, houve um tímido<br />

acesso às instituições <strong>de</strong> mais alto nível – universida<strong>de</strong>s e aca<strong>de</strong>mias. O terceiro<br />

momento, já no século XX, se caracteriza por abarcar a segunda onda do<br />

feminismo; nesse há a busca por enten<strong>de</strong>r por que há tão poucas <strong>mulheres</strong>,<br />

“primeiro estudando ciências, logo, trabalhando nelas e, fi<strong>na</strong>lmente, nos postos <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong>” 41 (SEDEÑO, 2000, s.p.). Este terceiro momento ainda vai<br />

compreen<strong>de</strong>r duas fases: <strong>na</strong> primeira as perguntas se referem à Ciência, enquanto<br />

que <strong>na</strong> segunda, se amplia à Tecnologia, ambos terrenos tradicio<strong>na</strong>lmente<br />

masculinos (SEDEÑO, 2000).<br />

A indagação da autora a partir da recuperação <strong>de</strong>ste histórico é quase que<br />

<strong>uma</strong> questão retórica:<br />

41 Tradução livre <strong>de</strong>: “primero estudiando ciencias, luego, trabajando en ellas y, fi<strong>na</strong>lmente, en los<br />

puestos <strong>de</strong> responsabilidad” (SEDEÑO, 2000, s.p.).


52<br />

A impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ace<strong>de</strong>r às instituições educativas e científicas ao longo<br />

da história e a escassa presença <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> prática científica, ainda<br />

hoje, que praticamente nenhum país, ao menos oci<strong>de</strong>ntal, admite<br />

discrimi<strong>na</strong>ção por razão <strong>de</strong> sexo, conduz à pergunta pelos mecanismos que<br />

o haviam provocado e ainda hoje o provocam 42 (SEDEÑO, 2000, s.p.).<br />

Foi lento o processo <strong>de</strong> acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à Ciência e Tecnologia – aos<br />

poucos elas começaram a ser admiti<strong>das</strong> como membros <strong>das</strong> Socieda<strong>de</strong>s e<br />

instituições, embora não pu<strong>de</strong>ssem li<strong>de</strong>rar ou fazer parte <strong>de</strong> algum comitê especial.<br />

Alg<strong>uma</strong>s socieda<strong>de</strong>s científicas inclusive aceitaram <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua criação a<br />

participação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, como foi o caso <strong>das</strong> Sociedad Botánica <strong>de</strong> Londres,<br />

Sociedad Zoológica e a Real Sociedad <strong>de</strong> Entomología 43 .<br />

Um fator que contribuiu para que os campos científico e tecnológico fossem<br />

se consolidando historicamente como campos masculinos é o fato <strong>de</strong> que mesmo<br />

quando eram <strong>mulheres</strong> po<strong>de</strong>rosas que aprovavam a criação <strong>de</strong> novas socieda<strong>de</strong>s<br />

científicas, outras <strong>mulheres</strong> eram proibi<strong>das</strong> <strong>de</strong> participar 44 .<br />

As possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em alguns âmbitos e conquistas<br />

efetivas no campo da Ciência e da Tecnologia não foram significativas <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong><br />

oci<strong>de</strong>ntal europeia dos séculos XVII ao XIX e casos como o <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong>staca<strong>das</strong><br />

cientistas nos levam a perceber <strong>uma</strong> questão que diz respeito ao fato que, apesar<br />

<strong>das</strong> conquistas, a mulher ainda mantinha certas características e práticas<br />

inter<strong>na</strong>liza<strong>das</strong> pelas relações sociais em que estavam inseri<strong>das</strong>.<br />

Eleanor Ormerod (1828-1901), por exemplo, foi <strong>uma</strong> importante<br />

entomologista e a primeira mulher a receber o título <strong>de</strong> doutorado honoris causa pela<br />

42 Tradução livre <strong>de</strong>: “La imposibilidad <strong>de</strong> acce<strong>de</strong>r a las instituciones educativas y científicas a lo largo<br />

<strong>de</strong> la historia y la escasa presencia <strong>de</strong> mujeres en la práctica científica, aún hoy, en que<br />

prácticamente ningún país, al menos occi<strong>de</strong>ntal, admite discrimi<strong>na</strong>ción por razón <strong>de</strong> sexo condujo a la<br />

pregunta por los mecanismos que lo habían provocado y aún hoy lo provocan” (SEDEÑO, 2000, s.p.).<br />

43 Estas áreas frequentemente davam livre acesso às <strong>mulheres</strong> por se tratarem <strong>de</strong> áreas mais<br />

"a<strong>de</strong>qua<strong>das</strong>" (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003). Para saber mais, ver no capítulo 3 do livro Las<br />

científicas y su historia en el aula o tópico <strong>de</strong>dicado às Ciências Naturais e a condição <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>;<br />

<strong>de</strong>stacamos o que aconteceu no século XVIII: “En la época (...) se consi<strong>de</strong>ró que la botánica era u<strong>na</strong><br />

ocupación apropiada para las mujeres, pues a<strong>de</strong>más <strong>de</strong> contribuir a que no estuvieran ociosas,<br />

impedía el tumulto <strong>de</strong> las pasiones y disminuía el gusto por las diversiones frívolas. Algo semejante<br />

ocurrió con la astronomía, pues ésta permitía la contemplación <strong>de</strong> los cielos, apartando a las mujeres<br />

<strong>de</strong> las tentaciones terre<strong>na</strong>les” (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).<br />

44 Destaque para a Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Berlim, criada em 1700 pela rainha da Prússia Sofía Carlota, e à<br />

Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Ciências <strong>de</strong> São Petersburgo, patroci<strong>na</strong>da pelas imperatrizes Catali<strong>na</strong> I, A<strong>na</strong> e Catali<strong>na</strong>,<br />

a Gran<strong>de</strong>; em ambas se proibiu o acesso <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> até fi<strong>na</strong>is do século XIX (LIRES, ANGÓS e<br />

PAIRÓ, 2003).


53<br />

Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Edimburgo em 1900. Apesar <strong>de</strong> todo <strong>de</strong>staque e reconhecimento<br />

como cientista, ela era extremamente conservadora em relação à sua posição<br />

enquanto mulher, chegando até a <strong>de</strong>scartar qualquer relação com questões volta<strong>das</strong><br />

às causas feministas (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003).<br />

Como mais um exemplo, temos Mary Fairfax Somerville (1780-1872),<br />

consi<strong>de</strong>rada um exemplo <strong>de</strong> "perfeita compatibilida<strong>de</strong> entre o cumprimento exemplar<br />

<strong>das</strong> tarefas mais suaves da vida doméstica e as mais profun<strong>das</strong> investigações em<br />

filosofia matemática" (LIRES, ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.) 45 ; isso pressupõe dois<br />

aspectos: a) a mulher exemplar é necessariamente aquela que, ainda que se<br />

<strong>de</strong>dicasse à pesquisa, não abando<strong>na</strong>ria a vida doméstica; b) a vida doméstica seria<br />

repleta <strong>de</strong> “tarefas mais suaves”.<br />

A Ciência, controlada por poucos e controladora <strong>de</strong> saberes, hierarquizada e<br />

masculinizada, quando permitiu a entrada <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s que se <strong>de</strong>stacavam não foi <strong>de</strong><br />

maneira facilitada, mas por meio <strong>de</strong> imposições sutis: para se manter era necessário<br />

que as <strong>mulheres</strong> se “adaptassem”. E muitas o fizeram. Schiebinger (2001, p. 156)<br />

afirma que “Alg<strong>uma</strong>s <strong>mulheres</strong> não ape<strong>na</strong>s negaram sua feminilida<strong>de</strong> para<br />

trabalharem como cientistas sérias como obscureceram completamente seu sexo”.<br />

Forjar a masculinida<strong>de</strong> foi <strong>uma</strong> prática usada pelas <strong>mulheres</strong> em muitas áreas do<br />

conhecimento durante o século XIX.<br />

Outra exigência da Ciência Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong> era quanto à vida solitária que<br />

<strong>de</strong>veriam levar tanto <strong>mulheres</strong> como homens cientistas: as universida<strong>de</strong>s se<br />

tor<strong>na</strong>riam um espaço no qual era <strong>de</strong>sejável o celibato.<br />

Professores em Oxford e Cambridge, por exemplo, não podiam casar; mais<br />

tar<strong>de</strong>, no século XIX, o celibato ainda era requerido. Não faz muito tempo<br />

havia um historiador da Ciência em Harvard que ofereceu a seguinte receita<br />

para <strong>uma</strong> gran<strong>de</strong> Ciência: seja um gênio, durma pouco e não pratique sexo.<br />

(SCHIEBINGER, 2001, p. 185)<br />

Schiebinger (2001) <strong>de</strong>staca inclusive que até o início do século XX em<br />

alg<strong>uma</strong>s universida<strong>de</strong>s norteamerica<strong>na</strong>s havia a exigência <strong>de</strong> que as <strong>mulheres</strong><br />

<strong>de</strong>veriam permanecer solteiras, para não ferir o caráter quase religioso do <strong>de</strong>dicar-<br />

45 Tradução livre <strong>de</strong>: "la perfecta compatibilidad entre el cumplimiento ejemplar <strong>de</strong> las tareas más<br />

suaves <strong>de</strong> la vida doméstica y las más profun<strong>das</strong> investigaciones en filosofía matemática" (LIRES,<br />

ANGÓS e PAIRÓ, 2003, s.p.).


54<br />

se às Ciências; para os homens, por outro lado, era inclusive preferível que se<br />

casassem para não ameaçar as alu<strong>na</strong>s com algum tipo <strong>de</strong> assédio.<br />

Muitos aspectos importantes surgem <strong>de</strong>sse histórico e o mais instigante diz<br />

respeito à domi<strong>na</strong>ção <strong>de</strong> um saber que se auto<strong>de</strong>nomi<strong>na</strong> universal, mas que no<br />

entanto é unilateral e segregador. Para Lopes (1998, p. 358), “a Ciência, que não é<br />

unívoca, não é só legitimizadora da domi<strong>na</strong>ção, mas é também um recurso para os<br />

que resistem”.<br />

Nesse viés, po<strong>de</strong>mos dizer, assim como Haraway (1995), que o campo<br />

científico esteve interessado em manter domi<strong>na</strong>dos saberes sob um único viés – o<br />

da universalida<strong>de</strong>. O saber científico/tecnológico, portanto, <strong>de</strong>ve ser problematizado,<br />

pois po<strong>de</strong> se tor<strong>na</strong>r <strong>uma</strong> ferramenta <strong>de</strong> opressão, que escon<strong>de</strong>, encobre e exclui<br />

<strong>uma</strong> gran<strong>de</strong> massa <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>dos que, se mantida excluída, <strong>de</strong>ixaria <strong>de</strong> acrescentar<br />

sua multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> olhares, pela qual po<strong>de</strong>ria trazer novas percepções aos<br />

conhecimentos produzidos (LÖWY, 2000).<br />

Para a autora, a opressão po<strong>de</strong> carregar escolhas que, por sua vez,<br />

estariam presentes em duas mãos:<br />

a da assimilação, que po<strong>de</strong> ser exemplificada no caso <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que<br />

“tentam” ser atuantes assim como os “homens <strong>de</strong> Ciências”. Para participar<br />

do campo científico, alg<strong>uma</strong>s <strong>mulheres</strong> escolhem assumir características que<br />

historicamente se atribuem aos homens – as mesmas que permitem a eles<br />

participarem do campo. E para se fazerem passar por “homens”, elas <strong>de</strong>ixam<br />

<strong>de</strong> ser femini<strong>na</strong>s, o que representa <strong>uma</strong> violência, <strong>uma</strong> automutilação com<br />

cicatrizes que lhes acompanharão por toda a vida;<br />

outras po<strong>de</strong>m optar pela “manutenção <strong>na</strong> condição da margi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>”, <strong>de</strong><br />

on<strong>de</strong> é possível ver e posicio<strong>na</strong>r-se como domi<strong>na</strong>do, po<strong>de</strong>ndo esta ser<br />

classificada como <strong>uma</strong> posição privilegiada, ficando alheia <strong>das</strong> <strong>de</strong>cisões,<br />

porém também dos conflitos (LÖWY, 2000).<br />

Por outro lado, ainda há <strong>uma</strong> terceira possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha: aquela em<br />

que não se enten<strong>de</strong> a posição dos domi<strong>na</strong>dos como inferior, mas como <strong>uma</strong> outra<br />

escolha possível. Querer estar domi<strong>na</strong>do não significaria ser inferior e, por a<strong>na</strong>logia,<br />

estar <strong>na</strong> posição dos domi<strong>na</strong>ntes tampouco significaria ser superior – ambos são<br />

diferentes (LÖWY, 2000).


55<br />

Ainda que se tenha, portanto, formas <strong>de</strong> situar-se diante da Ciência e da<br />

Tecnologia como campos <strong>de</strong> atuação predomi<strong>na</strong>ntemente masculinos, po<strong>de</strong>mos<br />

perceber que há possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserção <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, visando a <strong>uma</strong><br />

<strong>de</strong>mocratização <strong>de</strong> acesso, a <strong>uma</strong> maior participação <strong>na</strong> produção e garantia <strong>de</strong><br />

permanência nos campos <strong>das</strong> Ciências e da Tecnologia.<br />

Löwy (2000) acredita que os estudos <strong>de</strong> gênero ao proporem a substituição<br />

<strong>de</strong> um universal que se mostra abstrato por um universal concreto, no qual são<br />

valoriza<strong>das</strong> as singularida<strong>de</strong>s, possibilitam também a outros grupos margi<strong>na</strong>lizados<br />

ter voz e chance <strong>de</strong> expressar seus pontos <strong>de</strong> vista, instituindo a multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

olhares que, ao contrário do que muitos pensariam, ao invés <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprestígio, traria<br />

mais “valor” e qualida<strong>de</strong> aos conhecimentos produzidos.<br />

A autora propõe que seja abando<strong>na</strong>da a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> universalida<strong>de</strong> e que<br />

passemos a concebê-la como algo mais amplo, em que vários pontos <strong>de</strong> vista sejam<br />

consi<strong>de</strong>rados. Ela propõe também e principalmente a opção por práticas e<br />

conhecimentos situados, que reflitam a posição <strong>de</strong> pessoas e necessida<strong>de</strong>s reais,<br />

como <strong>uma</strong> alter<strong>na</strong>tiva ao perigo do totalitarismo e do relativismo. A “Ciência situada”,<br />

para a autora, po<strong>de</strong>ria abrir caminho para que a Ciência passasse a usar outra<br />

<strong>de</strong>finição para objetivida<strong>de</strong> e universalida<strong>de</strong>, incluindo perspectivas outrora<br />

<strong>de</strong>spreza<strong>das</strong>, como a paixão, crítica, contestação, solidarieda<strong>de</strong>, responsabilida<strong>de</strong> –<br />

características do subjetivo que muito po<strong>de</strong>riam acrescentar à Ciência (LÖWY,<br />

2000).<br />

2.2.2 Nesse universo há espaço para elas? Estudos recentes sobre on<strong>de</strong> estão as<br />

<strong>mulheres</strong><br />

O que tratamos até agora é o que Estébanez (2003) chama <strong>de</strong><br />

“a questão da mulher <strong>na</strong> Ciência”, e que refere à sua participação, e sobreapresentação,<br />

<strong>na</strong>s ativida<strong>de</strong>s científicas e tecnológicas, em particular <strong>na</strong><br />

pesquisa, e aos problemas do acesso à carreira profissio<strong>na</strong>l respectiva<br />

(ESTÉBANEZ, 2003, s.p. Grifos da autora.).


56<br />

Interessa-nos <strong>de</strong>sse cenário enten<strong>de</strong>r porque as <strong>mulheres</strong> estão em menor<br />

número e pouco representa<strong>das</strong>. No entanto, tem-se como dificultante “o escasso<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> estatísticas <strong>de</strong> Ciência e tecnologia <strong>de</strong>sagrega<strong>das</strong> por sexo” e<br />

ainda a “inexistência <strong>de</strong> sistemas „harmonizados‟ que permitam comparar a situação<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> entre diversos países” (ESTÉBANEZ, 2003, s.p.), o que se configura<br />

como item fundamental para a análise e diagnósticos apropriados e, conforme<br />

pontua a autora, “para a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> ações que reparem situações <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong><br />

e que evita perda <strong>de</strong> talentos para a Ciência” (ESTÉBANEZ, 2003, s.p.).<br />

Estudiosas como Leta (2003) e Lopes (1998) se preocupam com o fato <strong>de</strong><br />

que nossa literatura sobre o assunto ainda é incipiente e precisa ser sistematizada<br />

<strong>de</strong> modo a contribuir para um campo que muito será necessário para pautar<br />

pesquisas posteriores. Lopes (1998) se questio<strong>na</strong> principalmente sobre o porquê <strong>de</strong><br />

tão pouco interesse da sociologia da Ciência e da Tecnologia pela participação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> e da incipiência da perspectiva feminista nos estudos sobre História da<br />

Ciência no Brasil.<br />

Segundo Estébanez (2003), a Unesco tem se preocupado com essas<br />

questões, participado <strong>de</strong> ações e acio<strong>na</strong>do outras instituições científicas que possam<br />

contribuir com dados significativos, <strong>de</strong>sagregados por sexo e região.<br />

Um dos diagnósticos da autora a respeito da situação da mulher<br />

latinoamerica<strong>na</strong> em C&T é que “a participação femini<strong>na</strong> ten<strong>de</strong> a aumentar nos<br />

âmbitos <strong>de</strong> trabalho públicos e universitários, enquanto que abaixa abruptamente<br />

nos âmbitos privados e empresariais”, e o que se vê é a estratificação vertical<br />

“mostrando que, quanto maior a hierarquia acadêmica ou científica, menor a<br />

participação femini<strong>na</strong> com in<strong>de</strong>pendência do campo discipli<strong>na</strong>r” (ESTÉBANEZ, 2003,<br />

s.p.), ocorrendo isso inclusive em países que <strong>de</strong>monstram aparente equida<strong>de</strong> 46 .<br />

Em relação ao acesso a posições mais altas, Estébanez conclui que elas<br />

são minoria, “inclusive quando as instituições ou os órgãos pertencem a discipli<strong>na</strong>s<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente femini<strong>na</strong>s” (2003, s.p.). Conhecido como fenômeno glass ceiling,<br />

46 Estébanez (2003) faz brevemente <strong>uma</strong> comparação entre os países da América Lati<strong>na</strong>, EUA,<br />

Espanha e Portugal. Nessa comparação vemos que países como Argenti<strong>na</strong>, Paraguai e Uruguai<br />

(números <strong>de</strong> 2001) <strong>de</strong>monstram certo equilíbrio <strong>na</strong> proporção entre homens e <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> função <strong>de</strong><br />

pesquisadores(as), o que para autora po<strong>de</strong>rá ser resultado <strong>de</strong> intervenção <strong>de</strong> fatores que ela chamou<br />

conceituais como, por exemplo, “a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>finições para „pesquisador‟ e, portanto, a<br />

diferente atribuição <strong>de</strong> <strong>de</strong>scritores <strong>de</strong> C&T em cada país” (ESTÉBANEZ, 2003, s.p.).


57<br />

“teto <strong>de</strong> vidro” ou “teto <strong>de</strong> cristal”, afeta reconhecidamente as <strong>mulheres</strong> e se<br />

caracteriza como sendo um fenômeno que as impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> ace<strong>de</strong>r aos postos mais<br />

altos <strong>na</strong>s organizações. Velho e León (1998) explicam a expressão comprovando<br />

com as respostas <strong>das</strong> entrevista<strong>das</strong> nos seus estudos <strong>na</strong> Unicamp:<br />

mesmo as <strong>mulheres</strong> bastante qualifica<strong>das</strong> são bloquea<strong>das</strong> <strong>na</strong> sua ascensão<br />

profissio<strong>na</strong>l por práticas discrimi<strong>na</strong>tórias, conflitos família-trabalho que as<br />

impe<strong>de</strong>m <strong>de</strong> produzir tanto quanto os homens, e por traços <strong>de</strong><br />

comportamento adquiridos durante o processo <strong>de</strong> socialização, que seriam<br />

“<strong>de</strong>sfavoráveis” ao sucesso profissio<strong>na</strong>l, tais como falta <strong>de</strong> agressivida<strong>de</strong>,<br />

<strong>de</strong> ambição, etc. (VELHO e LEÓN, 1998, s.p.).<br />

Rocha prefere o uso da expressão “teto <strong>de</strong> vidro” e justifica:<br />

O fenômeno do “teto <strong>de</strong> vidro” remete à <strong>de</strong>safiadora e interessante<br />

metáfora, <strong>na</strong> medida em que é mais fácil romper um vidro, quando este é<br />

<strong>uma</strong> barreira e ocupar outros espaços, que ir <strong>de</strong> encontro a estruturas<br />

extremamente rígi<strong>das</strong>, como o mármore ou o granito, por exemplo (ROCHA,<br />

2006, p. 88) 47 .<br />

Em relação ao lugar <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Ciência, Estébanez (2003) afirma que<br />

em países como Brasil, Argenti<strong>na</strong>, Venezuela e Uruguai as <strong>mulheres</strong> são maioria no<br />

campo <strong>das</strong> Ciências Sociais e H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s, além <strong>de</strong> apresentarem <strong>uma</strong> participação<br />

igualitária ou “levemente” maior <strong>na</strong> química, <strong>na</strong> biotecnologia e <strong>na</strong>s Ciências da<br />

Saú<strong>de</strong>, e <strong>uma</strong> baixa presença <strong>na</strong>s Ciências “duras” 48 , que inclui a Física, a<br />

Matemática, área <strong>de</strong> computação e as Engenharias.<br />

Po<strong>de</strong>-se constatar um interesse em torno da questão do baixo número <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> em alg<strong>uma</strong>s áreas científicas e tecnológicas iniciado a partir dos anos <strong>de</strong><br />

1960, no âmbito dos estudos da sociologia e da História da Ciência sob o viés<br />

feminista, ou a partir do interesse dos próprios movimentos feministas pela questão.<br />

Tem-se portanto <strong>uma</strong> preocupação por estudar a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> nestas<br />

áreas, basicamente sob duas linhas <strong>de</strong> pesquisas <strong>na</strong> maioria dos países: a relação<br />

mulher e educação superior e o status social da mulher em C&T. Estas linhas<br />

47 Tradução livre <strong>de</strong>: “El fenómeno <strong>de</strong>l „tejado <strong>de</strong> vidrio‟ remite a la <strong>de</strong>safiadora e interesante<br />

metáfora, en la medida en que es más fácil romper un vidrio, cuando este es u<strong>na</strong> barrera y ocupar<br />

otros espacios, que ir <strong>de</strong> encuentro a estructuras extremamente rígi<strong>das</strong>, como él mármol o el granito,<br />

por ejemplo” (ROCHA, 2006, p. 88).<br />

48 Tradução <strong>de</strong> hards, que qualifica as Ciências em oposição às softs, conforme explicaremos adiante<br />

(SCHIEBINGER, 2001).


58<br />

contribuíram para que várias conclusões fossem tira<strong>das</strong>, <strong>de</strong>ntre elas a <strong>de</strong> que as<br />

relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> se reproduzem <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> comunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

produção <strong>de</strong> conhecimento, estando as <strong>mulheres</strong> em <strong>de</strong>svantagem, ainda que em<br />

posições iguais às dos homens.<br />

Alguns estudos inclusive apontam para a exclusão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> “dos ca<strong>na</strong>is<br />

<strong>de</strong> comunicação informal e <strong>de</strong> interação acadêmica 49 ” (TABAK, 2002, p. 59) e um<br />

fenômeno <strong>de</strong> não socialização <strong>das</strong> informações importantes para a comunida<strong>de</strong>,<br />

mantendo a mulher alheia a dados exclusivamente intercambiados entre os homens<br />

(TABAK, 2002).<br />

Como exemplo <strong>de</strong>sta preocupação por problematizar a questão <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> em carreiras científico-tecnológicas, Leta (2003) aponta Alice Rossi como<br />

a primeira interessada 50 . Ainda que seja um exemplo dos EUA, é interessante<br />

ressaltar <strong>uma</strong> problemática ainda vigente; em seu artigo <strong>de</strong> 1965, Rossi atentou para<br />

a questão <strong>na</strong>s déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 50 e 60 especificamente e suas conclusões foram no<br />

seguinte sentido: baixo número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s Engenharias e número pequeno<br />

em alg<strong>uma</strong>s áreas <strong>das</strong> Ciências Naturais <strong>de</strong>vido a aspectos que passam pelo social<br />

e o psicológico:<br />

a priorida<strong>de</strong> do casamento e da maternida<strong>de</strong> diante da escolha profissio<strong>na</strong>l,<br />

a influência dos pais <strong>na</strong> escolha da carreira <strong>de</strong> seus filhos, <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ndo o<br />

que <strong>de</strong>vem ser atitu<strong>de</strong>s e comportamentos “femininos” e “masculinos” e<br />

incompatibilida<strong>de</strong>s ou diferenças <strong>de</strong> cunho biológico e/ou social entre<br />

homens e <strong>mulheres</strong>, tal como <strong>na</strong>s habilida<strong>de</strong>s cognitivas, <strong>na</strong> questão da<br />

in<strong>de</strong>pendência, <strong>de</strong> persistência e do distanciamento do convívio social<br />

(LETA, 2003, p. 272).<br />

Estas conclusões passam por situações semelhantes as que vemos<br />

ocorrendo ainda hoje em muitos países.<br />

Um estudo da Unesco aponta que a participação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s<br />

universida<strong>de</strong>s cresceu <strong>na</strong>s déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 70, 80 e 90 do século passado nos países da<br />

América Lati<strong>na</strong>, da Ásia e da Europa Oci<strong>de</strong>ntal, o que significa maior envolvimento<br />

“no sistema <strong>de</strong> C&T, se consi<strong>de</strong>rarmos essas instituições, as universida<strong>de</strong>s, como<br />

aquelas responsáveis por gran<strong>de</strong> parte da Ciência mundial” (LETA, 2003, p. 273),<br />

49 Sobre o assunto, Tabak cita as pesquisas <strong>de</strong> Reskin (1978), Kirkham e Thompson (1984) e White<br />

(1970).<br />

50 Conforme citamos, o artigo Why so few? foi o primeiro a articular gênero e Ciência.


59<br />

entretanto o mesmo estudo ressalta que em alguns países, como a África, por<br />

exemplo, não houve mudança no quadro.<br />

Evelyn Fox Keller 51 teve importante papel no âmbito inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l por<br />

relacio<strong>na</strong>r a questão <strong>de</strong> gênero com a Ciência, ao escrever em 1978 um <strong>de</strong> seus<br />

primeiros artigos sobre gênero e ciência, que culminou com o livro Reflexões sobre<br />

Gênero e Ciência 52 . Além disso a cientista escreveu também a biografia <strong>de</strong> Barbara<br />

McClintock, famosa geneticista que tardiamente seria laureada com um Prêmio<br />

Nobel.<br />

A respeito da trajetória <strong>de</strong> Barbara McClintock, Lopes (1998) diz que a<br />

geneticista, como to<strong>das</strong> as outras <strong>mulheres</strong> cientistas, não agia diferente do que os<br />

outros membros da comunida<strong>de</strong> científica que acreditavam cegamente que essa é<br />

neutra e objetiva. Citeli (2001), por sua vez, <strong>de</strong>staca a cientista como visionária e<br />

como <strong>uma</strong> mulher que se negou a seguir <strong>uma</strong> carreira tipicamente femini<strong>na</strong> –<br />

atuando como enfermeira ou auxiliar. É óbvio que, ao contrário do que muitos<br />

homens <strong>de</strong> sua geração, seu reconhecimento foi tardio, ren<strong>de</strong>ndo-lhe um Prêmio<br />

Nobel somente em 1983.<br />

Lopes (1998) i<strong>de</strong>ntifica, além <strong>de</strong> Keller, Helen Longino como outra teórica<br />

<strong>de</strong>fensora da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aplicação da diversida<strong>de</strong> à Ciência. Helen Longino<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ria a aceitação <strong>de</strong> múltiplos olhares: “diferentes mo<strong>de</strong>los gerados a partir <strong>de</strong><br />

diferentes posições <strong>de</strong> sujeitos que possam se articular” (LOPES, 1998, p. 356).<br />

Não é preciso ir muito longe para se questio<strong>na</strong>r sobre on<strong>de</strong> estão as<br />

<strong>mulheres</strong>. Ao observarmos a história <strong>das</strong> Aca<strong>de</strong>mias <strong>de</strong> Ciências e mesmo do<br />

Prêmio Nobel vemos <strong>uma</strong> ausência injustificada, já que elas sempre estiveram<br />

conduzindo pesquisas em condições semelhantes aos homens, ainda que em<br />

número pequeno.<br />

Tabak (2002) diz que o <strong>de</strong>bate sobre a participação femini<strong>na</strong> em carreiras<br />

científico-tecnológicas foi se intensificando a partir da década <strong>de</strong> 70 e teve seu ápice<br />

51 Nascida em 1936 nos Estados Unidos, é professora do Departamento <strong>de</strong> História e Filosofia da<br />

Ciência do Massachussets Institute of Technology. Em suas pesquisas Evelyn Fox Keller buscou o<br />

que ela chamou <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ciência melhor: “Em particular, procurei compreen<strong>de</strong>r a gênese da divisão<br />

sexual e emocio<strong>na</strong>l do trabalho, tão conspicuamente domi<strong>na</strong>nte em minha própria geração, que<br />

rotulava mente, razão e objetivida<strong>de</strong> como „masculi<strong>na</strong>s‟, e coração (e corpo), sentimento e<br />

subjetivida<strong>de</strong> como „femininos‟ e que, portanto, estão subjacentes à exclusão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> do<br />

empreendimento científico” (KELLER, 2006, p. 15).<br />

52 O título origi<strong>na</strong>l é Reflections on Gen<strong>de</strong>r and Science, pela Yale Station New Haven, CT, em 1985.


60<br />

<strong>na</strong> IV Conferência Mundial sobre a Mulher em Beijing no ano <strong>de</strong> 1995. As déca<strong>das</strong><br />

que se seguiram, graças a lutas mais empenha<strong>das</strong>, principalmente dos movimentos<br />

feministas, e graças à inserção <strong>de</strong> mais <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> um<br />

interesse por promover <strong>de</strong>bates e fomentar investigações a este respeito, foram <strong>de</strong><br />

extrema importância para as causas <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, especialmente no combate à<br />

extinção <strong>de</strong> todo e qualquer estereótipo sexual <strong>na</strong> educação que contribuiu durante<br />

muito tempo por reproduzir as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s, como forma <strong>de</strong> manter os papéis<br />

estabelecidos/perpetuados.<br />

Uma <strong>das</strong> questões que norteou os estudos e discussões nos inúmeros<br />

encontros e reuniões que ocorreram nos últimos 30 anos foi por que tão poucas<br />

<strong>mulheres</strong> se interessam por seguir carreira em C&T. Os organismos se <strong>de</strong>ram conta<br />

<strong>de</strong> que alcançar a equida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gênero seria um fator <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento socioeconômico do país (CEPAL, 1991 apud TABAK, 2002).<br />

Os avanços que tivemos quanto ao acesso a todos os níveis <strong>de</strong> educação<br />

não são percebidos quando se trata da escolha <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> C&T por parte <strong>das</strong><br />

jovens – as <strong>mulheres</strong> ainda predomi<strong>na</strong>m <strong>na</strong>s carreiras ditas “femini<strong>na</strong>s”, como por<br />

exemplo <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e educação, <strong>na</strong>s quais todavia não se po<strong>de</strong> dizer que<br />

as <strong>mulheres</strong> têm po<strong>de</strong>r, já que elas <strong>na</strong> maioria <strong>das</strong> vezes, graças ao fenômeno “teto<br />

<strong>de</strong> vidro”, permanecem <strong>na</strong> execução <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s e ape<strong>na</strong>s um pequeno número<br />

nos postos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão.<br />

Já <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1990, período posterior a um momento em que se<br />

acreditava que o gênero influenciava no conteúdo da Ciência (década <strong>de</strong> 80), outra<br />

questão permeou os estudos sobre o fazer científico pelas <strong>mulheres</strong>: as <strong>mulheres</strong><br />

fazem Ciência <strong>de</strong> modo diferente?<br />

Na verda<strong>de</strong> o que havia era um receio da parte dos que compunham o<br />

campo científico <strong>de</strong> que o gênero do pesquisador influenciasse negativamente no<br />

fazer científico e <strong>de</strong>pusesse contra as características tão preza<strong>das</strong> pelos cientistas<br />

homens da Ciência. Em relação a isso, po<strong>de</strong>-se dizer que houve um movimento no<br />

sentido <strong>de</strong> fazer a comunida<strong>de</strong> científica enten<strong>de</strong>r que existem métodos alter<strong>na</strong>tivos<br />

<strong>de</strong> conduzir pesquisa. O principal é que se incorpore “<strong>uma</strong> consciência crítica <strong>de</strong><br />

gênero <strong>na</strong> formação básica <strong>de</strong> jovens cientistas e no mundo rotineiro da Ciência”<br />

(SCHIEBINGER, 2001, p. 31) para evitar o que vinha ocorrendo até então – o<br />

domínio masculino do campo, sem sequer consi<strong>de</strong>ração à perspectiva do gênero


61<br />

como forma <strong>de</strong> possibilitar a atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em to<strong>das</strong> as áreas do<br />

conhecimento.<br />

Em relação à Ciência no Brasil, Leta <strong>de</strong>staca dois momentos significativos:<br />

fi<strong>na</strong>l dos anos sessenta, com a edição do Plano Estratégico <strong>de</strong> Desenvolvimento<br />

Nacio<strong>na</strong>l, “a questão científica e tecnológica surgiu como presença constante no<br />

planejamento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l” e só nos anos oitenta e noventa “as <strong>mulheres</strong> brasileiras<br />

aumentaram sua participação no setor” (LETA, 2003, p. 274). Seu <strong>de</strong>staque vai para<br />

o fato <strong>de</strong> que as <strong>mulheres</strong> são hoje “a maioria em boa parte dos cursos <strong>de</strong><br />

graduação e <strong>de</strong> pós-graduação do país” (LETA, 2003, p. 274) e seu otimismo<br />

aparece ao citar que em 2001, 56,3% do total <strong>de</strong> matrículas no ensino superior dizia<br />

respeito ao número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> ingressantes e que 62,4% representavam o total<br />

<strong>das</strong> que chegavam a concluir o ensino universitário (INEP, 2003 apud LETA, 2003),<br />

números atestados por Ristoff com resultados mais recentes (2008).<br />

É interessante atentar que em 1990 elas representavam a maioria nos<br />

cursos <strong>de</strong> Química, Medici<strong>na</strong>, Odontologia e Biologia – áreas em que a participação<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> tem se aplicado <strong>de</strong>vido à suposta relação <strong>de</strong>stas áreas a<br />

características consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> “femini<strong>na</strong>s”. As áreas <strong>de</strong> Medici<strong>na</strong> e Odontologia, por<br />

exemplo, são historicamente relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> ao cuidado, assim como o Magistério, por<br />

isso <strong>uma</strong> aceitação <strong>na</strong>tural <strong>de</strong> atuação femini<strong>na</strong> nestas ativida<strong>de</strong>s.<br />

Leta (2003) <strong>de</strong>monstra também que houve um aumento <strong>de</strong> contratações <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s instituições <strong>de</strong> nível superior, exemplificando com o caso da USP, <strong>uma</strong><br />

<strong>das</strong> maiores do país. Entretanto, a autora diz que as mudanças e a inserção real da<br />

mulher no mercado <strong>de</strong> trabalho, especialmente nos setores <strong>de</strong> Ciência e Tecnologia,<br />

ainda não aconteceram <strong>de</strong> fato em nosso país: as <strong>mulheres</strong> representavam, em<br />

2003, 34% do total dos docentes ativos da USP.<br />

Vale lembrar que no início do século XX, especialmente após a Segunda<br />

Guerra Mundial, foram criados no Brasil centros <strong>de</strong> investigação e institutos<br />

especializados em pesquisa, além <strong>de</strong> ter havido <strong>uma</strong> expansão <strong>de</strong> empresas<br />

estatais que se <strong>de</strong>dicaram à pesquisa e da reforma universitária que, ao expandir<br />

vagas e carreiras, favoreceu a entrada em <strong>de</strong>finitivo <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s<br />

(TABAK, 2002).<br />

Por outro lado o que vemos é que a relação, ainda <strong>de</strong>pois da entrada <strong>de</strong>las,<br />

não é equitativa, configurando o fenômeno “teto <strong>de</strong> vidro”:


62<br />

Nos cargos hierárquicos mais elevados <strong>das</strong> instituições <strong>de</strong> ensino superior e<br />

nos centros <strong>de</strong> pesquisa, predomi<strong>na</strong>m <strong>de</strong> maneira absoluta os homens – as<br />

<strong>mulheres</strong> se concentram <strong>na</strong>s posições mais baixas, são poucas aquelas<br />

que conseguem chegar ao topo (TABAK, 2002, p. 12).<br />

Isso significa que aqueles que ocupam a posição <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque constituem<br />

um grupo privilegiado, pois participam efetivamente <strong>na</strong>s toma<strong>das</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />

(TABAK, 2002).<br />

A partir do aqui exposto, enten<strong>de</strong>-se que muito ainda há a ser conquistado,<br />

pois, “Apesar do crescimento da participação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> C&T, as<br />

chances <strong>de</strong> sucesso e reconhecimento <strong>na</strong> carreira ainda são reduzi<strong>das</strong>” (LETA,<br />

2003, p. 277).<br />

Schiebinger (2001) se preocupa com as mudanças que <strong>de</strong>verão acontecer<br />

em toda a cultura <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da socieda<strong>de</strong> para que as <strong>mulheres</strong> possam se tor<strong>na</strong>r<br />

iguais <strong>na</strong> Ciência e, acrescentamos, <strong>na</strong>s áreas tecnológicas, o que implica em dizer<br />

que não bastaria sua entrada, mas <strong>uma</strong> alteração dos campos historicamente<br />

construídos sobre bases androcêntricas.<br />

Além disso a autora cita a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conscientização <strong>das</strong> próprias<br />

<strong>mulheres</strong> a respeito <strong>das</strong> questões <strong>de</strong> gênero, não sendo suficiente portanto o<br />

aumento numérico, mas a maior consciência pela maioria <strong>das</strong> questões pertinentes<br />

à sua entrada, permanência, exclusão, enfim, to<strong>das</strong> as nuances que permeiam as<br />

relações entre os gêneros.<br />

Ainda que não seja unânime a perspectiva <strong>de</strong> que elas têm capacida<strong>de</strong> para<br />

atuar no campo científico, o objetivo é que tenhamos “<strong>mulheres</strong> ingressando e<br />

começando a se sentir à vonta<strong>de</strong> <strong>na</strong>s Ciências” (DRESSELHAUS apud<br />

SCHIEBINGER, 2001, p. 34), justamente para <strong>de</strong>smistificar conceitos que estão<br />

cristalizados entre cientistas <strong>de</strong> ambos os sexos 53 , <strong>de</strong> que alg<strong>uma</strong>s áreas do<br />

conhecimento seriam <strong>de</strong> domínio masculino.<br />

53 Para comprovar que alguns conceitos não são exclusivos do sexo masculino, Schiebinger cita <strong>uma</strong><br />

pesquisa feita com 699 cientistas bastante consi<strong>de</strong>rados (<strong>de</strong> ambos os sexos) em que mais da<br />

meta<strong>de</strong> dizem que sim, as <strong>mulheres</strong> fazem Ciência <strong>de</strong> maneira diferente. E ainda: mais <strong>mulheres</strong><br />

respon<strong>de</strong>ram que o gênero <strong>de</strong>sempenhava um papel em seu trabalho como cientistas, e mais<br />

homens <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que a Ciência é e <strong>de</strong>ve permanecer sendo <strong>de</strong> gênero neutro. Outras pesquisas<br />

apontam para as escolhas dos objetos <strong>de</strong> estudo (<strong>mulheres</strong> estudam mais mamíferos, principalmente<br />

primatas, especificando o sexo dos objetos pesquisados, e os homens estudam mais os peixes,<br />

anfíbios e insetos). Há inclusive <strong>uma</strong> tendência ao <strong>de</strong>mérito do trabalho <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>; se têm<br />

sucesso, geralmente será em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> suas habilida<strong>de</strong>s e facilida<strong>de</strong>s biológicas (são mais


63<br />

Para contribuir no sentido <strong>de</strong> aumentar o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> trabalhando<br />

em Ciência, Schiebinger aponta que, aparentemente, são promissores os estudos<br />

<strong>de</strong> gênero <strong>na</strong> Ciência, pois, <strong>na</strong> medida em que ocorra a inserção, rompe-se com um<br />

paradigma cultural. É a chamada “teoria da massa crítica”:<br />

Peque<strong>na</strong>s minorias ten<strong>de</strong>m a conformar-se a culturas domi<strong>na</strong>ntes [...] mas a<br />

presença <strong>de</strong> um número ligeiramente maior <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> po<strong>de</strong> criar <strong>uma</strong><br />

oportunida<strong>de</strong> para remo<strong>de</strong>lar as relações <strong>de</strong> gênero <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>uma</strong> sala <strong>de</strong><br />

aula, laboratório, <strong>de</strong>partamento ou discipli<strong>na</strong> (DRESSELHAUS apud<br />

SCHIEBINGER, 2001, p. 34).<br />

As <strong>mulheres</strong> entrando nos “redutos” culturalmente masculinos é <strong>uma</strong><br />

preocupação <strong>de</strong> to<strong>das</strong> as áreas do conhecimento, <strong>de</strong>ixando inclusive <strong>de</strong> ser <strong>uma</strong><br />

luta ape<strong>na</strong>s <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, já que muitos homens uniram-se a pesquisas e lutas em<br />

favor <strong>de</strong> <strong>uma</strong> equida<strong>de</strong> entre os gêneros. Por ser política ela <strong>de</strong>ve ser <strong>uma</strong> luta da<br />

socieda<strong>de</strong>.<br />

Assim como Schiebinger (2001), Tabak fala da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ampliação<br />

da massa crítica 54 como ponto fundamental <strong>na</strong> questão da formação <strong>de</strong> recursos<br />

h<strong>uma</strong>nos para promover o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um país, que se vincula à função<br />

social da Ciência (e, neste caso, agregamos a Tecnologia), que “necessita <strong>de</strong><br />

estruturas e <strong>de</strong> <strong>uma</strong> organização que lhe sejam próprias. [...] A Ciência é parte<br />

integrante do movimento da socieda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sua história” (METZGER, 1974 apud<br />

TABAK, 2002, p. 25) – po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve impulsio<strong>na</strong>r o progresso social, pensando em<br />

aten<strong>de</strong>r realida<strong>de</strong>s específicas e necessida<strong>de</strong>s que possam assegurar o progresso<br />

social.<br />

É necessário que se tenha claro que a mudança não é algo fácil ou rápido,<br />

Porque a Ciência mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong> é um produto <strong>de</strong> cente<strong>na</strong>s <strong>de</strong> anos <strong>de</strong> exclusão<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, o processo <strong>de</strong> trazer <strong>mulheres</strong> para a Ciência exigiu, e vai<br />

continuar a exigir, profun<strong>das</strong> mudanças estruturais <strong>na</strong> [e da] cultura,<br />

métodos e conteúdo da Ciência. Não se <strong>de</strong>ve esperar que as <strong>mulheres</strong><br />

alegremente tenham êxito num empreendimento que em suas origens foi<br />

estruturado para excluí-las (SCHIEBINGER, 2001, p. 37).<br />

empáticas, por exemplo), e não em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>dicação e pesquisa. Schiebinger vai dizer que outros<br />

estudos como este “ten<strong>de</strong>m a mapear a perspectiva política sobre o sexo, simplificando<br />

excessivamente o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocratizar a Ciência, fazendo <strong>das</strong> „<strong>mulheres</strong>‟ os únicos agentes<br />

<strong>de</strong>ssa mudança” (SCHIEBINGER, 2001, p. 36).<br />

54 Fanny Tabak explica massa crítica: “<strong>uma</strong> única mulher é simbólica, sem efeito real. Só se consegue<br />

um efeito real com um conjunto <strong>de</strong> presenças femini<strong>na</strong>s” (TABAK, 2002, p. 37).


64<br />

Nesse sentido, o esforço para tentar minimizar a baixa participação femini<strong>na</strong><br />

em C&T tenta trazer à discussão que, “Embora não exista discrimi<strong>na</strong>ção formal ao<br />

acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à comunida<strong>de</strong> científica” (TABAK, 2002, p. 29) ela segue<br />

acontecendo, já que vemos as <strong>mulheres</strong> seguindo carreiras tradicio<strong>na</strong>lmente<br />

“femini<strong>na</strong>s” e <strong>uma</strong> baixa participação <strong>na</strong> produção <strong>de</strong> C&T.<br />

Tabak atenta para o fato <strong>de</strong> que em países como Bolívia, Chile e Colômbia<br />

os números relativos à participação femini<strong>na</strong> são muito parecidos e ilustram a<br />

dificulda<strong>de</strong> que muitas <strong>mulheres</strong> encontram para ingressar e/ou se manter ativas.<br />

Mulheres que participaram <strong>de</strong> <strong>uma</strong> mesa redonda promovida pela Unesco e<br />

a Fe<strong>de</strong>ração Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Mulheres Universitárias em Lisboa, 1985, i<strong>de</strong>ntificaram<br />

duas causas que dificultam <strong>uma</strong> maior participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em C&T:<br />

institucio<strong>na</strong>l – as instituições não favorecem a mulher, e psicológica – as próprias<br />

<strong>mulheres</strong> não se sentem capazes <strong>de</strong> avançar profissio<strong>na</strong>lmente (TABAK, 2002).<br />

Elas elencaram no mesmo evento diversos pontos para melhoria e <strong>de</strong>ntre<br />

eles um chama atenção, relativo ao fato <strong>de</strong> poucas <strong>mulheres</strong> li<strong>de</strong>rarem:<br />

Romper essa teoria da li<strong>de</strong>rança femini<strong>na</strong> seria algo tão <strong>de</strong>sejável,<br />

conforme os resultados, quanto a adoção <strong>de</strong> estratégias capazes <strong>de</strong> lhe dar<br />

sequência, como, por exemplo, a adoção <strong>de</strong> “patroci<strong>na</strong>dores”, <strong>uma</strong> ação<br />

<strong>das</strong> colegas <strong>mulheres</strong>, a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> apoio (TABAK, 2002, p. 40).<br />

Isso significa que <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>uma</strong> massa, ou ao estabelecer o que Tabak<br />

chama re<strong>de</strong> <strong>de</strong> apoio, elas teriam condições <strong>de</strong> serem representa<strong>das</strong>, criando meios<br />

para isso.<br />

Stolte-Heiskanen (1988 apud TABAK, 2002, p. 53) apontou em <strong>uma</strong> <strong>de</strong> suas<br />

pesquisas que “a mulher, em todos os países, está sub-representada <strong>na</strong>s posições<br />

<strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões, sendo portanto peque<strong>na</strong> a sua influência <strong>na</strong>s esferas social,<br />

econômica, política, cultural e intelectual”, não sendo diferente no campo científicotecnológico.<br />

Preocupar-se com a situação da mulher em C&T é preocupar-se<br />

diretamente com o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, já que elas representam parcela<br />

significativa <strong>de</strong> recursos h<strong>uma</strong>nos. Além disso


65<br />

as <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s <strong>na</strong> representação do sexo <strong>de</strong>ntro da ativida<strong>de</strong> científica<br />

constituem <strong>uma</strong> negação dos direitos h<strong>uma</strong>nos. A <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso<br />

a ativida<strong>de</strong>s intelectuais, tais como a carreira científica, implica também um<br />

acesso <strong>de</strong>sigual a posições <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r (STOLTE-HEISKANEN, 1998 apud<br />

TABAK, 2002, p. 54).<br />

Segundo a mesma autora as <strong>mulheres</strong> tiveram sim mais acesso ao nível<br />

superior <strong>de</strong> ensino, porém menos incentivos e possibilida<strong>de</strong>s para seguir carreiras<br />

científicas, o que as relega a permanecerem sub-representa<strong>das</strong>:<br />

a domi<strong>na</strong>ção masculi<strong>na</strong> <strong>na</strong> Ciência acarreta consequências não ape<strong>na</strong>s<br />

epistemológicas, tais como distorções <strong>na</strong>s afirmações do conhecimento<br />

científico em geral, mas também resulta em lacu<strong>na</strong>s substanciais no nosso<br />

conhecimento. A invisibilida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Ciência, em muitas<br />

discipli<strong>na</strong>s conduz à ausência dos interesses <strong>de</strong> pesquisas e, portanto, <strong>de</strong><br />

informação, em muitas áreas problemáticas, que afetam a vida <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> (STOLTE-HEISKANEN, 1998 apud TABAK, 2002, p. 54).<br />

Enten<strong>de</strong>-se que o avanço nos números relativos ao ensino superior<br />

possibilita <strong>uma</strong> extensão aos níveis <strong>de</strong> atuação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Ciência, elevando<br />

numérica e qualitativamente.<br />

Ainda assim, <strong>de</strong>stacamos que, aceitar a baixa participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em<br />

alg<strong>uma</strong>s áreas da Ciência e da Tecnologia é também restringir o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />

sobre questões que lhes dizem respeito, e isso é problemático já que se sabe que as<br />

<strong>mulheres</strong> representam parte significativa dos que são afetados pelas <strong>de</strong>scobertas<br />

científicas. Além disso, restringi-las a alguns campos do conhecimento acaba por<br />

contribuir para a segregação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em áreas específicas – situação a que<br />

chamamos divisão sexual do trabalho. Cabe a nós a<strong>de</strong>ntrarmos nessa problemática<br />

para <strong>na</strong> sequência visualizar como a educação po<strong>de</strong> contribuir para possibilitar<br />

mudanças.


66<br />

3 TRABALHO, EDUCAÇÃO E EMANCIPAÇÃO<br />

“Quando escrevemos a história do trabalho feminino como a história<br />

da construção discursiva <strong>de</strong> <strong>uma</strong> divisão sexual do trabalho, isso<br />

serve não para legitimar ou tor<strong>na</strong>r <strong>na</strong>tural o que se passou, mas para<br />

o questio<strong>na</strong>r. Po<strong>de</strong>mos abrir a história a explicações e interpretações<br />

múltiplas, perguntar o que podia ter acontecido <strong>de</strong> diferente, e<br />

colocarmo-nos n<strong>uma</strong> posição em que seja possível repensar como<br />

po<strong>de</strong> ser hoje concebido e organizado o trabalho feminino <strong>de</strong> modo<br />

diferente” (SCOTT, 1994, p. 474).<br />

3.1 DIVISÃO SEXUAL DO TRABALHO<br />

Na nossa cultura contemporânea, as <strong>mulheres</strong> entraram no mundo do<br />

trabalho para aten<strong>de</strong>r necessida<strong>de</strong>s sociais, históricas e econômicas, assumindo<br />

ativida<strong>de</strong>s que se julgavam possíveis serem por elas <strong>de</strong>sempenhados.<br />

Uma divisão social do trabalho era consi<strong>de</strong>rada <strong>na</strong>tural e necessária para a<br />

estruturação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> economia e <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> trabalho e <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Em<br />

<strong>de</strong>corrência da distribuição <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s, surge além da divisão entre trabalho<br />

manual e intelectual, outras formas <strong>de</strong> divisão, <strong>de</strong>ntre as quais a sexual.<br />

A divisão social do trabalho – processo pelo qual as ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção<br />

e reprodução social são diferencia<strong>das</strong>, especializa<strong>das</strong> e <strong>de</strong>sempenha<strong>das</strong><br />

por diferentes pessoas – po<strong>de</strong> ocorrer através da separação <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> produção <strong>de</strong> bens e serviços <strong>de</strong> acordo com o sexo <strong>das</strong> pessoas que as<br />

realizam – divisão sexual do trabalho (SILVA, s.d., s.p.).<br />

Scott (1994, p. 448) faz questão <strong>de</strong> frisar que tanto <strong>na</strong> Europa quanto <strong>na</strong><br />

América a mulher sempre trabalhou em ativida<strong>de</strong>s como costura, ourivesaria,<br />

cervejaria, polimento <strong>de</strong> metais, fabricação <strong>de</strong> botões ou ren<strong>das</strong>, além <strong>de</strong> outras<br />

liga<strong>das</strong> ao cuidado como ama, criada <strong>de</strong> lavoura ou criada doméstica. Além disso a<br />

autora <strong>de</strong>staca que “a força <strong>de</strong> trabalho femini<strong>na</strong> era predomi<strong>na</strong>ntemente jovem e<br />

solteira”, empregada em áreas “tradicio<strong>na</strong>is” da economia, como peque<strong>na</strong>s<br />

manufaturas, comércio e serviços. Entretanto foi só com a Revolução Industrial que<br />

surge a figura da mulher trabalhadora. Ela afirma que todo discurso sobre trabalho


67<br />

formal até então excluiu as <strong>mulheres</strong>, por ser aquele associado à remuneração –<br />

elas sempre trabalharam mas quase nunca percebiam remuneração.<br />

Vale citar comentário <strong>de</strong> 1860 do político francês Jules Simon: “<strong>uma</strong> mulher<br />

que se tor<strong>na</strong> trabalhadora <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser mulher” (apud SCOTT, 1994, p. 444). Esta<br />

era a percepção <strong>de</strong> praticamente toda a socieda<strong>de</strong> europeia oci<strong>de</strong>ntal: baseados <strong>na</strong><br />

oposição público/privado, trabalho/lar, salário/maternida<strong>de</strong>,<br />

produtivida<strong>de</strong>/feminilida<strong>de</strong>, a socieda<strong>de</strong> lutou por mantê-las longe dos espaços<br />

profissio<strong>na</strong>is.<br />

O problema se apresentou justamente porque no período a que se po<strong>de</strong><br />

chamar pré-industrial as <strong>mulheres</strong> combi<strong>na</strong>vam a ativida<strong>de</strong> produtiva ao cuidado no<br />

lar (incluindo a criação dos filhos) no espaço doméstico. Importante ressaltar que<br />

Scott (1994) inclusive cita casos <strong>de</strong> trabalhadoras que não tiveram dificulda<strong>de</strong>s em<br />

trabalhar no espaço público.<br />

A divisão entre trabalho e lar não era muito nítida, justamente porque muitas<br />

atuavam em seus próprios lares. Isso ocasionou a “diminuição <strong>das</strong> oportunida<strong>de</strong>s<br />

aceitáveis <strong>de</strong> <strong>uma</strong> mulher trabalhar por um salário” (SCOTT, 1994, p. 450). A partir<br />

do momento que se propôs a mudança do local <strong>de</strong> trabalho, a resistência emergiu.<br />

Desse período vemos levantado o problema em torno da situação da mulher<br />

no mercado <strong>de</strong> trabalho formal; Scott cita que as <strong>mulheres</strong> não seriam profissio<strong>na</strong>is<br />

i<strong>de</strong>ais, já que após casarem e ter filhos elas necessariamente abando<strong>na</strong>riam os<br />

empregos, exceto em casos em que os homens não conseguissem sustentar suas<br />

famílias – daqui surge a perspectiva <strong>de</strong> salários menores. Estabelece-se o que a<br />

autora chama <strong>de</strong> o “problema” da mulher trabalhadora, acentuado pelas constantes<br />

afirmações <strong>de</strong> que to<strong>das</strong> as <strong>mulheres</strong> eram iguais, com as mesmas perspectivas<br />

(casar, ter filhos, <strong>de</strong>dicação integral ao lar), “acentuando as diferenças entre homens<br />

e <strong>mulheres</strong>” (SCOTT, 1994, p. 444).<br />

De acordo com os exemplos apresentados por Scott (1994, p. 451), o fato <strong>de</strong><br />

trabalhar em casa ou não nem era percebido como um problema pelas <strong>mulheres</strong><br />

trabalhadoras, mas sim “os salários tão incrivelmente baixos”.


68<br />

Em relação às profissões que ela <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong> “empregos <strong>de</strong> colarinho<br />

branco 55 ”, Scott (1994) diz que, embora diferentes dos habituais – serviços<br />

domésticos e <strong>de</strong> costura – eram ocupados praticamente pelo mesmo público:<br />

raparigas jovens e solteiras. Repartições públicas, empresas e companhias<br />

<strong>de</strong> seguros contratavam secretárias, dactilógrafas e escriturárias; os<br />

correios preferiam <strong>mulheres</strong> para a venda <strong>de</strong> selos, as companhias <strong>de</strong><br />

telefones e telégrafos empregavam operadoras femini<strong>na</strong>s, lojas e armazéns<br />

recrutavam ven<strong>de</strong>doras, hospitais organizados <strong>de</strong> novo contratavam<br />

equipas <strong>de</strong> enfermeiras e os sistemas escolares públicos procuravam<br />

professoras. Os empregadores especificavam normalmente <strong>uma</strong> ida<strong>de</strong><br />

limite para as suas trabalhadoras, e por vezes impunham a exclusão em<br />

caso <strong>de</strong> casamento, mantendo assim <strong>uma</strong> força <strong>de</strong> trabalho bastante<br />

homogênea, abaixo dos 25 anos e solteira (SCOTT, 1994, p. 451-452.<br />

Grifos nossos.).<br />

Destacamos da fala da autora dois itens <strong>de</strong> especial relevância: a procura<br />

por <strong>mulheres</strong> para atuarem como professoras no século XIX representa algo<br />

importante no contexto da feminização da função docente <strong>de</strong> que trataremos ainda<br />

neste capítulo; além disso, não era qualquer mulher que estaria apta à ativida<strong>de</strong> –<br />

exigia-se que fosse jovem e solteira.<br />

O aumento no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> atuando em empregos <strong>de</strong> “colarinho<br />

branco” foi generalizado em vários países. Nos Estados Unidos, por exemplo, “em<br />

1920 quase 40% <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> trabalhadoras eram professoras, caixeiras ou<br />

emprega<strong>das</strong> <strong>de</strong> escritório” (SCOTT, 1994, p. 452), gerando <strong>uma</strong> associação:<br />

<strong>mulheres</strong>/setor <strong>de</strong> serviços, longe do setor produtivo. Além disso, a mão-<strong>de</strong>-obra<br />

femini<strong>na</strong> era consi<strong>de</strong>rada barata, no entanto nem todo trabalho barato era<br />

consi<strong>de</strong>rado apropriado para elas:<br />

Se eram consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> aptas para trabalhar nos têxteis, <strong>na</strong> confecção, no<br />

calçado, no tabaco, <strong>na</strong> alimentação e <strong>na</strong> marroqui<strong>na</strong>ria, raramente eram<br />

encontra<strong>das</strong> <strong>na</strong>s mi<strong>na</strong>s, <strong>na</strong> construção civil, <strong>na</strong> construção mecânica ou<br />

<strong>na</strong>val, mesmo quando havia necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra consi<strong>de</strong>rada “não<br />

qualificada” (SCOTT, 1994, p. 453).<br />

Scott afirma a partir <strong>de</strong>ssas constatações que o sexo era consi<strong>de</strong>rado fator<br />

principal <strong>na</strong> hora <strong>de</strong> divisão <strong>das</strong> funções. Ela acrescenta que<br />

55 Nessa categoria se encaixariam ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvi<strong>das</strong> em escritórios, como secretária e<br />

datilógrafa, por exemplo (SCOTT, 1994).


69<br />

O trabalho para que eram contrata<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> era <strong>de</strong>finido como “trabalho<br />

<strong>de</strong> mulher”, a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong> algum modo às suas capacida<strong>de</strong>s físicas e aos<br />

seus níveis i<strong>na</strong>tos <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong>. Este discurso produziu <strong>uma</strong> divisão<br />

sexual no mercado <strong>de</strong> trabalho, concentrando as <strong>mulheres</strong> em alguns<br />

empregos e não em outros, colocando-as sempre <strong>na</strong> base <strong>de</strong> qualquer<br />

hierarquia ocupacio<strong>na</strong>l e estabelecendo os seus salários abaixo do nível<br />

básico <strong>de</strong> subsistência (SCOTT, 1994, p. 453-454).<br />

Estabelece-se portanto, segundo Hirata e Kergoat (2007, p. 599), a divisão<br />

sexual do trabalho como “a forma <strong>de</strong> divisão do trabalho social <strong>de</strong>corrente <strong>das</strong><br />

relações sociais entre os sexos”.<br />

A divisão sexual do trabalho atribui, <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>sigual, ativida<strong>de</strong>s entre<br />

homens e <strong>mulheres</strong> no âmbito da produção e da reprodução. A legitimação<br />

<strong>de</strong>sse processo passa pela construção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s sociais masculi<strong>na</strong>s e<br />

femini<strong>na</strong>s em consonância com o que se espera <strong>de</strong> cada um dos sexos no<br />

contexto em que se inserem (SILVA, 2005, p. 8).<br />

Nesta perspectiva, a primeira separação ocorreu entre a esfera produtiva,<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da prioritariamente aos homens, e a esfera reprodutiva reservada às<br />

<strong>mulheres</strong>. Vemos novamente <strong>uma</strong> perspectiva <strong>de</strong>terminista evi<strong>de</strong>nte: <strong>de</strong> acordo com<br />

a biologia, ou seja, com o sexo da pessoa, ela estaria apta a atuar n<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong><br />

ou noutra.<br />

Baseando-se portanto <strong>na</strong>s diferenças biológicas entre homens e <strong>mulheres</strong>,<br />

Scott (1994, p. 445-446) diz que se legitima e institucio<strong>na</strong>liza as diferenças como<br />

base para a organização social, estando o “gênero como <strong>uma</strong> divisão sexual do<br />

trabalho „<strong>na</strong>tural‟”. E a autora ainda explica que <strong>na</strong> lógica do capitalismo industrial, “A<br />

divisão do trabalho era tida como o modo mais eficiente, racio<strong>na</strong>l e produtivo <strong>de</strong><br />

organização do trabalho, dos negócios e da vida social; a linha divisória entre o útil e<br />

o „<strong>na</strong>tural‟ esbatia-se quando o „gênero‟ era o objeto <strong>de</strong> análise”, ou seja, se antes a<br />

utilida<strong>de</strong> da separação dava conta <strong>de</strong> sustentar a lógica <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento dos<br />

processos produtivos – agora a diferença <strong>de</strong> gênero assumia o papel <strong>de</strong> legitimador<br />

da separação.<br />

Para Scott (1994) a divisão sexual do trabalho é fruto dos efeitos dos<br />

discursos, em especial da economia política, que durante todo o século XIX frisou<br />

certas posições ti<strong>das</strong> como axiomas, inclusive entre aqueles e aquelas que <strong>de</strong><br />

alg<strong>uma</strong> maneira buscavam mudanças. Dentre as posições advin<strong>das</strong> da economia<br />

política, temos:


70<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

o salário do marido <strong>de</strong>veria sustentar a família;<br />

o salário da mulher era insuficiente, mesmo para sustentar-se a si própria;<br />

nem o trabalho doméstico nem o remunerado da mãe eram visíveis, ou como<br />

prefere dizer a autora, “relevantes”;<br />

o trabalho <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> não produziria o que ela chamou “valor econômico”<br />

significativo.<br />

Além <strong>de</strong> receberem salários menores que os dos homens, outras eram as<br />

razões porque alguns preferiam empregar <strong>mulheres</strong> – quase sempre basea<strong>das</strong> no<br />

<strong>de</strong>terminismo biológico:<br />

No ensino e <strong>na</strong> enfermagem consi<strong>de</strong>rava-se que as <strong>mulheres</strong> exprimiam a<br />

sua <strong>na</strong>tureza carinhosa; a dactilografia era comparada a tocar piano; as<br />

tarefas <strong>de</strong> escritório ajustavam-se supostamente à sua <strong>na</strong>tureza submissa,<br />

à sua capacida<strong>de</strong> para tolerar tarefas repetitivas e ao seu gosto pelo<br />

pormenor (SCOTT, 1994, p. 462).<br />

No caso <strong>de</strong> atuarem no ensino público, Scott cita um exemplo da primeira<br />

meta<strong>de</strong> do século XIX nos EUA; ao preten<strong>de</strong>r-se diminuir custos com a educação<br />

pública, iniciou-se o recrutamento <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, com a justificativa <strong>de</strong> que elas<br />

“possuíam <strong>uma</strong> pulsão aquisitiva e trabalhariam por salários <strong>de</strong> subsistência”<br />

(CONWAY, 1987 apud SCOTT, 1994, p. 462). Isso aconteceu também em outras<br />

áreas <strong>de</strong> serviços: contratar <strong>mulheres</strong> era sinônimo <strong>de</strong> diminuição <strong>de</strong> custos 56 .<br />

De certa maneira isso contribuiu para que os homens fossem impelidos a<br />

outros postos, e com isso tivessem <strong>uma</strong> ascensão profissio<strong>na</strong>l, configurando<br />

espaços em que elas eram maioria e espaços a que elas não chegariam. O<br />

processo segregatório e hierarquizante estava instalado e, conforme Scott (1994, p.<br />

464), parecia confirmar-se dia a dia, sendo tomado como “prova da existência prévia<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> divisão sexual do trabalho „<strong>na</strong>tural‟”. Aceitava-se e justificava-se<br />

biologicamente a inferiorida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> – seus “corpos, capacida<strong>de</strong>s produtivas<br />

e responsabilida<strong>de</strong>s sociais as tor<strong>na</strong>vam incapazes para o tipo <strong>de</strong> trabalho que lhes<br />

traria reconhecimento econômico e social como trabalhadoras ple<strong>na</strong>s” (SCOTT,<br />

1994, p. 474).<br />

56 A esse processo comumente se chama feminização <strong>de</strong> espaços e ativida<strong>de</strong>s. Nos interessa nesse<br />

sentido a feminização da função docente, tratada adiante.


71<br />

A questão da separação ainda hoje é a<strong>na</strong>lisada por diversas teóricas,<br />

incluindo Kergoat e Hirata (2007). Para elas, a própria concepção <strong>de</strong> divisão sexual<br />

do trabalho pressupõe dois princípios:<br />

o da separação: existem trabalhos <strong>de</strong> homens e trabalhos <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>;<br />

o da hierarquização: os trabalhos dos homens valem mais que os <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong>.<br />

Esta concepção, portanto, ajuda <strong>na</strong> compreensão da dinâmica observada <strong>na</strong><br />

Ciência e <strong>na</strong> Tecnologia, campos que historicamente têm um maior número <strong>de</strong><br />

homens atuando. Destacamos <strong>de</strong>sses campos que há <strong>uma</strong> divisão inter<strong>na</strong> em<br />

relação a alg<strong>uma</strong>s áreas do conhecimento: <strong>uma</strong>s são reserva<strong>das</strong> à atuação<br />

masculi<strong>na</strong> e outras à femini<strong>na</strong>. O fato é que a separação <strong>de</strong> áreas se tor<strong>na</strong><br />

problemática a partir do momento que com ela vemos <strong>uma</strong> hierarquização que<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong> que as áreas reserva<strong>das</strong> aos homens têm necessariamente maior<br />

prestígio ou <strong>de</strong>staque do que as reserva<strong>das</strong> às <strong>mulheres</strong>. Além disso, <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong><br />

áreas também há <strong>uma</strong> hierarquização que <strong>de</strong>sfavorece as <strong>mulheres</strong>, já que níveis<br />

mais altos acabam sendo ocupados recorrentemente por eles.<br />

Segundo Hirata (2002), no campo da tecnologia, <strong>das</strong> mudanças e inovações<br />

tecnológicas, percebe-se que não ocorrem as mesmas consequências sobre<br />

homens e <strong>mulheres</strong> (eles notadamente têm <strong>de</strong>staque ou privilégios), in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

se se tratam <strong>de</strong> países industrializados ou países em via <strong>de</strong> industrialização,<br />

pensando <strong>na</strong>queles como mão-<strong>de</strong>-obra pronta a aten<strong>de</strong>r ao mercado. Suas<br />

pesquisas apontam que, no âmbito da revolução informática 57 , permanece a relação<br />

diferenciada <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e dos homens com as tecnologias, e a qualificação (ou<br />

<strong>de</strong>squalificação) para utilização <strong>de</strong>ssas tecnologias está no centro da divisão sexual<br />

do trabalho (HIRATA, 2002). O que se percebe é que as novas tecnologias po<strong>de</strong>m<br />

reforçar a margi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>. Um conjunto <strong>de</strong> fatores contribui para a<br />

reprodução <strong>de</strong>sta margi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ntre eles (SILVA, s.d., s.p.):<br />

Relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r e hierarquia entre homens e <strong>mulheres</strong>;<br />

57 Sobre o tema sugerimos os trabalhos da professora Clevi Ele<strong>na</strong> Rapkiewicz a respeito do mundo<br />

da informática ser ou não um âmbito <strong>de</strong> domínio masculino: RAPKIEWICZ, C. E. Informática: Domínio<br />

Masculino? Ca<strong>de</strong>rnos Pagu, v. 10, 1998, p. 169-200; RAPKIEWICZ, C. E. ; SEGRE, L. M. Novas<br />

tecnologias e a divisão sexual do trabalho, 1989; e RAPKIEWICZ, C. E. As novas fronteiras da<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>: homens e <strong>mulheres</strong> no mercado <strong>de</strong> trabalho. São Paulo: Se<strong>na</strong>c, 2002.


72<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

Escolhas profissio<strong>na</strong>is individuais;<br />

Mudanças comportamentais, transformações sociais;<br />

Representações sociais do masculino e do feminino;<br />

Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso à formação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Leta e Martins (2008) <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>m “divisão sexual do trabalho científico” à<br />

dinâmica já apresentada quando se tem as <strong>mulheres</strong> atuando no “fazer” científico,<br />

ou seja, com um papel coadjuvante, e os homens no “pensar” científico, como<br />

protagonista; autor e autora embasam essa hipótese no que eles chamam <strong>de</strong><br />

“complementarida<strong>de</strong> sexual” 58 , conceito criado para justificar posturas que assumiam<br />

o novo mo<strong>de</strong>lo socioeconômico no início da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. O conceito pressupõe um<br />

espaço/ativida<strong>de</strong> relegado às <strong>mulheres</strong> para completar o homem, cujos<br />

espaços/ativida<strong>de</strong>s estavam em extremo oposto (SCHIEBINGER, 2001).<br />

Além da separação, no entanto, temos um problema maior no fato <strong>de</strong> existir<br />

<strong>uma</strong> hierarquização que <strong>de</strong>fine quais as áreas <strong>de</strong> maior prestígio e valor social e a<br />

qual gênero elas estarão associa<strong>das</strong>. Nesse sentido, as áreas associa<strong>das</strong> ao<br />

cuidado como a Enfermagem, Fisioterapia, o Magistério <strong>na</strong>s séries iniciais, entre<br />

outras, frequentemente ocupa<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong>. Por outro lado, Ciências, como a<br />

Física, as Engenharias, a Matemática, no caso <strong>das</strong> chama<strong>das</strong> Ciências “duras”, e<br />

alg<strong>uma</strong>s carreiras <strong>na</strong> Medici<strong>na</strong>, no caso <strong>das</strong> Ciências da Saú<strong>de</strong>, entre outras, são<br />

mais ocupa<strong>das</strong> por homens.<br />

Algo que também afeta a atuação da mulher no campo da Ciência é a<br />

histórica responsabilida<strong>de</strong> pelo trabalho doméstico atribuído como responsabilida<strong>de</strong><br />

femini<strong>na</strong>. Silva (2005, p. 9) acrescenta que teríamos historicamente construída <strong>uma</strong><br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> femini<strong>na</strong> “em torno do mundo privado e da manutenção <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong><br />

família em que elas têm as responsabilida<strong>de</strong>s domésticas e socializadoras, o que<br />

condicionou a participação da mulher no mercado <strong>de</strong> trabalho”, e contribuiu para que<br />

alg<strong>uma</strong>s ativida<strong>de</strong>s fossem atribuí<strong>das</strong> “<strong>na</strong>turalmente” às <strong>mulheres</strong>, especialmente a<br />

ativida<strong>de</strong> docente, ainda associada ao cuidado.<br />

58 Leta e Martins (2008) vão dizer que havia um paradoxo: <strong>de</strong> um lado um movimento i<strong>de</strong>al que<br />

igualava todos os cidadãos e <strong>de</strong> outro <strong>uma</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> manutenção da or<strong>de</strong>m <strong>na</strong>turalizada –<br />

homens no público e <strong>mulheres</strong> no privado.


73<br />

Este fato tem forte impacto <strong>na</strong> escolha <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> por <strong>uma</strong> ou outra<br />

carreira, ou ainda <strong>na</strong> escolha por efetivamente seguir alg<strong>uma</strong> carreira: “As <strong>mulheres</strong><br />

que consi<strong>de</strong>ram seguir carreira <strong>na</strong> Ciência citam as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> combi<strong>na</strong>r carreira<br />

e família como a maior preocupação” (SCHIEBINGER, 2001, p. 194).<br />

Muitas <strong>mulheres</strong> têm dificulda<strong>de</strong> em optar por seguir <strong>uma</strong> carreira científicotecnológica,<br />

e isso as <strong>de</strong>ixa cada vez mais distantes da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sucesso<br />

nessa área. Schiebinger (2001, p. 194) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que “Para trazer as <strong>mulheres</strong> para<br />

a Ciência, precisamos reestruturar os mundos profissio<strong>na</strong>l e doméstico”, além <strong>de</strong><br />

fazer um esforço em convencer os parceiros a participarem, enten<strong>de</strong>ndo que é a<br />

forma mais justa <strong>de</strong> atuação profissio<strong>na</strong>l para ambos.<br />

A divisão sexual do trabalho que atribuiu às <strong>mulheres</strong> a responsabilida<strong>de</strong><br />

principal pelos serviços domésticos e criação dos filhos liberou o homem<br />

dos incômodos <strong>de</strong>talhes <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s diárias <strong>de</strong> sobrevivência, ao passo<br />

que sobrecarregou as <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> forma <strong>de</strong>sproporcio<strong>na</strong>l (LERNER apud<br />

SCHIEBINGER, 2001, p. 182).<br />

A problemática está em <strong>de</strong>rrubar a divisão sexual do trabalho, <strong>uma</strong> <strong>das</strong><br />

manifestações <strong>das</strong> relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r da socieda<strong>de</strong>, para que ela <strong>de</strong>ixe “<strong>de</strong> ser<br />

percebida como um processo <strong>na</strong>tural que distribui homens e <strong>mulheres</strong> em ativida<strong>de</strong>s<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> a<strong>de</strong>qua<strong>das</strong> a seu sexo” passando a ser vista assim como ela é: “parte<br />

<strong>de</strong> relações sociais basea<strong>das</strong> em diferenças socialmente construí<strong>das</strong> entre homens<br />

e <strong>mulheres</strong>” (SILVA, 2005, p. 28).<br />

Trata-se <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> entre diferentes, no sentido <strong>de</strong> equida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

oportunida<strong>de</strong>s. Na dinâmica social marcada pelo <strong>de</strong>terminismo biológico, vemos que<br />

prevalecem<br />

posições <strong>de</strong>siguais, tanto <strong>na</strong> esfera da produção quanto no âmbito privado<br />

<strong>das</strong> relações familiares, sendo comum, em nossa socieda<strong>de</strong>, que a mulher<br />

seja responsabilizada pelas ativida<strong>de</strong>s reprodutivas e o homem seja<br />

percebido como o provedor da família. Se, por um lado, o trabalho produtivo<br />

faz parte da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> masculi<strong>na</strong>, por outro, a construção da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

femini<strong>na</strong> condicio<strong>na</strong> e limita a participação da mulher no mercado <strong>de</strong><br />

trabalho, principalmente <strong>de</strong>vido à constante necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> articular<br />

ativida<strong>de</strong>s domésticas e profissio<strong>na</strong>is (SILVA, 2005, p. 28).<br />

As <strong>mulheres</strong> têm dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrada no mercado <strong>de</strong> trabalho e, quando o<br />

fazem, optam por alg<strong>uma</strong>s carreiras que possibilitem a conciliação (HIRATA e<br />

KERGOAT, 2007, p. 603): “política fortemente sexuada, visto que <strong>de</strong>fine


74<br />

implicitamente um único ator (ou atriz) <strong>de</strong>ssa “conciliação” – as <strong>mulheres</strong>, e<br />

consagra o status quo segundo o qual homens e <strong>mulheres</strong> não são iguais perante o<br />

trabalho profissio<strong>na</strong>l”. A conciliação seria para as autoras um mo<strong>de</strong>lo adotado <strong>de</strong><br />

relação entre as esferas doméstica e profissio<strong>na</strong>l.<br />

Além <strong>de</strong>sse, temos também outros três mo<strong>de</strong>los:<br />

a) o mo<strong>de</strong>lo tradicio<strong>na</strong>l – neste a mulher mantém o controle do espaço privado,<br />

ou seja, cuida da família e <strong>das</strong> tarefas domésticas, enquanto o homem<br />

mantém o papel <strong>de</strong> provedor;<br />

b) o mo<strong>de</strong>lo da <strong>de</strong>legação – <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> níveis <strong>de</strong> renda e escolarida<strong>de</strong> mais<br />

altos contratam o serviço <strong>de</strong> outras <strong>mulheres</strong> para atuarem em suas casas<br />

como emprega<strong>das</strong> domésticas, babás e cuidadoras. Outro exemplo é quando<br />

são avós, tias, irmãs e até mesmo filhas <strong>de</strong> maior ida<strong>de</strong> as escolhi<strong>das</strong> para<br />

cuidar <strong>das</strong> crianças. Mulheres <strong>de</strong>legando funções historicamente atribuí<strong>das</strong> a<br />

elas a outras <strong>mulheres</strong> – estas últimas quase sempre em situação inferior.<br />

Este mo<strong>de</strong>lo resolve os problemas <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> mas segue<br />

mantendo as <strong>de</strong> menos sorte em condição <strong>de</strong>sigual;<br />

c) por último, e o <strong>de</strong>sejado, é o mo<strong>de</strong>lo da parceria – a 4º Conferência Mundial<br />

sobre as Mulheres, organizada pela Organização <strong>das</strong> Nações Uni<strong>das</strong> em<br />

Pequim em 1995, preconiza-o como i<strong>de</strong>al porque pressupõe igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

posições, não existência <strong>de</strong> hierarquias e as tarefas domésticas seriam<br />

dividi<strong>das</strong>.<br />

Esta problemática não faz parte <strong>de</strong>ssa pesquisa, mas nos leva a inferir,<br />

conforme trataremos em capítulo apropriado, que no início do século eram poucas<br />

as <strong>mulheres</strong> que atuaram <strong>na</strong> Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices por estarem muitas<br />

<strong>de</strong>las presas ao mo<strong>de</strong>lo tradicio<strong>na</strong>l e ao da conciliação. Pelo primeiro elas nem<br />

chegariam a atuar como professoras, pois ficavam presas ao lar; pelo segundo elas<br />

tinham o direito <strong>de</strong> atuar no mercado <strong>de</strong> trabalho em tempo parcial, n<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong><br />

que lhes garantiria aten<strong>de</strong>r as ativida<strong>de</strong>s domésticas. É claro que era comum<br />

encontrarmos <strong>mulheres</strong> solteiras atuando nos anos iniciais, e estas possivelmente<br />

não enfrentassem problemas <strong>de</strong>ssa or<strong>de</strong>m, porém suas dificulda<strong>de</strong>s eram outras<br />

como oportu<strong>na</strong>mente problematizaremos.


75<br />

As muitas <strong>mulheres</strong> que encontramos em vários contextos, incluindo o aqui<br />

estudado, <strong>de</strong>sempenharam papel importante, pois representaram <strong>uma</strong> mudança em<br />

relação aos momentos históricos anteriores. Foram muitos os avanços por conta da<br />

coragem, ousadia e força <strong>de</strong> vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> muitas <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> quem quase não se<br />

ouve falar.<br />

Atualmente, discute-se a condição <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> ocuparem ainda as<br />

posições consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> tradicio<strong>na</strong>lmente femini<strong>na</strong>s, incluindo a docência, entretanto<br />

foi pela docência que elas tiveram ascensão, e inclusive alg<strong>uma</strong>s pu<strong>de</strong>ram chegar a<br />

postos mais altos, como é o caso da reitoria <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição pública 59 .<br />

Por ora, termi<strong>na</strong>mos esta discussão com a afirmação <strong>de</strong> Silva (2005); em<br />

sua tese ela <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que há <strong>uma</strong> continuida<strong>de</strong> da divisão que relega as <strong>mulheres</strong> a<br />

alg<strong>uma</strong>s áreas, seja do campo da Ciência ou da Tecnologia, ou qualquer outro<br />

campo, porém os avanços aos poucos se configuram:<br />

Todavia verificamos também <strong>uma</strong> tendência <strong>de</strong> alteração <strong>de</strong>ssa divisão,<br />

pois percebemos a ampliação do número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> em cargos<br />

hierarquicamente superiores, a inserção femini<strong>na</strong> em ativida<strong>de</strong>s<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> masculi<strong>na</strong>s e a ampliação do número <strong>de</strong> homens em<br />

ocupações consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s (SILVA, 2005, p. 29).<br />

elas.<br />

Acreditando nestas alterações, lançaremos olhar às posições ocupa<strong>das</strong> por<br />

3.1.1 Em que áreas elas estão?<br />

Assim como já se esboçou no capítulo anterior, a perspectiva assumida é <strong>de</strong><br />

que por meio do aumento no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> no ensino superior é possível<br />

mudar cenários no mercado <strong>de</strong> trabalho. Portanto, consi<strong>de</strong>ramos que a universida<strong>de</strong><br />

possibilita projeção para o mercado <strong>de</strong> trabalho e, consequentemente, para a<br />

carreira acadêmica.<br />

59 Moraes (2008) em sua tese A trajetória <strong>de</strong> reitoras em Santa Catari<strong>na</strong>: Ser mulher é ape<strong>na</strong>s um<br />

<strong>de</strong>talhe? conta a história <strong>de</strong> cinco <strong>mulheres</strong> que chegaram à reitoria <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong> representativida<strong>de</strong> no país.


76<br />

Tendo como foco os campos da Ciência e da Tecnologia, pensaremos neste<br />

capítulo como a universida<strong>de</strong> se configura chave <strong>de</strong> um cenário favorável às<br />

<strong>mulheres</strong>, já que escolarização e formação foram historicamente os principais<br />

fatores impulsio<strong>na</strong>ntes para elas.<br />

Melo e Rodrigues (2006) 60 preocuparam-se por contextualizar um momento<br />

em que ainda são poucas as que se <strong>de</strong>stacam <strong>na</strong>s carreiras científicas, são poucas<br />

as bolsas para estudo e pesquisa a elas <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> e é baixo o número <strong>das</strong> que<br />

chegam ao topo da carreira. Na contramão, aquelas que conseguem chegar à<br />

universida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>dicar-se a carreiras científico-tecnológicas acabam segrega<strong>das</strong> em<br />

âmbitos culturalmente impostos.<br />

Leta e Martins (2008, p. 85) acreditam que as universida<strong>de</strong>s mantiveram<br />

configurações <strong>das</strong> primeiras instituições que traziam consigo características <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

socieda<strong>de</strong> que se organizava <strong>de</strong> tal maneira a oprimir aqueles que não faziam parte<br />

da produção <strong>de</strong> conhecimento. Elas teriam sido “ergui<strong>das</strong> sob os princípios da<br />

hierarquia clerical, com o intuito <strong>de</strong> garantir a reprodução e o controle do saber<br />

autorizado pelos po<strong>de</strong>res vigentes”.<br />

Alguns dados estatísticos apontam que no fi<strong>na</strong>l do século XX as <strong>mulheres</strong><br />

continuavam optando mais pelas chama<strong>das</strong> carreiras soft 61 , como por exemplo, as<br />

Ciências Sociais e H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s, enquanto que <strong>na</strong>s chama<strong>das</strong> carreiras hard, como<br />

Ciências Exatas e Engenharias, o percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> ficava <strong>na</strong> casa dos 13%<br />

em média (SILVA, 2000).<br />

60 No livro Pioneiras da Ciência no Brasil, Hil<strong>de</strong>te Pereira <strong>de</strong> Melo e Lígia Maria Rodrigues fazem um<br />

breve apanhado <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> cientistas que se formaram no Brasil <strong>na</strong> primeira meta<strong>de</strong> do século XX.<br />

No total foram ape<strong>na</strong>s 19, <strong>de</strong>ssas, 6 não são brasileiras, somente <strong>de</strong>senvolveram suas ativida<strong>de</strong>s<br />

aqui, outras 5 são filhas <strong>de</strong> estrangeiros, 2 eram filhas <strong>de</strong> professores e outras 2 tiveram como<br />

incentivadores seus próprios maridos; as autoras justificam que citam suas origens e/ou<br />

incentivadores para mostrar que o meio foi um fator <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte para a carreira <strong>de</strong>stas “pioneiras”.<br />

61 Esta diferenciação entre softs e hards foi <strong>de</strong>finida por Schiebinger (2001, p. 296): “as chama<strong>das</strong><br />

Ciências hard são ti<strong>das</strong> como „imparciais‟, distantes, abstratas e quantitativas, enquanto as Ciências<br />

soft são consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> „compassivas‟ e qualitativas, talvez introspectivas, e próximas <strong>das</strong><br />

preocupações cotidia<strong>na</strong>s.”. A autora explica que “A „dureza‟ é pensada como <strong>de</strong>finindo <strong>uma</strong><br />

hierarquia <strong>das</strong> Ciências” (p. 297). A física estaria em primeiro lugar em relação à dificulda<strong>de</strong> que<br />

exige <strong>de</strong> seus aspirantes. A problemática é que os “métodos a<strong>na</strong>líticos e suposta capacida<strong>de</strong> para<br />

reduzir fenômenos complexos a princípios simples foram tomados como o mo<strong>de</strong>lo ao qual to<strong>das</strong> as<br />

outras Ciências <strong>de</strong>vem aspirar” e fez com que mesmo as h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>s passassem “por um período<br />

<strong>de</strong> intenso cientificismo <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1970, quando o objetivo era quantificar o empenho h<strong>uma</strong>no <strong>na</strong><br />

maior medida possível no sentido <strong>de</strong> chegar a <strong>uma</strong> maior certeza e respeito institucio<strong>na</strong>l”<br />

(SCHIEBINGER, 2001, p. 298). Nesse sentido as carreiras hards teriam mais prestígio e um número<br />

menor <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, enquanto que <strong>na</strong>s mais softs encontramos mais <strong>mulheres</strong> (SCHIEBINGER,<br />

2001).


77<br />

Segundo dados do Inep, em 2000, o percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que optava por<br />

cursar Pedagogia era <strong>de</strong> 92,5% contra 7,53% <strong>de</strong> homens. Já no curso <strong>de</strong><br />

Engenharia ocorria <strong>uma</strong> inversão: só 19,5% eram <strong>mulheres</strong>, contra 80,5% <strong>de</strong><br />

homens. Os números <strong>de</strong> 2005 não sofreram gran<strong>de</strong>s alterações: <strong>na</strong> Pedagogia as<br />

<strong>mulheres</strong> representavam 91,3% e os homens 8,66%, e <strong>na</strong> Engenharia as <strong>mulheres</strong><br />

somavam 20,3% e os homens 79,7% 62 .<br />

A mudança <strong>de</strong>sse quadro passa pela mudança <strong>na</strong> educação e formação<br />

tanto <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> quanto <strong>de</strong> homens para que haja a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolha para<br />

ambos os sexos por <strong>uma</strong> carreira in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do que culturalmente se construiu<br />

sobre elas.<br />

Com o acesso à educação formal po<strong>de</strong>-se conjecturar que o acesso e a<br />

permanência <strong>de</strong> mais <strong>mulheres</strong> em áreas <strong>na</strong>s quais ainda aparecem em menor<br />

número seja mais fácil. Este fato po<strong>de</strong> representar <strong>uma</strong> <strong>das</strong> formas <strong>de</strong> lutar contra a<br />

discrimi<strong>na</strong>ção 63 , que se concretiza em diferenças salariais, maior número em<br />

posições <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, etc.<br />

Para tentar mapear on<strong>de</strong> estão as <strong>mulheres</strong> são necessários meios<br />

quantitativos, no entanto ainda há dificulda<strong>de</strong> em chegar a estes dados. Melo e<br />

Oliveira (2006, p. 304) criticam as estatísticas que não são <strong>de</strong>sagrega<strong>das</strong> por<br />

gênero, justamente por enten<strong>de</strong>rem que “Tal critério, sob aparente neutralida<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

fato, iguala os que não são iguais no acesso às carreiras científicas e tecnológicas”,<br />

o que acaba por mascarar <strong>uma</strong> aparente igualda<strong>de</strong>.<br />

Consi<strong>de</strong>rando que há um avanço acontecendo, é necessário que os dados a<br />

respeito da produção científico-tecnológica apareçam sempre <strong>de</strong>sagregados por<br />

sexo, <strong>de</strong> forma a aumentar a visibilida<strong>de</strong> femini<strong>na</strong>:<br />

Na última década [artigo publicado em 2006] cresceu o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

realizando ativida<strong>de</strong>s científicas e há <strong>uma</strong> nítida tendência do avanço<br />

<strong>de</strong>ssas pesquisadoras <strong>na</strong> direção da maior qualificação e habilita<strong>das</strong> a<br />

participar sobera<strong>na</strong>mente, e não <strong>de</strong> forma subordi<strong>na</strong>da, nos grupos <strong>de</strong><br />

pesquisa <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is (MELO e OLIVEIRA, 2006, p. 305).<br />

62 Dados do relatório A mulher <strong>na</strong> educação superior brasileira: 1991-2005. Brasília: Inep, 2007,<br />

organizado por Dilvo Ristoff et al.<br />

63 Enten<strong>de</strong>mos discrimi<strong>na</strong>ção assim como Velho e León (1998, p. 331): “em seu sentido legal consiste<br />

no tratamento menos favorável a <strong>uma</strong> pessoa <strong>de</strong> um gênero do que aquele conferido a <strong>uma</strong> pessoa<br />

<strong>de</strong> outro gênero em circunstâncias iguais, ou não materialmente diferentes”.


78<br />

As conclusões <strong>de</strong> Melo e Oliveira em relação à situação atual <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong><br />

passam por vários pontos importantes. Uma <strong>de</strong>las diz que a revolução feminista<br />

empurrou mais <strong>mulheres</strong> para as universida<strong>de</strong>s e para a vida profissio<strong>na</strong>l, o que se<br />

constata pela elevação dos números <strong>na</strong> base da biblioteca Scielo: “as <strong>mulheres</strong><br />

representam 32,28% dos autores i<strong>de</strong>ntificados”; outro fator que autora e autor<br />

acreditam <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte é <strong>de</strong> que num futuro próximo a participação femini<strong>na</strong> avance<br />

tanto quanto a própria Ciência e a Tecnologia, fazendo com que essas percam “a<br />

imagem misógi<strong>na</strong> atualmente domi<strong>na</strong>nte” (MELO e OLIVEIRA, 2006, p. 328).<br />

É fato, porém, que as <strong>mulheres</strong> “continuam sujeitas a padrões diferenciados<br />

por gênero <strong>na</strong> escolha <strong>de</strong> carreiras profissio<strong>na</strong>is próximas do estereótipo do ser<br />

mulher” (MELO e OLIVEIRA, 2006, p. 328) e que as mudanças, ainda que ocorram<br />

lentamente, favorecem a luta, sendo cada dia mais importantes os estudos e<br />

pesquisas feitas no sentido <strong>de</strong> <strong>de</strong>smistificar a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a Ciência e a Tecnologia<br />

são lugares exclusivos dos homens.<br />

Por outro lado, autoras como García e Se<strong>de</strong>ño (s.d., s.p.) caminham noutra<br />

perspectiva <strong>de</strong> análise; elas afirmam que<br />

se bem que ao longo da história a presença <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s discipli<strong>na</strong>s<br />

científicas e <strong>na</strong> tecnologia foi inferior a dos homens, seu número não é tão<br />

pequeno como se cost<strong>uma</strong> afirmar. Contudo, sua presença fica oculta por<br />

preconceitos e concepções caducas do que é a história da ciência e a<br />

tecnologia (GARCÍA y SEDEÑO, s.d., s.p.) 64 .<br />

Nesse sentido, acreditar que elas sempre estiveram em número inferior e<br />

que isso foi o fator <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte <strong>de</strong> sua invisibilida<strong>de</strong> acaba por <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> lado o fato<br />

<strong>de</strong> que teriam sido questões maiores as ocultadoras, e nesse caso, teriam sido os<br />

preconceitos e concepções latentes à história da Ciência e da Tecnologia.<br />

Segundo informação do Censo do Diretório dos Grupos <strong>de</strong> Pesquisa no<br />

Brasil, divulgados pelos CNPq/MCT, com dados <strong>de</strong> 2008, as <strong>mulheres</strong> representam<br />

quase meta<strong>de</strong> do número <strong>de</strong> pesquisadores ca<strong>das</strong>trados: 49%. Além disso, a<br />

li<strong>de</strong>rança femini<strong>na</strong> nos grupos <strong>de</strong> pesquisa é <strong>de</strong> 45%. No entanto <strong>uma</strong> análise mais<br />

cuidadosa vai mostrar um fator bastante relevante: as áreas em que elas<br />

64 Tradução livre do origi<strong>na</strong>l: “si bien a lo largo <strong>de</strong> la historia la presencia <strong>de</strong> mujeres en las discipli<strong>na</strong>s<br />

científicas y en la tecnología ha sido inferior a la <strong>de</strong> los varones, su número no es tan pequeño como<br />

se suele afirmar. Sin embargo, su presencia queda oculta por prejuicios y concepciones caducas <strong>de</strong><br />

lo que es la historia <strong>de</strong> la ciencia y la tecnología” (GARCÍA y SEDEÑO, s.d., s.p.).


79<br />

predomi<strong>na</strong>m seguem sendo aquelas relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> ao “cuidado”, ao “feminino”. Na<br />

Fonoaudiologia, por exemplo, elas representam 90%, <strong>na</strong> Enfermagem 87%; no<br />

Serviço Social 81% e 79% <strong>na</strong> Nutrição. E, <strong>na</strong> esteira da confirmação histórica, <strong>na</strong><br />

Engenharia elas continuam sendo minoria: <strong>na</strong> Engenharia Mecânica 12%; <strong>na</strong><br />

Elétrica 13%; <strong>na</strong> Engenharia Naval e Oceânica 16% e 17% <strong>na</strong> Aeroespacial.<br />

Estes dados coinci<strong>de</strong>m com o perfil <strong>de</strong> gênero <strong>na</strong> Educação Superior no<br />

Brasil, segundo tabela 1:<br />

Tabela 1 – Cursos por matrícula e sexo em 2005<br />

Cursos<br />

Matrículas<br />

totais<br />

Matrículas<br />

femini<strong>na</strong>s<br />

%<br />

femini<strong>na</strong>s<br />

Matrículas<br />

masculi<strong>na</strong>s<br />

Pedagogia 372.159 339.937 91,3 32.222 8,66<br />

Engenharia 266.163 53.946 20,3 212.217 79,7<br />

Letras 196.818 157.513 80 39.305 20<br />

Enfermagem 153.359 127.065 82,9 26.294 17,1<br />

Ciência da Computação 110.927 20.853 18,8 90.074 81,2<br />

Fonte: Mec/Inep/Deaes 65<br />

%<br />

masculi<strong>na</strong>s<br />

Na tabela 1, observamos que o número <strong>de</strong> matrículas femini<strong>na</strong>s ainda são<br />

superiores em Pedagogia, Letras e Enfermagem, áreas relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> às <strong>mulheres</strong><br />

<strong>de</strong>vido à relação <strong>de</strong>stas com ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> docência e <strong>de</strong> cuidado. Já <strong>na</strong> Engenharia<br />

e em Ciência da Computação as <strong>mulheres</strong> representam em média perto <strong>de</strong> 20%,<br />

número bastante inferior.<br />

Ao comentar os dados do Censo em entrevista para o site Mais <strong>mulheres</strong> no<br />

po<strong>de</strong>r 66 , Moema <strong>de</strong> Castro Gue<strong>de</strong>s, <strong>de</strong>mógrafa e professora da Universida<strong>de</strong><br />

Cândido Men<strong>de</strong>s, que participa do grupo Gênero e Ciência da Fundação Oswaldo<br />

Cruz (Fiocruz), explica que <strong>na</strong> verda<strong>de</strong> as <strong>mulheres</strong> acabam por permanecer <strong>na</strong>s<br />

carreiras que são culturalmente menos valoriza<strong>das</strong> e <strong>na</strong>s quais os homens não<br />

querem entrar. Ela também <strong>de</strong>staca dos dados apresentados que “há <strong>uma</strong> clara<br />

prevalência <strong>de</strong> bolsistas <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s modalida<strong>de</strong>s iniciantes. Em relação ao total<br />

<strong>de</strong> bolsas <strong>de</strong> Iniciação Científica, o contingente feminino chega a 57%”. No<br />

65 Dados do relatório A mulher <strong>na</strong> educação superior brasileira: 1991-2005. Brasília: Inep, 2007,<br />

organizado por Dilvo Ristoff et al.<br />

66<br />

Perfil da ciência brasileira é cada vez mais feminino. Disponível em:<br />

http://www.mais<strong>mulheres</strong>nopo<strong>de</strong>rbrasil.com.br/noticia_geral.php?id=143 Acesso em: 21 fev. 2010.


80<br />

mestrado, são 52%, e, no doutorado e pós-doutorado, 51%, a maioria. No entanto<br />

ela também chama atenção para <strong>uma</strong> problemática:<br />

é interessante perceber que entre os bolsistas <strong>de</strong> produtivida<strong>de</strong> em<br />

pesquisa, estrato no qual estão os pesquisadores mais bem avaliados do<br />

país, as <strong>mulheres</strong> passam a representar ape<strong>na</strong>s 34%. Ao <strong>de</strong>sagregarmos<br />

este dado por categoria, vemos que as <strong>mulheres</strong> têm um peso relativo que<br />

cai conforme sobe o nível hierárquico. Enquanto entre os pesquisadores<br />

avaliados <strong>na</strong> categoria 2 (mais baixa), as <strong>mulheres</strong> representam 37%, <strong>na</strong><br />

categoria 1A (mais alta), o peso feminino cai para ape<strong>na</strong>s 23,6%. Ou seja,<br />

também no campo científico, há <strong>uma</strong> clara dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> progressão<br />

femini<strong>na</strong> se tomamos como referência a dinâmica masculi<strong>na</strong> 67 (Grifos<br />

nossos.).<br />

Ela aponta que nos níveis <strong>de</strong> maior prestígio o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> diminui,<br />

evi<strong>de</strong>nciando <strong>uma</strong> dificulda<strong>de</strong> assim como acontece em outros âmbitos sociais.<br />

É notório que estamos vendo um processo crescente, mas não po<strong>de</strong>mos<br />

achar que isso é suficiente, já que, conforme vemos <strong>na</strong> história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong><br />

Ciência e <strong>na</strong> Tecnologia e nos números do Censo do CNPq, há <strong>uma</strong> concentração<br />

<strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> em <strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong> carreiras e <strong>de</strong> homens em outras, o que acaba por<br />

reforçar os papéis imputados a homens e <strong>mulheres</strong>.<br />

Em relação aos números <strong>de</strong> pesquisadores por sexo no Brasil, observamos<br />

a tabela 2:<br />

Tabela 2 – Pesquisadores por Sexo no Brasil (%)<br />

Ano 1995 1997 2000 2002 2004 2006 2008<br />

Feminino 39 42 44 46 47 48 49<br />

Masculino 61 58 56 54 53 52 51<br />

Total 100 100 100 100 100 100 100<br />

Fonte: Censo CNPq – 30/11/2008 68<br />

Na tabela 2 percebemos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1995 o percentual <strong>de</strong> pesquisadoras<br />

cresce, o que comprova que meta<strong>de</strong> da população brasileira representa<br />

tecnicamente meta<strong>de</strong> da força <strong>de</strong> trabalho em Ciência e Tecnologia no país. 49%<br />

67<br />

Perfil da ciência brasileira é cada vez mais feminino. Disponível em:<br />

http://www.mais<strong>mulheres</strong>nopo<strong>de</strong>rbrasil.com.br/noticia_geral.php?id=143 Acesso em: 21 fev. 2010.<br />

68<br />

Perfil da ciência brasileira é cada vez mais feminino. Disponível em:<br />

http://www.mais<strong>mulheres</strong>nopo<strong>de</strong>rbrasil.com.br/noticia_geral.php?id=143 Acesso em: 21 fev. 2010.


81<br />

em 2008 representa <strong>uma</strong> conquista gradativa, tendo em vista como ponto <strong>de</strong> partida<br />

a entrada <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> como discentes <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s.<br />

De todos os modos ainda que a situação esteja mudando e os esforços<br />

estejam sendo recompensados, vemos um reflexo da mesma <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

gênero que encontramos <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong>. E para nos posicio<strong>na</strong>rmos e a<strong>na</strong>lisarmos<br />

formas <strong>de</strong> mudar as estatísticas que já dão conta <strong>de</strong> pontuar a <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> é<br />

importante refletir e questio<strong>na</strong>r sobre quem atualmente faz Ciência e Tecnologia,<br />

quem está à frente <strong>das</strong> <strong>de</strong>cisões que vão culmi<strong>na</strong>r em novas Tecnologias, e <strong>de</strong> que<br />

maneira estes atores e atrizes reproduzem atitu<strong>de</strong>s e padrões <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento<br />

herdados <strong>de</strong> seus antecessores.<br />

Po<strong>de</strong>mos concluir dos números disponíveis para a<strong>na</strong>lisarmos a questão <strong>de</strong><br />

gênero que a divisão sexual do trabalho <strong>na</strong>s Ciências passa pela divisão presente<br />

nos processos <strong>de</strong> formação, e estes começam bem antes que elas pensem em<br />

chegar à universida<strong>de</strong>.<br />

3.2 A EDUCAÇÃO DAS MULHERES COMO PROCESSO EMANCIPATÓRIO E<br />

OPORTUNIZADOR DE MUDANÇAS<br />

Até aqui, nessa breve retomada da situação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em C&T,<br />

pu<strong>de</strong>mos ver que alg<strong>uma</strong>s questões são cruciais. Muitas autoras, <strong>de</strong>ntre elas Tabak<br />

(2002), <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m que <strong>uma</strong> ação que comece a interferir <strong>na</strong> educação básica <strong>de</strong><br />

meni<strong>na</strong>s po<strong>de</strong> contribuir para que no futuro o cenário <strong>das</strong> estatísticas em C&T mu<strong>de</strong>.<br />

Vale lembrar que se o acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> foi tardio nos níveis básicos e<br />

superior, o que dizer do ensino <strong>de</strong> pós-graduação que funcio<strong>na</strong> como mola<br />

propulsora à pesquisa científico-tecnológica? E o que falar da permanência <strong>de</strong>las<br />

nos bancos escolares?<br />

O baixo número <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s concluintes do ensino médio (antigo segundo<br />

grau) que optam por carreiras científicas e tecnológicas é um dos motivos apontados<br />

por Tabak para que no topo da pirâmi<strong>de</strong> cheguem menos <strong>mulheres</strong> (TABAK, 2002).<br />

A partir dos anos 60 do século passado a Unesco apoiou estudos que<br />

indicaram que o imenso grupo formado por <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> população mundial não teve


82<br />

a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contribuir <strong>de</strong> maneira contun<strong>de</strong>nte para o crescimento econômico<br />

e o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> seus países, o que é um prejuízo para o crescimento do<br />

país:<br />

O país não po<strong>de</strong> se dar ao luxo <strong>de</strong> prescindir da incorporação <strong>de</strong> milhares<br />

<strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que venham a contribuir com seu talento e sua inteligência<br />

para fazer avançar a Ciência e a Tecnologia no Brasil e conseguir assim<br />

reduzir mais rapidamente a enorme <strong>de</strong>fasagem ainda persistente em<br />

relação aos países mais <strong>de</strong>senvolvidos (TABAK, 2002, p. 13).<br />

A expansão efetiva nos níveis <strong>de</strong> graduação e pós-graduação a partir <strong>de</strong><br />

1970 possibilitou a entrada <strong>de</strong> mais <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s aca<strong>de</strong>mias, porém elas<br />

continuavam significando menores números <strong>na</strong> conclusão <strong>de</strong> cursos <strong>das</strong> Ciências da<br />

Natureza e Matemáticas e pouquíssimas se <strong>de</strong>dicavam à pesquisa científica e<br />

tecnológica (TABAK, 2002).<br />

De novo, entre 1970 e 1990 as meni<strong>na</strong>s seguiam “optando” por carreiras<br />

mais tradicio<strong>na</strong>is, áreas <strong>de</strong> Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e Sociais, <strong>de</strong>vido aos estereótipos<br />

sexuais e à tradição patriarcal. Nesse sentido po<strong>de</strong>-se dizer que as meni<strong>na</strong>s são<br />

<strong>de</strong>sestimula<strong>das</strong> a seguir carreira <strong>na</strong>s Ciências Exatas já nos anos em que se oferta<br />

o ensino <strong>de</strong> Ciências, enquanto os meninos constantemente são encorajados a<br />

estudar Matemática por condizer com <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> que a socieda<strong>de</strong> impõe<br />

(TABAK, 2002; SEDEÑO, 2000).<br />

Em relação aos níveis superiores, Velho e León (1998) trazem <strong>uma</strong><br />

realida<strong>de</strong> que nos chama atenção: enquanto em países como EUA, Alemanha,<br />

Suécia, com sistemas <strong>de</strong> pós-graduação mais consolidados, o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

ficava em torno dos 30% no início da década <strong>de</strong> 1990, em Portugal e Itália ocorria<br />

algo diferente: 43% dos títulos <strong>de</strong> doutor <strong>na</strong> Itália entre 1991 e 1992 foram para<br />

<strong>mulheres</strong> e em Portugal foi apontada <strong>uma</strong> participação que chegou a 64% <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Física. Para as autoras os números são mera ilusão. Números elevados<br />

não se <strong>de</strong>vem ao fato <strong>de</strong> terem esses países supera<strong>das</strong> as diferenças em relação<br />

aos papéis sociais atribuídos a um ou outro sexo.<br />

Segundo Velho e León (1998), o que acontece nesses e em outros países<br />

<strong>de</strong> industrialização mais recente está atrelado ao <strong>de</strong>sprestígio <strong>de</strong> dada profissão; no<br />

caso, os homens abando<strong>na</strong>m certas ativida<strong>de</strong>s e seguem para profissões mais


83<br />

“promissoras” fi<strong>na</strong>nceiramente, facilitando o acesso para as <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>quelas<br />

“libera<strong>das</strong>”.<br />

Diversas pesquisas apontam para a questão <strong>de</strong> que as <strong>mulheres</strong> estão em<br />

número menor <strong>na</strong>s chama<strong>das</strong> Ciências “duras”, e, em relação à hierarquização,<br />

dificilmente ace<strong>de</strong>m a posições mais altas <strong>na</strong> carreira acadêmica ou mesmo <strong>de</strong><br />

li<strong>de</strong>rança, reproduzindo o que acontece no restante da socieda<strong>de</strong> (política, religião,<br />

educação).<br />

Para Velho e León (1998, p. 316) é imprescindível pensar, além da questão<br />

da incorporação da mulher em ativida<strong>de</strong>s científicas e tecnológicas, também e<br />

principalmente <strong>na</strong>s “circunstâncias em que ela vem a ser bem ou mal sucedida<br />

enquanto cientista” (p. 316). Para as autoras as circunstâncias<br />

certamente não são homogêneas em to<strong>das</strong> as áreas do conhecimento e<br />

países, sendo influencia<strong>das</strong> pela tradição cultural e <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, pelo nível <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico dos países, pelo papel que é localmente<br />

atribuído à Ciência, pela estrutura social, pelo sistema educativo e pela<br />

presença ou ausência <strong>de</strong> sistemas que viabilizem a vida profissio<strong>na</strong>l e<br />

familiar da mulher (VELHO e LEÓN, 1998, p. 316).<br />

As autoras também apontam que <strong>na</strong> Unicamp, <strong>de</strong> 1986 a 1993, um maior<br />

número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> se concentrava <strong>na</strong>s Ciências Biológicas e Sociais. No caso <strong>das</strong><br />

Biológicas e <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s áreas específicas da Química, com algum componente da<br />

Biologia, isso seria explicável:<br />

Argumenta-se que estas áreas ten<strong>de</strong>m a ser aquelas para as quais as<br />

<strong>mulheres</strong> são sutilmente, ou não tão sutilmente, empurra<strong>das</strong>, seja pelo já<br />

mencio<strong>na</strong>do processo <strong>de</strong> socialização que as induzem a não gostar <strong>de</strong><br />

Matemática e a acharem que <strong>de</strong>vem se interessar pelos seres vivos, seja<br />

porque tais discipli<strong>na</strong>s têm menor status e/ou menor remuneração (VELHO<br />

e LEÓN, 1998, p. 321) 69 .<br />

Como no Brasil, há perspectivas semelhantes em outros países, como é o<br />

caso da França; para Michèle Ferrand, a histórica e permanente exclusão <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> do fazer científico <strong>na</strong>quele país acaba por ser <strong>uma</strong> “manifestação sutil da<br />

domi<strong>na</strong>ção masculi<strong>na</strong>”; as <strong>mulheres</strong> sofreriam <strong>de</strong> <strong>uma</strong> “auto-renúncia razoável”,<br />

abrindo mão voluntariamente <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carreira mais “dura” para evitar conflitos nos<br />

69 As autoras fundamentam o baixo status ou <strong>de</strong>sprestígio <strong>de</strong> áreas ocupa<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong> com o<br />

<strong>de</strong>poimento <strong>de</strong> cientistas constantes no artigo “A construção social da produção científica por<br />

<strong>mulheres</strong>”. Ca<strong>de</strong>rnos Pagu, v. 10, 1998, p. 309-344.


84<br />

níveis: escolar – escola que se diz mista e igualitária, que a autora vai chamar<br />

“pseudo-mista”; profissio<strong>na</strong>l – tendo <strong>de</strong> enfrentar um mercado <strong>de</strong> trabalho cruel e <strong>de</strong><br />

rigi<strong>de</strong>z exacerbada, e familiar – tendo <strong>de</strong> conciliar a vida profissio<strong>na</strong>l à familiar<br />

(FERRAND, 1994, p. 364).<br />

As <strong>mulheres</strong> que conseguem romper com esta dinâmica <strong>de</strong> exclusão no<br />

nível escolar, apontam <strong>uma</strong> saída como <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte: <strong>de</strong>monstrar excelência<br />

escolar (FERRAND, 1994). Essa dinâmica acaba sendo reproduzida nos níveis<br />

profissio<strong>na</strong>l e familiar, quando muitas daquelas <strong>mulheres</strong> terão <strong>de</strong> se sobressair ou<br />

mesmo ter um <strong>de</strong>sempenho superior ao dos homens <strong>na</strong>s mesmas posições,<br />

justamente para superar o fato <strong>de</strong> serem consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> inferiores. Muitas pesquisas<br />

apontam para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> distinção dos homens: <strong>de</strong>vem ter <strong>de</strong>sempenho<br />

melhor para alcançar posições por ora iguais às <strong>de</strong>les; <strong>de</strong>vem ter gosto pelas<br />

Ciências e ter próximo a elas <strong>mulheres</strong> cientistas como exemplo, quase como um<br />

símbolo <strong>de</strong> permissão ao campo protegido e sagrado da carreira científica<br />

(FERRAND, 1994; TABAK, 2002).<br />

Ferrand (1994) afirma que <strong>de</strong>ntre aquelas que optam por profissões<br />

“masculi<strong>na</strong>s” os salários vão ser menores que os dos colegas homens; quando há<br />

homens <strong>na</strong>s mesmas profissões “femini<strong>na</strong>s”, eles necessariamente vão ganhar mais<br />

que as colegas <strong>mulheres</strong>; e ainda, quanto mais se aumenta o nível hierárquico,<br />

menos <strong>mulheres</strong> encontramos.<br />

Uma <strong>das</strong> soluções para a questão passa pela obtenção do diploma<br />

universitário, condição necessária para a entrada em alg<strong>uma</strong>s profissões, o que por<br />

si só não é suficiente para abrir “os caminhos do po<strong>de</strong>r” às <strong>mulheres</strong>, já que elas<br />

ten<strong>de</strong>m a permanecer em profissões “femini<strong>na</strong>s” ganhando menos. Por outro lado a<br />

chegada ao mais alto nível <strong>de</strong> ensino é um passo importante para conquistar <strong>uma</strong><br />

equida<strong>de</strong> <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> pesquisa e trabalho no Brasil.<br />

Acreditamos estar ocorrendo um avanço gradativo em relação à participação<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no ensino superior e isso implica no aumento <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> fazendo<br />

pesquisa 70 : Ristoff (2008) aponta que as <strong>mulheres</strong> representam a maioria <strong>das</strong><br />

70 Em relação ao número <strong>de</strong> matrículas em cursos <strong>de</strong> nível superior no Brasil, as matrículas femini<strong>na</strong>s<br />

são quase 56% em 2009. Os cursos mais procurados por elas são os Bacharelados (70%). INEP.<br />

Sinopses Estatísticas da Educação Superior – Graduação. Disponível em:<br />

Acesso em 20 fev. 2011.


85<br />

matrículas <strong>na</strong>quele nível <strong>de</strong> ensino, próximo <strong>de</strong> 56%, segundo dados do Censo 2006<br />

do Mec/Inep.<br />

é inescapável a observação <strong>de</strong> que a trajetória da mulher brasileira nos<br />

últimos séculos é, para dizer pouco, extraordinária: <strong>de</strong> <strong>uma</strong> educação no lar e<br />

para o lar, no período colonial, para <strong>uma</strong> participação tímida <strong>na</strong>s escolas<br />

públicas mistas do século 19; <strong>de</strong>pois, <strong>uma</strong> presença significativa <strong>na</strong> docência<br />

do ensino primário, seguida <strong>de</strong> <strong>uma</strong> presença hoje majoritária em todos os<br />

níveis <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>, bem como <strong>de</strong> <strong>uma</strong> expressiva participação <strong>na</strong><br />

docência da educação superior (RISTOFF, 2008, p. 27).<br />

Conforme veremos a seguir, o processo <strong>de</strong> acesso à escolarização e<br />

posteriormente aos cursos normais favoreceu um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> garotas em um<br />

curto período em relação à história da h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>; veremos também nos dados<br />

relativos à Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná, objeto <strong>de</strong> nosso estudo,<br />

quando abriu as portas ofertando níveis elementares <strong>de</strong> formação, que as<br />

professoras ou normalistas já estavam escrevendo sua história e a história da<br />

educação profissio<strong>na</strong>l no Brasil.<br />

Melo (2008) acredita que a universalização da educação abriu portas às<br />

<strong>mulheres</strong>, que se mantinham concentra<strong>das</strong> especialmente em alg<strong>uma</strong>s áreas.<br />

Segundo a autora, áreas como Engenharias, Matemática, Física (Ciências Exatas<br />

em geral), não são as mais favoráveis à participação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>. No entanto ela é<br />

otimista, afirmando que<br />

inegavelmente as <strong>mulheres</strong> estão presentes <strong>na</strong> produção do conhecimento<br />

no Brasil e, em certas áreas, como <strong>na</strong>s ciências h<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e sociais, a<br />

presença femini<strong>na</strong> é inequívoca e sua atuação expressiva [...] Mas é preciso<br />

lembrar que as <strong>mulheres</strong> ainda continuam sujeitas a padrões diferenciados<br />

por gênero <strong>na</strong> escolha <strong>de</strong> carreiras profissio<strong>na</strong>is próximas do estereótipo do<br />

ser mulher (MELO, 2008, p. 82. Grifos da autora.).<br />

As mudanças estão ocorrendo e isso representa um gran<strong>de</strong> passo para a<br />

diminuição <strong>das</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>s e para a <strong>de</strong>rrubada <strong>de</strong> pré-conceitos e estereótipos<br />

que mantiveram as <strong>mulheres</strong> durante tanto tempo em espaços reservados –<br />

exclu<strong>de</strong>ntes e <strong>de</strong>svalorizados.


86<br />

3.2.1 A educação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e para <strong>mulheres</strong><br />

Teóricos e teóricas nos contam como se <strong>de</strong>u o processo <strong>de</strong> acesso e<br />

aceitação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> escolarização para as <strong>mulheres</strong>. Muito do que se discutia a este<br />

respeito passava pelos padrões que guiavam as socieda<strong>de</strong>s oci<strong>de</strong>ntais.<br />

Importante <strong>de</strong>stacar a questão do sujeito do magistério, já que <strong>na</strong> sequência<br />

a feminização da função docente nos servirá <strong>de</strong> base para enten<strong>de</strong>r alguns<br />

processos.<br />

Louro (1997) bem lembra que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre, em território brasileiro, temos<br />

os homens no centro da docência; os jesuítas no século XVI se ocuparam <strong>de</strong>ssa<br />

ativida<strong>de</strong> com fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> específica. Cente<strong>na</strong>s <strong>de</strong> anos após esta primeira atuação<br />

masculi<strong>na</strong>, homens mantiveram-se à frente do magistério, no entanto, com a<br />

perspectiva que se apresentou pós In<strong>de</strong>pendência e Proclamação do país, as<br />

<strong>mulheres</strong> foram necessárias para ensi<strong>na</strong>r as meni<strong>na</strong>s 71 . No projeto <strong>de</strong><br />

industrialização pensado para o Brasil, educadores e educadoras teriam um papel<br />

fundamental, cada qual trabalhando com seu respectivo gênero. Mas antes <strong>de</strong><br />

pensarmos <strong>na</strong> educação feita por <strong>mulheres</strong>, temos <strong>de</strong> brevemente tratar da<br />

educação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

Em fi<strong>na</strong>is do século XIX eram exalta<strong>das</strong> as características exclusivamente<br />

femini<strong>na</strong>s para reforçar a <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> entre homens e <strong>mulheres</strong> – o <strong>de</strong>terminismo<br />

biológico ditava o que era pertinente a um ou outro sexo. Ainda assim viu-se que “o<br />

positivismo advogou a mesma instrução para homens e <strong>mulheres</strong>, embora seus<br />

a<strong>de</strong>ptos se manifestassem contrários à co-educação 72 ” (ALMEIDA, 1998, p. 19). No<br />

entanto, <strong>na</strong> mesma lógica que moldava a maioria <strong>das</strong> socieda<strong>de</strong>s oci<strong>de</strong>ntais, as<br />

<strong>mulheres</strong> tinham um tratamento diferenciado do dos homens, logo, a educação<br />

femini<strong>na</strong> tinha objetivos diferentes da educação masculi<strong>na</strong>. No geral tudo que se<br />

ensi<strong>na</strong>sse para elas <strong>de</strong>veria ser para aten<strong>de</strong>r a um objetivo maior: preparar a mulher<br />

para ser esposa e mãe.<br />

71 Louro (1997) vai dizer que “idéias positivistas e cientificistas” viam <strong>na</strong> mulher <strong>uma</strong> importante aliada<br />

para afastar a socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> concepções não científicas.<br />

72 A autora chamará coeducação a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> educar meninos e meni<strong>na</strong>s <strong>na</strong> mesma turma.


87<br />

Herança do pensamento português, no Brasil se disseminou a instrução <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong>, ora em sua própria casa, ora em instituições específicas, com vistas à<br />

criação dos filhos.<br />

Além <strong>das</strong> escolas básicas <strong>de</strong> instrução básica para as meni<strong>na</strong>s, <strong>de</strong>veria<br />

também haver <strong>uma</strong> saída para a profissio<strong>na</strong>lização femini<strong>na</strong>, representada<br />

por um trabalho que não atentasse contra as representações acerca <strong>de</strong> sua<br />

domesticida<strong>de</strong> e maternida<strong>de</strong> (ALMEIDA, 1998, p. 58-59).<br />

Nesse sentido as escolas normais surgiriam para aten<strong>de</strong>r a <strong>uma</strong><br />

necessida<strong>de</strong> e vários i<strong>de</strong>ais.<br />

À medida que as novas configurações sociais e econômicas favoreciam a<br />

abertura <strong>de</strong> novas áreas <strong>de</strong> atuação para os homens, as <strong>mulheres</strong> manifestaram<br />

maior interesse pelos cursos Normais, criados ainda no século XIX em várias<br />

províncias, com oferta <strong>de</strong> vagas para ambos os sexos.<br />

Inicialmente as escolas normais eram <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> aos homens (ALMEIDA,<br />

1998): em 1846 foi criada a primeira em São Paulo, somente um ano <strong>de</strong>pois foi<br />

criada a Escola Normal Femini<strong>na</strong> no Seminário <strong>das</strong> Educan<strong>das</strong>; conhecido por<br />

“Seminário do Acú”, ofertava um curso <strong>de</strong> dois anos ensi<strong>na</strong>ndo: Gramática<br />

Portuguesa, Aritmética, Doutri<strong>na</strong> Cristã, Língua Francesa e Música.<br />

Após alg<strong>uma</strong>s i<strong>das</strong> e vin<strong>das</strong> <strong>das</strong> primeiras instituições <strong>de</strong> ensino para o<br />

magistério, e após um período em que os números <strong>de</strong> homens matriculados e<br />

formados superavam o <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, após 1908 as Escolas Normais registraram um<br />

crescimento <strong>das</strong> matrículas femini<strong>na</strong>s. “A entrada <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s escolas normais<br />

e a feminização do magistério primário foi um fenômeno que aconteceu rapidamente<br />

e, em pouco tempo, eram elas a gran<strong>de</strong> maioria nesse nível <strong>de</strong> ensino” (ALMEIDA,<br />

1998, p. 62).<br />

Vale chamar atenção que, ainda que pareça <strong>na</strong>tural aos olhos atuais, houve<br />

muita resistência em relação ao processo que estava se configurando:<br />

A i<strong>de</strong>ntificação da mulher com a ativida<strong>de</strong> docente, que hoje parece a<br />

muitos tão <strong>na</strong>tural, era alvo <strong>de</strong> discussões, disputas e polêmicas. Para<br />

alguns parecia <strong>uma</strong> completa insensatez entregar às <strong>mulheres</strong> usualmente<br />

<strong>de</strong>sprepara<strong>das</strong>, portadoras <strong>de</strong> cérebros “pouco <strong>de</strong>senvolvidos” pelo seu<br />

“<strong>de</strong>suso” a educação <strong>das</strong> crianças (LOURO, 1997, p. 450. Grifo da autora.).


88<br />

Mas também houve <strong>de</strong>fesas favoráveis, pois as <strong>mulheres</strong> seriam<br />

“<strong>na</strong>turais educadoras”, portanto <strong>na</strong>da mais a<strong>de</strong>quado do que lhes confiar a<br />

educação escolar dos pequenos. [...] O argumento parecia perfeito: a<br />

docência não subverteria a função femini<strong>na</strong> fundamental, ao contrário,<br />

po<strong>de</strong>ria ampliá-la ou sublimá-la. Para tanto seria importante que o<br />

magistério fosse também representado como <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> amor, <strong>de</strong><br />

entrega e doação (LOURO, 1997, p. 450).<br />

Gay (1988, p. 135) diz que o magistério acaba se configurando <strong>uma</strong><br />

profissão femini<strong>na</strong> por excelência “quer pertencesse à classe operária ou à<br />

burguesia, as <strong>mulheres</strong> chegaram a engrossar as fileiras dos professores, sobretudo<br />

<strong>na</strong> escola primária”, mesmo porque “dar aulas era <strong>na</strong>turalmente <strong>uma</strong> escolha quase<br />

pre<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da”.<br />

No fi<strong>na</strong>l do século XIX começa a expansão <strong>das</strong> escolas primárias e<br />

secundárias, aumentando a <strong>de</strong>manda por novos profissio<strong>na</strong>is: as <strong>mulheres</strong> que até<br />

então se encontravam fora do mercado <strong>de</strong> trabalho assalariado tor<strong>na</strong>m-se peças<br />

chave nesta construção (GONÇALVES, 2006).<br />

Esta relação entre ativida<strong>de</strong> laboral e ser mãe satisfazia os interesses dos<br />

lí<strong>de</strong>res, que reconheciam a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no novo<br />

projeto <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização da socieda<strong>de</strong>. As <strong>mulheres</strong>, portanto, eram “convoca<strong>das</strong>”<br />

para participar <strong>de</strong>sse projeto, sendo as responsáveis por formar filhos – futuros<br />

lí<strong>de</strong>res <strong>de</strong>sse novo país. Para formar elas <strong>de</strong>veriam ser <strong>mulheres</strong> exemplares e,<br />

sobretudo, cristãs. Nessa lógica,<br />

A educação da mulher seria feita, portanto, para além <strong>de</strong>la, já que sua<br />

justificativa não se encontrava em seus próprios anseios ou necessida<strong>de</strong>s,<br />

mas em sua função social <strong>de</strong> educadora dos filhos ou, <strong>na</strong> linguagem<br />

republica<strong>na</strong>, <strong>na</strong> função <strong>de</strong> formadora dos futuros cidadãos (LOURO, 1997,<br />

p. 447).<br />

A partir <strong>de</strong>sse momento surge <strong>uma</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserção <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong><br />

n<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> que aos olhos da maioria não afligiria sua condição apropriada, pelo<br />

contrário, facilitaria que as <strong>mulheres</strong> aten<strong>de</strong>ssem seu <strong>de</strong>stino: ser mães e esposas<br />

<strong>de</strong>dica<strong>das</strong>, com um elemento a mais – elas saíam da ignorância.<br />

O magistério feminino e a feminização do magistério são assuntos bastante<br />

importantes se se consi<strong>de</strong>ra que isso possibilitou sua entrada em setores da<br />

socieda<strong>de</strong> até então inimagináveis.


89<br />

Ainda que relativo ao magistério <strong>na</strong> educação básica, e não trate com<br />

profundida<strong>de</strong> da educação profissio<strong>na</strong>l, a não ser a formação para o magistério,<br />

Almeida (1998) nos dá alg<strong>uma</strong>s pistas a respeito <strong>de</strong> um processo que até hoje<br />

ocorre <strong>de</strong> <strong>de</strong>svalorização do papel da mulher <strong>na</strong> função docente. Almeida afirma que<br />

a pretensa inferiorida<strong>de</strong> <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> relacio<strong>na</strong>da com as ativida<strong>de</strong>s por elas<br />

exerci<strong>das</strong> faz com que estas sejam vistas como áreas <strong>de</strong>sprivilegia<strong>das</strong>:<br />

A profissão do magistério que, a princípio, foi i<strong>de</strong>ologicamente vista como<br />

<strong>de</strong>ver sagrado e sacerdócio, [...] tornou-se, <strong>na</strong> segunda meta<strong>de</strong> do século<br />

XX, alvo <strong>das</strong> acusações e <strong>das</strong> <strong>de</strong>núncias <strong>de</strong> proletarização do magistério,<br />

ora colocando professores e professoras como vítimas do sistema, ora<br />

como responsáveis pelos problemas educacio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o momento <strong>de</strong> sua<br />

formação profissio<strong>na</strong>l. Ao incorporar que o magistério era um trabalho<br />

essencialmente feminino, essas mesmas teorias acabaram por promover<br />

distorções a<strong>na</strong>líticas quando alocaram no sexo do sujeito a <strong>de</strong>svalorização<br />

da profissão, o que foi, convenhamos, <strong>uma</strong> contribuição que acabou por se<br />

revelar também como um fator <strong>de</strong> discrimi<strong>na</strong>ção e “vitimização” da mulher<br />

(ALMEIDA, 1998, p. 20).<br />

Almeida se empenha por <strong>de</strong>monstrar com base <strong>na</strong> história do magistério que<br />

não foi o fato <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> tomarem este espaço <strong>de</strong> trabalho que o <strong>de</strong>svalorizou. O<br />

processo foi bem mais complexo.<br />

A cultura que se criou em torno da atuação <strong>de</strong> pessoas no magistério ainda<br />

no século XIX aponta para a generalizada concepção <strong>de</strong> que a formação não era<br />

condição sine qua non para o exercício do magistério. Unida à pouca estabilida<strong>de</strong> e<br />

regularida<strong>de</strong> <strong>das</strong> Escolas Normais cria<strong>das</strong> em quase todos os estados ainda<br />

<strong>na</strong>quele século, a não exigência <strong>de</strong> formação específica <strong>de</strong>squalificava a ativida<strong>de</strong><br />

docente (ROMANOWSKI, 2006). Além disso as instituições que necessitavam<br />

contratar docentes realizavam concursos para pessoas sem formação regular, ou<br />

nomeavam pessoas <strong>de</strong> prestígio <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong>, o que favorecia a <strong>de</strong>svalorização da<br />

ativida<strong>de</strong>.<br />

Por sua vez, “A feminização do magistério primário no Brasil aconteceu num<br />

momento em que o campo educacio<strong>na</strong>l se expandia em termos quantitativos”<br />

(ALMEIDA, 1998, p. 64.). Dois fatores <strong>de</strong>ram condições para que isso ocorresse: os<br />

professores estavam socialmente impedidos <strong>de</strong> educar as meni<strong>na</strong>s e a luta contra a<br />

coeducação.<br />

Rapidamente o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> cresceu por causa do argumento <strong>de</strong><br />

que elas teriam condições <strong>na</strong>turais <strong>de</strong> cuidar <strong>das</strong> crianças. Não obstante, não foi


90<br />

com o consentimento dos homens que isso se <strong>de</strong>u, pois muitos perdiam seus postos<br />

<strong>de</strong> trabalho com a entrada maciça <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

Alguns fatores são apresentados por Almeida (1998) para explicar a “saída”<br />

dos homens:<br />

A perda <strong>de</strong> prestígio;<br />

Abertura <strong>de</strong> novos postos <strong>de</strong> trabalho melhor remunerados;<br />

A (im)possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conciliação entre magistério e outras ativida<strong>de</strong>s, como<br />

medici<strong>na</strong>, por exemplo;<br />

A atribuição <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>s liga<strong>das</strong> à maternida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ixando a carreira<br />

“femini<strong>na</strong>”;<br />

Baixa remuneração (não significa que enquanto ocupada por eles, eles<br />

tenham sido bem remunerados; pelo contrário, a autora afirma que os salários<br />

sempre foram baixos).<br />

Graças ao interesse <strong>das</strong> autorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ensino e da militância ainda que<br />

tímida <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s feministas, a profissio<strong>na</strong>lização se <strong>de</strong>u e elas a cada dia se<br />

firmaram mais <strong>na</strong> docência.<br />

Almeida acrescenta que “a feminização do magistério foi um potencial <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong> libertação e não <strong>de</strong> submissão e <strong>de</strong>svalorização como se tem pretendido<br />

fazer acreditar” (ALMEIDA, 1998, p. 78).<br />

Po<strong>de</strong>-se dizer que atuar no magistério primário possibilitava às <strong>mulheres</strong> a<br />

inserção no espaço público e o não abandono do espaço privado. Para Almeida<br />

(1998) as <strong>mulheres</strong> se incluíam n<strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ologia da profissão que associava vocação<br />

e missão ao ser mulher/mãe, por se sentirem beneficia<strong>das</strong> nesta lógica <strong>de</strong><br />

manutenção <strong>de</strong> duas esferas <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r – da casa e da escola, e <strong>de</strong> libertação, por<br />

ser esta a única opção possível <strong>de</strong>ntro do contexto social que tinha no matrimônio a<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ção <strong>de</strong> seu futuro.<br />

O magistério seria o espaço profissio<strong>na</strong>l a<strong>de</strong>quado “ao que <strong>de</strong>las se<br />

esperava em termos sociais e àquilo <strong>de</strong> que realmente precisavam para ir ao<br />

encontro <strong>de</strong> um futuro com mais in<strong>de</strong>pendência e menos opressão” (ALMEIDA,<br />

1998, p. 74). Além disso,


91<br />

O magistério possibilitava <strong>uma</strong> inserção social mais ativa e as <strong>mulheres</strong><br />

po<strong>de</strong>riam exercer maior influência sendo professoras, havendo também a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> promover mudanças sociais, políticas e espirituais e<br />

veicular valores como <strong>uma</strong> maior igualda<strong>de</strong> social e sexual, a tolerância e a<br />

diminuição dos preconceitos, assim como a conversão religiosa entre os<br />

alunos e seus pais (ALMEIDA, 1998, p. 71).<br />

A ativida<strong>de</strong>, além <strong>de</strong> representar <strong>uma</strong> chance <strong>de</strong> alcançar o mesmo nível<br />

educacio<strong>na</strong>l dos homens, as favorecia em vários aspectos: possibilitava atuar em<br />

outra ativida<strong>de</strong> que não <strong>na</strong>s profissões menos valoriza<strong>das</strong> socialmente, como<br />

parteiras, costureiras etc., facilitava que elas saíssem <strong>de</strong>sacompanha<strong>das</strong>,<br />

adquirissem cultura e <strong>uma</strong> certa liberda<strong>de</strong> pessoal e autonomia fi<strong>na</strong>nceira.<br />

Num momento em que era totalmente aceito que <strong>mulheres</strong> pobres<br />

trabalhassem, às <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> posses (ou com um futuro garantido – o casamento)<br />

restaria exercer o magistério, consi<strong>de</strong>rada a profissão i<strong>de</strong>al, caso elas tivessem<br />

interesse <strong>de</strong> sair do espaço privado.<br />

O ponto <strong>de</strong> partida – ingresso no magistério primário – possibilitou a entrada,<br />

no secundário e superior, isso não sem a resistência por parte <strong>de</strong> alguns homens.<br />

O maior acesso à escolarização no século XIX possibilitou a tomada da<br />

ativida<strong>de</strong> por elas, <strong>de</strong>stacando que no fi<strong>na</strong>l do período o aumento gradativo <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> nos cursos normais já era tranquilamente compreendido, porém Almeida<br />

(1998) cita que, ainda que fossem a maioria, elas nunca chegavam aos mais altos<br />

graus da instituição escolar (cargos <strong>de</strong> chefia).<br />

Para a autora as <strong>mulheres</strong> tiveram a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserir-se n<strong>uma</strong><br />

ativida<strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>l e, com isso, tiveram oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alterar e ter sua realida<strong>de</strong><br />

alterada, já que “se a educação modifica a mulher, assim como todos os seres<br />

h<strong>uma</strong>nos, a mulher também modifica a educação escolarizada, enquanto sua<br />

principal veiculadora” (ALMEIDA, 1998, p. 21).<br />

Em relação a isso, Louro (2007) afirma que<br />

...ainda que as agentes do ensino possam ser <strong>mulheres</strong>, elas se ocupam <strong>de</strong><br />

um universo marcadamente masculino – não ape<strong>na</strong>s porque as diferentes<br />

discipli<strong>na</strong>s escolares se construíram pela ótica dos homens, mas porque a<br />

seleção, a produção e a transmissão dos conhecimentos (os programas, os<br />

livros, as estatísticas, os mapas; as questões, as hipóteses e os métodos <strong>de</strong><br />

investigação “científicos” e válidos; a linguagem e a forma <strong>de</strong> apresentação<br />

dos saberes) são masculinos (LOURO, 2007, p. 89).


92<br />

Além disso, cabe acrescentar que a pesquisa <strong>de</strong>senvolvida em 2009,<br />

intitulada Relações <strong>de</strong> gênero e po<strong>de</strong>r no cotidiano escolar <strong>na</strong> visão <strong>de</strong> docentes,<br />

funcionários e funcionárias da re<strong>de</strong> pública estadual <strong>de</strong> ensino no município <strong>de</strong><br />

Curitiba/PR: <strong>uma</strong> proposta para a conscientização (MUZI, 2010) aponta que homens<br />

e <strong>mulheres</strong> têm impreg<strong>na</strong>da a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que a escola é um espaço totalmente<br />

ocupado por <strong>mulheres</strong>, e atuam em funções como servente, professora, pedagoga.<br />

Já em relação a espaços consi<strong>de</strong>rados masculinos, elas e eles citaram as funções<br />

<strong>de</strong> direção e vice-direção como mais ocupa<strong>das</strong> por eles. Esses dados surgem em<br />

oposição à realida<strong>de</strong> da época: em 2009, <strong>na</strong> cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Curitiba a maioria dos cargos<br />

<strong>de</strong> direção eram ocupados por <strong>mulheres</strong>, além dos dois cargos máximos <strong>na</strong><br />

educação no estado do Paraná – <strong>de</strong> Secretária Estadual e Municipal <strong>de</strong> Educação.<br />

Já no âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, o Ministério da Educação (MEC) era composto por diversos<br />

cargos – chefe <strong>de</strong> gabinete, assessores, secretários. De um total <strong>de</strong> 31 (trinta e um)<br />

cargos no total, somente 11 (onze) eram ocupados por <strong>mulheres</strong>, 35%. E <strong>de</strong>stas 11<br />

<strong>mulheres</strong>, somente <strong>uma</strong> ocupava um cargo máximo (presi<strong>de</strong>nte do CNE – Conselho<br />

Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Educação). Além disso, à frente do Ministério, cargo maior, a mulher só<br />

vai aparecer nos últimos 30 anos: Esther <strong>de</strong> Figueiredo Ferraz ficou no cargo <strong>de</strong><br />

24/08/1982 a 15/03/1985; anterior e posterior a esta data não tivemos nenh<strong>uma</strong><br />

outra mulher como Ministra da Educação (MUZI, 2010).<br />

Para dar conta <strong>de</strong> perceber como as <strong>mulheres</strong> foram capazes <strong>de</strong> modificar a<br />

educação, Almeida (1998) apresenta dados <strong>de</strong> São Paulo, a respeito <strong>das</strong><br />

primeiras <strong>mulheres</strong>, as pioneiras da profissão que <strong>de</strong>safiaram estruturas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> social, que resistiram e acataram normatizações que as<br />

confi<strong>na</strong>vam e oprimiam, mas que também <strong>de</strong>ram os primeiros passos <strong>na</strong><br />

tentativa <strong>de</strong> conseguir algo mais do que aquilo que lhes concedia o po<strong>de</strong>r<br />

masculino (ALMEIDA, 1998, p. 22).<br />

Ainda que a profissão se caracterizasse como <strong>uma</strong> confirmação do que se<br />

entendia <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> como i<strong>de</strong>al para as <strong>mulheres</strong>, concretizado <strong>na</strong> função<br />

docente,<br />

esse foi o primeiro passo dado pelas <strong>mulheres</strong> no período [ela citava 1876<br />

quando se abriu a sessão femini<strong>na</strong> da Escola Normal no Seminário da<br />

Glória] a fim <strong>de</strong> adquirir alg<strong>uma</strong> instrução e conseguir o ingresso n<strong>uma</strong><br />

profissão. Isso não foi ape<strong>na</strong>s resultado <strong>de</strong> <strong>uma</strong> concessão masculi<strong>na</strong>, nem<br />

se veiculou sem estar impreg<strong>na</strong>do <strong>de</strong> preconceitos ligados ao sexo, mas


93<br />

significou a oportunida<strong>de</strong> entrevista pelas jovens <strong>de</strong> conseguir maior<br />

liberda<strong>de</strong> e autonomia, num mundo que se transformava e no qual queriam<br />

ocupar um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do espaço que não ape<strong>na</strong>s o que lhes foi reservado<br />

pela socieda<strong>de</strong> masculi<strong>na</strong> e representado pela vida no lar, <strong>de</strong>dicando-se<br />

inteiramente à família (ALMEIDA, 1998, p. 23. Grifos nossos.).<br />

Ela acrescenta portanto que o magistério foi durante muito tempo a única<br />

profissão que aceitou as <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> maneira não estigmatizada, e facilmente se<br />

feminizou justamente por isso; se <strong>na</strong>s outras elas não eram aceitas, as que queriam<br />

um trabalho formal buscaram os cursos normais.<br />

Antes do século XX o que se acreditava era que a educação po<strong>de</strong>ria<br />

contami<strong>na</strong>r a alma pura femini<strong>na</strong>; com a luta dos movimentos feministas <strong>na</strong> América<br />

do Norte e Europa essa visão foi sendo abando<strong>na</strong>da. Ao lado <strong>de</strong> um discurso que<br />

agora aceitava a educação femini<strong>na</strong> como um<br />

verda<strong>de</strong>iro benefício para a socieda<strong>de</strong> e para a vida em família, o<br />

movimento, li<strong>de</strong>rado por <strong>mulheres</strong> pertencentes a <strong>uma</strong> elite intelectual e<br />

econômica, revelou um raro sentido <strong>de</strong> argúcia e sensatez ao buscar a<br />

cooptação e o consentimento, como aconteceu, por exemplo, no Brasil e em<br />

Portugal, em vez da revolta <strong>de</strong>clarada, como <strong>na</strong> Inglaterra e nos Estados<br />

Unidos (ALMEIDA, 1998, p. 34).<br />

Entretanto, nem tudo significou ganhos gratuitos às <strong>mulheres</strong>:<br />

a educação e a profissio<strong>na</strong>lização que acabaram por ser conquista<strong>das</strong>,<br />

embora parcialmente porque restritas a <strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong> profissões, revelaramse<br />

como mais um mecanismo <strong>de</strong> opressão. À medida que a educação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> possibilitou conservar nos lares, <strong>na</strong>s escolas e <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> a<br />

hegemonia masculi<strong>na</strong>, esta foi <strong>uma</strong> faca <strong>de</strong> dois gumes: <strong>de</strong>tentores do<br />

po<strong>de</strong>r econômico e político, os homens apropriaram-se do controle<br />

educacio<strong>na</strong>l e passaram a ditar as regras e normatizações da instrução<br />

femini<strong>na</strong> e limitar seu ingresso em profissões por eles <strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong><br />

(ALMEIDA, 1998, p. 35).<br />

o controle.<br />

Isso significa que as regras eram dita<strong>das</strong> pelos homens <strong>de</strong> maneira a manter<br />

Para viabilizar esse po<strong>de</strong>r <strong>na</strong> educação escolar, [os homens] elaboraram<br />

leis e <strong>de</strong>cretos, criaram escolas e liceus femininos, compuseram seus<br />

currículos e programas, escreveram a maioria dos livros didáticos e manuais<br />

escolares, habilitaram-se para a cátedra <strong>das</strong> discipli<strong>na</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> mais<br />

nobres e segregaram as professoras a “guetos femininos” como Economia<br />

Doméstica e Culinária, Etiqueta, Desenhos Artístico, Puericultura, Trabalhos<br />

Manuais, e assim por diante (ALMEIDA, 1998, p. 35. Grifos da autora.).


94<br />

É exatamente o que observamos <strong>na</strong> Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, atual<br />

Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> seus primeiros anos quando<br />

encontramos <strong>mulheres</strong> atuando nos níveis elementares <strong>de</strong> ensino. Por terem<br />

recebido <strong>uma</strong> educação restrita, elas não tinham qualificação necessária para<br />

atuarem em outras discipli<strong>na</strong>s, a não ser <strong>na</strong>s elementares. Percebemos um círculo<br />

vicioso: se não tinham a qualificação permaneciam segrega<strong>das</strong> a áreas liga<strong>das</strong> a<br />

suas características consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> <strong>na</strong>turais.<br />

E Almeida ainda chama atenção para o fato <strong>de</strong> que a ativida<strong>de</strong> não era<br />

estendida a to<strong>das</strong> as <strong>mulheres</strong>:<br />

Logicamente, isso estava restrito às <strong>mulheres</strong> <strong>das</strong> classes privilegia<strong>das</strong>.<br />

Para as <strong>mulheres</strong> do povo a ausência <strong>de</strong> instrução e o trabalho pela<br />

sobrevivência sempre foram <strong>uma</strong> dura realida<strong>de</strong>. O mesmo po<strong>de</strong> ser dito a<br />

respeito <strong>de</strong> raça e, para as <strong>mulheres</strong> negras, o estigma da escravidão<br />

perdurou por muito tempo, só lhes restando os trabalhos <strong>de</strong> nível inferior e a<br />

total ausência <strong>de</strong> instrução (ALMEIDA, 1998, p. 35).<br />

Ela afirma que as <strong>mulheres</strong> que ingressavam no magistério primário eram<br />

“notadamente da classe média que se alicerçava no panorama socioeconômico do<br />

país”; estas <strong>mulheres</strong> enxergaram<br />

A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aliar ao trabalho doméstico e à maternida<strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

profissão revestida <strong>de</strong> dignida<strong>de</strong> e prestígio social [o que] fez que “ser<br />

professora” se tor<strong>na</strong>sse extremamente popular entre as jovens e, se, a<br />

princípio, temia-se a mulher instruída, agora tal instrução passava a ser<br />

<strong>de</strong>sejável, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que normatizada e dirigida para não oferecer riscos sociais<br />

(ALMEIDA, 1998, p. 28).<br />

Portanto, o ingresso foi permitido para poucas e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que mantendo as<br />

“regras” sociais <strong>de</strong> não perturbar o andamento do que se entendia como a<strong>de</strong>quado<br />

para elas e mais ainda para manter a lógica <strong>de</strong>sejada. Porém a autora ressalta que<br />

em alguns casos, citando como exemplo a Escola Normal no Seminário da Glória,<br />

as matrículas eram <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> às órfãs e jovens pobres que precisavam do trabalho<br />

para sobreviver, já que não tinham como <strong>de</strong>stino certo o casamento como garantia<br />

<strong>de</strong> futuro (ALMEIDA, 1998).<br />

Não obstante muitas <strong>mulheres</strong> terem concordado com as condições, já que<br />

só a saída para o espaço público já era um gran<strong>de</strong> feito, muitas não se contentaram


95<br />

e aproveitaram ecos do exterior para reivindicar tudo aquilo que elas entendiam<br />

como direitos:<br />

O movimento feminista no Brasil, <strong>na</strong> virada do século [XX, primeira onda<br />

feminista], foi li<strong>de</strong>rado por <strong>uma</strong> elite femini<strong>na</strong> letrada, culta e <strong>de</strong> maior po<strong>de</strong>r<br />

econômico, que, a exemplo <strong>das</strong> suas iguais europeias e norte-america<strong>na</strong>s,<br />

não queria ficar ausente do processo histórico (ALMEIDA, 1998, p. 28)<br />

As manifestações aconteceram para que elas pu<strong>de</strong>ssem participar<br />

integralmente dos processos históricos.<br />

Com o movimento feminista e <strong>na</strong> esteira <strong>das</strong> reivindicações pelo voto, o que<br />

lhes possibilitaria maior atuação política e social, a domesticida<strong>de</strong> foi<br />

invadida e as <strong>mulheres</strong> passaram a atuar no espaço público e a exigir<br />

igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> direitos, <strong>de</strong> educação e profissio<strong>na</strong>lização (ALMEIDA, 1998, p.<br />

27).<br />

Vale lembrar que as <strong>mulheres</strong> são aceitas no processo por que passava o<br />

Brasil no início do século XX como agentes discipli<strong>na</strong>dores, contribuindo para educar<br />

os meninos pobres e transformá-los em corpos úteis; a mulher neste momento<br />

histórico foi consi<strong>de</strong>rada “regeneradora da socieda<strong>de</strong> e salvadora da pátria”, assim<br />

como pretendiam os lí<strong>de</strong>res e <strong>de</strong>fensores do i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> higienização da pátria, <strong>de</strong><br />

tor<strong>na</strong>r meninos pobres – os <strong>de</strong>svalidos – seres úteis ao novo i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> <strong>na</strong>ção<br />

(ALMEIDA, 1998).<br />

Não obstante esta abertura a <strong>uma</strong> profissio<strong>na</strong>lização, não se via o mesmo<br />

em outras áreas que não o magistério ou enfermagem. Nesse sentido é só<br />

atentarmos ao período em que iniciam os cursos consi<strong>de</strong>rados femininos <strong>na</strong>s<br />

próprias Escolas <strong>de</strong> Aprendizes, já transformados em Liceus Industriais, <strong>na</strong> década<br />

<strong>de</strong> 1930. A profissio<strong>na</strong>lização <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> acontece a passos lentos e, ainda que a<br />

primeira mulher tenha ingressado <strong>na</strong> universida<strong>de</strong> em 1887 73 , o real ingresso <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> tardou em acontecer, limitando ainda mais suas áreas <strong>de</strong> atuação<br />

profissio<strong>na</strong>l.<br />

Para concluir, Almeida amplia a discussão para a questão do trabalho<br />

feminino:<br />

73 Dom Pedro II, então Imperador do Brasil, permitiu em 1879 a entrada <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> em cursos<br />

superiores. A primeira mulher a ingressar <strong>na</strong> universida<strong>de</strong> no Brasil foi no estado da Bahia no ano <strong>de</strong><br />

1887, formando-se pela faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> medici<strong>na</strong> (BLAY e CONCEIÇÃO, 1991).


96<br />

O trabalho feminino, historicamente, tem sofrido pressões e tentativas <strong>de</strong><br />

controle i<strong>de</strong>ológico e econômico por parte do elemento masculino e <strong>das</strong><br />

instâncias sociais, como o têm apontado os pesquisadores e,<br />

principalmente, pesquisadoras <strong>de</strong> vários países. O trabalho docente<br />

feminino, além do processo regulador impingido pelo sistema capitalista,<br />

também encontra-se atrelado a esse mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> normatização exigido pelas<br />

regras masculi<strong>na</strong>s e é acentuado pelo controle que o sistema social<br />

preten<strong>de</strong> exercer sobre as <strong>mulheres</strong>, nesses mesmos planos. Além disso,<br />

não há como negar que os setores ocupacio<strong>na</strong>is com os menores salários<br />

são e sempre foram ocupados por <strong>mulheres</strong>, nos mais diversos países<br />

(ALMEIDA, 1998, p. 63. Grifo da autora).<br />

Ainda assim, para Almeida os aspectos positivos <strong>de</strong>vem ser exaltados:<br />

Entre <strong>mulheres</strong> e educação, o que sempre se esculpiu <strong>na</strong>s vi<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s<br />

foi um entrelaçamento <strong>de</strong> <strong>de</strong>stinos incorporando sujeitos históricos<br />

aspirando por um lugar próprio no tecido social e <strong>uma</strong> profissão que se<br />

adaptou perfeitamente àquilo que elas <strong>de</strong>sejavam, aliando ao <strong>de</strong>sempenho<br />

<strong>de</strong> um trabalho remunerado as aspirações h<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e afetivas que sempre<br />

lhes foram <strong>de</strong>fini<strong>das</strong> pela socieda<strong>de</strong> (ALMEIDA, 1998, p. 26).<br />

Para isso a autora acha fundamental o registro e a recuperação da trajetória<br />

<strong>das</strong> professoras que num dado momento histórico pu<strong>de</strong>ram marcar um espaço <strong>de</strong><br />

atuação que ainda hoje sofre alterações e muito provavelmente continuará sofrendo.


97<br />

4 ENSINO TÉCNICO, PROFISSIONAL E INDUSTRIAL: ANTECEDENTES DA<br />

CHAMADA EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA<br />

“Acompanhando a evolução <strong>das</strong> idéias filosóficas que têm presidido<br />

ao <strong>de</strong>senvolvimento do ensino <strong>de</strong> ofícios, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> suas origens,<br />

quando era olhado como humilhante e <strong>de</strong>sprezível, até aos dias <strong>de</strong><br />

hoje [época em que escrevia o livro], em que se encontra valorizado e<br />

em pé <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> com os outros ramos da educação, sente-se não<br />

terem ainda chegado ao seu término as transformações constantes<br />

por que tem passado, principalmente quando se leva em conta o fato<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>ver ele acompanhar as correntes econômicas e filosóficas<br />

próprias <strong>de</strong> um mundo, como o <strong>de</strong> hoje, em contínua e acelerada<br />

mutação.<br />

As novas diretrizes traça<strong>das</strong> para o ensino industrial <strong>de</strong>verão influir <strong>na</strong><br />

harmonia social do país, pois constituem um meio <strong>de</strong> miscige<strong>na</strong>ção<br />

<strong>de</strong> classes, um fator <strong>de</strong> equilíbrio <strong>das</strong> massas populares, <strong>uma</strong> força<br />

nova agindo no sentido <strong>de</strong> <strong>uma</strong> melhor compreensão entre os<br />

elementos da socieda<strong>de</strong>” (FONSECA,1986, p. 203, v. 3).<br />

Neste trabalho, nossa proposta é trazer dados a respeito <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> que<br />

participaram da construção da atual Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

Por isso, para a construção <strong>de</strong>sse capítulo é preciso lembrar que antes <strong>de</strong> se instituir<br />

como espaço on<strong>de</strong> se privilegia a chamada educação tecnológica, a Instituição teve<br />

seu início no contexto histórico que se convencionou chamar ensino industrial, e<br />

posteriormente técnico-profissio<strong>na</strong>l. Isso significou inúmeros contextos históricos e<br />

mudanças <strong>de</strong> filosofia inclusive, a<strong>na</strong>lisados por vários autores ao longo <strong>de</strong> mais <strong>de</strong><br />

meio século. O primeiro <strong>de</strong>les, Celso Suckow da Fonseca, será nossa principal<br />

referência e tentaremos a partir <strong>de</strong> seu texto a respeito da história do ensino<br />

industrial até a década <strong>de</strong> 1960 traçar um diálogo com outros pesquisadores que<br />

trataram do assunto, em consonância com nossos objetivos.<br />

Fonseca (1986, v. 1) justifica o <strong>de</strong>preciado tratamento histórico dado ao<br />

ensino industrial pelo fato <strong>de</strong><br />

terem sido índios e escravos os primeiros aprendizes <strong>de</strong> ofício [o que]<br />

marcou com um estigma <strong>de</strong> servidão o início do ensino industrial em nosso<br />

país. É que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então, habituou-se o povo <strong>de</strong> nossa terra a ver aquela<br />

forma <strong>de</strong> ensino como <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da somente a elementos <strong>das</strong> mais baixas<br />

categorias sociais (FONSECA, 1986, p. 22, v. 1).


98<br />

<br />

<br />

Junto a isso ele elencou outros fatores:<br />

Foram relegados aos escravos o trabalho pesado e as profissões manuais, o<br />

que não interessava aos trabalhadores livres, <strong>de</strong>vido ao baixo retorno salarial;<br />

A oferta <strong>de</strong> <strong>uma</strong> educação intelectual aos filhos dos colonos; caso estes<br />

apresentassem marcas em suas mãos <strong>de</strong> que algum dia <strong>de</strong>sempenharam<br />

ativida<strong>de</strong>s manuais, não assumiriam funções públicas.<br />

Fonseca (1986) ao fazer <strong>uma</strong> <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> como se constituiu a história do<br />

ensino industrial no país remonta aos primeiros anos <strong>de</strong> existência do Brasil, quando<br />

colônia. Para ele, se no período colonial foi ensi<strong>na</strong>do algum ofício aos índios pelos<br />

jesuítas foi <strong>de</strong>vido às necessida<strong>de</strong>s que se criavam e, nesse caso, os próprios<br />

padres se incumbiam <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r práticas como a <strong>de</strong> carpintaria e tecelagem, por<br />

exemplo. Entretanto o autor faz questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>stacar que esta não era a priorida<strong>de</strong><br />

da Companhia <strong>de</strong> Jesus; esta se voltava à formação intelectual <strong>das</strong> classes<br />

dirigentes, aos filhos dos colonos ou ainda daqueles que pretendiam seguir a vida<br />

religiosa. Aos índios comumente eram ensi<strong>na</strong><strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s manuais necessárias à<br />

sobrevivência. Santos (2003) e Cunha (2000), nesse sentido, também acreditam que<br />

é <strong>de</strong>ste período que se instala a cultura <strong>de</strong> <strong>de</strong>preciação <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s manuais.<br />

Em suas pesquisas sobre educação profissio<strong>na</strong>l em contextos distintos, ao<br />

fazer um levantamento a respeito do estado da arte no Brasil, Delmon<strong>de</strong>s (2006) e<br />

Mariano <strong>de</strong> Carvalho (2008) afirmam que a educação <strong>de</strong> ofícios 74 era dada aos<br />

escravos e índios, responsáveis pelo trabalho pesado; os filhos <strong>das</strong> elites<br />

<strong>de</strong>sprezavam os trabalhos manuais, eram educados basicamente para as ativida<strong>de</strong>s<br />

intelectuais.<br />

Delmon<strong>de</strong>s (2006) faz questão <strong>de</strong> frisar que diante <strong>de</strong>sse quadro se<br />

configurou a divisão entre trabalho intelectual, ofertado pelos padres jesuítas aos<br />

mais favorecidos, e trabalho manual, ensi<strong>na</strong>do e oportunizado aos índios. Para a<br />

autora,<br />

74 Mariano <strong>de</strong> Carvalho (2008) e Delmon<strong>de</strong>s (2006), assim como Cunha (2000; 2000a), preferem<br />

chamar o ensino <strong>de</strong>sse período como <strong>de</strong> ofícios; chamar-se-á ensino profissio<strong>na</strong>l a educação para o<br />

trabalho no período <strong>de</strong> industrialização do país, consi<strong>de</strong>rando os períodos anteriores como ensino <strong>de</strong><br />

ofícios. Nesse sentido, Delmon<strong>de</strong>s (2006) afirma que para recuperar os primórdios da educação<br />

profissio<strong>na</strong>l no Brasil é necessário enten<strong>de</strong>r como se davam as relações daquela com o modo <strong>de</strong><br />

produção capitalista <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o fi<strong>na</strong>l do séc. XIX, já que seria <strong>de</strong>sse período o surgimento <strong>de</strong>ssa<br />

modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino, ou pelo menos com esta nomenclatura.


99<br />

Essa dualida<strong>de</strong>, presente <strong>na</strong> educação brasileira <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início continua a<br />

permear o nosso sistema educacio<strong>na</strong>l refletindo não só o profundo abismo<br />

entre as classes sociais no Brasil, bem como, o conflito existente entre a<br />

baixa qualida<strong>de</strong> do ensino oferecido ao trabalhador e a educação reservada<br />

a <strong>uma</strong> elite que ocupará altos postos <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> (DELMONDES, 2006, p.<br />

63-64).<br />

Assim como Fonseca, Jussara Mariano <strong>de</strong> Carvalho (2008, p. 58) explica<br />

que no Brasil do período Colonial, os processos educativos em instituições já nos<br />

formatos escolares, “no que diz respeito à relação trabalho-educação seria, ape<strong>na</strong>s,<br />

<strong>uma</strong> formação não-sistematizada para o trabalho e um ensino <strong>de</strong> ofícios”.<br />

Surgem neste período as corporações <strong>de</strong> ofícios 75 que serviam para ensi<strong>na</strong>r<br />

somente um público seleto, o que significava que negros e mulatos não podiam<br />

participar (MARIANO DE CARVALHO, 2008). A maior exigência que se fazia era que<br />

o aprendiz po<strong>de</strong>ria exercer ofício após dar provas <strong>de</strong> habilitação via avaliação pelos<br />

pares. Segundo Fonseca (1986, v. 1), no entanto, não havia proibição para serem<br />

aprendizes, mas sim no caso <strong>de</strong> quererem exercer a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> juízes, que eram<br />

os responsáveis por avaliar os ofícios. Ele cita que só em casos excepcio<strong>na</strong>is se<br />

aceitou que um negro fosse juiz <strong>de</strong> ofício, e, neste caso, ainda assim, só teria direito<br />

a exami<strong>na</strong>r negros. Aos que vinham <strong>de</strong> fora tampouco era permitido o exercício <strong>de</strong><br />

qualquer profissão.<br />

Vale <strong>de</strong>stacar que, quando atendia aos interesses dos senhores <strong>de</strong><br />

escravos, estes recebiam ensi<strong>na</strong>mentos <strong>na</strong> maior parte <strong>das</strong> vezes <strong>de</strong> maneira<br />

compulsória – os ofícios eram ensi<strong>na</strong>dos aos negros, órfãos e <strong>de</strong>svalidos <strong>na</strong>s<br />

próprias instituições assistenciais on<strong>de</strong> ficavam.<br />

Entre fi<strong>na</strong>is do século XVI e início do XVIII <strong>de</strong>vido ao gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong><br />

engenhos instalando-se em vários estados e cida<strong>de</strong>s (São Vicente, Bahia,<br />

Per<strong>na</strong>mbuco, Rio <strong>de</strong> Janeiro e Mi<strong>na</strong>s Gerais) polarizava-se neles a aprendizagem <strong>de</strong><br />

75 Fonseca (1986) <strong>de</strong>staca que as Corporações <strong>de</strong> Ofícios <strong>de</strong>sse período funcio<strong>na</strong>vam tal qual as da<br />

Metrópole e <strong>de</strong> outros países europeus, origi<strong>na</strong><strong>das</strong> dos Colégios <strong>de</strong> Roma e <strong>das</strong> guil<strong>das</strong> germânicas<br />

e escandi<strong>na</strong>vas. Não sendo possível precisar o ano <strong>de</strong> início, ele nos dá o ano fim, 1824, com a<br />

Constituição outorgada por D. Pedro I, curiosamente 10 anos antes da extinção em Portugal.<br />

Conheci<strong>das</strong> também como “Ban<strong>de</strong>iras dos Ofícios” (o que significava que ninguém po<strong>de</strong>ria exercer<br />

ofício sem primeiro ser submetido a exames que comprovassem suas habilida<strong>de</strong>s), seguiam o padrão<br />

<strong>de</strong> composição europeu: mestres, oficiais e aprendizes. No Brasil as Corporações seguiam fielmente<br />

o “Livro dos Regimetos dos Officiaes mecanicos da mui nobre e sepre Leal cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Lixbôa”, que<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>vam quase como um código as questões trabalhistas e sociais (FONSECA, 1986. v. 1.<br />

Capítulo II, As corporações <strong>de</strong> ofícios, p. 24-72.).


100<br />

ofícios (FONSECA, 1986). Em torno <strong>das</strong> riquezas gera<strong>das</strong> pelos engenhos<br />

encontrávamos senhores <strong>de</strong> escravos cada vez mais ricos, os negros tendo o pleno<br />

exercício <strong>de</strong> todo ofício, como por exemplo da carpintaria e da mecânica, e os<br />

brancos <strong>de</strong>les afastados.<br />

Fonseca (1986, p. 79, v. 1) relata que com a <strong>de</strong>scoberta do ouro o cenário<br />

econômico muda e o do ensino profissio<strong>na</strong>l também: <strong>de</strong>vido às condições “Homens<br />

experimentados <strong>de</strong>veriam ensi<strong>na</strong>r aos aventureiros a melhor maneira <strong>de</strong> exami<strong>na</strong>r o<br />

metal e lavrar as mi<strong>na</strong>s”.<br />

Surgem então as Casas <strong>de</strong> Fundição e <strong>de</strong> Moeda (por volta <strong>de</strong> 1729 em<br />

Mi<strong>na</strong>s Gerais) e passa a ser necessário a cada dia qualificar mais pessoas para<br />

nelas atuarem. O ensino <strong>de</strong> ofício aqui mantinha semelhanças e diferenças em<br />

relação ao que acontecia até então. Nos mesmos mol<strong>de</strong>s como ocorria nos<br />

engenhos, o ensino <strong>na</strong>s Casas <strong>de</strong> Fundição e <strong>de</strong> Moeda acontece <strong>de</strong> maneira<br />

assistemática e sem método; entretanto, ao contrário daqueles, o ensino se dirigia<br />

somente a homens brancos, filhos <strong>de</strong> colonos ou <strong>de</strong> empregados da própria casa<br />

on<strong>de</strong> se trabalhava o ouro. Curiosamente nesse período vemos um distanciamento<br />

do i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> assistência a menores <strong>de</strong>svalidos. Após o período <strong>de</strong> formação, assim<br />

como já vimos em período anterior, os aprendizes prestavam provas práticas<br />

manuais para comprovar qualificação (FONSECA, 1986).<br />

Além <strong>das</strong> Casas da Moeda, Fonseca (1986) cita os Arse<strong>na</strong>is da Marinha<br />

como centros <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> ofícios. Os profissio<strong>na</strong>is que vinham da<br />

Metrópole para neles atuar formavam os seus aprendizes <strong>de</strong> ofício. Mas a <strong>de</strong>manda<br />

foi tanta que obrigou D. Maria I a expedir Carta <strong>de</strong> Lei em 1796 em que criava <strong>uma</strong><br />

nova modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> engenheiros e dois tipos <strong>de</strong> cursos, um para formar o novo<br />

Engenheiro Construtor e o outro para preparar mestres e contramestres.<br />

Detalhe para o fato <strong>de</strong> que todos os interessados eram aceitos nos Arse<strong>na</strong>is<br />

<strong>de</strong>vido à escassez <strong>de</strong> homens – brancos, portugueses, escravos trazidos por estes,<br />

escravos da Coroa, presos ou simplesmente <strong>de</strong>tidos.<br />

Fonseca reconhece a importância dos Arse<strong>na</strong>is para a transmissão <strong>de</strong><br />

conhecimentos, por haverem eles provocado <strong>na</strong>s autorida<strong>de</strong>s a preocupação em<br />

admitir aprendizes <strong>de</strong> ofícios, ainda que somente para receber conhecimentos<br />

práticos, alijados <strong>de</strong> conhecimento teórico.


101<br />

No início do século seguinte, 1808, foram abertos os portos ao comércio<br />

estrangeiro, o que <strong>de</strong>spertou o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> aprendizes portugueses que vinham em<br />

busca <strong>de</strong> trabalho. Ao mesmo tempo, Delmon<strong>de</strong>s (2006) cita que foi permitida a<br />

instalação <strong>de</strong> fábricas no Brasil e, com isso, D. João VI cria o Colégio <strong>de</strong> Fábricas,<br />

que passa a ser o primeiro estabelecimento criado pelo po<strong>de</strong>r público no país, com a<br />

fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> educar profissio<strong>na</strong>lmente artistas aprendizes.<br />

Fonseca faz questão <strong>de</strong> citar que o príncipe regente foi pessoa interessada<br />

em promover a preparação <strong>de</strong> artífices e via vários <strong>de</strong>cretos instituiu as condições<br />

<strong>de</strong> abertura, atuação e administração <strong>de</strong> centros para o ensino, ainda que fosse <strong>uma</strong><br />

fábrica, como foi o caso da Fábrica <strong>de</strong> Lapidação dos Diamantes, ou mesmo a Real<br />

Impressão (FONSECA, 1986, v. 1).<br />

Alguns anos mais tar<strong>de</strong> foram instalados nos Arse<strong>na</strong>is da Marinha do Brasil<br />

centros <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> ofícios, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do àqueles que fossem encontrados <strong>na</strong>s<br />

ruas, a todo aquele que não opusesse resistência ou ainda a presos que<br />

apresentassem condição física e mental <strong>de</strong> executar alg<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>l.<br />

Dentre as ativida<strong>de</strong>s ensi<strong>na</strong><strong>das</strong> estavam as <strong>de</strong> serralheiro, ferreiro e carpinteiro.<br />

Mariano <strong>de</strong> Carvalho (2008) cita alg<strong>uma</strong>s iniciativas no sentido <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

educação profissio<strong>na</strong>l sistematizada no período <strong>de</strong> passagem <strong>de</strong> Colônia a Império:<br />

em 1809, o Decreto do Príncipe Regente para a formação do colégio <strong>de</strong> fábricas e<br />

em 1816 a formação da Escola <strong>de</strong> Belas Artes propunha o ensino <strong>de</strong> ciências e<br />

<strong>de</strong>senho para ofícios mecânicos. Estas iniciativas eram direcio<strong>na</strong><strong>das</strong> à parcela da<br />

população que se submetia às ativida<strong>de</strong>s braçais e em especial aos órfãos e<br />

<strong>de</strong>svalidos <strong>das</strong> Santas Casas/Casa dos Expostos. A autora ressalta<br />

que tais iniciativas, além <strong>de</strong> marcarem o início <strong>de</strong> um caráter utilitarista para<br />

tal população, contavam com o objetivo principal da diminuição da<br />

crimi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> e da vagabundagem, ou seja, visavam à restauração da<br />

“or<strong>de</strong>m social” nos centros urbanos já existentes no país (MARIANO DE<br />

CARVALHO, 2008, p. 63).<br />

Importante ressaltar que estes mesmos i<strong>de</strong>ais aparecem em documentos do<br />

início do século XX, em especial no Decreto <strong>de</strong> criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes<br />

Artífices em 1909.


102<br />

Ainda no período imperial, Mariano <strong>de</strong> Carvalho (2008) cita a formação dos<br />

Liceus <strong>de</strong> Artes e Ofícios a partir <strong>de</strong> 1858, criados para aten<strong>de</strong>r também à camada<br />

média da socieda<strong>de</strong> e à elite.<br />

Ao fi<strong>na</strong>l do período imperial, com a aceleração da urbanização no su<strong>de</strong>ste,<br />

gerava-se um centro civilizado, para o qual <strong>uma</strong> imensa massa migratória começou<br />

a vir. Por essa ocasião, Mariano <strong>de</strong> Carvalho diz que<br />

já havia um discurso sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um ensino técnico/profissio<strong>na</strong>l,<br />

porém aliado à preocupação da elite (urba<strong>na</strong>) com a margi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> e com a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra. Dessa preocupação, <strong>na</strong>sceu a Escola dos<br />

Desvalidos, em 1874, que <strong>de</strong>u origem à escola profissio<strong>na</strong>l masculi<strong>na</strong>,<br />

associando, assim, ensino profissio<strong>na</strong>l à preservação da or<strong>de</strong>m social<br />

(afastamento dos <strong>de</strong>svalidos da margi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>) e à assistência. Nesse<br />

processo, formavam-se ainda poucas escolas agrícolas, em sua maioria<br />

inter<strong>na</strong>tos, pois abrigavam também alunos “carentes”... (MARIANO DE<br />

CARVALHO, 2008, p. 67)<br />

Destaque então para o fato <strong>de</strong> a República ter mantido o ensino <strong>de</strong> ofícios<br />

com a <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>ção aos pobres e <strong>de</strong>svalidos.<br />

Já no século XX o fato mais importante em relação à educação profissio<strong>na</strong>l<br />

citado pelos historiadores é necessariamente a criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes<br />

Artífices. Delmon<strong>de</strong>s (2006), ao refletir a respeito da oferta <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong> ofícios aos<br />

mais pobres ou menos favorecidos, <strong>de</strong>staca que a estes somente eram abertas a<br />

escola primária e a profissio<strong>na</strong>lizante, enquanto que à aristocracia era ofertado<br />

ensino que os preparasse para atuar nos altos postos sociais.<br />

Ao tratar da situação específica do ensino profissio<strong>na</strong>l no estado do Paraná,<br />

Fonseca (1986, v. 5), nos conta que não há muito o que retroce<strong>de</strong>r <strong>na</strong> história, já<br />

que até 1852 o estado pertencia a São Paulo. Ele recupera somente o período em<br />

que o Estado se tor<strong>na</strong> in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. Até o momento, não teria havido nenh<strong>uma</strong><br />

iniciativa no tocante à modalida<strong>de</strong> no Paraná.<br />

O autor acrescenta que pouco se tem registrado a respeito da condição do<br />

ensino profissio<strong>na</strong>l no estado do período monárquico (até 1889). Pelo que se sabe,<br />

por aqui, como em vários outros pontos, os ofícios eram ensi<strong>na</strong>dos nos próprios<br />

locais <strong>de</strong> trabalho, sem nenhum método ou orientação pedagógica, ape<strong>na</strong>s imitando<br />

as operações que o mestre ou o oficial executavam.<br />

Acredita-se que, embora autorida<strong>de</strong>s gover<strong>na</strong>mentais tenham sugerido a<br />

criação <strong>de</strong> liceus <strong>de</strong> ofícios e o estado inclusive ter à época um número razoável <strong>de</strong>


103<br />

indústrias instala<strong>das</strong> 76 , até a criação da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices não existia<br />

ensino profissio<strong>na</strong>l no Paraná.<br />

Em relação à Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do Paraná, Fonseca conta que<br />

a instituição logo conquistou respeito e se distinguiu <strong>das</strong> <strong>de</strong>mais por conquistar duas<br />

medalhas <strong>de</strong> ouro, <strong>uma</strong> <strong>de</strong> prata, <strong>uma</strong> <strong>de</strong> bronze e <strong>uma</strong> menção honrosa <strong>na</strong><br />

participação <strong>na</strong> gran<strong>de</strong> Exposição Inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Turim-Roma, em 1911, com<br />

trabalhos <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong> Sapataria, Selaria e Alfaiataria.<br />

Pelo fato <strong>de</strong> não aten<strong>de</strong>r às moças da capital, foi criada pelo governo<br />

estadual a Escola Profissio<strong>na</strong>l Femini<strong>na</strong> República Argenti<strong>na</strong> 77 , ofertando cursos <strong>de</strong><br />

Pintura, Desenho, Flores e Artes Aplica<strong>das</strong>, Corte, Costura, Ren<strong>das</strong> e Bordados<br />

(FONSECA, 1986).<br />

Nos anos que se seguiram outras instituições além <strong>das</strong> inúmeras Escolas do<br />

Se<strong>na</strong>i (década <strong>de</strong> 1940) fortaleceram o ensino profissio<strong>na</strong>l no estado, <strong>de</strong>ntre elas:<br />

Escola Profissio<strong>na</strong>l Cel. Tibúrcio Cavalcanti, em Ponta Grossa, em 1940;<br />

Escola Profissio<strong>na</strong>l Cel. Durival <strong>de</strong> Brito, em Curitiba, em 1944;<br />

Escola Técnica Para<strong>na</strong>ense, em Curitiba, em 1957;<br />

Centro <strong>de</strong> Pesquisas e Trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> Professores, <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong><br />

Curitiba (ETC), em 1957; e<br />

Instituto Politécnico Estadual, em Curitiba, em 1960 (FONSECA, 1986, v. 5).<br />

Enfim, po<strong>de</strong>-se dizer que a instituição que alcança o maior <strong>de</strong>staque e<br />

longevida<strong>de</strong> no estado foi a Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, da qual conheceremos a<br />

história no próximo capítulo.<br />

76 Segundo o primeiro censo <strong>de</strong> indústria, <strong>de</strong> 1907, no Paraná existiam 297 indústrias; em relação às<br />

22 unida<strong>de</strong>s da fe<strong>de</strong>ração, o estado ocupava a 5ª posição (FONSECA, 1986, v. 5).<br />

77 No site do Centro Estadual <strong>de</strong> Capacitação em Artes Guido Viaro <strong>de</strong>scobrimos que a instituição<br />

teve origem em 1886, via projeto aprovado <strong>de</strong> criação e funcio<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> <strong>uma</strong> Escola <strong>de</strong> Desenho e<br />

Pintura, e seu primeiro nome foi “Escola <strong>de</strong> Artes e Indústrias do Paraná”. Em 1917 passou a se<br />

chamar “Escola Profissio<strong>na</strong>l Femini<strong>na</strong>”. Só em 1933 recebe a <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ção “Escola Profissio<strong>na</strong>l<br />

Femini<strong>na</strong> República Argenti<strong>na</strong>” como home<strong>na</strong>gem do Interventor Manoel Ribas ao Cônsul da<br />

Argenti<strong>na</strong>, que estava em visita ao nosso Estado. Em <strong>de</strong>corrência da Lei 5.692/71, passou a “Escola<br />

Estadual Profissio<strong>na</strong>l República Argenti<strong>na</strong>”. Neste momento, os professores da Escola passaram a<br />

ministrar, também, aulas <strong>de</strong> Formação Especial aos alunos <strong>das</strong> Escolas Públicas centrais da cida<strong>de</strong>.<br />

E em 03 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1992, a escola é reestruturada para resgatar as origens como “Escola <strong>de</strong> Arte” e<br />

a partir <strong>de</strong> então leva em seu nome a home<strong>na</strong>gem a um importante artista para<strong>na</strong>ense. Disponível<br />

em: Acesso em: 3 jan. 2011.


104<br />

Além disso, em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, o <strong>de</strong>creto <strong>de</strong> criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong><br />

Aprendizes representou “o marco inicial <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s do governo fe<strong>de</strong>ral, no setor<br />

do ensino <strong>de</strong> ofícios” (GURSKY JR, 2000, p. 52).<br />

Em 1910, já estavam instala<strong>das</strong> 19 Escolas <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, mas,<br />

segundo Fonseca (1986), foi com eficiência consi<strong>de</strong>rada baixa que elas abriram e<br />

permaneceram por alguns anos, <strong>de</strong>vido a vários fatores, mas em especial <strong>de</strong>vido à<br />

falta <strong>de</strong> professores e <strong>de</strong> mestres especializados; para suprir a <strong>de</strong>manda os<br />

professores e professoras saíram dos quadros do ensino primário e os mestres<br />

vieram <strong>das</strong> fábricas ou ofici<strong>na</strong>s.<br />

Em relação à formação ou qualificação <strong>de</strong> professores para atuarem <strong>na</strong><br />

educação profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> 1500 ao ano 2000, Magela Neto (2002 78 ) diz que a questão<br />

foi <strong>de</strong>sprezada, e, quando houve tratamento promissor, ora não teve continuida<strong>de</strong>,<br />

como foi o caso da Escola Wenceslau Brás, fundada sob os auspícios <strong>de</strong>ste<br />

presi<strong>de</strong>nte que via nela um centro <strong>de</strong> formação para as novas escolas, ora se<br />

mostrou enfraquecido, <strong>de</strong>vido à frequente avaliação <strong>de</strong> que era <strong>de</strong>snecessária.<br />

Com a criação da Escola Wenceslau Brás em 1919 se pensou que o<br />

problema <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores estaria suprido, mas foi um engano como<br />

trataremos adiante.<br />

No Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, <strong>de</strong> 1932, <strong>uma</strong> atenção à<br />

questão:<br />

A preparação dos professores, como se vê, é tratada entre nós, <strong>de</strong> maneira<br />

diferente, quando não é inteiramente <strong>de</strong>scuidada, como se a função<br />

educacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> to<strong>das</strong> as funções públicas a mais importante, fosse a única<br />

para cujo exercício não houvesse necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer preparação<br />

profissio<strong>na</strong>l. 79<br />

Segundo Magela Neto (2002),<br />

78 Magela Neto, em seu livro Quinhentos anos <strong>de</strong> história do ensino técnico no Brasil: <strong>de</strong> 1500 a 2000<br />

se utiliza da análise dos eventos históricos ligados ao ensino técnico-profissio<strong>na</strong>lizante no Brasil<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Colônia até o ano 2000 para tratar da condição especificamente no estado <strong>de</strong> Mi<strong>na</strong>s Gerais.<br />

No entanto, po<strong>de</strong>mos utilizar seus dados para pensarmos a questão em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.<br />

79<br />

O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova<br />

(1932). Disponível em: Acesso em: 04 jan. 2011.


105<br />

Os po<strong>de</strong>res públicos não tinham campo on<strong>de</strong> recrutar pessoal<br />

experimentado. Os professores saíram dos quadros do ensino primário, não<br />

trazendo, por essa razão, nenh<strong>uma</strong> idéia do que necessitariam lecio<strong>na</strong>r no<br />

ensino profissio<strong>na</strong>l. Os mestres viriam <strong>das</strong> fábricas ou ofici<strong>na</strong>s e seriam<br />

homens sem a necessária base teórica, com capacida<strong>de</strong>, ape<strong>na</strong>s, <strong>de</strong><br />

transmitir a seus discípulos os conhecimentos empíricos que traziam<br />

(MAGELA NETO, 2002, p. 182).<br />

Apesar disso, Fonseca (1986, v. 3) reconhece o período como <strong>uma</strong> nova era<br />

<strong>na</strong> aprendizagem <strong>de</strong> ofícios no país. O autor nos apresenta um longo período <strong>de</strong><br />

análise nos cinco volumes <strong>de</strong> seu História do Ensino Industrial e em vários<br />

momentos ele aponta que “o maior entrave que o ensino industrial tem tido, através<br />

<strong>de</strong> toda a sua história, é sem dúvida, a falta <strong>de</strong> professorado”. E acrescenta:<br />

Des<strong>de</strong> os tempos do <strong>de</strong>scobrimento, quando os jesuítas ensi<strong>na</strong>vam aos<br />

silvícolas rudimentos <strong>de</strong> ofícios, até aos nossos dias, ainda o problema se<br />

apresenta em toda a sua plenitu<strong>de</strong>. [...] Nos primeiros tempos os<br />

professores teóricos não po<strong>de</strong>riam sair senão dos quadros do ensino<br />

primário, não tendo por essa razão nenh<strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ia do que necessitavam<br />

lecio<strong>na</strong>r no ensino profissio<strong>na</strong>l. E quanto aos que <strong>de</strong>viam ensi<strong>na</strong>r a parte<br />

prática, não havendo outras fontes on<strong>de</strong> ir buscá-los, seriam recrutados <strong>na</strong>s<br />

fábricas ou ofici<strong>na</strong>s, <strong>de</strong>ntre os operários mais hábeis, porém sem a<br />

necessária base teórica e que, evi<strong>de</strong>ntemente, por essa mesma razão, só<br />

po<strong>de</strong>riam transmitir a seus alunos os conhecimentos empíricos que<br />

possuíam (FONSECA, 1986, p. 115, v. 3).<br />

Em relação ao tema, Fonseca (1986) cita trecho da conferência <strong>de</strong> Horácio<br />

da Silveira: “Foi então preciso recorrer aos normalistas, que se lançaram ao<br />

trabalho, com <strong>uma</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adaptação e um senso <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> que<br />

nunca po<strong>de</strong>remos exaltar suficientemente” 80 . O que significa que a maneira<br />

encontrada para suprir a <strong>de</strong>manda docente foi recorrer a normalistas que, ainda que<br />

não tivessem condições teóricas para ensi<strong>na</strong>r ofício, tinham conhecimento<br />

pedagógico para atuar.<br />

Já <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início do século XX a contratação <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is <strong>de</strong> fora do país<br />

para suprir <strong>uma</strong> <strong>de</strong>manda específica que era atuar como mestres <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s foi<br />

prática comum. Machado (2010) relata que isso aconteceu <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1909, quando o<br />

próprio Lu<strong>de</strong>ritz ia recrutar profissio<strong>na</strong>is <strong>na</strong> Europa e nos Estados Unidos, até a<br />

década <strong>de</strong> 1940; dados <strong>de</strong> 1942 indicam que neste ano 29 técnicos <strong>de</strong>sembarcaram<br />

no Brasil para atuar <strong>na</strong> Escola Técnica Nacio<strong>na</strong>l <strong>na</strong> capital fe<strong>de</strong>ral.<br />

80 Trecho da conferência “O Ensino Industrial em São Paulo” apud FONSECA, 1986, p. 116, v. 3.


106<br />

No quadro político, com a primeira gran<strong>de</strong> guerra (1914), <strong>de</strong>vido à<br />

impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> importar, o Brasil se viu obrigado a produzir mais para subsistir e<br />

também para exportar. Com esta <strong>de</strong>manda, quase 6 mil empresas industriais<br />

surgem até 1919 (FONSECA, 1986, v. 1). Isso vai implicar necessariamente em<br />

contratação <strong>de</strong> mais operários melhores formados. A questão da educação<br />

profissio<strong>na</strong>l é revista e a ida<strong>de</strong> mínima para ingresso <strong>na</strong>s Escolas baixou para 10<br />

anos, além <strong>de</strong> terem sido criados cursos noturnos <strong>de</strong> aperfeiçoamento a todos os<br />

interessados 81 .<br />

O documento “Consolidação dos dispositivos concernentes às Escolas <strong>de</strong><br />

Aprendizes Artífices” <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1926 buscou: uniformizar os currículos,<br />

que até então eram <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos pelos seus respectivos diretores; regular os<br />

currículos dos cursos primário e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, que passavam a se constituir <strong>das</strong><br />

seguintes discipli<strong>na</strong>s: Português, Aritmética, Geometria Prática, Lições <strong>de</strong> Coisas,<br />

Desenho e Trabalhos Manuais, Caligrafia, Ginástica e Canto Coral, Corografia e<br />

História do Brasil, Instrução Moral e Cívica, Elementos <strong>de</strong> Álgebra, Noções <strong>de</strong><br />

Trigonometria, Rudimentos <strong>de</strong> Física e Química, Desenho Industrial e Tecnologia <strong>de</strong><br />

cada ofício (artigo 5º).<br />

Como se po<strong>de</strong> notar, o ensino técnico-profissio<strong>na</strong>l, no ramo industrial, foi<br />

objetivo <strong>de</strong> interesse dos po<strong>de</strong>res públicos somente <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> duas<br />

déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> implantação do regime republicano, quando se criaram as<br />

Escolas <strong>de</strong> Aprendizes e Artífices. Des<strong>de</strong> a fundação até o fi<strong>na</strong>l da década<br />

<strong>de</strong> 1920, estas instituições se <strong>de</strong>senvolveram e gran<strong>de</strong> parte do seu plano<br />

origi<strong>na</strong>l, foi alterado; todavia, conservaram as características assistenciais.<br />

As principais mudanças se fizeram, no nível da organização inter<strong>na</strong>; o<br />

currículo foi aperfeiçoado e ampliado, introduziu-se a aprendizagem dos<br />

ofícios correlativos, apareceram, mais <strong>de</strong>finidamente, as preocupações com<br />

o problema da orientação profissio<strong>na</strong>l, adotou-se o esquema da<br />

industrialização <strong>das</strong> escolas, aperfeiçoaram-se os recursos <strong>de</strong> recrutamento<br />

<strong>de</strong> pessoal técnico e assim por diante. São, sem dúvida, alterações<br />

importantes, principalmente quando se pensa que constituíram <strong>uma</strong><br />

resposta às questões propostas por <strong>uma</strong> ambiência histórica, existente ou<br />

<strong>de</strong>sejada (NAGLE, 1974, p. 172).<br />

O currículo apresentado pela Consolidação prenunciava a mudança do grau<br />

do ensino profissio<strong>na</strong>l, consi<strong>de</strong>rado até então como <strong>de</strong> grau primário;<br />

81 No caso <strong>de</strong> não serem alunos, <strong>de</strong>veriam ter mais <strong>de</strong> 16 anos, e serem preferencialmente<br />

<strong>de</strong>sfavorecidos <strong>de</strong> fortu<strong>na</strong>, como mandava o regulamento.


107<br />

...nota-se pelo currículo estabelecido pela Consolidação, <strong>uma</strong> tentativa<br />

inicial <strong>de</strong> elevação <strong>de</strong> nível <strong>de</strong>sse ramo <strong>de</strong> ensino, o que realmente viria<br />

acontecer alguns anos <strong>de</strong>pois, quando o ensino industrial passaria a ser<br />

consi<strong>de</strong>rado como <strong>de</strong> segundo grau, em paralelo com o ensino secundário<br />

(GURSKY JR, 2000, p. 59).<br />

Queluz (1998) a<strong>na</strong>lisa o ensino profissio<strong>na</strong>l no século XX no Brasil a partir<br />

do método <strong>de</strong> ensino utilizado. O primeiro adotado foi <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>do método intuitivo;<br />

recuperado e implantado pelo primeiro diretor da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do<br />

Paraná, professor Paulo Il<strong>de</strong>fonso d‟Assumpção, perdurou até a década <strong>de</strong> 1920,<br />

quando é implantado o segundo pelas mãos <strong>de</strong> João Lu<strong>de</strong>ritz, não sem sofrer<br />

resistência, especialmente por parte <strong>de</strong> Paulo Il<strong>de</strong>fonso.<br />

Embora quisessem se mostrar diferencia<strong>das</strong>, a conclusão a que chega<br />

Queluz (1998) é <strong>de</strong> que ambas as abordagens visavam basicamente aos mesmos<br />

fins: controle social, com vistas a aten<strong>de</strong>r <strong>uma</strong> necessida<strong>de</strong> dita social, e<br />

discipli<strong>na</strong>rização dos meninos pobres que <strong>na</strong> instituição a<strong>de</strong>ntravam.<br />

O autor fala <strong>de</strong> um entusiasmo que o país apresentava em relação à<br />

educação e às perspectivas trazi<strong>das</strong> por ela; aliada a <strong>uma</strong> necessida<strong>de</strong> notória <strong>de</strong><br />

industrialização e, para tanto, <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra, o ensino específico <strong>de</strong> e<br />

para “menores <strong>de</strong>svalidos”, transformando-os em trabalhadores, ganha <strong>de</strong>staque.<br />

Nesse cenário, Queluz <strong>de</strong>staca que a criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes em âmbito<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l foi o “primeiro projeto <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l efetivo relacio<strong>na</strong>do ao ensino profissio<strong>na</strong>l”<br />

(1998, p. 136), contribuindo com aqueles objetivos supracitados.<br />

Para, portanto, cumprir com os objetivos <strong>de</strong> maneira eficaz, era necessária a<br />

adoção <strong>de</strong> um método <strong>de</strong> ensino específico: Paulo Il<strong>de</strong>fonso adota o método intuitivo<br />

que trazia em sua essência que o ensino fosse público e a instrução fosse “o<br />

principal instrumento <strong>de</strong> docilização <strong>de</strong> corpos e mentes” (QUELUZ, 1998, p. 139).<br />

Vale dizer que a dificulda<strong>de</strong> em encontrar profissio<strong>na</strong>is para atuarem como<br />

docentes foi preocupação constante do então diretor.<br />

Por não ser <strong>uma</strong> preocupação regio<strong>na</strong>l, para suprir esta falta, em primeira<br />

instância, o governo fe<strong>de</strong>ral criou em 11 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1919 a Escola Wenceslau<br />

Brás no Rio <strong>de</strong> Janeiro. Com o objetivo <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores, perdurou com<br />

dificulda<strong>de</strong> até 1937, <strong>de</strong>ixando um “buraco” em relação à questão da formação <strong>de</strong><br />

professores, se se consi<strong>de</strong>ra que a Comissão Brasileiro-America<strong>na</strong> Industrial,


108<br />

CBAI, 82 entrará em funcio<strong>na</strong>mento somente em 1946. O fato é que <strong>de</strong> acordo com<br />

registros da época, Queluz conclui que o problema persistiu ainda <strong>de</strong>pois da criação<br />

<strong>de</strong>ssas entida<strong>de</strong>s.<br />

Ao <strong>de</strong>screver a realida<strong>de</strong> da época em relação aos profissio<strong>na</strong>is docentes,<br />

Queluz (1998) cita como problemas enfrentados pela direção:<br />

o <strong>de</strong>spreparo <strong>de</strong> seus mestres e contramestres para o ensino, com precária<br />

formação escolar e conhecimento puramente prático, em contradição com a<br />

qualificada equipe <strong>de</strong> professores do ensino elementar, geralmente jovens<br />

advindos <strong>das</strong> elites locais, como os bacharéis Rubens Klier d‟Assumpção,<br />

Cyro Silva e Leocádio Ferreira e normalistas. Situação que era agravada<br />

pela precarieda<strong>de</strong> do funcio<strong>na</strong>mento <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s, excesso <strong>de</strong> trabalho e<br />

baixos salários, além <strong>de</strong> procedimentos pouco mo<strong>de</strong>rnos dos mestres para<br />

discipli<strong>na</strong>r os aprendizes, como a palmatória e a pura brutalida<strong>de</strong>. [...] Além<br />

disto, a relação amigável entre professores <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s e da área geral<br />

esteve quase sempre longe <strong>de</strong> existir... (QUELUZ, 1998, p. 143)<br />

Alg<strong>uma</strong>s tentativas frustra<strong>das</strong> <strong>de</strong> empenho pela formação <strong>de</strong> professores e<br />

professoras do período cita<strong>das</strong> por Fonseca (1986, v. 3) são: em 1920 houve <strong>uma</strong><br />

tentativa <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> 4 Escolas Normais para suprir a falta <strong>de</strong> professorado;<br />

amplamente embasado e justificado, o projeto não foi aprovado <strong>na</strong> Câmara e,<br />

portanto, não saiu do papel. João Lu<strong>de</strong>ritz incluiu em seu Projeto <strong>de</strong> Regulamento<br />

para o Ensino Profissio<strong>na</strong>l Técnico a transformação dos Institutos Parobé, em Porto<br />

Alegre, e Lauro Sodré, no Belém do Pará, em Escolas Normais <strong>de</strong> Artes e Ofícios,<br />

porém o projeto nunca foi aprovado.<br />

Em relação à Escola Normal <strong>de</strong> Artes e Ofícios Wenceslau Brás, ela foi<br />

criada<br />

com o intuito <strong>de</strong> preparar professores, mestres e contramestres para os<br />

institutos e escolas profissio<strong>na</strong>is, assim como professores <strong>de</strong> trabalhos<br />

manuais para as escolas primárias da Prefeitura do Distrito Fe<strong>de</strong>ral. [...] O<br />

problema da falta <strong>de</strong> professorado para as escolas <strong>de</strong> aprendizes artífices<br />

era, porém, <strong>de</strong> caráter <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l (FONSECA, 1986, p. 122-123, v. 3).<br />

Nesse caso foi feita a transferência <strong>de</strong> controle da instituição da prefeitura<br />

para a União. Quando <strong>de</strong> sua criação havia duas seções: <strong>uma</strong> masculi<strong>na</strong> e <strong>uma</strong><br />

femini<strong>na</strong>, mas esta nunca foi posta em funcio<strong>na</strong>mento. Entretanto quando da<br />

82 Trataremos adiante do contexto <strong>de</strong> criação da CBAI e a importância para o processo <strong>de</strong> formação e<br />

qualificação docente.


109<br />

ocasião da mudança o diretor da Escola, professor Corinto da Fonseca, propôs ao<br />

Ministro da Agricultura que a formação em trabalhos manuais fosse aberta ao<br />

público feminino.<br />

A Escola, até 1921, fora exclusivamente masculi<strong>na</strong>, porém, em 28 <strong>de</strong><br />

outubro <strong>de</strong> 1921, por Aviso n. 163, o Ministro da Agricultura autorizava o<br />

diretor a criar <strong>uma</strong> Secção <strong>de</strong> Pren<strong>das</strong> e Economia Doméstica, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da ao<br />

sexo feminino. E em novembro do mesmo ano começavam a funcio<strong>na</strong>r as<br />

ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong> Bordados, Costura e Flores Artificiais (FONSECA, 1986, p. 124,<br />

v. 3).<br />

<br />

<br />

<br />

A Escola oferecia os seguintes cursos:<br />

Cursos profissio<strong>na</strong>is: trabalhos em ma<strong>de</strong>ira, metal e alve<strong>na</strong>ria, com a duração<br />

<strong>de</strong> 4 anos, ou 8 períodos, acompanhados <strong>de</strong> um curso <strong>de</strong> adaptação 83 ;<br />

Curso <strong>de</strong> trabalhos manuais: compreendia o ensino <strong>de</strong> trabalho em papel e<br />

cartão, ma<strong>de</strong>ira, palha, vime e bambu, arame, couro, argila plástica, além <strong>de</strong><br />

trabalhos <strong>de</strong> jardi<strong>na</strong>gem, horticultura e pomicultura;<br />

Curso <strong>de</strong> adaptação: <strong>de</strong>veriam acompanhar exclusivamente os cursos<br />

profissio<strong>na</strong>is e os <strong>de</strong> trabalhos manuais. Para os profissio<strong>na</strong>is, seriam<br />

ministra<strong>das</strong> as seguintes discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> adaptação: Desenho, Mo<strong>de</strong>lagem,<br />

Tecnologia e Mecânica Industrial, Português e Educação Cívica, Pedagogia<br />

relativa aos ofícios do curso, Geografia Industrial e História <strong>das</strong> Indústrias,<br />

Matemática aplicada às Indústrias, Física com <strong>de</strong>senvolvimento quanto à<br />

Eletricida<strong>de</strong>, História Natural, Química Industrial e Contabilida<strong>de</strong> Industrial. Já<br />

para os <strong>de</strong> trabalhos manuais as discipli<strong>na</strong>s eram Desenho, Mo<strong>de</strong>lagem,<br />

Português e Educação Cívica, Pedagogia relativa ao objeto do curso,<br />

Matemática aplicada ao objeto do curso, Física e História Natural (FONSECA,<br />

1986, p. 119-120, v. 3).<br />

Po<strong>de</strong>-se atentar ao fato <strong>de</strong> que exceto pelas ativida<strong>de</strong>s artesa<strong>na</strong>is que<br />

envolvem o curso <strong>de</strong> trabalhos manuais, os cursos profissio<strong>na</strong>is, bem como seu<br />

respectivo curso <strong>de</strong> adaptação, trazem discipli<strong>na</strong>s ou áreas do conhecimento<br />

historicamente ocupa<strong>das</strong> ou exerci<strong>das</strong> por homens.<br />

83 Caso fosse <strong>de</strong> interesse do prefeito, po<strong>de</strong>riam acontecer também cursos profissio<strong>na</strong>is <strong>de</strong> cerâmica,<br />

<strong>de</strong> trabalhos em couro, <strong>de</strong> fiação e tecelagem, <strong>de</strong> artes gráficas e outros consi<strong>de</strong>rados necessários<br />

(FONSECA, 1986).


110<br />

Um novo regimento interno é instituído <strong>na</strong> Escola em 1924 e com ele se<br />

extinguia a oferta <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> contramestres e professores <strong>de</strong> trabalhos<br />

manuais; agora o preparo ficava exclusivo a professores e mestres para as escolas<br />

profissio<strong>na</strong>is da União (FONSECA, 1986, v. 3).<br />

Com o novo regimento, o curso passou a ser composto <strong>de</strong> 6 anos <strong>de</strong><br />

formação, com discipli<strong>na</strong>s em comum a todos os cursos. Porém houve a<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ção <strong>de</strong> que “As alu<strong>na</strong>s, nos dois primeiros anos, cursariam as ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong><br />

Ofici<strong>na</strong> Doméstica e Costura, tendo o resto do curso para especializar-se <strong>na</strong>quilo<br />

que houvessem escolhido”. Os alunos, por sua vez, <strong>de</strong>veriam frequentar “as ofici<strong>na</strong>s<br />

<strong>de</strong> Trabalhos em Ma<strong>de</strong>ira e Metal, nos dois primeiros anos, especializando-se no<br />

curso escolhido, nos anos restantes” (FONSECA, 1986, p. 126, v. 3).<br />

Fonseca faz questão <strong>de</strong> apontar que a Escola Wenceslau Brás foi muito<br />

criticada. Para ele isso se <strong>de</strong>u porque, apesar <strong>de</strong> ter um corpo docente respeitado,<br />

sua fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> estaria sendo <strong>de</strong>turpada, pois<br />

Fora fundada principalmente para formar mestres para as ofici<strong>na</strong>s escolares<br />

e tinha <strong>uma</strong> maioria <strong>de</strong> moças, estudando Datilografia e Estenografia, com o<br />

objetivo <strong>de</strong> obter diplomas <strong>de</strong> contador, ou se preparando para lecio<strong>na</strong>r<br />

Costura e Bordados. Não era propriamente isto que o país esperava, mas<br />

sim a formação <strong>de</strong> homens que estivessem à altura <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r Mecânica,<br />

Eletricida<strong>de</strong>, Serralheria, Fundição, Marce<strong>na</strong>ria, Carpintaria, etc., enfim, <strong>de</strong><br />

homens que pu<strong>de</strong>ssem fazer <strong>de</strong> seus alunos verda<strong>de</strong>iros artífices para a<br />

indústria <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Daí a cele<strong>uma</strong> contra a Escola (FONSECA, 1986, p. 132-<br />

133, v. 3).<br />

Na opinião do autor, a <strong>de</strong>turpação dos objetivos primeiros da Escola <strong>de</strong><br />

Formação <strong>de</strong>u origem às críticas contra ela – sua fala indica o preconceito que muito<br />

provavelmente fazia parte da socieda<strong>de</strong> daquele período em relação aos ofícios<br />

femininos, ou, à oferta <strong>de</strong> formação para <strong>mulheres</strong>. “Não era propriamente isto que o<br />

país esperava” é <strong>uma</strong> frase que po<strong>de</strong> ilustrar a opinião <strong>de</strong> muitos, verbalizada pelo<br />

autor. Este posicio<strong>na</strong>mento diz respeito ao entendimento do que era necessário<br />

ensi<strong>na</strong>r <strong>na</strong>s escolas profissio<strong>na</strong>is do período; Mecânica, Eletricida<strong>de</strong>, Serralheria,<br />

enfim, eram áreas <strong>de</strong> interesse, por isso, ao se ter <strong>uma</strong> instituição formadora <strong>de</strong><br />

professores atuando em outras frentes – formando professoras para ensi<strong>na</strong>r<br />

Costuras e Bordados – têm-se <strong>uma</strong> situação que para muitos <strong>de</strong>monstra<br />

<strong>de</strong>sperdício, já que era premente o objetivo <strong>de</strong> formar artífices para a <strong>na</strong>ção. As<br />

críticas do autor não aparecem somente neste trecho.


111<br />

Por portaria <strong>de</strong> 1926 alg<strong>uma</strong>s mudanças foram implanta<strong>das</strong> <strong>na</strong> Escola,<br />

<strong>de</strong>ntre elas a inclusão <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s discipli<strong>na</strong>s, como Fisiologia, Psicologia, Noções<br />

<strong>de</strong> Direito, Canto, Música e Educação Física, e a junção dos cursos <strong>de</strong> Costura e<br />

Chapéus em um só, chamado curso <strong>de</strong> Mo<strong>das</strong> (FONSECA, 1986, v. 3).<br />

Fonseca ainda acrescenta:<br />

A Venceslau Brás teve sempre prepon<strong>de</strong>rância do elemento feminino entre<br />

seus alunos matriculados, o que, <strong>de</strong> certa forma, prejudicou o principal fim<br />

colimado, que era a formação <strong>de</strong> mestres para o ensino profissio<strong>na</strong>l.<br />

Realmente era muito mais necessário às várias escolas on<strong>de</strong> se aprendiam<br />

ofícios o preparo <strong>de</strong> pessoal capaz <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r trabalhos em ma<strong>de</strong>ira, em<br />

metal, ou eletricida<strong>de</strong>, do que a formação <strong>de</strong> professores <strong>de</strong> Datilografia,<br />

Estenografia, Mo<strong>das</strong> ou Economia Doméstica. E as moças que se<br />

matriculavam procuravam sempre <strong>uma</strong> <strong>de</strong>ssas últimas especialida<strong>de</strong>s<br />

(FONSECA, 1986, p. 135-136, v. 3).<br />

Conforme alertamos, em mais um trecho o autor trata <strong>de</strong> justificar os maus<br />

momentos da Escola por conta da prepon<strong>de</strong>rância “do elemento feminino” no corpo<br />

discente. Ao contrário do trecho anterior, neste ele atenta para <strong>uma</strong> situação que<br />

po<strong>de</strong> ser problematizada: “...as moças que se matriculavam procuravam sempre<br />

<strong>uma</strong> <strong>de</strong>ssas últimas especialida<strong>de</strong>s”, que eram, segundo ele, Datilografia,<br />

Estenografia, Mo<strong>das</strong> ou Economia Doméstica. Estas informações apontam para <strong>uma</strong><br />

tendência seguida pelas moças que buscavam a Wenceslau Brás – as áreas <strong>de</strong><br />

interesse eram aquelas que as levariam a ativida<strong>de</strong>s “convencio<strong>na</strong>is”, ou seja,<br />

liga<strong>das</strong> historicamente ao feminino. Trata-se explicitamente <strong>de</strong> <strong>uma</strong> divisão sexual<br />

<strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong> campos do saber.<br />

Fonseca (1986) apresenta um quadro em que expressa o movimento <strong>de</strong><br />

matrículas e diplomados <strong>de</strong>sagregado por sexo no período <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento da<br />

Escola Wenceslau Brás (tabela 3):


112<br />

Tabela 3 – Movimento <strong>de</strong> matrículas, separa<strong>das</strong><br />

por sexo, e <strong>de</strong> diplomados, ano a ano, da<br />

Escola Wenceslau Brás<br />

Anos Matrículas Diplomados<br />

Sexo<br />

masc.<br />

Sexo<br />

fem.<br />

Total<br />

Sexo<br />

masc.<br />

Sexo<br />

fem.<br />

1918 - - - - - -<br />

1919 60 62 122 - - -<br />

1920 69 106 175 - - -<br />

1921 67 154 221 - - -<br />

1922 60 200 260 - - -<br />

1923 24 196 220 7 10 17<br />

1924 26 204 230 - 15 15<br />

1925 23 166 189 2 22 24<br />

1926 42 215 257 - - -<br />

1927 49 256 305 2 3 5<br />

1928 72 276 348 - 16 16<br />

1929 105 343 448 2 23 25<br />

1930 148 311 459 1 27 28<br />

1931 119 257 376 4 19 23<br />

1932 116 267 383 13 59 72<br />

1933 120 228 348 7 15 22<br />

1934 94 213 307 9 46 55<br />

1935 76 164 240 12 49 61<br />

1936 81 123 204 13 5 18<br />

1937 59 140 199 - - -<br />

Total<br />

Totais 72 309 381<br />

Fonte: FONSECA, 1986, p. 136, v. 3.<br />

Conforme se po<strong>de</strong> notar <strong>na</strong> tabela 3, o número <strong>de</strong> matrículas é muito<br />

superior ao número <strong>de</strong> diplomados, e o número <strong>de</strong> matrículas femini<strong>na</strong>s é muito<br />

maior do que o <strong>de</strong> masculi<strong>na</strong>s. Embora se perceba que o número <strong>de</strong> concluintes é<br />

pequeno em relação ao montante no período total, isso representou um momento<br />

em que as <strong>mulheres</strong> tivessem acesso à formação para atuar <strong>na</strong> educação<br />

profissio<strong>na</strong>l, ainda que fossem em áreas consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s.<br />

A Escola fechou as portas em 11 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1937 para dar lugar à Escola<br />

Técnica Nacio<strong>na</strong>l, que também foi pensada para formar professores; para tanto seria<br />

seguido o <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do pela Lei Orgânica <strong>de</strong> 1942, que instituiu o Ensino<br />

Pedagógico, que abrangia dois cursos: o <strong>de</strong> Didática e o <strong>de</strong> Administração do


113<br />

Ensino Industrial. Entretanto, somente em 1952 funcionou um curso pedagógico <strong>na</strong><br />

Escola Nacio<strong>na</strong>l, ficando o país, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o fechamento da Escola Wenceslau Brás até<br />

esta data sem amparo no ponto mais crítico do ensino industrial.<br />

Em relação aos i<strong>de</strong>ais propostos para a educação, é importante <strong>de</strong>stacar<br />

que <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1920 surgem as reformas educacio<strong>na</strong>is que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m a<br />

racio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> da fábrica como mo<strong>de</strong>lo para a organização da socieda<strong>de</strong>, ou melhor,<br />

Defen<strong>de</strong>m um discurso científico para a educação, enfatizando os “aspectos<br />

técnicos e metodológicos, isto é, os meios tidos como racio<strong>na</strong>is e<br />

científicos”, a revisão dos programas <strong>de</strong> ensino, o laicismo, a co-educação<br />

dos sexos, a educação pública e gratuita, a orientação profissio<strong>na</strong>l, os<br />

testes <strong>de</strong> aptidões, rapi<strong>de</strong>z, precisão e maximização dos resultados<br />

escolares (MONARCHA, 1989 apud QUELUZ, 1998, p. 146).<br />

Um dos Relatórios do Ministério da Agricultura <strong>de</strong>staca a importância por<br />

formar <strong>de</strong>ntro do próprio país a mão-<strong>de</strong>-obra necessária para a indústria, e mais: “A<br />

educação profissio<strong>na</strong>l é vista como elemento primordial para a constituição da <strong>na</strong>ção<br />

e como fator <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> outros povos...” (QUELUZ, 1998, p. 147).<br />

Neste período o Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio cria a<br />

Comissão <strong>de</strong> Remo<strong>de</strong>lação do Ensino Técnico Profissio<strong>na</strong>l 84 , que objetivava<br />

reformar este tipo <strong>de</strong> ensino. Alg<strong>uma</strong>s <strong>das</strong> principais mudanças em relação ao<br />

primeiro método são o aumento <strong>de</strong> tempo (3 e 4 anos <strong>de</strong> aprendizagem dos ofícios e<br />

mais 1 e 2 anos complementares) e a elevação do ensino técnico-industrial do nível<br />

primário para o secundário, como forma <strong>de</strong> valorizar os formandos como<br />

profissio<strong>na</strong>is, atraindo-os cada vez mais.<br />

Para Fonseca, o Serviço <strong>de</strong> Remo<strong>de</strong>lação foi um avanço:<br />

A consolidação dos dispositivos concernentes às escolas <strong>de</strong> aprendizes<br />

artífices é, sem dúvida, um documento importante <strong>na</strong> história da<br />

aprendizagem <strong>de</strong> ofícios entre nós, pois foi com ela que as escolas<br />

passaram a ter currículos uniformes e, por conseguinte, unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino,<br />

ao mesmo tempo em que era criado um órgão central mantenedor <strong>de</strong>ssa<br />

uniformida<strong>de</strong> (FONSECA, 1986, p. 210, v.1).<br />

84 Um ano mais tar<strong>de</strong>, a Comissão passará a se chamar Serviço <strong>de</strong> Remo<strong>de</strong>lação do Ensino<br />

Profissio<strong>na</strong>l Técnico. Em todo o período, o chefe foi João Lu<strong>de</strong>ritz, engenheiro pertencente à Escola<br />

<strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> Porto Alegre, que atuou no Instituto Parobé, instituição mo<strong>de</strong>lo para o ensino<br />

profissio<strong>na</strong>l no país, e que anos mais tar<strong>de</strong> fundou o Se<strong>na</strong>i (QUELUZ, 1998).


114<br />

Entretanto, segundo Queluz (1998), o objetivo maior <strong>de</strong> João Lu<strong>de</strong>ritz era<br />

transformar a Escola em fábrica e isso, foi alcançado, à medida que se instituía<br />

normas como permanência mínima <strong>na</strong> Escola, aceitação <strong>de</strong> encomen<strong>das</strong> e ganhos<br />

por produtivida<strong>de</strong>.<br />

Dentre vários problemas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m estrutural e gover<strong>na</strong>mental, Lu<strong>de</strong>ritz<br />

também enfrentou problemas em relação à falta <strong>de</strong> docentes qualificados, e por seu<br />

intermédio acontecerá a transformação da Escola Wenceslau Brás em centro <strong>de</strong><br />

formação <strong>de</strong> professores.<br />

Em relação aos métodos <strong>de</strong> Paulo Il<strong>de</strong>fonso e João Lu<strong>de</strong>ritz, como já<br />

mencio<strong>na</strong>do, apesar <strong>das</strong> divergências, para Queluz não existe diferença entre as<br />

pretensões <strong>de</strong> ambos.<br />

Os dois <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>m o método intuitivo como o método por excelência, apesar<br />

da leitura <strong>de</strong> Lu<strong>de</strong>ritz ser marcada acentuadamente pelo taylorismo, ape<strong>na</strong>s<br />

latente no pensamento <strong>de</strong> Paulo Il<strong>de</strong>fonso. Os dois se esforçam, através da<br />

utilização <strong>de</strong> estratégias múltiplas, alg<strong>uma</strong>s vezes divergentes, para incutir<br />

no trabalhador, hábitos <strong>de</strong> trabalho. Ambos colaboram para a constituição<br />

<strong>de</strong> um discurso hegemônico, que garanta a estabilida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong><br />

burguesa. Ambos colaboram, conjuntamente, com higienistas, engenheiros,<br />

filantropos e outros homens cultos, no esforço <strong>de</strong> esquadrinhar e discipli<strong>na</strong>r<br />

as classes perigosas, que caminham pelas ruas da cida<strong>de</strong> que se<br />

transforma velozmente... (QUELUZ, 1998, p. 151)<br />

Para o autor isso marcou consi<strong>de</strong>ravelmente os primeiros anos <strong>de</strong> existência<br />

da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do Paraná.<br />

Em relação ao interesse pela educação profissio<strong>na</strong>l no Brasil, Delmon<strong>de</strong>s<br />

(2006) afirma que ele sofrerá modificação a partir da transformação do mo<strong>de</strong>lo<br />

agroexportador pelo industrial <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1930, que vai exigir mão-<strong>de</strong>-obra<br />

especializada, algo que se ampliou com o engajamento <strong>das</strong> próprias indústrias <strong>na</strong><br />

formação profissio<strong>na</strong>l, o que favorecia o Estado, que não tinha condições <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rar<br />

o processo.<br />

Com a nova configuração política e econômica, vê-se a educação atribuindo<br />

papel <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>nte ao trabalho, com o objetivo <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> gran<strong>de</strong> massa<br />

produtiva. Apesar disso, o Decreto n. 21.241 <strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1932 manteve a<br />

dicotomia entre os tipos <strong>de</strong> ensino médio, <strong>de</strong>sunindo o médio profissio<strong>na</strong>l do<br />

secundário, <strong>de</strong> ensino propedêutico, e do superior.


115<br />

Em 1931, o Ministério da Educação criou a Inspetoria do Ensino Profissio<strong>na</strong>l<br />

Técnico, buscando dar direcio<strong>na</strong>mentos a todos os serviços relativos ao<br />

ensino profissio<strong>na</strong>l técnico. Em 1934, transformava a Inspetoria em<br />

Superintendência do Ensino Profissio<strong>na</strong>l, subordi<strong>na</strong>ndo-a, diretamente, ao<br />

Ministro do Estado, aumentando o reconhecimento do ensino técnico e <strong>das</strong><br />

escolas profissio<strong>na</strong>is (MARIANO DE CARVALHO, 2008, p. 74).<br />

Para Machado (2010), no entanto, o período que se convencionou chamar<br />

Revolução <strong>de</strong> 30 não é visto como início da preocupação com a formação da força<br />

<strong>de</strong> trabalho no Brasil, mas a partir <strong>de</strong> então se viu a centralização e a tentativa <strong>de</strong><br />

controle por parte do Ministério da Educação e Saú<strong>de</strong> 85 , o que promoveu um<br />

aumento do papel do estado que daria origem à Lei Orgânica em 1942, e que para<br />

Cunha serviu como incremento do aparato escolar com ecos até a década <strong>de</strong> 1980<br />

(2000 apud MACHADO, 2010).<br />

Na década <strong>de</strong> 1930, houve um aprofundamento no <strong>de</strong>bate sobre educação e<br />

trabalho; Machado cita que sob elaboração do engenheiro belga Omer Buyse foi<br />

apresentado um anteprojeto da Universida<strong>de</strong> do Trabalho. A instituição promoveria<br />

além do ensino superior outros níveis <strong>de</strong> ensino e formaria artífices, mestres e<br />

contramestres, além <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r o nicho <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores para as escolas<br />

profissio<strong>na</strong>is superiores (MACHADO, 2010). Foi proposta a criação <strong>de</strong> um sistema,<br />

composto pela Universida<strong>de</strong> do Trabalho, gabinetes <strong>de</strong> seleção e orientação<br />

profissio<strong>na</strong>l, escolas profissio<strong>na</strong>is e profissio<strong>na</strong>is superiores, escolas vestibulares e<br />

escola primária adaptada, orientado para as questões pertinentes ao trabalho – o<br />

chamado “Plano <strong>de</strong> Organização Scientífica do Trabalho” significou um passo<br />

importante <strong>na</strong> relação trabalho e educação (MACHADO, 2010).<br />

No período é possível encontrarmos registros da preocupação com a<br />

formação <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s: Machado cita que um dos documentos <strong>de</strong> criação do “Plano<br />

<strong>de</strong> Organização Scientífica do Trabalho” explica que os termos usados no masculino<br />

diziam respeito a homens e <strong>mulheres</strong> (no caso, quando se citava a formação <strong>de</strong><br />

professores e alunos, por exemplo, <strong>de</strong>veria ser entendido como professores e<br />

professoras, alunos e alu<strong>na</strong>s); e também a indicação <strong>de</strong> que seriam formados<br />

mestres para as ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong> chapéus, mo<strong>das</strong> e culinária (MACHADO, 2010),<br />

indicando que seria ofertado algum (ou alguns) curso para elas.<br />

85 O ministro foi o senhor Gustavo Capanema <strong>de</strong> 1934 a 1945 (MACHADO, 2010).


116<br />

Na década <strong>de</strong> 1930 o Brasil participou <strong>de</strong> alguns congressos inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is<br />

do ensino técnico, cujo interesse externo estava <strong>na</strong> relação do ensino técnico e vida<br />

econômica, orientação profissio<strong>na</strong>l e sua continuida<strong>de</strong>, formação <strong>de</strong> responsáveis<br />

pelo ensino prático e a preparação da mulher (MACHADO, 2010).<br />

Fi<strong>na</strong>is da década <strong>de</strong> 1930, Gursky Jr <strong>de</strong>screve o período como significante<br />

em relação à questão da educação:<br />

Nesse momento da história brasileira, e também premido pela conjuntura<br />

inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e seus embates i<strong>de</strong>ológicos, o <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lismo brasileiro se<br />

tornou mais vigoroso, e o governo buscava o apoio popular ao novo regime<br />

(Estado Novo) através da educação.<br />

As escolas eram estimula<strong>das</strong> a fortalecer valores como a <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, a<br />

discipli<strong>na</strong>, o vigor físico e o trabalho, além dos assuntos educacio<strong>na</strong>is<br />

usuais. As escolas <strong>de</strong>veriam, pois, servir ao duplo objetivo: formar<br />

profissio<strong>na</strong>is competentes, e cidadãos conscientes, que eram necessários<br />

ao progresso econômico e à <strong>de</strong>fesa <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l (GURSKY JR, 2000, p. 86).<br />

Com a Lei n. 378, <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1937 (que entre outras ações 86 mudou<br />

a <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ção do Ministério da Educação e Saú<strong>de</strong> Pública que passou a se chamar<br />

Ministério da Educação e Saú<strong>de</strong>), é instituído o Liceu Industrial do Paraná alterando<br />

a filosofia da aprendizagem profissio<strong>na</strong>l (GURSKY JR, 2000).<br />

A Lei não alterou os currículos que seguiriam prezando pela<br />

complementarida<strong>de</strong> essencial para a formação educacio<strong>na</strong>l dos aprendizes<br />

artífices, mesclando o trei<strong>na</strong>mento e a aprendizagem <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s, com <strong>uma</strong><br />

relativa base sólida <strong>de</strong> educação geral. Já <strong>na</strong>quela época era indispensável<br />

compatibilizar o ensino profissio<strong>na</strong>l vinculado à formação cultural da classe<br />

proletária, imbuída <strong>de</strong> um profundo sentimento <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lista (GURSKY JR,<br />

2000, p. 83).<br />

Era um novo momento histórico e político e novos i<strong>de</strong>ais filosóficos foram<br />

tomando as instituições escolares:<br />

O Estado Novo (10/10/1937) havia trazido consigo um novo entusiasmo a<br />

respeito da filosofia da educação. A instrução pública, <strong>na</strong>quele momento,<br />

fora vista como instrumento <strong>de</strong> coesão social, fator <strong>de</strong> construção da<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, assim como <strong>de</strong> formação do cidadão produtivo e patriota. O<br />

seu pretensioso pensamento racio<strong>na</strong>l e científico assumiu o papel <strong>de</strong><br />

preceptor do povo e <strong>das</strong> crianças, marcado pelo discurso i<strong>de</strong>ológico e pela<br />

menorida<strong>de</strong> social. A educação é quase <strong>uma</strong> religião cívica, que seria a<br />

86 Ela também extinguiu a Superintendência do Ensino Profissio<strong>na</strong>l, criando em seu lugar a Divisão<br />

do Ensino Industrial.


117<br />

principal responsável pela obra <strong>de</strong> regeneração <strong>das</strong> massas populares e<br />

pela organização do trabalho livre. Com o crescimento urbano e industrial<br />

do Estado Novo procurou-se, através da educação, o equacio<strong>na</strong>mento da<br />

questão urba<strong>na</strong> e a estruturação <strong>de</strong> “esquemas <strong>de</strong> controle” que<br />

viabilizassem o discipli<strong>na</strong>mento <strong>das</strong> populações resistentes, quer <strong>na</strong><br />

vadiagem, <strong>na</strong> a<strong>na</strong>rquia, ou em outros pensamentos políticos e i<strong>de</strong>ológicos,<br />

contrários à nova or<strong>de</strong>m que se implantava (GURSKY JR, 2000, p. 91).<br />

Ainda em relação aos anos <strong>de</strong> 1930, Machado cita que a Constituição <strong>de</strong><br />

1937, em seu artigo 129, privilegiava a questão da “qualificação profissio<strong>na</strong>l dos<br />

„trabalhadores do Brasil‟” (p. 65), ou seja, às classes menos favoreci<strong>das</strong>, para<br />

atuarem no projeto industrialista <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. A Lei obrigava que as<br />

indústrias criassem escolas <strong>de</strong> aprendizagem, o que causava transtorno, já que<br />

havia um limite para contratação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra estrangeira para atuar como<br />

docentes (MACHADO, 2010), o que <strong>de</strong>monstra que a questão da importância da<br />

formação docente para o ensino industrial permeou as discussões.<br />

Em relação à educação profissio<strong>na</strong>l, Getúlio Vargas, em 1939, <strong>de</strong>clarou que<br />

o Estado Novo tinha particular interesse em promover e auxiliar a educação<br />

profissio<strong>na</strong>l, por enten<strong>de</strong>r que os profissio<strong>na</strong>is formados contribuiriam para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>das</strong> nossas indústrias.<br />

No mesmo momento Gustavo Capanema se pronunciou, proferindo as<br />

seguintes palavras em <strong>de</strong>fesa do <strong>de</strong>ver do Estado:<br />

Nenh<strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> ensino está exigindo, no Brasil, tanto a ação dos<br />

po<strong>de</strong>res públicos como o ensino profissio<strong>na</strong>l. É por isso que a Constituição<br />

<strong>de</strong>clara que, em matéria <strong>de</strong> educação, difundir o ensino profissio<strong>na</strong>l é o<br />

primeiro <strong>de</strong>ver do Estado (apud GURSKY JR, 2000, p. 92-93).<br />

Em seus escritos Fonseca (1986, v. 2) consi<strong>de</strong>ra Gustavo Capanema<br />

pessoa importante para a educação brasileira e em especial para a educação<br />

profissio<strong>na</strong>l, pois, em sua gestão, ao adotar novas políticas educacio<strong>na</strong>is, elevou o<br />

ensino industrial <strong>de</strong> elementar para o segundo grau. Ele cita também que<br />

A filosofia que lhe era peculiar e que o acompanhava havia séculos,<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>ndo-o aos pobres, <strong>de</strong>serdados da sorte, evoluiu, transformando-o<br />

num imenso campo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s aberto a to<strong>das</strong> as cama<strong>das</strong> sociais. Os<br />

obstáculos que impediam o acesso aos cursos superiores foram afastados,<br />

e o ensino industrial, assim, <strong>de</strong>mocratizado (FONSECA, 1986, p. 280, v. 2).


118<br />

Na opinião do autor, o ensino industrial era <strong>de</strong> fácil acesso a qualquer<br />

pessoa, <strong>de</strong> qualquer camada social. Entretanto, embora não seja nosso foco,<br />

po<strong>de</strong>mos relativizar esta informação lembrando o porquê <strong>de</strong> o governo ter facilitado<br />

o acesso <strong>de</strong> pobres a este ramo <strong>de</strong> ensino, fazendo com que se evi<strong>de</strong>nciem os<br />

interesses maiores, interesses estes que também facilitarão que a Escola se<br />

tor<strong>na</strong>sse cada vez mais elitizada ao longo dos anos.<br />

Voltando ao foco <strong>de</strong> expla<strong>na</strong>ção <strong>de</strong>ste capítulo, em relação à educação<br />

profissio<strong>na</strong>l o movimento <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is que elaboraram o Manifesto dos Pioneiros<br />

da Educação Nova se posicionou em favor do <strong>de</strong>senvolvimento da educação<br />

técnica 87 profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> nível médio e superior, com multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos em<br />

áreas diversas 88 . Para os educadores escolanovistas o ensino profissio<strong>na</strong>lizante<br />

merecia especial atenção, já que, por ser <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às classes trabalhadoras, sofreu<br />

margi<strong>na</strong>lização ao longo da história 89 .<br />

Com o advento da Revolução Industrial surge a exigência <strong>de</strong> qualificação,<br />

daí a implementação da formação técnico-profissio<strong>na</strong>l. Portanto, consi<strong>de</strong>ra-se que a<br />

partir da industrialização “surge a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> ensino voltado à<br />

formação profissio<strong>na</strong>l para aten<strong>de</strong>r à crescente <strong>de</strong>manda do mercado” (MELLO et al,<br />

1997, s.p.).<br />

E para aten<strong>de</strong>r a esta <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>l para a indústria, e formar o<br />

que Fonseca chamaria <strong>de</strong> “paralelismo” <strong>de</strong>ntro da própria educação profissio<strong>na</strong>l,<br />

governo e empresários, por meio da Confe<strong>de</strong>ração Nacio<strong>na</strong>l <strong>das</strong> Indústrias (CNI),<br />

lançam as bases para a implantação <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> ensino profissio<strong>na</strong>l para a<br />

indústria. O resultado foi a criação do Sistema “S”, composto pelo Serviço Nacio<strong>na</strong>l<br />

<strong>de</strong> Aprendizagem Industrial (Se<strong>na</strong>i), pelo Serviço Social da Indústria (Sesi) e pelo<br />

Serviço Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Aprendizagem Comercial (Se<strong>na</strong>c), única voltada ao setor<br />

terciário. O Estado dividia portanto com a indústria a responsabilida<strong>de</strong> pela formação<br />

<strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra.<br />

87 Kirschner (1993, p. 9) nesse contexto chama educação técnica a que visava à formação<br />

profissio<strong>na</strong>l do indivíduo, em função da “inspiração taylorista-fordista <strong>de</strong> organização do trabalho <strong>na</strong><br />

produção industrial”.<br />

88 Não somente voltados à indústria, mas também à pesca, transportes, comércio, mi<strong>na</strong>s e<br />

agricultura.<br />

89 Vários nomes se <strong>de</strong>stacaram em <strong>de</strong>fesa da educação dos trabalhadores, mas em especial citamos<br />

o nome <strong>de</strong> Anísio Teixeira que também se empenhou <strong>na</strong> luta por diminuir as diferenças entre as<br />

escolas dos trabalhadores e as secundárias, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> a <strong>uma</strong> elite.


119<br />

Do período <strong>de</strong> 1942 a 1945 <strong>de</strong>stacamos dois fatos importantes para a<br />

educação profissio<strong>na</strong>l: a criação da Lei Orgânica do Ensino Industrial e a criação dos<br />

cursos técnicos.<br />

Criada pelo Decreto-lei n. 4073 <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1942, a Lei Orgânica do<br />

Ensino Industrial veio modificar esta modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino em sua estrutura<br />

pedagógica, filosófica e prática.<br />

O ensino industrial era agora consi<strong>de</strong>rado <strong>de</strong> segundo grau, garantindo aos<br />

egressos daquele o ingresso no ensino superior. Portanto, a Lei abriu possibilida<strong>de</strong><br />

ao aluno que fi<strong>na</strong>lizasse os cursos <strong>de</strong> mecânica, marce<strong>na</strong>ria ou eletricista, por<br />

exemplo, <strong>de</strong> prosseguir seus estudos e se tor<strong>na</strong>r engenheiro ou arquiteto. Além<br />

disso, o ensino industrial <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do aos “<strong>de</strong>sfavorecidos da fortu<strong>na</strong>” ou<br />

“<strong>de</strong>svalidos da sorte”; em certa medida, será dado a todos a mesma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

entrada (FONSECA, 1986, v. 2).<br />

Para Fonseca (1986, v. 2), a Lei Orgânica tratou <strong>de</strong> harmonizar as correntes<br />

filosóficas, dando ao ensino ora <strong>uma</strong> fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> individual, preparando o trabalhador<br />

para exercer <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> em prol <strong>de</strong> si próprio, ora <strong>uma</strong> fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> social,<br />

aten<strong>de</strong>ndo às necessida<strong>de</strong>s <strong>das</strong> empresas e, consequentemente, da <strong>na</strong>ção 90 .<br />

Tratava-se, então, <strong>de</strong> instruir e ensi<strong>na</strong>r ofício aos jovens preparando-os para<br />

as fábricas, mas também os orientava educacio<strong>na</strong>lmente, formando-os<br />

intelectualmente quanto ao papel e <strong>de</strong>veres sociais e morais. Para Fonseca (1986,<br />

v. 2), <strong>de</strong>finitivamente, a Lei indicou avanços para a educação profissio<strong>na</strong>l e para a<br />

educação como um todo, por ter unificado o ensino profissio<strong>na</strong>l em todo o território,<br />

incluindo escolas estaduais, municipais ou particulares, e não somente as escolas<br />

fe<strong>de</strong>rais, como ocorrera até então.<br />

No aspecto pedagógico a mudança proporcio<strong>na</strong>da pela Lei se <strong>de</strong>u porque<br />

passou a existir um acompanhamento via orientação educacio<strong>na</strong>l; o intuito era que o<br />

aluno estivesse amparado durante e após o término do curso, além <strong>de</strong> ter a<br />

90 Ciavatta comenta que quando se implantou um projeto <strong>de</strong> <strong>na</strong>ção no Brasil e um projeto que<br />

tratasse da preparação para o trabalho foi somente para servir aos interesses <strong>de</strong> produção da<br />

riqueza, direcio<strong>na</strong>do a aten<strong>de</strong>r os interesses da indústria e o Sistema S se tornou anos <strong>de</strong>pois sua<br />

mais viva expressão: “...é sob a égi<strong>de</strong> dos interesses industriais que se organiza o ensino profissio<strong>na</strong>l<br />

e técnico como um sistema dotado <strong>de</strong> instalações, ofici<strong>na</strong>s, laboratórios, instrutores e professores e<br />

po<strong>de</strong>r político para gerenciar o sistema" (CIAVATTA, 2010, p. 169).


120<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer não somente técnicas mas que fosse formado<br />

integralmente.<br />

Para Machado (2010), a Lei, não obstante ter sofrido alterações ao longo<br />

dos anos posteriores, pelo papel <strong>de</strong>sempenhado, <strong>de</strong>sdobrou-se até os anos <strong>de</strong><br />

1980.<br />

A Lei Orgânica do Ensino Industrial apresentou <strong>uma</strong> nova divisão do ensino;<br />

seu objetivo era organizar este nível <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>r a partir do seu art. 6º<br />

que o ensino industrial seria a partir <strong>de</strong> então ministrado em dois ciclos. O primeiro<br />

se dividiria:<br />

Ensino industrial básico - <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos ao ensino, <strong>de</strong> modo completo, <strong>de</strong> um<br />

ofício cujo exercício requeira a mais longa formação profissio<strong>na</strong>l com duração<br />

<strong>de</strong> quatro anos;<br />

Ensino <strong>de</strong> mestria - tem por “fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> dar aos diplomados em curso<br />

industrial a formação profissio<strong>na</strong>l necessária ao exercício da função <strong>de</strong><br />

mestre com duração <strong>de</strong> dois anos”;<br />

Ensino artesa<strong>na</strong>l - Os cursos artesa<strong>na</strong>is “<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>m-se ao ensino <strong>de</strong> um ofício<br />

em período <strong>de</strong> duração reduzida” com duração <strong>de</strong> um ou dois anos;<br />

Cursos <strong>de</strong> aprendizagem - <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos a “ensi<strong>na</strong>r, metodicamente aos<br />

aprendizes dos estabelecimentos industriais, em período variável, e sob<br />

regime <strong>de</strong> horário reduzido, o seu ofício” po<strong>de</strong>ndo variar <strong>na</strong> duração <strong>de</strong> um a<br />

quatro anos.<br />

No segundo ciclo do ensino industrial, surgiram os cursos técnicos e os<br />

cursos pedagógicos:<br />

Os cursos técnicos eram “<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos ao ensino <strong>de</strong> técnicas, próprias ao<br />

exercício <strong>de</strong> funções <strong>de</strong> caráter específico <strong>na</strong> indústria” com cursos técnicos<br />

<strong>de</strong> mecânica, metalurgia, eletrotécnica, eletrônica, química e outros com<br />

duração <strong>de</strong> três anos e um quarto ano para estágio supervisio<strong>na</strong>do;<br />

Os cursos pedagógicos “<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>m-se à formação <strong>de</strong> pessoal docente e<br />

administrativo do ensino industrial” com duração <strong>de</strong> um ano. Há ainda a<br />

modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cursos extraordinários com os módulos <strong>de</strong> especialização e<br />

aperfeiçoamento, que po<strong>de</strong>riam ser ministrados em qualquer escola industrial


121<br />

com exceção aos <strong>de</strong> aperfeiçoamento que só po<strong>de</strong>riam ser dados <strong>na</strong>s<br />

escolas técnicas, e os cursos avulsos indicados para dar atualida<strong>de</strong>s<br />

técnicas.<br />

O artigo 16 garantia o diploma <strong>de</strong> artífice aos alunos que concluíssem<br />

qualquer um dos cursos industriais, o diploma <strong>de</strong> mestre aos que concluíssem<br />

qualquer um dos cursos <strong>de</strong> mestria, e aos que concluíssem qualquer um dos cursos<br />

técnicos ou pedagógicos o diploma correspon<strong>de</strong>nte à técnica ou à ramificação<br />

pedagógica estudada.<br />

A Lei Orgânica <strong>de</strong>u origem a vários <strong>de</strong>cretos para subsidiá-la e garantir<br />

uniformida<strong>de</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, <strong>de</strong>ntre elas mais <strong>uma</strong> alteração <strong>de</strong> nomenclatura: o Liceu<br />

Industrial do Paraná passou a se chamar Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba, via Decreto n.<br />

4.127, <strong>de</strong> 25 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1942.<br />

O ano <strong>de</strong> 1942 serviu <strong>de</strong> adaptação <strong>das</strong> instituições à nova normativa, para<br />

que no início do ano seguinte ocorresse a cerimônia <strong>de</strong> instalação dos cursos<br />

técnicos <strong>na</strong> então Escola Técnica. Nessa ocasião foram i<strong>na</strong>ugurados os cursos <strong>de</strong><br />

Construção <strong>de</strong> Máqui<strong>na</strong>s e Motores, Edificações, Desenho Técnico e Decoração <strong>de</strong><br />

Interiores. Com duração <strong>de</strong> três anos, a eles só era permitida a matrícula se<br />

aten<strong>de</strong>ssem as especificações:<br />

Ter concluído o primeiro ciclo do ensino secundário ou curso industrial<br />

relacio<strong>na</strong>do com o curso técnico pretendido;<br />

Possuir capacida<strong>de</strong> física e mental para os estudos e trabalhos;<br />

Ser aprovado em exames vestibulares.<br />

Destaque ao fato <strong>de</strong> que a partir <strong>de</strong>sse momento é permitido o ingresso <strong>de</strong><br />

meni<strong>na</strong>s nos cursos consi<strong>de</strong>rados apropriados – Corte e Costura <strong>de</strong> I ciclo e<br />

Decoração <strong>de</strong> Interiores <strong>de</strong> II ciclo. Este ponto será discutido no próximo capítulo.<br />

No período <strong>de</strong> vigência da Lei Orgânica, Machado (2010) diz que se<br />

manteve a prática <strong>de</strong> contratação <strong>de</strong> estrangeiros para atuarem como docentes. Ao<br />

a<strong>na</strong>lisar a questão da contratação <strong>de</strong> mestres para os cursos <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos ao público<br />

feminino a autora encontrou somente <strong>uma</strong> referência em documento <strong>de</strong> 1940, o que<br />

para ela significa a confirmação <strong>de</strong> que aos olhos da maioria era <strong>de</strong>snecessária a


122<br />

formação específica para <strong>de</strong>sempenhar ativida<strong>de</strong>s femini<strong>na</strong>s – os saberes femininos<br />

são <strong>na</strong>turalizados.<br />

Em relação à formação docente, Magela Neto (2002) diz que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />

Reforma Capanema, <strong>de</strong> 1942, houve um aumento da preocupação com a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se formar professores para os cursos profissio<strong>na</strong>is, ou <strong>de</strong><br />

aprendizagem. No entanto o registro <strong>de</strong> professores durante os vinte anos <strong>de</strong><br />

vigência da Reforma Capanema era obtido mediante exames <strong>de</strong> suficiência,<br />

contrariamente ao que preconizava o artigo 53 da Lei Orgânica do Ensino Industrial,<br />

que dizia: “a formação <strong>de</strong> professores <strong>de</strong> discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> cultura geral, <strong>de</strong> cultura<br />

técnica ou <strong>de</strong> cultura pedagógica, e bem assim <strong>de</strong> práticas educativas, <strong>de</strong>verá ser<br />

feita em cursos apropriados”.<br />

A Lei <strong>de</strong> 1942, por sua vez, implementou um quarto ano após o término do<br />

curso técnico que daria conta da formação pedagógica para atuar no ensino<br />

industrial; a estes egressos inclusive dava-se pela Lei o direito a cursar Pedagogia.<br />

Entretanto Amorim (2004) nos informa que a Lei só foi regulamentada em 1954,<br />

portanto os cursos <strong>de</strong> formação <strong>de</strong>moraram mais <strong>de</strong> 10 anos para começarem a<br />

funcio<strong>na</strong>r.<br />

Machado (2010) conclui que após a reformulação do ensino industrial em<br />

1942 o quadro docente <strong>de</strong> cultura geral foi sendo formado por professores<br />

provenientes <strong>de</strong> outra(s) instituição(ões) <strong>de</strong> ensino superior em Curitiba.<br />

Um acordo entre Brasil e Estados Unidos firmado em 1946, abriu a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formação para atuar <strong>na</strong>s áreas técnicas em todo o Brasil. Chamada<br />

Comissão Brasileiro-America<strong>na</strong> Industrial (CBAI) tinha como objetivos:<br />

Trei<strong>na</strong>r professores para atuarem no ensino industrial;<br />

Produzir material didático para esta área 91 .<br />

A CBAI oferta os primeiros cursos em 1947, no entanto, estes não<br />

funcio<strong>na</strong>ram <strong>de</strong> maneira a agradar os docentes e passou por vários percalços.<br />

Em 1957, já no que Machado chamou segunda fase <strong>de</strong> atuação da CBAI, foi<br />

implantado <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba o Centro <strong>de</strong> Pesquisas e Trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong><br />

Professores (CPTP). O público-alvo do Centro eram professores da área técnica,<br />

91 Outro objetivo da CBAI se voltava à orientação vocacio<strong>na</strong>l dos cursistas (educacio<strong>na</strong>l e<br />

profissio<strong>na</strong>l).


123<br />

para os quais eram ofertados cursos <strong>de</strong> aperfeiçoamento, já que eram atuantes, e<br />

ex-alunos que quisessem ser professores.<br />

Amorim (2004) faz <strong>uma</strong> longa análise a respeito da condição <strong>de</strong> instalação<br />

da CBAI e do CPTP 92 em Curitiba, que tinha por principal objetivo formar<br />

professores e aspirantes a professores.<br />

O autor <strong>de</strong>staca que a forma <strong>de</strong> ingresso dava-se pela seleção concentrada<br />

<strong>na</strong>s outras escolas industriais e técnicas, oficiais ou não; após eleitos via exames <strong>de</strong><br />

seleção, os candidatos vinham para Curitiba. Os cursos 93 eram <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos a<br />

professores, técnicos e instrutores <strong>das</strong> escolas fe<strong>de</strong>rais, estaduais e municipais,<br />

além do Se<strong>na</strong>i e <strong>de</strong> outras entida<strong>de</strong>s convida<strong>das</strong> pela CBAI.<br />

Embora não aparecesse como condição exclu<strong>de</strong>nte para inscrição ao<br />

exame <strong>de</strong> seleção ou para matrícula, não havia presença femini<strong>na</strong> nos<br />

cursos <strong>de</strong> trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> professores! Os cursos do CPTP eram tidos como<br />

caracteristicamente masculinos, tanto por envolverem ofícios<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente ligados aos homens, quanto por se tratar <strong>de</strong> matéria<br />

tecnológica, também tida como <strong>de</strong>finidora do trabalho masculino, pois<br />

envolveria conhecimentos mais aprofundados, o que estaria fora do alcance<br />

e da compreensão do sexo feminino, <strong>de</strong> acordo com a noção construída<br />

historicamente para a mulher (AMORIM, 2004, p. 288. Grifos nossos.).<br />

Não obstante todos os esforços da CBAI, estes não foram suficientes, já que<br />

visavam ao aperfeiçoamento do professorado já existente, e não à formação <strong>de</strong><br />

novos professores, como fazia a Escola Wenceslau Brás e como pretendia a Lei<br />

Orgânica.<br />

Como não estava aten<strong>de</strong>ndo às expectativas, o foco foi sendo direcio<strong>na</strong>do à<br />

formação <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is <strong>de</strong> indústrias e ex-alunos. O boletim “Você quer ser<br />

professor?” comprova esta dificulda<strong>de</strong> em recrutar interessados em formação.<br />

O Brasil necessita <strong>de</strong> maior número <strong>de</strong> professores, homens jovens com<br />

capacida<strong>de</strong>, entusiasmo e o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r aos outros. Em face <strong>de</strong>stas<br />

razões [...] estamos planejando um trei<strong>na</strong>mento para os futuros professores.<br />

Trata-se realmente <strong>de</strong> <strong>uma</strong> oportunida<strong>de</strong> excepcio<strong>na</strong>l para jovens <strong>de</strong> visão,<br />

<strong>de</strong>sejosos <strong>de</strong> servir ao seu povo. De que outra maneira po<strong>de</strong>rá um homem<br />

influenciar o futuro dos outros, a não ser beneficiando a vida dos outros<br />

92 Amorim (2004) <strong>de</strong>screve a organização do CPTP: com um diretor brasileiro, o então diretor da ETC,<br />

Lauro Wilhelm, e um diretor estaduni<strong>de</strong>nse, nos anos <strong>de</strong> 1958 e 1959, os cursos tinham duração <strong>de</strong> 8<br />

meses (<strong>de</strong> abril a novembro), e a partir <strong>de</strong> 1960 a duração passa para 9 meses. Um técnico<br />

estaduni<strong>de</strong>nse e um professor brasileiro ministravam as discipli<strong>na</strong>s.<br />

93 Eles eram organizados com aulas teóricas, práticas, <strong>de</strong>bates e preparação e administração <strong>de</strong><br />

aulas pelos professores-alunos, visando à didática individual (AMORIM, 2004).


124<br />

mediante o ensino? Portanto, aos jovens <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> e <strong>de</strong>sejosos <strong>de</strong><br />

fazerem do ensino <strong>uma</strong> carreira, recomendamos sinceramente consi<strong>de</strong>rar<br />

esta oportunida<strong>de</strong> com a maior atenção possível. 94<br />

A respeito <strong>de</strong>sse texto <strong>de</strong> chamamento <strong>de</strong> pessoas para se formarem<br />

professores, atentemos ao fato <strong>de</strong> que se evocam “homens jovens com capacida<strong>de</strong>,<br />

entusiasmo e o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r aos outros” – isso <strong>de</strong>monstra <strong>uma</strong> tendência a se<br />

pensar o magistério <strong>na</strong>s áreas técnicas ofícios masculinos. As escolas precisavam<br />

<strong>de</strong> “um homem [para] influenciar o futuro dos outros”; algo dito <strong>na</strong>turalmente, já que<br />

os espaços eram <strong>de</strong>finidos claramente: homens e <strong>mulheres</strong> atuando em suas<br />

apropria<strong>das</strong> áreas.<br />

Uma modificação no processo se dá quando o CPTP passa a se chamar<br />

Centro <strong>de</strong> Formação <strong>de</strong> Professores (AMORIM, 2004). O diferencial do período está<br />

<strong>na</strong> criação <strong>de</strong> um serviço <strong>de</strong> orientação que atuou no processo <strong>de</strong> formação dos<br />

alunos e também <strong>na</strong> sua entrada no mercado <strong>de</strong> trabalho. Destacamos que a chefe<br />

do serviço <strong>de</strong> orientação foi <strong>uma</strong> professora, Ester, <strong>uma</strong> <strong>das</strong> entrevista<strong>das</strong> para a<br />

tese <strong>de</strong> Machado (2010). Formada em Matemática e Física, a partir <strong>de</strong> 1950 chefiou<br />

o serviço <strong>de</strong> orientação que segundo Machado não tratou especificamente <strong>de</strong><br />

necessida<strong>de</strong>s <strong>das</strong> alu<strong>na</strong>s, visto que havia um número muito inferior <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s<br />

forma<strong>das</strong> e pouco espaço <strong>de</strong> atuação profissio<strong>na</strong>l <strong>na</strong>quele período.<br />

Desse período <strong>de</strong> atuação do serviço <strong>de</strong> orientação saiu a proposta <strong>de</strong> oferta<br />

<strong>de</strong> cursos para formar docentes-orientadores, e por isso Machado (2010) <strong>de</strong>staca<br />

que, diferente do que ocorreu em experiências anteriores <strong>de</strong> formação <strong>de</strong><br />

professores, o grupo <strong>de</strong> treze pessoas neste momento incluiu três <strong>mulheres</strong>, além<br />

da chefe, professora Ester.<br />

A CBAI durou <strong>de</strong>zessete anos, sendo extinta no início da ditadura, e foi<br />

bastante criticada por causa dos resultados que não traziam vantagens a longo<br />

prazo para o nosso país. Via Decreto, em 1963, é encerrada a atuação da CBAI.<br />

Alguns esforços isolados para formar professores durante o período são<br />

apontados por Fonseca (1986):<br />

A Escola Normal <strong>de</strong> Artes e Ofícios em Araraquara, subvencio<strong>na</strong>da pelo<br />

governo fe<strong>de</strong>ral;<br />

94 Você quer ser professor? Informações sobre bolsas <strong>de</strong> estudos para candidatos a professores do<br />

ensino industrial. CBAI, 1960. Disponível no Nudhi, caixa 1960A.


125<br />

A Escola Profissio<strong>na</strong>l Femini<strong>na</strong> Carlos <strong>de</strong> Campos, em São Paulo, em 1931<br />

passou a ter um curso normal, além do básico, para a formação <strong>de</strong> mestras<br />

para o ensino profissio<strong>na</strong>l. Por isso o nome foi alterado para Escola Normal<br />

Femini<strong>na</strong> <strong>de</strong> Artes e Ofícios que se manteve até 1933, quando foi chamado<br />

Instituto Profissio<strong>na</strong>l Feminino. No início da década <strong>de</strong> 1960, ela passaria a se<br />

chamar Escola Técnica Carlos <strong>de</strong> Campos.<br />

A Escola Aureliano Leal, em Niterói, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1926 possibilitava o ingresso <strong>de</strong><br />

meni<strong>na</strong>s e àquelas que concluíssem o direito <strong>de</strong> exercer o cargo <strong>de</strong><br />

professoras <strong>de</strong> trabalhos manuais e <strong>de</strong> agulha nos grupos escolares<br />

estaduais.<br />

Alguns <strong>de</strong>cretos tentaram implementar um curso Normal-Profissio<strong>na</strong>l,<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do ao preparo <strong>de</strong> professoras para as escolas profissio<strong>na</strong>is com<br />

duração <strong>de</strong> 2 anos, <strong>de</strong>ntre eles o Decreto n. 129/1936, regulamento do estado<br />

do RJ, no entanto eles não chegaram a funcio<strong>na</strong>r regularmente.<br />

O Instituto Pedagógico do Ensino Industrial, em São Paulo, em 1957,<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>va-se ao preparo <strong>de</strong> pessoal para a direção, orientação e docência do<br />

ensino industrial. Por algum tempo foi o único estabelecimento com esta<br />

fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>.<br />

A Escola Técnica Getúlio Vargas, em São Paulo, teve criados Cursos<br />

Pedagógicos conforme previsto pela Lei Orgânica, mas segundo Fonseca já<br />

não funcio<strong>na</strong>vam no início da década <strong>de</strong> 1960, já que para se matricular o<br />

aluno <strong>de</strong>via ter cursado curso técnico ou <strong>de</strong> mestria que já tivessem<br />

experiência profissio<strong>na</strong>l obtido <strong>na</strong> indústria. Para o autor isto era praticamente<br />

impossível: esperar que um rapaz abando<strong>na</strong>sse o posto <strong>de</strong> trabalho para<br />

voltar aos bancos escolares. Às meni<strong>na</strong>s, então, tampouco o acesso era<br />

facilitado, logo, nem eles, nem elas (FONSECA, 1986, p. 142-144, v. 3).<br />

Delmon<strong>de</strong>s (2006) afirma que após a Lei Orgânica que tratou<br />

especificamente do ensino industrial, e especialmente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 1950, a<br />

população ansiava por modificações em todos os âmbitos da socieda<strong>de</strong>, sobretudo<br />

no educacio<strong>na</strong>l. Após anos <strong>de</strong> <strong>de</strong>bates surge a primeira Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da<br />

Educação – a Lei Fe<strong>de</strong>ral 4.024/61, segundo a autora,


126<br />

articulou o sistema <strong>de</strong> ensino regular com o profissio<strong>na</strong>l, <strong>na</strong> medida em que<br />

incorporou ao sistema regular os cursos técnicos <strong>de</strong> nível médio,<br />

estabelecendo a equivalência ple<strong>na</strong> entre os cursos propedêuticos e os<br />

profissio<strong>na</strong>lizantes. Essa lei reuniu <strong>na</strong> mesma estrutura os dois sistemas,<br />

passando a existir dois ramos <strong>de</strong> ensino médio diferenciados, mas<br />

equivalentes: um propedêutico representado pelo científico e outro<br />

profissio<strong>na</strong>lizante, com os cursos normal (magistério), industrial, comercial e<br />

agrícola (DELMONDES, 2006, p. 74).<br />

Delmon<strong>de</strong>s <strong>de</strong>staca as principais inovações referentes ao ensino<br />

profissio<strong>na</strong>l:<br />

O ensino <strong>de</strong> 1º grau, <strong>de</strong> 1ª a 4ª séries, teria o currículo composto <strong>de</strong><br />

discipli<strong>na</strong>s que abrangessem conteúdos generalizantes;<br />

A partir da 5ª série, a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> discipli<strong>na</strong>s vocacio<strong>na</strong>is volta<strong>das</strong> para<br />

sondagem <strong>de</strong> aptidões e iniciação para o trabalho, aumentaria conforme se<br />

avançasse <strong>na</strong>s séries;<br />

Quanto ao ensino <strong>de</strong> 2º grau, os conteúdos <strong>de</strong>veriam enfatizar a formação<br />

profissio<strong>na</strong>l prepon<strong>de</strong>rando sobre a educação geral, pois a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> era<br />

proporcio<strong>na</strong>r a habilitação profissio<strong>na</strong>l ao aluno (DELMONDES, 2006, p. 76).<br />

Segundo Kuenzer (1991) permanecia a lógica segregatória já que os<br />

trabalhadores, sem perspectiva <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos (acesso à educação<br />

superior) seguiram escolhendo cursos profissio<strong>na</strong>lizantes, e os <strong>de</strong> classes mais altas<br />

iam para o propedêutico que lhes daria acesso à universida<strong>de</strong>. Delmon<strong>de</strong>s (2006)<br />

concorda com a manutenção da dualida<strong>de</strong> até os dias <strong>de</strong> hoje e afirma que, <strong>de</strong>vido à<br />

origem social, a pessoa acabava ficando condicio<strong>na</strong>da a um tipo <strong>de</strong> ensino, que, ao<br />

ser concluído, funcio<strong>na</strong>va como última possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso, ocasio<strong>na</strong>ndo o<br />

abandono dos bancos escolares.<br />

“Após <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> reformas educacio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> ao ajuste da<br />

educação aos novos objetivos e à nova or<strong>de</strong>m social, promulgou-se a Lei n. 5.692<br />

<strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1971” (DELMONDES, 2006, p. 75). Com ela duas foram as<br />

maiores modificações: instituiu-se que a todos os que cursassem o segundo grau<br />

seria dado o título <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>l e se substituiu a equivalência entre os ramos<br />

profissio<strong>na</strong>l e propedêutico (KUENZER, 1997). Segundo a autora isto se <strong>de</strong>u porque<br />

os interesses políticos e econômicos do Estado ansiavam por ter ao alcance vasta


127<br />

mão-<strong>de</strong>-obra qualificada para atuarem <strong>na</strong>s empresas <strong>de</strong> médio e gran<strong>de</strong> porte que<br />

vinham sendo implanta<strong>das</strong>, por <strong>de</strong>spolitizar o ensino secundário, oferecendo um<br />

currículo basicamente tecnicista, e por <strong>de</strong>sarticular o movimento estudantil que<br />

ganhava forças <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década anterior (KUENZER, 1997).<br />

Novamente se pensamos em relação à questão da formação docente, temos<br />

alg<strong>uma</strong>s tentativas <strong>de</strong> resolução <strong>de</strong> um problema quase que permanente. Para<br />

Magela Neto (2002, p. 107) terá gran<strong>de</strong> importância a Lei n. 4.024/61, porque a<br />

partir <strong>de</strong> seu artigo 59 foram organizados os Cursos <strong>de</strong> Licenciatura Ple<strong>na</strong> para a<br />

Graduação <strong>de</strong> Professores da Parte <strong>de</strong> Formação Especial do currículo do ensino <strong>de</strong><br />

segundo grau dos três setores da economia.<br />

Os primeiros cursos especiais <strong>de</strong> educação técnica para a formação <strong>de</strong><br />

professores do Ensino Técnico Industrial, regulamentados pela Portaria<br />

Ministerial n. 141-Br/61, foram ministrados pelo Ceteg – Centro <strong>de</strong><br />

Educação Técnica do Estado da Gua<strong>na</strong>bara, sob a coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção do<br />

Professor Alfonso Martignoni (MAGELA NETO, 2002, p. 107).<br />

Só no período <strong>de</strong> 1965 a 1968 os cursos formaram 605 professores. Além<br />

<strong>de</strong>sse trabalho consi<strong>de</strong>rado pioneiro, outras instituições se <strong>de</strong>stacaram como foi o<br />

caso do Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica <strong>de</strong> Mi<strong>na</strong>s Gerais, que criou o<br />

Centro <strong>de</strong> Educação Técnica da Fundação <strong>de</strong> Educação para o Trabalho <strong>de</strong> Mi<strong>na</strong>s<br />

Gerais – Cet-Utramig, que em diversas cida<strong>de</strong>s do estado, no período <strong>de</strong> 1967 a<br />

1994 formou 1000 professores. O Cefet-Mg esten<strong>de</strong>u seu programa <strong>de</strong> formação<br />

Esquema I e II a outros estados do país, assim como ocorreu com o Cefet-Pr que só<br />

no período <strong>de</strong> 1984 a 1992 formou 634 professores em todo o país 95 .<br />

Em documento “O problema da formação do Magistério”, Anísio Teixeira<br />

expla<strong>na</strong> a respeito da situação da educação no país nos últimos 50 anos (sua<br />

análise se pauta no período <strong>de</strong> 1916 a 1966), em que se viam postos dois sistemas<br />

educacio<strong>na</strong>is – um privilegiado, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do aos senhores, outro menos importante,<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do aos mais pobres; segundo ele<br />

95 Os Esquemas I e II foram oferecidos pelo Cefet-Pr em outras cida<strong>de</strong>s além <strong>de</strong> Curitiba, como<br />

Ma<strong>na</strong>us, Cuiabá, Campos, Natal, Pelotas, Florianópolis e São Paulo (Fonte: Arquivo Nudhi). O<br />

Esquema I era ofertado para os portadores <strong>de</strong> diploma <strong>de</strong> curso superior e o Esquema II para os<br />

portadores <strong>de</strong> diploma <strong>de</strong> técnico <strong>de</strong> 2º grau. Como não se trata <strong>de</strong> nosso foco, apontamos somente<br />

que estes projetos foram bastante criticados.


128<br />

Somente agora [no ano <strong>de</strong> 1966] começa a surgir a consciência <strong>de</strong> que a<br />

chave para essa expansão da educação formal, cuja necessida<strong>de</strong> para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico, social e político acabou por ser reconhecida,<br />

está num gran<strong>de</strong> movimento <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> professores, ao nível superior<br />

para o próprio ensino superior, para todo o extraordi<strong>na</strong>riamente diversificado<br />

ensino médio e para os cursos normais <strong>de</strong> formação do magistério primário<br />

(TEIXEIRA, 1966, p. 5).<br />

A partir <strong>de</strong> então outros esforços do legislativo surgem 96 , como por exemplo<br />

a Portaria Ministerial n. 111/68, do Mec, que regulamenta os Cursos Especiais <strong>de</strong><br />

Educação Técnica Industrial, para tentar implantar a formação como obrigatória.<br />

Se consi<strong>de</strong>ramos que neste período já tinham sido criados vários cursos <strong>de</strong><br />

licenciatura e a formação universitária estava cada vez mais consolidada, o<br />

problema se mantinha mais <strong>de</strong>tidamente <strong>na</strong> questão <strong>de</strong> pessoas habilita<strong>das</strong> a<br />

lecio<strong>na</strong>r <strong>na</strong> educação profissio<strong>na</strong>l que, provenientes dos bacharelados necessitavam<br />

<strong>de</strong> formação pedagógica específica. Nesse sentido iniciativas como a oferta dos<br />

Esquemas I e II pela Coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção do Programa Especial <strong>de</strong> Formação Pedagógica<br />

(Cofop) do Cefet-Pr, e posteriormente com a oferta do Programa Especial <strong>de</strong><br />

Formação Pedagógica, tentou suprir <strong>uma</strong> <strong>de</strong>manda histórica <strong>de</strong> professores<br />

habilitados para atuarem <strong>na</strong> educação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Em relação ao período em que passaria <strong>de</strong> Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná a Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica (1978) várias modificações<br />

acontecem em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l no que diz respeito à educação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Vários autores apresentam a transição e as várias diretrizes lança<strong>das</strong> no<br />

período entre as déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 1970 e 1990, que culmi<strong>na</strong>m com a mesma dualida<strong>de</strong><br />

anterior à década <strong>de</strong> 1960;<br />

Com a aprovação da Lei n. 9.394/96, foram abertos os espaços necessários<br />

para a institucio<strong>na</strong>lização, novamente, da dualida<strong>de</strong> estrutural <strong>na</strong> educação<br />

brasileira. Isso ocorreu <strong>de</strong>vido a obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>das</strong> escolas a separar o<br />

ensino regular médio da formação técnica (DELMONDES, 2006, p. 85).<br />

A década <strong>de</strong> 1990 trouxe novas expectativas para a educação profissio<strong>na</strong>l; a<br />

Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacio<strong>na</strong>l, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996, e os<br />

96 Magela Neto (2002) elenca várias Portarias Ministeriais e Leis e discute brevemente em que<br />

medida elas foram eficientes em seu objetivo – propor formação docente; <strong>de</strong>ntre elas estão a Portaria<br />

n. 330/70, a Portaria n. 432-BSB/71 e a Lei 5692/71.


129<br />

<strong>de</strong>cretos posteriores tiveram como objetivo impulsio<strong>na</strong>r esta modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino<br />

(DELMONDES, 2006).<br />

Para a autora, o contexto da Reforma da Educação Profissio<strong>na</strong>l está<br />

engendrado com os fatores socioeconômicos, tecnológicos e políticos, além da<br />

própria subordi<strong>na</strong>ção do Estado aos interesses do capitalismo, tor<strong>na</strong>ndo-se o que<br />

ela chamou <strong>de</strong> Estado “mínimo gestor”, gerando mudanças que<br />

criaram um novo paradigma educacio<strong>na</strong>l orientado predomi<strong>na</strong>ntemente pela<br />

racio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> do capital, que conduz à subsunção da esfera educação à<br />

esfera econômica, <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ndo um processo <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>do como<br />

mercantilização da educação, orientado pela lógica da competência e pela<br />

i<strong>de</strong>ologia da empregabilida<strong>de</strong>, como é o caso da Educação Profissio<strong>na</strong>l<br />

(DELMONDES, 2006, p. 79).<br />

A respeito da nova fase da educação profissio<strong>na</strong>l no Brasil, Delmon<strong>de</strong>s<br />

(2006) afirma que as modificações são em favor da formação eficaz do trabalhador<br />

para o mundo do trabalho e para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos.<br />

Reformas propostas afetam todos os níveis <strong>de</strong> ensino, mas em se tratando<br />

<strong>de</strong> nosso objeto <strong>de</strong> estudo, o Cefet-Pr foi atingido pelo Programa <strong>de</strong> Expansão da<br />

Educação Profissio<strong>na</strong>l (Proep), programa do MEC (Ministério <strong>de</strong> Educação e<br />

Cultura), fi<strong>na</strong>nciado pelo BID (Banco Interamericano <strong>de</strong> Desenvolvimento) e pelo<br />

FAT (Fundo <strong>de</strong> Amparo ao Trabalhador). O Proep, responsável <strong>de</strong>ntre outras coisas<br />

pela extinção dos cursos técnicos integrados ao ensino médio, foi muito criticado no<br />

período.<br />

Um dos subprogramas afetou especialmente os Cefets por prever a<br />

transformação <strong>de</strong>stes em centros <strong>de</strong> referência para a Educação Profissio<strong>na</strong>l.<br />

Inúmeros autores criticaram estes mo<strong>de</strong>los (GENTILI, 1998; FRIGOTTO, 1998 apud<br />

DELMONDES, 2006), e criticaram especialmente a aceitação <strong>de</strong> ser controlado pelo<br />

BID – como os investimentos oferecidos eram altos, ficou difícil dizer não às<br />

imposições, o que, segundo Delmon<strong>de</strong>s (2006), trouxe prejuízos ao trabalhador, à<br />

educação profissio<strong>na</strong>l e à socieda<strong>de</strong> como um todo.<br />

A Reforma apoiada pelo Proep criou um sistema <strong>de</strong> educação profissio<strong>na</strong>l<br />

separado do ensino médio e do ensino superior; a partir <strong>de</strong> então <strong>de</strong>veriam ser<br />

ofertados cursos pós-médio e cursos livres <strong>de</strong> ensino básico e <strong>de</strong> aperfeiçoamento<br />

(DELMONDES, 2006).


130<br />

A Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da Educação Nacio<strong>na</strong>l (LDB) <strong>de</strong> 1996, em seu<br />

capítulo III, traz a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> educação profissio<strong>na</strong>l – são quatro artigos em que se<br />

institui o que se preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>sse nível <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong> forma articulada ao ensino<br />

regular, e não mais integrada:<br />

Art. 39. A educação profissio<strong>na</strong>l, integrada às diferentes formas <strong>de</strong><br />

educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduz ao permanente<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> aptidões para a vida produtiva.<br />

Parágrafo único. O aluno matriculado ou egresso do ensino fundamental,<br />

médio e superior, bem como o trabalhador em geral, jovem ou adulto,<br />

contará com a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso à educação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Art. 40. A educação profissio<strong>na</strong>l será <strong>de</strong>senvolvida em articulação com o<br />

ensino regular ou por diferentes estratégias <strong>de</strong> educação continuada, em<br />

instituições especializa<strong>das</strong> ou no ambiente <strong>de</strong> trabalho.<br />

Art. 41. O conhecimento adquirido <strong>na</strong> educação profissio<strong>na</strong>l, inclusive no<br />

trabalho, po<strong>de</strong>rá ser objeto <strong>de</strong> avaliação, reconhecimento e certificação para<br />

prosseguimento ou conclusão <strong>de</strong> estudos.<br />

Parágrafo único. Os diplomas <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> educação profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> nível<br />

médio, quando registrados, terão valida<strong>de</strong> <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.<br />

Art. 42. As escolas técnicas e profissio<strong>na</strong>is, além dos seus cursos regulares,<br />

oferecerão cursos especiais, abertos à comunida<strong>de</strong>, condicio<strong>na</strong>da a<br />

matrícula à capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aproveitamento e não necessariamente ao nível<br />

<strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>.<br />

Como não se trata do foco do nosso trabalho, não discutiremos aqui o que<br />

estes artigos e toda a articulação política do período refletiram <strong>na</strong> questão da<br />

qualificação do trabalhador, ainda que seja <strong>de</strong>bate importante. Destacamos somente<br />

que, a partir <strong>de</strong>sse momento em que se buscou a<strong>de</strong>quar a questão da formação aos<br />

interesses estritamente econômicos, as instituições <strong>de</strong> formação profissio<strong>na</strong>l tiveram<br />

novas exigências e acabaram por refletir i<strong>de</strong>ais que segundo os críticos do período<br />

colocaram a questão da competência e da competitivida<strong>de</strong> em primeiro plano, lógica<br />

esta que acabou envolvendo toda a comunida<strong>de</strong> escolar, em especial professores e<br />

professoras 97 .<br />

97 Delmon<strong>de</strong>s cita o Decreto 5.154/04 como um documento que tenta rearticular e mascarar questões<br />

que tanto a LDB como os <strong>de</strong>cretos posteriores tentaram implantar; ela diz que “ao se conceber a i<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> integrar o currículo da Educação Profissio<strong>na</strong>l com o Ensino Médio preten<strong>de</strong>u-se construir um<br />

percurso que contribuísse para a superação da histórica dualida<strong>de</strong> do sistema educacio<strong>na</strong>l brasileiro.<br />

Buscou-se efetivar a articulação da teoria com a prática consi<strong>de</strong>rando a importância da relação entre<br />

saber científico e saber tácito; procurou-se articular parte e totalida<strong>de</strong>; e, por fim, trabalhou-se <strong>na</strong><br />

perspectiva <strong>de</strong> superar a dicotomia entre formação propedêutica e formação profissio<strong>na</strong>l”. Porém a<br />

autora acrescenta que a nova legislação “não rompe com a dualida<strong>de</strong> estrutural que sempre permeou<br />

o Ensino Médio e o Técnico, permanecendo a fragmentação e o interesse <strong>de</strong> classe” (DELMONDES,<br />

2006, p. 94).


131<br />

Nesse contexto <strong>de</strong> transformação, um <strong>de</strong>bate tem tomado forma. Alguns<br />

autores têm proposto <strong>uma</strong> discussão a respeito da atual configuração da educação<br />

tecnológica no país, em especial tratando da transformação dos antigos Cefets em<br />

Universida<strong>de</strong>(s) Tecnológica(s) ou Institutos Superiores <strong>de</strong> Ensino – os chamados<br />

Institutos Fe<strong>de</strong>rais <strong>de</strong> Educação, Ciência e Tecnologia. 98<br />

cabe <strong>de</strong>stacar que a questão da universida<strong>de</strong> tecnológica precisa ser<br />

abordada como um tema <strong>de</strong> toda a educação <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e da socieda<strong>de</strong><br />

brasileira. [...] A<strong>de</strong>mais, embora a expressão universida<strong>de</strong> tecnológica não<br />

seja <strong>uma</strong> novida<strong>de</strong>, a questão passou a ter materialida<strong>de</strong> no Brasil a partir<br />

do processo que resultou <strong>na</strong> transformação do Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica do Paraná em Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná<br />

(<strong>UTFPR</strong>), conforme dispõe a Lei n. 11.184, <strong>de</strong> 07 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2005 (LIMA<br />

FILHO, 2010, p. 143-144).<br />

Para o autor, o <strong>de</strong>bate é imprescindível porque aponta para <strong>uma</strong> direção que<br />

<strong>de</strong>sejamos que seja diferente do que vimos, no que diz respeito à relação<br />

aluno/trabalhador-educação/formação/qualificação, e especialmente à disputa entre<br />

formação geral e formação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Lima Filho propõe inicialmente <strong>uma</strong> discussão que problematize o conceito<br />

<strong>de</strong> universida<strong>de</strong> e a adjetivação tecnológica.<br />

A adjetivação do termo universida<strong>de</strong> é <strong>uma</strong> operação complexa e <strong>de</strong><br />

duvidosa pertinência, seja <strong>na</strong> perspectiva tecnológica, seja por meio <strong>de</strong><br />

outra qualificação. Isso nos remete sempre a questões iniciais sobre o<br />

significado da universida<strong>de</strong> e sua função social. A<strong>de</strong>mais, no caso em<br />

questão, entra em ce<strong>na</strong> o complexo e polissêmico conceito <strong>de</strong> tecnologia<br />

(LIMA FILHO, 2010, p. 144).<br />

Ciavatta (2010), por sua vez, também problematiza a questão, embora siga<br />

outro viés <strong>de</strong> análise:<br />

Universida<strong>de</strong> tecnológica é <strong>uma</strong> contradição em termos a universida<strong>de</strong><br />

especializada. Se é <strong>uma</strong> instituição que preten<strong>de</strong> abrigar a universalida<strong>de</strong><br />

ou a rica diversida<strong>de</strong> dos saberes produzidos pela h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>, não po<strong>de</strong><br />

abrigar ape<strong>na</strong>s os saberes tecnológicos, nem mesmo ape<strong>na</strong>s os saberes<br />

científicos <strong>das</strong> ciências da <strong>na</strong>tureza, da física, da química, da matemática,<br />

etc., que dão sustentação às tecnologias.<br />

98 Embora nosso foco não seja este, achamos pertinente trazer a perspectiva <strong>de</strong> alguns teóricos a<br />

respeito da atual transformação da educação tecnológica no Brasil, <strong>de</strong>ixando inclusive aqui registrado<br />

que achamos <strong>de</strong> s<strong>uma</strong> importância a exploração <strong>de</strong>stes temas para a história da educação brasileira.


132<br />

Mas se é <strong>uma</strong> contradição em termos, é, também, <strong>uma</strong> realida<strong>de</strong> social,<br />

historicamente admitida e <strong>de</strong>senvolvida em muitos países, nos mais<br />

avançados que nos servem <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lo. Não estamos inventando a<br />

universida<strong>de</strong> tecnológica. Estamos aspirando a ter um sistema <strong>de</strong> produção<br />

do conhecimento científico-tecnológico comparável aos países do<br />

capitalismo central (CIAVATTA, 2010, p. 161).<br />

A autora é otimista em tratar do interesse do Brasil em se aproximar do<br />

mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> países <strong>de</strong> sucesso; se a fórmula <strong>de</strong>u certo em outros países, a pergunta<br />

é, por que não daria certo por aqui.<br />

Inicialmente sua expla<strong>na</strong>ção se aproxima da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Lima Filho, no entanto<br />

ela se diferencia por não ver caracterizado um prejuízo para o país ou para o<br />

sistema <strong>de</strong> ensino. Ainda assim, Lima Filho propõe que se discuta o significado dos<br />

conceitos e da transformação, que implica em discussões maiores que passam por<br />

olhar para a história do que se concebeu como educação, bem como do projeto<br />

i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> <strong>na</strong>ção pretendido:<br />

Assim, além da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um aprofundamento maior sobre o<br />

significado conceitual do termo universida<strong>de</strong> tecnológica e <strong>das</strong> implicações<br />

<strong>de</strong> sua adoção e materialização institucio<strong>na</strong>l <strong>na</strong> educação brasileira<br />

compondo marcos <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> educação superior, <strong>de</strong>staco que a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transformação dos Cefet em universida<strong>de</strong>s ou<br />

universida<strong>de</strong>s tecnológicas, ou a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s<br />

tecnológicas, ainda que não originárias <strong>de</strong> Cefet, <strong>de</strong>ve levar em<br />

consi<strong>de</strong>ração a história da formação social e da educação brasileiras. Essa<br />

temática não po<strong>de</strong> estar <strong>de</strong>scolada <strong>de</strong> <strong>uma</strong> discussão maior acerca <strong>de</strong> um<br />

projeto <strong>de</strong> <strong>na</strong>ção para a socieda<strong>de</strong> brasileira e <strong>de</strong> suas priorida<strong>de</strong>s sociais,<br />

no qual se localiza a política pública para a educação (LIMA FILHO, 2010,<br />

p. 144-145).<br />

Lima Filho (2010, p. 145) ao tratar da <strong>de</strong>finição dos termos afirma que<br />

ambos estão carregados <strong>de</strong> historicida<strong>de</strong>. Universida<strong>de</strong> faria referência “à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

pluralida<strong>de</strong> do saber, à busca da universalida<strong>de</strong> do conhecimento e à<br />

indissociabilida<strong>de</strong> entre ensino, pesquisa e extensão”, e ao se justapor um adjetivo,<br />

além <strong>de</strong> se nos apresentar <strong>uma</strong> contradição, há ainda o risco <strong>de</strong> incorrermos em<br />

reducionismo ou <strong>de</strong>terminismo tecnológico. Por ser polissêmico, o autor consi<strong>de</strong>ra o<br />

termo tecnologia a partir <strong>de</strong> duas matrizes conceituais, a relacio<strong>na</strong>l e a<br />

instrumental 99 . A tecnologia se mostraria<br />

99 “(i) a matriz relacio<strong>na</strong>l, que compreen<strong>de</strong> a tecnologia como construção, aplicação e apropriação <strong>das</strong><br />

práticas, saberes e conhecimentos; (ii) a matriz instrumental, que compreen<strong>de</strong> a tecnologia como<br />

técnica, isto é, como aplicação prática <strong>de</strong> saberes e conhecimentos” (LIMA FILHO e QUELUZ, 2005,


133<br />

cada vez mais indissociável <strong>das</strong> práticas sociais cotidia<strong>na</strong>s, em seus vários<br />

campos/diversida<strong>de</strong>s/tempos e espaços, [que] assume <strong>uma</strong> dimensão<br />

sociocultural, <strong>uma</strong> centralida<strong>de</strong> geral, e não específica, <strong>na</strong> sociabilida<strong>de</strong><br />

h<strong>uma</strong><strong>na</strong>, inclusive <strong>na</strong> produção do conhecimento e no processo educativo, o<br />

que inclui a universida<strong>de</strong> (LIMA FILHO, 2010, p. 147).<br />

Ao tomarmos Ciência e Tecnologia como construções sociais e universida<strong>de</strong><br />

como espaço plural <strong>de</strong> saberes temos a perspectiva <strong>de</strong> que todos – homens e<br />

<strong>mulheres</strong> – <strong>de</strong>vem estar envolvidos. In<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>das</strong> discussões em torno da<br />

conceituação, o que nos interessa é termos a participação <strong>de</strong> todos os agentes para<br />

que não se percam as múltiplas experiências e olhares, enfim.<br />

Em relação à trajetória diferenciada da Universida<strong>de</strong> Tecnológica, em<br />

comparação com outras universida<strong>de</strong>s, o problema resi<strong>de</strong> <strong>na</strong> questão da divisão que<br />

segrega e hierarquiza.<br />

Com base <strong>na</strong> divisão técnica e social do trabalho, a história da educação no<br />

Brasil apresenta-se como <strong>uma</strong> disputa permanente, explícita ou latente,<br />

pela separação entre a formação geral e a formação profissio<strong>na</strong>l. A<br />

primeira, conduzindo à educação <strong>de</strong> nível superior e a segunda, ao<br />

trabalho, à formação profissio<strong>na</strong>l para as ativida<strong>de</strong>s manuais e técnicas<br />

(CIAVATTA, 2010, p. 160).<br />

Sua conclusão se mostra em consonância com os autores e autoras que<br />

vimos até aqui. Po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar que leis e instituições foram responsáveis por<br />

reproduzir esta dicotomia, ao contrário do que se espera em se tratando <strong>de</strong> <strong>uma</strong> luta<br />

pela equida<strong>de</strong>. As transformações que atingem as instituições <strong>de</strong> nível superior<br />

po<strong>de</strong>m ser só mais <strong>uma</strong> fase, como po<strong>de</strong>m ser si<strong>na</strong>is <strong>de</strong> novas possibilida<strong>de</strong>s.<br />

Na nova configuração <strong>das</strong> instituições <strong>de</strong> nível superior, espera-se que a<br />

tentativa <strong>de</strong> superação faça parte <strong>de</strong> seus projetos político-pedagógicos, prevendo<br />

que porque toda a carga histórica recai sobre estas novas possibilida<strong>de</strong>s, as<br />

mudanças po<strong>de</strong>m ser positivas. Possibilida<strong>de</strong>s para trabalhadores, que têm <strong>uma</strong><br />

nova perspectiva <strong>de</strong> formação; mais do que nunca a formação profissio<strong>na</strong>l é vista<br />

como <strong>uma</strong> saída para o <strong>de</strong>semprego e a formação integral. Possibilida<strong>de</strong>s para<br />

p. 24). Os autores concluem que “enquanto <strong>na</strong> conceituação relacio<strong>na</strong>l a tecnologia é compreendida<br />

como construção social complexa integrada às relações sociais <strong>de</strong> produção, <strong>na</strong> conceituação<br />

instrumental atribui-se especificida<strong>de</strong> e autonomia que não somente a concebe isolada <strong>das</strong> relações<br />

sociais, como, em certa medida as <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>”.


134<br />

docentes <strong>de</strong> diferentes áreas do conhecimento se integrarem e pensarem juntos a<br />

educação tecnológica. Possibilida<strong>de</strong>s para a socieda<strong>de</strong> brasileira que tem n<strong>uma</strong><br />

nova etapa da educação profissio<strong>na</strong>l possibilida<strong>de</strong>s para alcançarmos o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong><br />

formação integral.<br />

A proposta <strong>de</strong> Ciavatta é que haja compromisso por parte <strong>de</strong> alguns<br />

agentes:<br />

O papel dos intelectuais, dos professores, é “pôr or<strong>de</strong>m <strong>na</strong>s i<strong>de</strong>ias”<br />

mistificadoras que sob a égi<strong>de</strong> da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong>m reduzir o<br />

conhecimento a <strong>uma</strong> ciência antiética, abstraída <strong>de</strong> suas consequências<br />

para a h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong>, ou reduzi-lo ao exercício <strong>de</strong> técnicas produtivas e a<br />

práticas que não conduzem à amplitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> visão que o conhecimento social<br />

contém. Também é seu papel pôr “or<strong>de</strong>m <strong>na</strong>s i<strong>de</strong>ias” sobre a<br />

responsabilida<strong>de</strong> da socieda<strong>de</strong> em organizar-se para gerir a distribuição <strong>de</strong><br />

renda e <strong>de</strong> conhecimento e universalizar a educação básica até o nível<br />

médio, <strong>de</strong> modo a garantir padrões h<strong>uma</strong>nizados <strong>de</strong> vida a toda a<br />

população (CIAVATTA, 2010, p. 170).<br />

E acrescenta:<br />

Cabe aos senhores gestores <strong>das</strong> universida<strong>de</strong>s tecnológicas e <strong>das</strong> políticas<br />

públicas gover<strong>na</strong>mentais e institucio<strong>na</strong>is, engenheiros especializados,<br />

cientistas <strong>das</strong> áreas afins respon<strong>de</strong>r às questões do ensino e da pesquisa<br />

como um compromisso científico-tecnológico e ético-político. [...] Significa,<br />

ainda, empenhar-se <strong>na</strong> produção, minimamente, autônoma e sobera<strong>na</strong> da<br />

ciência e da tecnologia para respon<strong>de</strong>r aos problemas can<strong>de</strong>ntes do país<br />

(CIAVATTA, 2010, p. 171-172).<br />

Seria ingênuo pensar que mantendo as <strong>mulheres</strong> longe <strong>das</strong> <strong>de</strong>cisões<br />

chegaríamos efetivamente a realizar estes i<strong>de</strong>ais. Para cumprir com estes<br />

propósitos, instituições têm <strong>de</strong> sofrer mudanças, assim como, indiscutivelmente, o<br />

campo científico-tecnológico tem que passar por <strong>uma</strong> reestruturação que questione<br />

sua constituição e formas <strong>de</strong> atuação, <strong>de</strong> maneira a abrir espaço a to<strong>das</strong> as pessoas<br />

que tenham possibilida<strong>de</strong> e vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> chegar até ele. Assim como coloca Tabak<br />

(2002), é inconcebível que se <strong>de</strong>spreze o potencial <strong>de</strong> meta<strong>de</strong> da população que<br />

po<strong>de</strong> contribuir assim como a outra meta<strong>de</strong>, nesse momento em que fazer Ciência e<br />

produzir Tecnologia são indispensáveis para o <strong>de</strong>senvolvimento econômico, político<br />

e social do país.<br />

Este resumo <strong>de</strong> como foram os caminhos do ensino industrial/profissio<strong>na</strong>l no<br />

país nos induzem a pensar sobre que bases a Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do


135<br />

Paraná foi criada. Diferentemente <strong>de</strong> outras instituições <strong>de</strong> nível superior, que, em<br />

sua maioria, foram cria<strong>das</strong> como faculda<strong>de</strong>s para <strong>de</strong>pois, por um processo <strong>de</strong> união,<br />

darem corpo a universida<strong>de</strong>s – centros <strong>de</strong> Ensino, Pesquisa e Extensão – a<br />

Universida<strong>de</strong> Tecnológica se construiu sobre <strong>uma</strong> trajetória <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> ofícios,<br />

<strong>de</strong> preparação para o trabalho, coadu<strong>na</strong>ndo ensinos profissio<strong>na</strong>l e propedêutico,<br />

interessado em “povoar” o país <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra qualificada. Quando, ao ingressar<br />

no nível do ensino superior a instituição se viu voltada a outros fins, muitos dos<br />

arranjos se mantiveram, <strong>de</strong>ntre eles o <strong>de</strong> manter professoras e professores em<br />

espaços pré-<strong>de</strong>finidos socialmente. E ainda que recentemente tenham ocorrido<br />

mudanças consi<strong>de</strong>ráveis em relação à questão da mulher <strong>na</strong> instituição estudada,<br />

seus primeiros anos foram praticamente esquecidos. Na sequência, nosso papel é<br />

trazer à to<strong>na</strong> <strong>uma</strong> nova história da <strong>UTFPR</strong> – nesta história consi<strong>de</strong>ra-se e articula-se<br />

a trajetória do ensino profissio<strong>na</strong>l e da produção científica no Brasil.<br />

A seguir, no quadro 1, apresentamos os principais acontecimentos da<br />

história da Universida<strong>de</strong> Tecnológica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua criação, até os dias atuais. Adiante<br />

estes mesmos dados servirão <strong>de</strong> pano <strong>de</strong> fundo para os acontecimentos e dados<br />

encontrados para esta pesquisa:


136<br />

1909 Criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes Artífices 100 . No Paraná a capital recebeu a Escola <strong>de</strong><br />

Aprendizes Artífices do Paraná que começou a funcio<strong>na</strong>r em janeiro <strong>de</strong> 1910 em prédio <strong>na</strong><br />

Praça Carlos Gomes 101 , no centro da cida<strong>de</strong>.<br />

1936 Devido ao crescimento no número <strong>de</strong> alunos, a Escola foi para o local no qual permanece<br />

até os dias atuais – a Avenida Sete <strong>de</strong> Setembro esqui<strong>na</strong> com a Rua Desembargador<br />

Westphalen.<br />

1937 A Escola começou a ofertar o ensino <strong>de</strong> 1º grau, passando a se chamar Liceu Industrial do<br />

Paraná.<br />

1942 Após a reformulação da Lei <strong>de</strong> regulamentação <strong>das</strong> instituições <strong>de</strong> formação profissio<strong>na</strong>l<br />

no país e a criação da re<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> educação profissio<strong>na</strong>l, a Escola foi <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>da Escola<br />

Técnica <strong>de</strong> Curitiba.<br />

1943 Oferta dos primeiros cursos técnicos 102 : Construção <strong>de</strong> Máqui<strong>na</strong>s e Motores, Desenho<br />

Técnico e Decoração <strong>de</strong> Interiores. Esse fato terá bastante significação para pensarmos a<br />

entrada <strong>de</strong> alu<strong>na</strong>s e, consequentemente, mais professoras para aten<strong>de</strong>r a <strong>de</strong>manda 103 .<br />

1959 Transformação para Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

1974 Oferta <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduação <strong>de</strong> curta duração: Engenharia <strong>de</strong> Operação <strong>na</strong> área <strong>de</strong><br />

Construção Civil e <strong>de</strong> Elétrica.<br />

1978 Criação do Centro <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> Operações. São ofertados os primeiros cursos plenos<br />

<strong>de</strong> Engenharia, iniciando <strong>uma</strong> mudança <strong>de</strong> status. Como Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação<br />

Tecnológica do Paraná (Cefet-Pr), segundo o site oficial, teria início a “maiorida<strong>de</strong>” 104 da<br />

instituição: nessa fase foi ampliada a oferta <strong>de</strong> ensino para quase todos os níveis: cursos<br />

<strong>de</strong> nível médio (técnicos), <strong>de</strong> graduação e os primeiros <strong>de</strong> pós-graduação – stricto e lato<br />

sensu.<br />

2005 A instituição se transformou em Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná (<strong>UTFPR</strong>).<br />

Quadro 1 – Principais datas da história da <strong>UTFPR</strong><br />

Fonte: www.utfpr.edu.br. Elaboração própria.<br />

100 O Decreto n. 7.568 <strong>de</strong> implantação <strong>das</strong> 19 Escolas <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, <strong>de</strong> 23 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong><br />

1909, <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>va que os alunos tivessem entre 10 e 13 anos e fossem “filhos dos <strong>de</strong>sfavorecidos da<br />

sorte”. Pelo Decreto se instituía Escolas <strong>na</strong>s principais capitais do país, sendo elas: Maceió (AL),<br />

Ma<strong>na</strong>us (AM), Salvador (BA), Fortaleza (CE), Vitória (ES), Goiânia (GO), São Luiz (MA), Belo<br />

Horizonte (MG), Cuiabá (MG), Belém (PA), João Pessoa (PB), Recife (PE), Teresi<strong>na</strong> (PI), Curitiba<br />

(PR), Natal (RN), Florianópolis (SC), Aracaju (SE), São Paulo (SP). Além <strong>de</strong>ssas, a do Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />

foi instalada em Campos e no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul não foi criada <strong>uma</strong> nova escola, mas transformada<br />

<strong>uma</strong> escola já existente, pertencente ao Estado.<br />

101 O prédio existe até hoje, faz esqui<strong>na</strong> com as ruas Pedro Ivo e Lourenço Pinto, e sedia atualmente<br />

a Secretaria <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Obras Públicas, SEOP.<br />

102 Nessa data, no entanto, o que se encontram são registros <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> cursos a nível técnico, mas<br />

<strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>dos cursos <strong>de</strong> II ciclo, <strong>de</strong> formação técnica e pedagógica. Estes cursos serão oficialmente<br />

chamados técnicos cinco anos <strong>de</strong>pois.<br />

103 O contexto <strong>de</strong> entrada <strong>das</strong> alu<strong>na</strong>s está vinculado à implantação <strong>de</strong> cursos consi<strong>de</strong>rados<br />

“femininos”, nos quais era imprescindível a atuação <strong>das</strong> professoras para ensi<strong>na</strong>r boas maneiras,<br />

corte e costura, bordado, enfim.<br />

104<br />

Disponível em: <br />

Acesso em: 12 ago. 2010.


137<br />

5 UNIVERSIDADE, EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E A HISTÓRIA DAS MULHERES<br />

NA <strong>UTFPR</strong><br />

“A história <strong>de</strong>ste campo não requer somente <strong>uma</strong> <strong>na</strong>rrativa linear,<br />

mas um relato mais complexo, que leve em conta, ao mesmo tempo,<br />

a posição variável <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> história, o movimento feminista e<br />

a discipli<strong>na</strong> da história. Embora a história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> esteja<br />

certamente associada à emergência do feminismo, este não<br />

<strong>de</strong>sapareceu, seja como <strong>uma</strong> presença <strong>na</strong> aca<strong>de</strong>mia ou <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong><br />

em geral, ainda que os termos <strong>de</strong> sua organização e <strong>de</strong> sua<br />

existência tenham mudado” (SCOTT, 1992, p. 65)<br />

Nesse momento nos <strong>de</strong>bruçamos mais especificamente sobre alguns dados<br />

históricos e os caminhos percorridos pela Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua criação como Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, enfocando<br />

especialmente a participação <strong>das</strong> professoras <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ano <strong>de</strong> criação da instituição,<br />

bem como os cargos e funções ocupa<strong>das</strong> pelas <strong>mulheres</strong> como docentes ou não, <strong>de</strong><br />

maneira a ter um panorama da participação <strong>de</strong>ssas funcionárias.<br />

Interessa-nos relatar aqui os dados que foram encontrados durante a<br />

pesquisa, justamente para perceber qual foi o grau <strong>de</strong> participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong><br />

nos primeiros 50 anos <strong>de</strong> história e como isso teria influenciado o atual quadro<br />

funcio<strong>na</strong>l em termos quantitativos, refletindo nos números em relação à atuação <strong>na</strong><br />

pesquisa científica e a consolidação da instituição como Universida<strong>de</strong>.<br />

A partir daqui apresentaremos dados a respeito <strong>de</strong> quais as primeiras<br />

<strong>mulheres</strong> a participarem <strong>de</strong>ssa história. Estas participaram <strong>de</strong> <strong>uma</strong> trajetória que<br />

possibilitou que agora no século atual encontremos o nome da instituição associado<br />

a inúmeros programas <strong>de</strong> pós-graduação e inúmeras pesquisas <strong>de</strong> peso no cenário<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l.


138<br />

5.1 PRIMEIRA FASE (1909-1936): PROFESSORAS ADJUNTAS OU<br />

COADJUVANTES (IN)VISÍVEIS<br />

No início <strong>de</strong> sua história, no ano <strong>de</strong> 1909, quando o então presi<strong>de</strong>nte Nilo<br />

Peçanha cria <strong>na</strong>s capitais do país as Escolas <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, o público alvo<br />

eram garotos <strong>de</strong> cama<strong>das</strong> menos favoreci<strong>das</strong> da socieda<strong>de</strong>, chamados em vários<br />

momentos <strong>de</strong> “<strong>de</strong>sprovidos da sorte”. As Escolas origi<strong>na</strong>lmente se apresentavam<br />

como um local <strong>de</strong> <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>ção social e h<strong>uma</strong>nitária, pois ensi<strong>na</strong>r ofício àquela época<br />

garantia que os meninos pu<strong>de</strong>ssem sobreviver e sustentar a família. O objetivo <strong>de</strong>las<br />

portanto era oferecer ensino profissio<strong>na</strong>l/industrial a estes meninos como <strong>uma</strong><br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrada num mercado <strong>de</strong> trabalho que ansiava por mão-<strong>de</strong>-obra<br />

técnica especializada.<br />

Amorim (2004) enten<strong>de</strong> ensino profissio<strong>na</strong>l como o ramo <strong>de</strong> ensino, <strong>de</strong> nível<br />

primário e secundário, que objetiva a formação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra qualificada. O autor<br />

<strong>de</strong>staca que<br />

a criação <strong>das</strong> Escolas <strong>de</strong> Aprendizes Artífices, que mais tar<strong>de</strong> irão compor o<br />

sistema <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> ensino profissio<strong>na</strong>l, procura contemplar tanto as<br />

necessida<strong>de</strong>s da crescente indústria <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l e regio<strong>na</strong>l quanto discipli<strong>na</strong>r<br />

pelo trabalho os filhos <strong>das</strong> classes trabalhadoras, afastando-os <strong>de</strong><br />

quaisquer “<strong>de</strong>svios <strong>de</strong> comportamento”. Está inserida num contexto <strong>de</strong><br />

gran<strong>de</strong>s mudanças pelas quais passa o Brasil, no fi<strong>na</strong>l do século XIX e<br />

primeiras déca<strong>das</strong> do século XX (AMORIM, 2004, p. 20).<br />

Queluz (2000, p. 47), por sua vez, vai dizer que “Pelo menos até 1920, a<br />

instituição caracterizou-se pelo aprendizado <strong>de</strong> ofícios em bases artesa<strong>na</strong>is e pela<br />

precarieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> suas ofici<strong>na</strong>s e equipamentos”. Durante esse período,<br />

a escola tinha caráter primário, e nos quatro anos <strong>de</strong> duração do curso, os<br />

alunos entre 12 e 16 anos, além do trabalho <strong>de</strong> aprendizado <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s,<br />

freqüentavam os cursos <strong>de</strong> instrução elementar e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho. [...] Em 1918,<br />

com o novo regulamento, a faixa etária dos alunos a serem admitidos <strong>na</strong><br />

instituição foi modificada para 10 a 16 anos (QUELUZ, 2000, p. 49).<br />

Amorim tratará <strong>de</strong>ssa primeira década <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento da Escola e<br />

explicará objetivamente como estava estruturada: o mo<strong>de</strong>lo adotado pela Escola era<br />

o <strong>de</strong> grupo escolar,


139<br />

com <strong>uma</strong> gra<strong>de</strong> horária fixa, com as aulas sendo ministra<strong>das</strong> <strong>de</strong> segunda a<br />

sábado pela manhã (duas horas e meia <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s), enquanto as<br />

ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ofici<strong>na</strong> ocorriam à tar<strong>de</strong> (quatro horas <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s). O<br />

currículo básico <strong>de</strong> 1ª a 4ª série era composto pelas discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong><br />

Português, Desenho, Cálculo e Medi<strong>das</strong> <strong>das</strong> Gran<strong>de</strong>zas (cada <strong>uma</strong> com<br />

seis aulas sema<strong>na</strong>is), Prosódia e Explicação dos Vocábulos (quatro aulas<br />

sema<strong>na</strong>is), História e Geografia (<strong>uma</strong> aula sema<strong>na</strong>l cada), com um sistema<br />

<strong>de</strong> rotativida<strong>de</strong> dos professores, especializados em <strong>uma</strong> matéria específica.<br />

Estas eram trabalha<strong>das</strong> partindo-se <strong>das</strong> noções mais simples para os<br />

assuntos mais complexos, caracterizando o método intuitivo, adotado <strong>na</strong><br />

instituição (AMORIM, 2004, p. 30-31. Grifos do autor.).<br />

O método 105 citado é explicado por Queluz como um<br />

aprendizado através da experiência e observação, a antipatia para com os<br />

livros didáticos, a <strong>de</strong>composição do conhecimento em regras simples, o<br />

incentivo ao raciocínio livre. [...] As diversas discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong>veriam ser<br />

integra<strong>das</strong> <strong>de</strong> acordo com as “exigências do trabalho e com a tecnologia<br />

dos ofícios” em harmonia com o programa <strong>de</strong> ensino (QUELUZ, 2000, p.<br />

49).<br />

Segundo os autores, percebemos que a Escola era dividida em dois ciclos: o<br />

primeiro, <strong>de</strong> núcleo geral ou comum, era, como veremos, o espaço <strong>de</strong> atuação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong>, já que as discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> língua portuguesa e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho geralmente eram<br />

ministra<strong>das</strong> por elas.<br />

O segundo dizia respeito ao período da tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às ofici<strong>na</strong>s que<br />

serviam para instruir os meninos profissio<strong>na</strong>l e tecnicamente, por isso e diante dos<br />

relatórios e dados que encontramos po<strong>de</strong>mos dizer que eram somente homens que<br />

ensi<strong>na</strong>vam.<br />

Gonçalves (2006) nos chama atenção que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o século XIX vinha<br />

ocorrendo no Brasil o mesmo que em muitos países europeus: as escolas ofertavam<br />

ensino somente aos meninos. Às <strong>mulheres</strong> sobraria a educação <strong>de</strong>sses meninos, <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> maneira controlada e direcio<strong>na</strong>da 106 , <strong>de</strong> forma a aten<strong>de</strong>r a or<strong>de</strong>m e um ensino<br />

controlado.<br />

105 Conforme tratado em capítulo anterior, o método intuitivo foi o primeiro a ser adotado <strong>na</strong><br />

instituição, e prece<strong>de</strong>u o método <strong>de</strong> João Lu<strong>de</strong>ritz, o que não significa que eles divergiam. Sobre o<br />

assunto ver Queluz, 2000.<br />

106 No caso da Europa no séc. XIX, a Igreja ocupava-se <strong>de</strong>sse controle e direcio<strong>na</strong>mento. Quando a<br />

Igreja per<strong>de</strong> o controle frente aos movimentos feministas que emergiam, o medo começa a fazer<br />

parte à medida que a mulher começa a avançar no espaço público (CHAUÍ, 1987 apud<br />

GONÇALVES, 2006).


140<br />

Como o objetivo central da Instituição era possibilitar o ensino <strong>de</strong> ofícios,<br />

quando se pensa num quadro inicial <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is atuantes <strong>na</strong> Escola, a<br />

tendência histórica foi a <strong>de</strong> registrar, via dados fotográficos e textuais, somente os<br />

homens. É o caso da foto número 1:<br />

Foto 1 – Primeiro quadro <strong>de</strong> servidores da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do Paraná<br />

Fonte: Arquivo Nudhi.<br />

A foto 1 registra o primeiro quadro <strong>de</strong> servidores da Escola; po<strong>de</strong>mos afirmar<br />

que ela ilustra perfeitamente como se concebia a instituição: ensi<strong>na</strong>r um ofício <strong>na</strong>s<br />

áreas <strong>de</strong> alfaiataria, sapataria, marce<strong>na</strong>ria e serralheria para meninos exigia um<br />

corpo docente especializado, com saber prático para passar aos futuros artífices.<br />

Essa exigência quase que relegava exclusivamente os postos aos homens, já que<br />

estes tinham o conhecimento necessário para atuar. Entretanto, ao nos <strong>de</strong>pararmos<br />

com um registro fotográfico com a legenda “Foto do primeiro quadro <strong>de</strong> servidores<br />

da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do Paraná...” somos incita<strong>das</strong> ao erro <strong>de</strong> acreditar<br />

que não existiam <strong>mulheres</strong> atuando, o que não é verda<strong>de</strong>. Já no primeiro ano, dados<br />

do relatório da Escola <strong>de</strong> 1911, apontam que no total eram <strong>de</strong>z os funcionários <strong>na</strong><br />

Escola, e <strong>de</strong>ntre eles <strong>uma</strong> professora.<br />

Nas duas primeiras déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> existência, os números são sempre nesta<br />

proporção – para cada <strong>de</strong>z funcionários <strong>uma</strong> é mulher.


141<br />

O fato <strong>de</strong> não encontrarmos n<strong>uma</strong> <strong>das</strong> primeiras fotos que compõem o<br />

arquivo histórico da Instituição o retrato <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> <strong>das</strong> professoras que atuou <strong>na</strong><br />

Escola nos primeiros 20 anos nos leva a argumentar que o processo <strong>de</strong><br />

invisibilização <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> se <strong>de</strong>u <strong>de</strong>vido à concepção <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> i<strong>de</strong>al político<br />

que vinha se construindo no país no início do século (MACHADO, 2010).<br />

Nome<br />

Alba Bittencourt <strong>de</strong> Abreu<br />

A<strong>na</strong> Marques Guimarães<br />

Ativida<strong>de</strong><br />

Adjunta <strong>de</strong> professor interi<strong>na</strong> do curso<br />

primário<br />

Adjunta <strong>de</strong> professor interi<strong>na</strong> do curso<br />

primário e instrução elementar<br />

Período<br />

inicial<br />

Período<br />

fi<strong>na</strong>l<br />

1910* 1922**<br />

1910* 1939<br />

Fanny Pereira Marques Professora do curso primário 1910 1922**<br />

Maria Clotil<strong>de</strong> Moreira Huebel<br />

Marietta Rodrigues<br />

Izaura Sydney Gasparini (ou Isaura)<br />

Candida Lopes<br />

Maria da Conceição Rodrigues<br />

Fer<strong>na</strong>ndi<strong>na</strong> Lagos Marques<br />

Professora coadjuvante do ensino <strong>de</strong><br />

instrução primária<br />

Professora Coadjuvante interi<strong>na</strong> do<br />

curso <strong>de</strong> instrução elementar<br />

Adjunta do professor do curso <strong>de</strong><br />

instrução elementar / adjunta da<br />

ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Geografia industrial e<br />

História <strong>das</strong> indústrias da Escola<br />

Normal <strong>de</strong> Artes e Ofícios Wenceslau<br />

Braz<br />

Adjunta interi<strong>na</strong> do professor do curso<br />

primário<br />

Adjunta <strong>de</strong> professor do curso <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senho<br />

Coadjuvante do ensino <strong>de</strong> 3ª classe,<br />

professora normal, adjunta interi<strong>na</strong> <strong>de</strong><br />

professor do curso primário e <strong>de</strong><br />

instrução elementar<br />

1910* 1920<br />

1910* 1922**<br />

1912 1926<br />

1915 1922**<br />

1917 1927<br />

1918 1938<br />

Caroli<strong>na</strong> Moreira da Cunha Carneiro (ou<br />

Caroli<strong>na</strong> Moreira <strong>de</strong> Sant'an<strong>na</strong>)<br />

Professora coadjuvante do ensino<br />

primário/coadjuvante do ensino <strong>de</strong><br />

instrução primária<br />

1920 1937<br />

Quadro 2 – Professoras admiti<strong>das</strong> <strong>na</strong> Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices <strong>de</strong> 1910 a 1920<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

* período <strong>de</strong> início do relatório. É bem possível que esta data não esteja exata, porém como não tivemos acesso<br />

a nenhum documento que informasse a data <strong>de</strong> entrada precisa <strong>de</strong>stas <strong>mulheres</strong>, consi<strong>de</strong>ramos o ano do<br />

relatório como início, o que não significa que a entrada tenha sido em 1910.<br />

** ano fi<strong>na</strong>l do relatório. Assim como no ano inicial, po<strong>de</strong> haver alg<strong>uma</strong> diferença em relação à saída <strong>de</strong>stas<br />

<strong>mulheres</strong>, para mais ou para menos.<br />

Curiosamente e contrariando a impressão passada ao observarmos a foto,<br />

em relatório <strong>de</strong> 1910 a 1922 encontramos dados que apontam que eram <strong>mulheres</strong><br />

as que ministravam as aulas no turno da manhã aos 45 alunos, o chamado curso<br />

elementar, equivalente ao ensino primário – elas eram chama<strong>das</strong> professoras do


142<br />

curso primário ou <strong>de</strong> instrução elementar; no entanto, não encontramos informação<br />

se alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong>las era responsável por discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> formação técnica especializada.<br />

Eram no total <strong>de</strong>z as <strong>mulheres</strong> que atuaram <strong>na</strong>queles anos iniciais, conforme vemos<br />

no quadro 2.<br />

Porque tivemos acesso a folhas <strong>de</strong> pagamento e relatórios internos <strong>de</strong><br />

controle da direção, foi possível elaborar o quadro 2 com o nome <strong>das</strong> <strong>de</strong>z primeiras<br />

professoras da Instituição. O primeiro nome com que nos <strong>de</strong>paramos já <strong>na</strong> folha <strong>de</strong><br />

pagamento <strong>de</strong> 1910 foi o da professora Fanny Pereira Marques. Infelizmente foi a<br />

única informação encontrada a seu respeito. O mesmo ocorreu em relação às outras<br />

professoras: poucas informações.<br />

Temos então Fanny Pereira Marques como a primeira mulher a ingressar <strong>na</strong><br />

Escola, nomeada exatamente no dia <strong>de</strong> sua i<strong>na</strong>uguração em 14 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1910<br />

com os <strong>de</strong>mais funcionários.<br />

Nesse período inicial muitas professoras foram contrata<strong>das</strong> <strong>na</strong> condição <strong>de</strong><br />

adjunta. Romanowski (2006) vai dizer que este era um modo bastante comum para<br />

preparação <strong>de</strong> docentes no século XIX, já que, com a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong><br />

ensino básico à população pós In<strong>de</strong>pendência e Proclamação da República, era<br />

necessária a formação <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>-obra para atuarem. No entanto, a prática <strong>de</strong><br />

contratação <strong>de</strong> pessoas sem muito preparo acaba se dissemi<strong>na</strong>ndo, e <strong>uma</strong> saída se<br />

<strong>de</strong>u através da contratação <strong>de</strong> pessoas interessa<strong>das</strong> <strong>na</strong> condição <strong>de</strong> aprendizes; os<br />

“adjuntos permaneciam por algum tempo com professores experientes para<br />

realizarem a sua formação e a iniciação no ofício; era <strong>uma</strong> formação guiada pela<br />

reprodução da prática” (ROMANOWSKI, 2006, p. 75-76).<br />

Até a década <strong>de</strong> 1930 foram várias as que ingressaram <strong>na</strong> Escola como<br />

adjuntas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, adjuntas <strong>de</strong> professor do curso <strong>de</strong> instrução elementar e <strong>de</strong><br />

instrução primária. Na verda<strong>de</strong>, ainda que as nomenclaturas fossem diferentes, elas<br />

diziam respeito à atuação <strong>das</strong> professoras somente no nível primário e elementar,<br />

“especialida<strong>de</strong>” da Escola conforme supracitado; basicamente então víamos as<br />

<strong>mulheres</strong> atuando nos cursos <strong>de</strong> instrução elementar e, mais adiante, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho,<br />

nunca <strong>na</strong>s ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong> a formar os meninos <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> alfaiataria,<br />

sapataria, marce<strong>na</strong>ria e serralheria, que ocorriam no turno da tar<strong>de</strong>.<br />

Na ocasião do início <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento da Escola, Machado (2010) <strong>de</strong>staca<br />

que havia <strong>uma</strong> professora titular <strong>de</strong> instrução primária e os professores que atuavam


143<br />

<strong>na</strong> mesma função eram adjuntos, o que para a autora evi<strong>de</strong>ncia que “ao longo <strong>das</strong><br />

déca<strong>das</strong>, acompanhando as reformulações legais, as professoras vão per<strong>de</strong>ndo<br />

espaço <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba, à medida que o nível <strong>de</strong> exigência <strong>de</strong><br />

escolarida<strong>de</strong> dos alunos ia sendo aumentado” (2010, p. 109).<br />

Queluz (2000) apresenta <strong>uma</strong> revisão <strong>de</strong> como se estruturava o ensino<br />

primário e, a<strong>na</strong>lisando documentos do período, especialmente o material “Esboços<br />

<strong>de</strong> Programas <strong>de</strong> Ensino” da Escola, <strong>de</strong> 1924, no qual o então diretor Paulo<br />

Il<strong>de</strong>fonso faz <strong>uma</strong> longa explicação a respeito do método adotado para ensi<strong>na</strong>r os<br />

meninos, já tratado no capítulo anterior, encontramos <strong>uma</strong> referência ao corpo<br />

docente:<br />

Para implementar o seu “sistema rotativo <strong>de</strong> ensino” no ensino primário, ele<br />

[o diretor] contava com <strong>uma</strong> equipe qualificada. Em suas próprias palavras,<br />

estes professores eram “elementos aptos e inteligentes”, “moços <strong>de</strong> preparo<br />

mo<strong>de</strong>rno.” Estes moços eram geralmente oriundos <strong>das</strong> elites locais,<br />

bacharéis como Rubens Klier d’Assumpção [filho do diretor Paulo Il<strong>de</strong>fonso<br />

e futuro diretor da Escola, após a morte do pai], Cyro Silva e Leocádio<br />

Ferreira ou normalistas (Relatório da Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices do<br />

Paraná, 1913, p. 1000 apud QUELUZ, 2000, p. 73. Grifos nossos.).<br />

Detalhe para o fato que os nomes dos professores são citados e <strong>das</strong><br />

professoras “normalistas” não, isso porque seus nomes são encontrados raramente<br />

<strong>na</strong> documentação da época. Como constatamos quando da coleta <strong>de</strong> dados, seus<br />

nomes aparecem <strong>na</strong>s folhas <strong>de</strong> pagamento da época, ou em ofícios e atas redigidos<br />

para algum fim específico, como por exemplo <strong>uma</strong> reunião do corpo docente em que<br />

um documento fosse lavrado; fora isso é difícil encontrar seus nomes associados a<br />

gran<strong>de</strong>s feitos <strong>na</strong> Escola, como por exemplo organização <strong>de</strong> eventos estudantis,<br />

como cost<strong>uma</strong>va acontecer sob orientação dos professores 107 . Um fato recorrente<br />

<strong>na</strong> época era a contratação <strong>de</strong> professoras que atuavam em escolas do estado, o<br />

que po<strong>de</strong> ter ocorrido aqui, já que não foram encontrados registros funcio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>stas<br />

professoras da primeira década <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento da Escola.<br />

Po<strong>de</strong>mos perceber que para alcançar os objetivos colocados para as<br />

Escolas <strong>de</strong> Aprendizes em 1910 as <strong>mulheres</strong> foram solicita<strong>das</strong>, já que elas<br />

107 Como exemplo po<strong>de</strong>mos citar as ofici<strong>na</strong>s <strong>das</strong> quais saíam produtos para serem expostos à<br />

comunida<strong>de</strong> e comercializados; estas exposições eram sempre li<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> pelos professores.


144<br />

comporiam o quadro <strong>de</strong> responsáveis por ensi<strong>na</strong>r conteúdos elementares para a<br />

permanência dos meninos nos primeiros anos.<br />

Na tabela 4, temos o número <strong>de</strong> docentes <strong>na</strong> Escola nos primeiros 10 anos:<br />

Tabela 4 – Distribuição, por gênero, dos docentes no período <strong>de</strong><br />

1911 a 1919<br />

Ano 1911 1912 1913 1914 1915 1916 1917 1918 1919<br />

Homens 9 * 21 21 12 23 * 21 19<br />

Mulheres 1 * 2 2 1 2 * 3 3<br />

Total 10 * 23 23 13 25 * 24 22<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

* dados não localizados.<br />

Enquanto o número <strong>de</strong> homens se mantém n<strong>uma</strong> média <strong>de</strong> <strong>de</strong>zoito nos <strong>de</strong>z<br />

primeiros anos, a média é <strong>de</strong> duas <strong>mulheres</strong> ingressando ao ano; apesar <strong>de</strong> poucas<br />

elas estavam presentes. Do ponto <strong>de</strong> vista do cenário no início do século e do<br />

acesso ao mercado formal que poucas <strong>mulheres</strong> tinham, temos um quadro que<br />

indica que, embora poucas, elas estavam interessa<strong>das</strong> em atuar profissio<strong>na</strong>lmente,<br />

ainda que fosse n<strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> que segundo alg<strong>uma</strong>s autoras representava a<br />

reprodução do que <strong>de</strong>las se esperava <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> (LOURO, 1997; ALMEIDA,<br />

1998).<br />

O número <strong>de</strong> docentes se alterou <strong>na</strong> década seguinte, conforme tabela 5:<br />

Tabela 5 – Distribuição, por gênero, dos docentes no período <strong>de</strong> 1921 a 1930<br />

Ano 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930<br />

Homens 22 19 21 19 19 18 15 16 15 15<br />

Mulheres 7 5 3 4 5 5 4 6 5 2<br />

Total 29 24 24 23 24 23 19 22 20 17<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

Já em 1921, tínhamos sete <strong>mulheres</strong> compondo o quadro docente <strong>na</strong><br />

Instituição, e embora o número apareça <strong>de</strong>caindo, o número proporcio<strong>na</strong>lmente<br />

aumenta em relação aos anos iniciais. Por exemplo, em 1923 a cada sete homens<br />

tínhamos <strong>uma</strong> mulher; em 1929, a cada três homens, <strong>uma</strong> mulher. Estes números<br />

são bastante positivos se consi<strong>de</strong>ramos que nesta época ainda só temos cursos<br />

consi<strong>de</strong>rados masculinos sendo ofertados <strong>na</strong> Escola, por outro lado como o curso


145<br />

primário era visto como “ativida<strong>de</strong>” femini<strong>na</strong>, elas eram indispensáveis.<br />

Problematizando, verificamos <strong>na</strong> realida<strong>de</strong> estudada a repetição <strong>de</strong> um cenário <strong>de</strong><br />

divisão sexual do trabalho, <strong>na</strong> qual <strong>mulheres</strong> atuavam como docentes <strong>de</strong> séries<br />

iniciais – algo bastante recorrente <strong>na</strong> história da educação do Brasil.<br />

Observamos <strong>na</strong> tabela 5 que o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> chegou a um pico <strong>de</strong><br />

sete no ano <strong>de</strong> 1921, representando um terço do total <strong>de</strong> pessoas, número que só<br />

será superado em 1928, momento em que novamente teremos <strong>uma</strong> queda no<br />

número tanto <strong>de</strong> homens quanto <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

No período <strong>de</strong> 1923 a 1925 não encontramos nenhum relatório oficial no<br />

Núcleo <strong>de</strong> Documentação Histórica, porém em alguns documentos são citados<br />

nomes <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s <strong>das</strong> mesmas professoras do período anterior, o que nos leva a<br />

crer que não temos gran<strong>de</strong> renovação ou aumento <strong>de</strong> pessoal do sexo feminino. No<br />

relatório <strong>de</strong> 1926 além da continuida<strong>de</strong> dos trabalhos <strong>de</strong> quatro <strong>das</strong> professoras que<br />

atuaram nos anos iniciais da Escola, mais <strong>uma</strong> se junta ao grupo. No ano <strong>de</strong> 1927<br />

encontramos os mesmos nomes e em 1928 somente três professoras do início<br />

permaneciam e outras duas se juntaram ao grupo; importante lembrar que durante<br />

todo este período estas professoras atuavam somente no nível elementar <strong>de</strong> ensino.<br />

Este mesmo grupo atuará até o ano <strong>de</strong> 1934 quando teremos <strong>uma</strong> nova professora,<br />

e em 1935 duas.<br />

Importante citar que alg<strong>uma</strong>s professoras eram contrata<strong>das</strong> em regime<br />

temporário para suprir as necessida<strong>de</strong>s momentâneas; estas professoras eram<br />

chama<strong>das</strong> “interi<strong>na</strong>s”. Este fato nos leva a pensar que a falta <strong>de</strong> vínculo <strong>de</strong>ixava<br />

estas professoras <strong>de</strong>sprotegi<strong>das</strong>, ou seja, elas podiam ser dispensa<strong>das</strong> a qualquer<br />

momento, o que <strong>de</strong>nota <strong>uma</strong> situação <strong>de</strong> precarização do trabalho. Entretanto para<br />

muitas esta seria <strong>uma</strong> oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação profissio<strong>na</strong>l.<br />

Levando-se em conta a realida<strong>de</strong> da Escola em relação à frequência e<br />

permanência dos meninos nos cursos e ofici<strong>na</strong>s e dos diversos problemas, tanto <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m física (espaço i<strong>na</strong>propriado) quanto econômica (falta <strong>de</strong> maqui<strong>na</strong>ria<br />

apropriada), as primeiras déca<strong>das</strong> se pautaram em condições relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> à<br />

necessida<strong>de</strong> local e <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, já que se vivia um momento <strong>de</strong> mudanças no cenário


146<br />

político-social, no qual os interesses se voltavam a <strong>uma</strong> formação que preparasse os<br />

cidadãos para aten<strong>de</strong>r seu país 108 .<br />

O Relatório que traz os dados <strong>de</strong> 1910 a 1922 por exemplo indica que um<br />

total <strong>de</strong> 54 funcionários teria passado pela Escola no período, entre funcionários<br />

efetivos, contratados e interinos.<br />

A respeito da oscilação no total <strong>de</strong> funcionários e funcionárias da Instituição<br />

que vemos <strong>na</strong>s tabelas 4 e 5, po<strong>de</strong>mos dizer que estes números estavam<br />

diretamente ligados aos números <strong>de</strong> matrículas e <strong>de</strong> concluintes <strong>na</strong>s duas primeiras<br />

déca<strong>das</strong>, quando a evasão e os baixos salários eram problemas que a Escola<br />

enfrentava 109 , o que acabava por repercutir <strong>na</strong> redução no número <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is.<br />

Po<strong>de</strong>mos concluir que as <strong>mulheres</strong> eram sempre requisita<strong>das</strong> porque matrículas<br />

sempre existiram, porém é fato que os números oscilavam tanto para os homens<br />

quanto para as <strong>mulheres</strong>, justamente por causa da flutuação no número <strong>de</strong> alunos.<br />

Como já dissemos, não foi encontrado nenhum documento que falasse<br />

diretamente <strong>das</strong> professoras <strong>das</strong> primeiras déca<strong>das</strong>, e a primeira ficha funcio<strong>na</strong>l 110<br />

encontrada é <strong>de</strong> 1926 da professora Alilat Muricy Borges dos Reis ou Alilat <strong>de</strong><br />

Bittencourt Muricy.<br />

A professora <strong>de</strong> Desenho ingressa <strong>na</strong> re<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> ensino em 1926 <strong>na</strong><br />

Escola Industrial <strong>de</strong> Florianópolis. Em 1928 veio transferida para a Escola Técnica<br />

<strong>de</strong> Curitiba. De 1926, ano <strong>de</strong> ingresso, a 1944 atua como adjunta <strong>de</strong> professor. Em<br />

1945 passa a professora industrial da discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Desenho Or<strong>na</strong>mental. Aposentase<br />

em 1956 e vem a falecer em 1986.<br />

108 Além do exposto em capítulo anterior, para saber mais a respeito do cenário político, social e<br />

econômico que <strong>de</strong>terminou os caminhos seguidos pela Escola, ver as teses <strong>de</strong> Queluz (2000),<br />

Amorim (2004) e Machado (2010).<br />

109 Já em 1918 o Ministro da Agricultura da época e o então presi<strong>de</strong>nte Wenceslau Brás aprovaram<br />

um Decreto que consistia num novo regulamento para as Escolas que <strong>de</strong>veriam estar pensa<strong>das</strong> para<br />

ajudar no processo <strong>de</strong> consolidação e competitivida<strong>de</strong> da mão-<strong>de</strong>-obra <strong>de</strong> trabalho no Brasil. Isso<br />

porque elas passavam por problemas como instalações <strong>de</strong>ficientes; qualificação docente ínfima no<br />

que diz respeito à atuação no ensino industrial, e, nesse caso, alcançando somente pessoal<br />

masculino; salários baixos aos profissio<strong>na</strong>is <strong>das</strong> Escolas; alto índice <strong>de</strong> <strong>de</strong>sistência dos alunos; falta<br />

<strong>de</strong> padrão no ensino ofertado pelas Escolas, falta <strong>de</strong> instrumentos e máqui<strong>na</strong>s (QUELUZ, 2000).<br />

110 As fichas funcio<strong>na</strong>is disponíveis no Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong> quase sempre trazem informações<br />

relativas à formação e vida profissio<strong>na</strong>l. Entretanto as mais antigas não estão completas, o que nos<br />

impe<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer a formação da maioria <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> encontra<strong>das</strong>.


147<br />

Foto 2 – Alilat Muricy Borges dos Reis<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

Além <strong>de</strong> Alilat foram encontrados no Nudhi nomes <strong>de</strong> outras seis<br />

profissio<strong>na</strong>is, entretanto não existem pastas funcio<strong>na</strong>is no Arquivo Geral, o que nos<br />

impossibilitou <strong>de</strong> conhecer mais a seu respeito; as poucas informações obti<strong>das</strong><br />

aparecem no quadro 3 abaixo 111 :<br />

Nome<br />

Ativida<strong>de</strong><br />

Período<br />

inicial<br />

Henriqueta <strong>de</strong> Almeida Adjunta <strong>de</strong> professor do curso <strong>de</strong><br />

Assumpção**<br />

<strong>de</strong>senho 1921 1922<br />

Magdale<strong>na</strong> Navarro** Adjunta do professor <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho 1926 1932<br />

Zenny dos Santos Carrano** Adjunto <strong>de</strong> professor primário 1928 *<br />

Jenny Gartner Roslindo (Ou<br />

Jenny Roslindo Fruet ou Geny)**<br />

Avaní Altheia Bizetti (ou Avany)**<br />

Coadjuvante, professora normal /<br />

Coadjuvante do ensino <strong>de</strong> 3ª classe 1934 1939<br />

Coadjuvante, professora normal,<br />

normalista <strong>de</strong> 1ª Classe 1935 1939<br />

Período<br />

fi<strong>na</strong>l<br />

Coadjuvante, professora normal,<br />

E<strong>na</strong>ura Guimarães**<br />

adjunta <strong>de</strong> professor 1935 1939<br />

Quadro 3 – Professoras que ingressaram <strong>na</strong> Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices <strong>de</strong> 1920 a 1936<br />

Fonte: Dados encontrados no arquivo do Nudhi e Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>. Elaboração própria.<br />

* informação não localizada no Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

** não localizada pasta no Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

111 Nossa busca por nomes <strong>das</strong> primeiras professoras da Escola ficou com o recorte qualitativo, além<br />

do quantitativo, nos primeiros 50 anos <strong>de</strong> história da Escola. Portanto, além <strong>de</strong> citar os números,<br />

procuramos citar o nome e as informações obti<strong>das</strong> <strong>de</strong> cada <strong>uma</strong> <strong>das</strong> professoras. Esse recorte foi<br />

feito justamente porque a partir <strong>de</strong> 1970, ou terceira fase, o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> cresceu, juntamente<br />

com o número <strong>de</strong> funcionários, ficando difícil citar to<strong>das</strong> as <strong>mulheres</strong> neste trabalho, mesmo porque<br />

não é este nosso objetivo.


148<br />

Observamos <strong>uma</strong> inconsistência quanto à grafia dos nomes. Muito<br />

provavelmente alguns <strong>de</strong>les foram alterados após o matrimônio quando ainda era<br />

obrigatório que a mulher adotasse o nome do marido, no entanto, as fichas<br />

funcio<strong>na</strong>is não <strong>de</strong>ram conta <strong>de</strong> informar a este respeito.<br />

Em s<strong>uma</strong>, o cenário encontrado nesta primeira fase está pautado em<br />

condições bem específicas: são poucas as opções <strong>de</strong> atuação para as <strong>mulheres</strong>, e<br />

portanto as contratações se davam <strong>de</strong> maneira pon<strong>de</strong>rada, <strong>de</strong> acordo com as<br />

necessida<strong>de</strong>s. Quando afirmamos isso, temos em mente que a partir <strong>de</strong> <strong>uma</strong> divisão<br />

sexual do trabalho as necessida<strong>de</strong>s cria<strong>das</strong> eram especificamente em alg<strong>uma</strong>s<br />

áreas.<br />

5.2 SEGUNDA FASE (1937-1970): AS NORMALISTAS DO LICEU INDUSTRIAL DO<br />

PARANÁ<br />

Uma segunda fase da Escola conheceremos a partir do ano <strong>de</strong> 1937; por<br />

visar primordialmente à formação profissio<strong>na</strong>l a Escola será elevada ao estatuto <strong>de</strong><br />

Liceu Industrial do Paraná, tendo como gran<strong>de</strong> avanço a instituição do ensino <strong>de</strong> 1º<br />

grau, correspon<strong>de</strong>nte ao atual ensino fundamental.<br />

A partir <strong>de</strong>ste momento teremos <strong>uma</strong> configuração cada vez mais voltada ao<br />

profissio<strong>na</strong>lizante, portanto, os anos iniciais sendo extintos, o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

ten<strong>de</strong>rá a diminuir.<br />

Alguns relatórios são importantes para conhecermos a configuração da<br />

Escola nos anos que antece<strong>de</strong>m esta nova fase.<br />

Referente ao ano <strong>de</strong> 1935, o Boletim <strong>de</strong> Informações do Ministério da<br />

Educação e Saú<strong>de</strong> 112 traz os seguintes dados: o curso primário complementar tem<br />

seis docentes, <strong>de</strong>stes dois homens e quatro <strong>mulheres</strong>; no curso <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho dos<br />

quatro docentes três eram homens e <strong>uma</strong> mulher, e o curso profissio<strong>na</strong>l técnico, os<br />

sete docentes eram homens.<br />

112 Documento disponível no Nudhi, caixa ano 1935.


149<br />

No relatório referente ao ano <strong>de</strong> 1936 113 , o mesmo Boletim <strong>de</strong> Informações<br />

do Ministério da Educação e Saú<strong>de</strong> indica que o curso primário complementar tinha<br />

oito docentes, sendo sete <strong>mulheres</strong>; o curso <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho permanecia com a mesma<br />

configuração e o curso profissio<strong>na</strong>l técnico teve o número <strong>de</strong> docentes homens<br />

aumentado para oito. Já o Boletim <strong>de</strong> Informações do Ministério da Educação e<br />

Saú<strong>de</strong> do ano <strong>de</strong> 1938 114 tem <strong>uma</strong> curiosida<strong>de</strong>: o número <strong>de</strong> alunos aparece<br />

<strong>de</strong>sagregado por gênero, porém não havia nenh<strong>uma</strong> meni<strong>na</strong>. Neste também vemos<br />

a organização e movimento dos cursos ministrados no estabelecimento. O chamado<br />

"Primo-médio" tinha nove pessoas no corpo docente: dois homens e sete <strong>mulheres</strong>;<br />

e o curso <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, um homem e <strong>uma</strong> mulher.<br />

Outra mudança em relação ao período anterior observamos no relatório <strong>de</strong><br />

1938: as servidoras que ingressaram nestes anos foram admiti<strong>das</strong> com o cargo <strong>de</strong><br />

“professora normal”.<br />

O relatório aparece bastante <strong>de</strong>talhado quanto a alg<strong>uma</strong>s especificida<strong>de</strong>s<br />

dos professores e professoras:<br />

Nome<br />

Jenny Gartner Roslindo<br />

E<strong>na</strong>ura Guimarães<br />

Alilat <strong>de</strong> Bittencourt Muricy<br />

Fer<strong>na</strong>ndi<strong>na</strong> Lagos Marques<br />

A<strong>na</strong> Marques Guimarães<br />

Avaní Altheia Bizetti<br />

Hilda Bley Oliveira<br />

Nice Lopes Schwartz<br />

Maria Arruda A. Ribeiro<br />

Dr. Leôni<strong>das</strong> M. Loyola<br />

Felix Szabô<br />

André Huber<br />

Detalhamento<br />

24 anos, coadjuvante, professora normal<br />

22 anos, coadjuvante, professora normal<br />

30 anos, coadjuvante, professora normal<br />

41 anos, coadjuvante, professora normal<br />

48 anos, coadjuvante, professora normal<br />

21 anos, coadjuvante, professora normal<br />

25 anos, coadjuvante, professora normal<br />

24 anos, coadjuvante, professora normal<br />

25 anos, coadjuvante, professora normal<br />

45 anos, catedrático, Bach. Direito<br />

32 anos, catedrático, Dip. Esta Escola<br />

66 anos, alemão, mestre alf., Oficial Alfaiate<br />

Carlos Langer Junior 49 anos, mestre mecânica, eletricista<br />

Quadro 4 – Dados do Relatório <strong>de</strong> 1938<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

É bem possível que este relatório não esteja completo, pois aparecem<br />

somente quatro homens. Entretanto, interessa-nos apresentar aqui por sua<br />

preocupação em registrar a ida<strong>de</strong> e a formação <strong>de</strong> alguns docentes, dados pelos<br />

quais po<strong>de</strong>mos inferir algo.<br />

113 Documento disponível no Nudhi, caixa ano 1936.<br />

114 Documento disponível no Nudhi, caixa ano 1938 A1.


150<br />

Po<strong>de</strong>mos perceber que to<strong>das</strong> as professoras aparecem com <strong>uma</strong><br />

informação padrão e somente a ida<strong>de</strong> difere, levando-nos a acreditar que a<br />

formação mínima as restringia a ativida<strong>de</strong>s únicas. Já em relação aos professores<br />

elencados, cada um <strong>de</strong>les tem <strong>uma</strong> formação diferente. A ida<strong>de</strong> também chama<br />

atenção, pois <strong>na</strong> média as <strong>mulheres</strong> tinham 30 anos, contra 48 dos homens. Como a<br />

maioria <strong>das</strong> normalistas estava <strong>na</strong> faixa dos 20 e poucos anos, ratifica-se a<br />

afirmação <strong>de</strong> Scott (1994) quando diz que as recruta<strong>das</strong> para ensi<strong>na</strong>r eram<br />

comumente <strong>mulheres</strong> jovens.<br />

No ano <strong>de</strong> 1939, as professoras que ingressaram foram chama<strong>das</strong><br />

“normalistas <strong>de</strong> 1ª classe”, conforme constatamos em alguns documentos.<br />

A partir <strong>de</strong>sse momento, po<strong>de</strong>mos dizer que não havia mais como negar a<br />

presença <strong>de</strong>las. Vejamos a foto a seguir:<br />

Foto 3 – Reunião <strong>de</strong> confraternização do Liceu Industrial do Paraná em novembro <strong>de</strong> 1939<br />

Fonte: Revista Labor, n. 1, abr. 1940. Arquivo Nudhi.<br />

A foto 3 foi tirada quando da reunião <strong>de</strong> confraternização que aconteceu em<br />

30 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1939, da Administração e corpo docente, para marcar o fim do<br />

ano letivo e os votos pela próspera direção <strong>de</strong> Lauro Wilhelm. Nela po<strong>de</strong>mos ver um<br />

número consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> fazendo parte da reunião <strong>de</strong>dicada aos<br />

profissio<strong>na</strong>is da Escola. Se comparamos com o relatório <strong>de</strong> 1938 em que apareciam<br />

nove <strong>mulheres</strong>, um ano <strong>de</strong>pois mais <strong>uma</strong> se juntaria ao grupo, e to<strong>das</strong> formariam o<br />

quadro funcio<strong>na</strong>l da Escola agora composto por quinze homens e <strong>de</strong>z <strong>mulheres</strong>.


151<br />

Com base no que apresentamos em relação à feminização da função<br />

docente e o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> formadora, po<strong>de</strong>mos afirmar que as professoras atuantes<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices foram criteriosamente escolhi<strong>das</strong>. Isso se<br />

comprova <strong>na</strong>s imagens e legen<strong>das</strong> publica<strong>das</strong> no primeiro número da Revista<br />

Labor 115 , em consonância com o que se entendia como atributos a<strong>de</strong>quados à<br />

convivência em socieda<strong>de</strong>. Em janeiro <strong>de</strong> 1940 publicavam-se as fotos <strong>de</strong> quatro<br />

professoras da Instituição (três <strong>de</strong>las apareceram no quadro 4), para parabenizá-las<br />

pela passagem <strong>de</strong> seus aniversários. Reproduzimos abaixo as imagens e<br />

respectivas legen<strong>das</strong>.<br />

Foto 4 – Professora E<strong>na</strong>ura Guimarães<br />

Fonte: Revista Labor, n. 1, abr. 1940.<br />

115 A Revista Labor foi a primeira publicação institucio<strong>na</strong>l responsável por divulgar inter<strong>na</strong> e<br />

exter<strong>na</strong>mente as ações da Escola <strong>de</strong> Aprendizes, agora Liceu Industrial do Paraná. Para Amorim<br />

(2004, p. 133), a “Labor foi um veículo <strong>de</strong> imprensa escolar que teve o papel <strong>de</strong> contribuir para a<br />

construção do mito da doação da legislação do ensino industrial, on<strong>de</strong> to<strong>das</strong> as propostas e<br />

experiências anteriores sobre este ramo da educação foram <strong>de</strong>forma<strong>das</strong>, isto é, retrabalha<strong>das</strong> pelo<br />

discurso getulista”.


152<br />

Foto 5 – Professora Hilda <strong>de</strong> Oliveira<br />

Fonte: Revista Labor, n. 1, abr. 1940.<br />

Foto 6 – Professora Avaní Altéia Buzetti<br />

Fonte: Revista Labor, n. 1, abr. 1940.


153<br />

Foto 7 – Professora Solange Marques<br />

Fonte: Revista Labor, n. 1, abr. 1940.<br />

Em comum, além <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> reputação admirada, atestada pelas<br />

qualificações “possuidora <strong>de</strong> nobres predicados e elemento <strong>de</strong> alta projeção <strong>na</strong><br />

nossa socieda<strong>de</strong>”; “dotada <strong>de</strong> raros predicados” etc., elas eram apresenta<strong>das</strong> e<br />

parabeniza<strong>das</strong> pela passagem <strong>de</strong> seus aniversários, <strong>de</strong> maneira a expor<br />

publicamente que eram renomes da socieda<strong>de</strong> para<strong>na</strong>ense: Solange Marques e<br />

Avaní Buzetti eram solteiras. Hilda <strong>de</strong> Oliveira e E<strong>na</strong>ura Guimarães, por sua vez,<br />

tinham <strong>uma</strong> figura masculi<strong>na</strong> a elas associada no ambiente <strong>de</strong> trabalho. E<strong>na</strong>ura era<br />

filha <strong>de</strong> um coronel – Adolfo Guimarães –, e Hilda era casada com o senhor Roberto<br />

Doria <strong>de</strong> Oliveira. Só por seus vínculos podia-se dizer que elas provavelmente<br />

atendiam ao i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> professora. A figura masculi<strong>na</strong>, portanto, representava <strong>uma</strong><br />

forma <strong>de</strong> manter estas moças com <strong>uma</strong> boa imagem <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong>.<br />

Somada ao fato <strong>de</strong> serem jovens, a reputação garantia a permanência<br />

<strong>de</strong>stas <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Escola. Elas foram exemplos <strong>das</strong> normalistas <strong>de</strong> que tanto<br />

ouviremos falar como representantes <strong>de</strong> <strong>uma</strong> nova etapa <strong>na</strong> história da educação no<br />

Brasil, que relegou a elas a dura responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alfabetizar milhares <strong>de</strong><br />

cidadãos ao longo do século XX.<br />

Apesar <strong>de</strong> mais visibiliza<strong>das</strong> em comparação com o período anterior, <strong>na</strong><br />

tabela 6 vemos novamente <strong>uma</strong> diminuição no número <strong>de</strong> professoras:


154<br />

Tabela 6 – Valores absolutos do número <strong>de</strong> homens e <strong>mulheres</strong> no período <strong>de</strong><br />

1931 a 1942<br />

Ano 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938 1939 1940 1941 1942<br />

Homens 13 15 ** 14 15 17 18 16 20 * ** 17<br />

Mulheres 3 2 ** 4 3 3 3 4 4 * ** 5<br />

Total 16 17 ** 18 18 20 21 20 24 20 ** 22<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

* somente dados totais.<br />

** dados não localizados.<br />

Machado (2010) chama atenção para a diminuição no número <strong>de</strong><br />

funcionárias <strong>na</strong> escola ao longo dos anos tanto em relação ao número <strong>de</strong> homens e<br />

<strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>. Por exemplo observando o dado <strong>de</strong> 1919 (tabela 4), eram vinte e dois<br />

funcionários <strong>na</strong> Escola, e <strong>de</strong>stes três eram <strong>mulheres</strong>; já em 1932 (tabela 6) dos<br />

<strong>de</strong>zessete funcionários, duas eram professoras, <strong>uma</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho e outra <strong>de</strong><br />

instrução primária, ambas adjuntas, ou seja, não titulares <strong>das</strong> ca<strong>de</strong>iras.<br />

O que se vê é que no fi<strong>na</strong>l da década <strong>de</strong> 1920 até 1942 tanto o número <strong>de</strong><br />

homens quanto o <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> volta a cair, o que po<strong>de</strong> ser relacio<strong>na</strong>do com as<br />

mudanças por que o ensino industrial passava e as inúmeras a<strong>de</strong>quações que<br />

viriam após este período.<br />

Po<strong>de</strong>mos dizer que <strong>uma</strong> primeira gran<strong>de</strong> transformação ocorre em 1942: é<br />

criada a re<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> ensino industrial e a Lei Orgânica do Ensino<br />

Industrial que, por sua vez, criará as Escolas Industriais, fazendo o Liceu passar a<br />

Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba. Com a mudança, o ensino passou a ser ministrado em<br />

dois ciclos, <strong>de</strong>mandando contratação <strong>de</strong> novos professores para atuar, no primeiro<br />

ciclo <strong>de</strong> ensino industrial básico, mestria e artesa<strong>na</strong>l, e no segundo, <strong>de</strong> ensino<br />

técnico e pedagógico.<br />

Machado ressalta que a mudança fará <strong>na</strong>scer a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ampliação<br />

da Escola no período:<br />

A possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ampliação da área <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da à Escola, vislumbrada em<br />

fins <strong>de</strong> 1941, vai ganhar força efetivamente a partir <strong>de</strong> 1946, quando o<br />

processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sapropriação <strong>das</strong> áreas vizinhas, conjugada com a doação<br />

<strong>de</strong> terrenos pelo governo do Estado, resultou <strong>na</strong> melhoria da estrutura<br />

oferecida <strong>na</strong> Instituição, com a construção <strong>de</strong> <strong>de</strong>z novas ofici<strong>na</strong>s, refeitório,<br />

auditório, pisci<strong>na</strong>, ginásio <strong>de</strong> esportes e, inclusive, inter<strong>na</strong>to (MACHADO,<br />

2010, p. 193).


155<br />

A transformação atinge as <strong>mulheres</strong> pelo menos em dois sentidos: aumenta<br />

o número <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> escola, não sendo menos que vinte, e<br />

amplia-se a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação; até então elas atuavam no ensino elementar,<br />

como professoras do curso primário ou até mesmo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho, mas <strong>na</strong>da além<br />

<strong>de</strong>ssas possibilida<strong>de</strong>s. Ainda que recebessem <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ções diferentes, elas<br />

<strong>de</strong>sempenhavam o mesmo conjunto <strong>de</strong> atribuições – professora do curso primário,<br />

do curso elementar, <strong>de</strong> instrução primária e normalista.<br />

Gay (1988) comenta que a maioria <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> atuava como<br />

alfabetizadoras, justamente porque o ensino secundário 116 para elas <strong>de</strong>moraria a ser<br />

acessível. Isso só acontece no começo do século XX, mais intensamente a partir <strong>de</strong><br />

1920, o que não favorecia a atuação <strong>de</strong>las no ensino profissio<strong>na</strong>l, pelo menos se<br />

pensamos no início do funcio<strong>na</strong>mento da Instituição estudada.<br />

Lauro Wilhelm, ex-professor e ex-diretor da Escola (1939-1945), relata que a<br />

partir da Lei Orgânica <strong>de</strong> 1942 houve alterações no número <strong>de</strong> alunos e ampliação<br />

<strong>de</strong> cursos, que <strong>de</strong>mandariam novas contratações <strong>de</strong> docentes:<br />

Quando houve a reforma [...], que saiu daquele período <strong>de</strong>, vamos dizer,<br />

primário, educação básica que passou para gi<strong>na</strong>sial, não é? Aí tivemos que<br />

ampliar também o corpo docente dos professores e, como era fe<strong>de</strong>ral, eu<br />

então fui escolher os melhores professores que tinham em várias áreas,<br />

então tivemos aqui professores da Universida<strong>de</strong> lecio<strong>na</strong>ndo aqui [...] enfim<br />

<strong>uma</strong> série <strong>de</strong> professores que vieram pra cá, que eram <strong>de</strong> nível<br />

universitário, mas vieram porque eles <strong>de</strong>ixaram até o Colégio Estadual, que<br />

era Estadual, não é? E vieram porque era fe<strong>de</strong>ral aqui [...] E aí então que a<br />

Escola começou a ficar até mais famosa [...] esses eram os <strong>de</strong> cultura geral,<br />

agora os <strong>de</strong> cultura técnica, por exemplo, eles procuraram se aperfeiçoar<br />

também, acompanhando o <strong>de</strong>senvolvimento e tudo, e eles então... aí já<br />

começamos a pegar professores <strong>de</strong> um nível mais elevado (apud<br />

MACHADO, 2010, p. 163).<br />

De sua fala e dos relatórios incompletos a que tivemos acesso, percebemos<br />

que o que acontece é <strong>uma</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is para lecio<strong>na</strong>r <strong>na</strong> Escola que<br />

tivessem conhecimento <strong>de</strong> áreas técnicas, o que nos leva a acreditar que isso<br />

manteve as professoras exclusivamente em áreas que a Instituição consi<strong>de</strong>ra <strong>de</strong><br />

cultura geral, como é o caso <strong>de</strong> Português, pois para estas áreas exigia-se<br />

minimamente que as <strong>mulheres</strong> comprovassem terem o curso primário.<br />

116 Entretanto, vale <strong>de</strong>stacar que com o acesso ao ensino secundário elas também pu<strong>de</strong>ram<br />

qualificar-se para exercer a própria função <strong>de</strong> alfabetizadoras, algo dispensável inicialmente (GAY,<br />

1988).


156<br />

Hilda Bley <strong>de</strong> Oliveira**<br />

Nome Ativida<strong>de</strong> Período inicial Período fi<strong>na</strong>l<br />

“Coadjuvante,<br />

professora<br />

normal/normalista <strong>de</strong> 1ª classe” 1937 1939<br />

Maria Arruda A. Ribeiro** “Coadjuvante, professora normal” 1938 1939<br />

“Coadjuvante, professora normal,<br />

Nice Lopes Schwartz**<br />

normalista <strong>de</strong> 1.classe” 1938 1939<br />

Professora padrão <strong>de</strong> Artes<br />

Maria Amélia Pinto<br />

Culinárias e <strong>de</strong> Educação Doméstica 1938 1968<br />

Aracy <strong>de</strong> Souza Feijó** Normalista adjunta <strong>de</strong> 1ª classe 1939 *<br />

Clotil<strong>de</strong> Moreira Huebel** Normalista <strong>de</strong> 1ª classe 1939 *<br />

Ione Altheia Buzetti** Normalista <strong>de</strong> 1ª classe 1939 *<br />

Maria <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s Bley** Normalista <strong>de</strong> 1ª classe 1939 *<br />

Solange <strong>de</strong> Freitas Marques*<br />

Professora coadjuvante do ensino<br />

primário 1939 *<br />

Mirian Guzel Weigert Gomes (ou<br />

Myrian) Professora Matemática 1943 1967<br />

Fanny Me<strong>de</strong>iros (ou Fanny<br />

Me<strong>de</strong>iros Ribas) 117<br />

Professora e artífice <strong>de</strong> Ren<strong>das</strong> e<br />

bordados 1943 1977<br />

Astra <strong>de</strong> Paola Jorge (ou Astra<br />

<strong>de</strong> Paola Pereira Jorge) Professora <strong>de</strong> Ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> Costura 1944 1978<br />

Amalia Zaze (ou Amalia Zaze<br />

Gowslawski) Professora padrão 1945 1964<br />

Professora do ensino industrial do<br />

Alay<strong>de</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Cunha (ou curso primário<br />

Alay<strong>de</strong> Ferreira <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>) Desenho or<strong>na</strong>mental 1945 1955<br />

Hele<strong>na</strong> Poss Melchiori Professora / costureira*** 1945 1978<br />

Leonídia Ebersol Vasconcelos** Professora 1946 *<br />

Aurora Saraiva Professora padrão 1948 1964<br />

Lucia Leoni Mansur Professora 1949 1956<br />

Aneri<strong>na</strong> Ressetti Miró Professora 1954 1978<br />

Klei<strong>de</strong> Ferreira do Amaral<br />

Pereira<br />

Professora padrão <strong>de</strong> Canto<br />

orfeônico 1956 1965<br />

Zedir Almeida Professora 1956 1988<br />

Isalti<strong>na</strong> Paoliello** Professora <strong>de</strong> português 1958 *<br />

Léa Baldi** Professora <strong>de</strong> ciências 1958 *<br />

Maria do Socorro B. <strong>de</strong> Castro** Professora <strong>de</strong> ciências 1958 *<br />

Irene Egle Muzzillo Bus<strong>na</strong>rdo<br />

Professora padrão <strong>de</strong> Desenho<br />

Or<strong>na</strong>mental 1959 1980<br />

Rosário Farani M. Guérios Português (chefe da ca<strong>de</strong>ira) 1960 *<br />

Nely Scolaro Portella Professora <strong>de</strong> português 1964 1991<br />

Quadro 5 – Professoras que ingressaram <strong>na</strong> instituição <strong>de</strong> 1937 a 1964<br />

Fonte: Dados encontrados no arquivo do Nudhi e Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>. Elaboração própria.<br />

* informação não localizada no Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

** não localizada pasta no Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

*** alguns registros apontam que ela era somente costureira, noutros que era professora também,<br />

apresentaremos o porquê disso quando falarmos um pouco <strong>de</strong> sua história.<br />

117 Fanny Me<strong>de</strong>iros aparecerá também <strong>na</strong> lista <strong>de</strong> professoras, <strong>de</strong>vido a <strong>uma</strong> questão muito particular<br />

que será contada no espaço <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às histórias que conhecemos durante a investigação.


157<br />

No período que vai <strong>de</strong> 1937 a 1963, localizamos 27 professoras, cita<strong>das</strong> no<br />

quadro 5 com a respectiva discipli<strong>na</strong>, provável ano <strong>de</strong> entrada e provável ano <strong>de</strong><br />

saída. Adiante falaremos mais <strong>de</strong>tidamente daquelas cujas pastas funcio<strong>na</strong>is<br />

conseguimos localizar no Arquivo Geral.<br />

Assim como observamos no quadro 3 <strong>na</strong> fase anterior, po<strong>de</strong>mos perceber<br />

pelas legen<strong>das</strong> que <strong>de</strong> muitas <strong>de</strong>las não sabemos <strong>na</strong>da além do que o apresentado<br />

no quadro 5; além disso ocorre a mesma inconsistência em relação à grafia dos<br />

nomes.<br />

Dessas primeiras professoras o que sabemos é pouco, mas temos a certeza<br />

<strong>de</strong> sua imensa colaboração para a construção da Instituição.<br />

Nos empenhamos em agregar à nossa pesquisa as histórias <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s<br />

professoras, ainda que breves, pois os dados são restritos. Só o fato <strong>de</strong> termos<br />

encontrados preservados dados em suas fichas funcio<strong>na</strong>is já nos favorece para<br />

po<strong>de</strong>rmos colaborar no registro <strong>de</strong> seus nomes. Vamos a alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong>las:<br />

I. A professora Maria Amélia Pinto <strong>na</strong>sceu em 1917, era normalista, e atuava com<br />

a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Economia Doméstica, também chamada Educação Doméstica.<br />

Aposentou-se como professora <strong>de</strong> práticas educativas em 1968.<br />

II.<br />

Da professora Astra <strong>de</strong> Paola Pereira Jorge sabemos que <strong>na</strong>sceu em 1907 e<br />

morreu em 1991. Em 1944 foi admitida como servente <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong><br />

Curitiba. Um ano <strong>de</strong>pois, em 1945, foi indicada para atuar como professora do<br />

ensino industrial, para ministrar a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Ren<strong>das</strong> e Bordados. Isso po<strong>de</strong> ter<br />

acontecido <strong>de</strong>vido a <strong>uma</strong> necessida<strong>de</strong> da Escola, ou <strong>de</strong>vido às habilida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong>monstra<strong>das</strong> por ela, possibilitando sua promoção.<br />

Atuou nesta ativida<strong>de</strong> até 1973 quando com a extinção do ginásio industrial da<br />

Escola ela e alg<strong>uma</strong>s outras professoras tiveram <strong>de</strong> ser remaneja<strong>das</strong> <strong>de</strong><br />

ativida<strong>de</strong>; a Escola as alocou <strong>na</strong> função <strong>de</strong> Auxiliar <strong>de</strong> Biblioteca. Astra ficaria<br />

nesta função até sua aposentadoria em 1978.<br />

III.<br />

Myrian Guzel Weigert Gomes era professora do ensino industrial técnico, e<br />

tinha habilitação para ensi<strong>na</strong>r matemática, consi<strong>de</strong>rada cultura geral pela


158<br />

Diretoria <strong>de</strong> Ensino Industrial. Em 1943 é admitida como professora auxiliar e se<br />

aposenta em 1967.<br />

IV.<br />

Fanny Me<strong>de</strong>iros tem <strong>uma</strong> trajetória curiosa <strong>na</strong> Escola. Atuou como diarista <strong>de</strong><br />

1943 a 1952. A partir <strong>de</strong> 1952 tor<strong>na</strong>-se mensalista. Até 1965 está registrada nos<br />

documentos como servente. Por ter cursado curso primário no grupo escolar<br />

“Silveira <strong>de</strong> Souza” <strong>de</strong> Florianópolis e ser consi<strong>de</strong>rada Artífice <strong>de</strong> Ren<strong>das</strong> e<br />

bordados, foi readaptada como mestre <strong>de</strong> ofici<strong>na</strong> em 1966. Segundo o<br />

documento <strong>de</strong> solicitação para a readaptação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1948 ela exercia a ativida<strong>de</strong><br />

“com eficiência, continuida<strong>de</strong>, em caráter permanente e com pontualida<strong>de</strong>”<br />

(Documento ao Exmo. Sr. Diretor do Pessoal do Ministério da Educação e<br />

Cultura <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1966.)<br />

Uma <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1966 informava que ela estava em exercício<br />

<strong>na</strong> Seção <strong>de</strong> Bordados, auxiliando a professora Astra <strong>de</strong> Paola Pereira Jorge<br />

lecio<strong>na</strong>ndo a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Ren<strong>das</strong> e Bordados, consi<strong>de</strong>rada prática <strong>de</strong> ofici<strong>na</strong>,<br />

“às alu<strong>na</strong>s do 1.ciclo (Aprendizagem Industrial e Ginásio Industrial)”.<br />

As professoras Amália Zaze e Astra <strong>de</strong> Paola auxiliaram no processo <strong>de</strong><br />

readaptação fazendo <strong>de</strong>clarações <strong>de</strong> próprio punho data<strong>das</strong> <strong>de</strong> 1 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong><br />

1965, confirmando que Fanny <strong>de</strong>sempenhava a função <strong>de</strong> professora “há mais<br />

<strong>de</strong> 20 anos...” De 1973 a 1977, assim como a professora Astra, atuou como<br />

Auxiliar <strong>de</strong> Biblioteca. Nessa ativida<strong>de</strong> ela se aposenta.<br />

V. Amalia Zaze Goslawski <strong>na</strong>sceu em 1901, cursou o ginásio completo, o curso <strong>de</strong><br />

corte e costura da Escola Profissio<strong>na</strong>l Curitiba e também o curso <strong>de</strong><br />

aperfeiçoamento CBAI – Porto Alegre. Na gra<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino <strong>de</strong>ste último ela foi<br />

capacitada em: Auxílios Áudiovisuais, Emprego <strong>de</strong> Material Didático,<br />

Planejamento e Direção <strong>de</strong> Ofici<strong>na</strong>s. Ela teve formação também no curso linhas<br />

Varicor (novida<strong>de</strong>s infantis) e participou da 1ª Sema<strong>na</strong> <strong>de</strong> Educação Familiar no<br />

Paraná, em 1957.<br />

Em 1945 foi admitida interi<strong>na</strong>mente como professora chefe do curso <strong>de</strong> Corte e<br />

Costura. Com saída em abril <strong>de</strong> 1956 e readmissão no mesmo ano para <strong>uma</strong> vez<br />

mais exercer interi<strong>na</strong>mente o cargo <strong>de</strong> professora chefe do Curso <strong>de</strong> Corte e<br />

Costura.


159<br />

Foi enquadrada como professora do ensino industrial básico em 1965 e<br />

transformada em funcionária efetiva por ter entrado em data anterior à Lei n.<br />

4.054 <strong>de</strong> 2 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1962, alterada pelo artigo 37 da Lei nº 4.069 <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong><br />

junho <strong>de</strong> 1962. Amalia falece em 1971.<br />

Foto 8 – Amalia Zaze Goslawski<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

VI.<br />

A professora Alay<strong>de</strong> Ferreira <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, que aparece em alguns documentos<br />

com o nome <strong>de</strong> Alay<strong>de</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Cunha, foi professora <strong>de</strong> Canto Orfeônico<br />

<strong>de</strong> 1945 a 1955. Sua trajetória foi curta mas, junto com alg<strong>uma</strong>s <strong>das</strong> até aqui<br />

apresenta<strong>das</strong>, ela foi <strong>uma</strong> <strong>das</strong> primeiras a ensi<strong>na</strong>r <strong>uma</strong> discipli<strong>na</strong> técnica <strong>na</strong><br />

Escola.<br />

VII.<br />

Aurora Saraiva ingressou <strong>na</strong> Escola em 1948, nomeada como professora <strong>de</strong><br />

práticas educativas. Sua discipli<strong>na</strong> era Canto Orfeônico. Aurora também se<br />

<strong>de</strong>staca por ter ocupado a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Educação Artística, <strong>na</strong> qual ensi<strong>na</strong>va<br />

Técnica Vocal. Aposentou-se em 1969.


160<br />

Foto 9 – Aurora Saraiva<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

VIII.<br />

Lucia Xavier Leoni ou Lucia Leoni Mansur ingressou <strong>na</strong> Escola em 1949 como<br />

professora <strong>de</strong> Português no 1º ciclo do ensino secundário (correspon<strong>de</strong>nte ao<br />

ensino <strong>de</strong> 5ª a 8ª séries do antigo 1º grau). Ela saiu da Escola em 1956.<br />

IX.<br />

A professora Aneri<strong>na</strong> Ressetti Miro <strong>na</strong>sceu em 1907 <strong>na</strong> Colônia Alexandra – Pr.<br />

Fez o curso primário e gi<strong>na</strong>sial em Para<strong>na</strong>guá (<strong>na</strong>s Escolas Ludovica Borio e<br />

Eleosi<strong>na</strong> Plaisant respectivamente). Isso lhe garantiu po<strong>de</strong>r atuar como docente<br />

<strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba. Antes <strong>de</strong> chegar a ser professora, trabalhou em<br />

comércio particular e ateliê <strong>de</strong> costura. Na Escola ela foi nomeada como<br />

professora industrial em 1954, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> Corte e Costura. Seu conhecimento<br />

prático aliado à habilitação formal lhe garantiu atuar por quase 20 anos como<br />

professora, isso porque em 1973, nos seus últimos anos <strong>na</strong> Escola, atuou como<br />

Auxiliar <strong>de</strong> Biblioteca, até se aposentar em 1978. Aneri<strong>na</strong> foi <strong>uma</strong> <strong>das</strong><br />

professoras em cuja ficha consta ter participado do curso <strong>de</strong> qualificação <strong>na</strong><br />

CBAI em Porto Alegre no ano <strong>de</strong> 1954. O curso teria durado cinco meses.


161<br />

Foto 10 – Aneri<strong>na</strong> Ressetti Miro<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

X. Tivemos acesso a informações relativas à formação da professora Klei<strong>de</strong><br />

Ferreira do Amaral Pereira. Ela cursou nível superior <strong>de</strong> piano <strong>na</strong> Escola<br />

Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Música da Universida<strong>de</strong> do Brasil, fez curso <strong>de</strong> extensão<br />

universitária <strong>de</strong> nível <strong>de</strong> especialização em iniciação musical e curso <strong>de</strong><br />

especialização <strong>de</strong> professor <strong>de</strong> Canto Orfeônico, conferido pelo Conservatório<br />

Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Canto Orfeônico.<br />

Na Escola ingressou em 1956 como professora do ensino secundário <strong>de</strong> práticas<br />

educativas. Foi chefe <strong>de</strong> ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Canto Orfeônico para o curso industrial<br />

básico. Como era consi<strong>de</strong>rada professora <strong>de</strong> práticas educativas, ela elaborou<br />

um documento en<strong>de</strong>reçado ao Presi<strong>de</strong>nte do Conselho <strong>de</strong> Representantes, para<br />

requerer equiparação salarial por lecio<strong>na</strong>r <strong>uma</strong> discipli<strong>na</strong> incluída com a<br />

<strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ção “práticas educativas”.<br />

O documento traz como resposta o seguinte texto:


162<br />

Foto 11 – Resposta ao pedido <strong>de</strong> equiparação salarial da professora Klei<strong>de</strong><br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

Assi<strong>na</strong>va a resposta 118 o Presi<strong>de</strong>nte do Conselho <strong>de</strong> Representantes, Henrique<br />

Bettes. Ainda que tenha reconhecido que as ativida<strong>de</strong>s se equivaliam – Práticas<br />

Educativas e Cultura Geral, o Presi<strong>de</strong>nte admite não ser <strong>de</strong> sua alçada a<br />

resolução <strong>de</strong> equiparação, cabendo à Divisão <strong>de</strong> Pessoal fazê-lo. Não<br />

encontramos nenhum documento em sua ficha funcio<strong>na</strong>l que atestasse que a<br />

equiparação tenha sido atendida. Em 1965 Klei<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser professora da<br />

Escola.<br />

XI.<br />

Nascida em 1921 a professora Zedir Almeida Cardoso ingressou <strong>na</strong> Escola em<br />

1956, entretanto não encontramos sua discipli<strong>na</strong> nem tampouco sua formação.<br />

Ela se aposentou em 1988.<br />

118 Transcrição da resposta: “Enten<strong>de</strong>mos que as Práticas Educativas po<strong>de</strong>riam, para o efeito<br />

requerido, ser equipara<strong>das</strong> ás [sic] discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> Cultura Geral, porisso [sic] que elas aten<strong>de</strong>m ao<br />

mesmo objetivo <strong>de</strong> formação <strong>das</strong> <strong>de</strong>mais discipli<strong>na</strong>s. Mas, não sendo esta Presidência quem <strong>de</strong>va<br />

interpretar o texto da lei, e sim a Divisão <strong>de</strong> Pessoal, que lhe <strong>de</strong>legou po<strong>de</strong>res, <strong>de</strong>termino seja<br />

consultada a Divisão <strong>de</strong> Pessoal sôbre o alcance da Lei com referência às práticas educativas.<br />

Curitiba, 18 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong> 1963.”


163<br />

XII.<br />

Irene Egle Muzillo Bus<strong>na</strong>rdo foi também professora do ensino industrial do<br />

curso primário, ingressando para atuar em 1959 com a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Desenho<br />

Or<strong>na</strong>mental. Aposentou-se em 1980 como Auxiliar <strong>de</strong> Biblioteca.<br />

Foto 12 – Irene Egle Muzillo Bus<strong>na</strong>rdo<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

XIII.<br />

XIV.<br />

Rosário Farani M. Guérios ingressa em 1960 como professora <strong>de</strong> Português.<br />

No relatório <strong>de</strong> 1960 encontramos a informação <strong>de</strong> que ela era “chefe da ca<strong>de</strong>ira<br />

<strong>de</strong> português”, o que representava o mais alto posto <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sua área <strong>de</strong><br />

atuação. A professora é, segundo nossa pesquisa, a primeira a exercer <strong>uma</strong><br />

função <strong>de</strong> chefia <strong>de</strong> <strong>uma</strong> “ca<strong>de</strong>ira” <strong>de</strong> discipli<strong>na</strong>. Ainda que esta seja <strong>de</strong> <strong>uma</strong> área<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente ocupada por elas, isso é muito relevante <strong>de</strong>ntro do contexto da<br />

Escola que, com cinco déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> existência, se mantinha ainda masculi<strong>na</strong> em<br />

relação aos postos <strong>de</strong> comando.<br />

De Lucia Leoni Mansur ou Lucia Xavier Leoni não ficamos sabemos muito. Ela<br />

<strong>na</strong>sceu em 1927 <strong>na</strong> Lapa e ingressou <strong>na</strong> Escola em 1949 como professora <strong>de</strong><br />

Português.<br />

Apesar <strong>de</strong> não haver encontrado nenhum documento que atestasse sua saída,<br />

foi encontrado no sistema do Arquivo Geral o ano <strong>de</strong> 1956 como ano limite <strong>de</strong><br />

seu vínculo <strong>na</strong> Escola.


164<br />

XV.<br />

A professora Nely Scolaro Portella <strong>na</strong>sceu em 1934 em Jaguariaíva e teve <strong>uma</strong><br />

formação privilegiada: graduou-se em Letras, Licenciatura Línguas Neolati<strong>na</strong>s <strong>na</strong><br />

Puc-Pr, em 1962. De 1960 a 1961 foi Auxiliar <strong>de</strong> Tesouraria junto à CBAI. De<br />

1962 a 1964 ministrou aulas <strong>na</strong> ETC <strong>na</strong> condição <strong>de</strong> prestadora <strong>de</strong> serviços.<br />

Ainda em 1964 ingressaria como celetista <strong>na</strong> Escola e ficaria até se aposentar<br />

em março <strong>de</strong> 1991.<br />

Foto 13 – Nely Scolaro Portella<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

XVI.<br />

Outro nome a ser lembrado é <strong>de</strong> Hele<strong>na</strong> Poss Miranda ou Hele<strong>na</strong> Poss<br />

Melchiori, estrangeira, <strong>na</strong>sceu em 1909 <strong>na</strong> Rússia mas se <strong>na</strong>turalizou brasileira.<br />

Fez curso primário completo e curso <strong>de</strong> arte e costura <strong>na</strong> Aca<strong>de</strong>mia Worth em<br />

Curitiba em 1943. Em 1945 é admitida como artífice <strong>na</strong> ETC, segundo ofício 817<br />

<strong>de</strong> 4 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1945 <strong>na</strong> vaga <strong>de</strong> Astra <strong>de</strong> Paola Pereira Jorge. Em 1963 foi<br />

enquadrada como costureira. Em 1970 foi readaptada como mestre após<br />

processo que corria há pelo menos quatro anos, pelo qual ela solicitou<br />

readaptação como “Mestre <strong>de</strong> Ofici<strong>na</strong>”. O Grupo responsável pelo seu processo<br />

<strong>de</strong>feriu em seu favor, mas o fato somente se cons<strong>uma</strong>ria em 1970. No processo<br />

<strong>de</strong> solicitação <strong>de</strong> readaptação (ver anexos A e B) aparecem as seguintes<br />

referências às ativida<strong>de</strong>s exerci<strong>das</strong> pela professora:


165<br />

“vem exercendo o magistério há mais <strong>de</strong> 20 anos, <strong>de</strong>sempenhando as suas<br />

ativida<strong>de</strong>s a contento e <strong>de</strong> maneira brilhante, lecio<strong>na</strong>ndo às alu<strong>na</strong>s da<br />

Aprendizagem Industrial <strong>de</strong> Corte e Costura, como também às alu<strong>na</strong>s da 3ª<br />

e 4ª séries, atribuindo notas, <strong>de</strong>veres, bem como realizando exames com as<br />

respectivas alu<strong>na</strong>s” (<strong>de</strong>claração da professora Amália Zaze Goslawski);<br />

“vem exercendo atribuições diversas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1946 por absoluta necessida<strong>de</strong><br />

do serviço, pois o órgão não dispunha <strong>de</strong> servidores para executar as<br />

atribuições que lhe foram cometi<strong>das</strong>, <strong>de</strong>vido a carência <strong>de</strong> pessoal”<br />

(Certidão n. 37/66. Arquivo Geral.);<br />

“O <strong>de</strong>svio dura mais <strong>de</strong> 5 anos, antes <strong>de</strong> 1959 (...) A servidora possui as<br />

necessárias aptidões para o <strong>de</strong>sempenho regular do nôvo cargo em que<br />

<strong>de</strong>ve ser classificado.” (Certidão n. 37/66. Arquivo Geral.).<br />

O fato <strong>de</strong>la não ter registro <strong>na</strong> Diretoria do Ensino Industrial – DEI, e tampouco<br />

curso da CBAI a impedia <strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada professora. No entanto, ter o curso<br />

primário e a prática do Corte e Costura lhe possibilitaram a readaptação anos<br />

<strong>de</strong>pois, não como mestre <strong>de</strong> ofici<strong>na</strong> como se pretendia inicialmente. O <strong>de</strong>sfecho<br />

da história não fica muito claro, inclusive porque há um registro <strong>de</strong> que em 1973,<br />

assim como ocorreu com outras professoras, passou a Auxiliar <strong>de</strong> Biblioteca.<br />

Aposentou-se em 1978 e faleceu em 1995.<br />

Foto 14 – Hele<strong>na</strong> Poss Miranda<br />

Fonte: Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.


166<br />

5.2.1 Cursos “femininos”: nova configuração do corpo discente e do quadro geral <strong>de</strong><br />

servidoras<br />

A década <strong>de</strong> 1940 também teve fundamental importância em relação à<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrada <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s <strong>na</strong> Instituição, em especial <strong>de</strong>vido à Lei<br />

Orgânica do Ensino Industrial 119 . Ao a<strong>na</strong>lisá-la, Machado (2010) mostrou que no<br />

documento se entendia a formação como um bem comum. Nessa época, as<br />

discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> formação geral, também chama<strong>das</strong> práticas educativas, compunham a<br />

chamada dimensão h<strong>uma</strong><strong>na</strong> pensada pela Lei. As discipli<strong>na</strong>s eram: educação física,<br />

educação musical, educação doméstica para as alu<strong>na</strong>s e educação pré-militar para<br />

os alunos. No Capítulo VI – Das práticas educativas, art. 26, lemos:<br />

Os alunos regulares dos cursos mencio<strong>na</strong>dos no capítulo anterior serão<br />

obrigados às práticas educativas seguintes: a) educação física, obrigatória<br />

até a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vinte e um anos, e que será ministrada <strong>de</strong> acordo com as<br />

condições <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, sexo e trabalho <strong>de</strong> cada aluno; b) educação musical,<br />

obrigatória até a ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>zoito anos, e que será dada por meio <strong>de</strong> aulas<br />

e exercícios do canto orfeônico. § 1º Aos alunos do sexo masculino se dará<br />

ainda a educação premilitar, até atingirem a ida<strong>de</strong> própria da instrução<br />

militar. § 2º As <strong>mulheres</strong> se dará também a educação doméstica, que<br />

consistirá essencialmente no ensino dos misteres próprios da administração<br />

do lar. 120 (Grifos nossos.)<br />

Para Machado (2010), as práticas educativas <strong>de</strong>monstravam a <strong>de</strong>marcação<br />

<strong>de</strong> lugares <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos a <strong>mulheres</strong> e homens à medida que alg<strong>uma</strong>s práticas tinham<br />

um público certo para atingir <strong>de</strong> acordo com a função social que <strong>de</strong>le se esperava. A<br />

lógica é <strong>de</strong> que para cada sexo alg<strong>uma</strong>s funções eram <strong>de</strong>sti<strong>na</strong><strong>das</strong>; a Lei limitava os<br />

espaços <strong>de</strong> acordo com o que se via <strong>na</strong> própria organização social: os meninos<br />

recebiam <strong>uma</strong> educação para o serviço militar, que lhes ensi<strong>na</strong>ria discipli<strong>na</strong>, or<strong>de</strong>m,<br />

119 A Lei trazia questões como princípios e fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>s do ensino industrial que dizem respeito “aos<br />

interesses aos quais <strong>de</strong>veriam estar subordi<strong>na</strong>dos o Ensino Industrial” (MACHADO, 2010, p. 74).<br />

Estes interesses estariam para aten<strong>de</strong>r: “1. Aos interesses do trabalhador, realizando sua preparação<br />

profissio<strong>na</strong>l e sua formação h<strong>uma</strong><strong>na</strong>. 2. Aos interesses <strong>das</strong> empresas, nutrindo-as, segundo as suas<br />

necessida<strong>de</strong>s crescentes e mutáveis, <strong>de</strong> suficiente e a<strong>de</strong>quada mão-<strong>de</strong>-obra. 3. Aos interesses da<br />

<strong>na</strong>ção, promovendo continuamente a mobilização <strong>de</strong> eficientes construtores <strong>de</strong> sua economia e<br />

cultura.” (Art. 3º – Lei Orgânica do Ensino Industrial. Decreto-lei 4.073, <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1942.<br />

Disponível em: Acesso em: 18 jul. 2010.).<br />

120<br />

Lei Orgânica do Ensino Industrial. Disponível em:<br />

Acesso em: 18 jul. 2010.


167<br />

responsabilida<strong>de</strong> – qualida<strong>de</strong>s que se esperava <strong>de</strong> um futuro “pai <strong>de</strong> família”. As<br />

meni<strong>na</strong>s receberiam a “educação doméstica” que consistia “no ensino dos misteres<br />

próprios da administração do lar”, ou seja, no aprendizado dos ofícios requeridos<br />

para ser <strong>uma</strong> ótima do<strong>na</strong> <strong>de</strong> casa.<br />

Em se tratando <strong>de</strong> normativas, o Decreto n. 8.673, <strong>de</strong> 3 <strong>de</strong> fevereiro <strong>de</strong><br />

1942, foi o responsável por <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>r quais cursos <strong>de</strong> I e II ciclos seriam ofertados,<br />

formas <strong>de</strong> acesso a cada um <strong>de</strong>les, incluindo os pré-requisitos para candidatura aos<br />

<strong>de</strong> II ciclo. Dentre os cursos <strong>de</strong> I ciclo, o único que “possibilitava” o ingresso <strong>de</strong><br />

meni<strong>na</strong>s era o <strong>de</strong> Corte e Costura, isso porque os <strong>de</strong>mais não impediam<br />

explicitamente, conforme justificamos a seguir.<br />

Nos princípios fundamentais da Lei Orgânica, artigo 5º, item 5, lê-se: “O<br />

direito <strong>de</strong> ingressar nos cursos industriais é igual para homens e <strong>mulheres</strong>. A estas,<br />

porem, não se permitirá, nos estabelecimentos <strong>de</strong> ensino industrial, trabalho que sob<br />

o ponto <strong>de</strong> vista da saú<strong>de</strong>, não lhes seja a<strong>de</strong>quado” 121 . Não obstante o referido item<br />

e ainda a garantia via legislação <strong>de</strong> educação como um bem comum, a formação<br />

compreendia limitações às meni<strong>na</strong>s – por seu tipo físico <strong>de</strong>sprivilegiado elas teriam<br />

acesso limitado, ratificando, <strong>na</strong> opinião <strong>de</strong> Machado (2010), a divisão sexual do<br />

trabalho, já que, ao impedir a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos <strong>de</strong>vido a questões físicas e<br />

biológicas e a questões sociais que buscavam “garantir” um lar respaldado pela<br />

figura femini<strong>na</strong>, não se efetivava a liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrada e <strong>de</strong> escolha <strong>de</strong> quais<br />

formações buscar 122 .<br />

Dentre os cursos <strong>de</strong> II ciclo oferecidos havia: Decoração <strong>de</strong> Interiores,<br />

Máqui<strong>na</strong>s e Motores e Edificações 123 . Para cada um <strong>de</strong>les o Decreto exigia <strong>uma</strong><br />

121<br />

Lei Orgânica do Ensino Industrial. Disponível em:<br />

Acesso em: 18 jul. 2010.<br />

122 Machado (2010) empreen<strong>de</strong>u para sua tese a busca por <strong>na</strong>rradores(as) que tivessem estudado no<br />

período pesquisado; ela encontrou Jamile, a única alu<strong>na</strong> que se formou técnica em Decoração <strong>de</strong><br />

Interiores mas que, <strong>de</strong>vido à pressão pater<strong>na</strong>, não <strong>de</strong>u continuida<strong>de</strong> à carreira; ela também<br />

entrevistou Iraci e Alzira, <strong>de</strong>sistentes do curso técnico.<br />

123 Em sua análise, Machado (2010) faz <strong>uma</strong> comparação entre os currículos dos cursos técnicos, a<br />

partir da perspectiva <strong>de</strong> que sua composição tem um caráter ten<strong>de</strong>ncioso para aten<strong>de</strong>r ao que ela<br />

chamou <strong>de</strong> projeto <strong>de</strong> formação da força <strong>de</strong> trabalho no Brasil; o número <strong>de</strong> discipli<strong>na</strong>s no curso <strong>de</strong><br />

Decoração <strong>de</strong> Interiores (três) é bastante inferior ao do curso <strong>de</strong> Edificações e Construção <strong>de</strong><br />

Máqui<strong>na</strong>s e Motores (sete e nove respectivamente). Para a autora havia “conhecimentos<br />

privilegiados” ao serem ofereci<strong>das</strong> discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> “Ensaios em laboratório” e “Complementos <strong>de</strong><br />

Matemática” nos dois últimos e no primeiro não. Para a autora, “...o papel do Estado, através da<br />

legislação concernente ao ensino industrial, especialmente nos cursos <strong>de</strong> 1º ciclo, foi imprescindível


168<br />

formação mínima <strong>de</strong> I ciclo. E no caso do curso <strong>de</strong> Decoração <strong>de</strong> Interiores 124 , curso<br />

com maior abertura à entrada <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s, havia dois impedimentos:<br />

a) gran<strong>de</strong> parte <strong>das</strong> meni<strong>na</strong>s àquela época não tinham formação inicial para<br />

ingressar no I ciclo, portanto ficavam impedi<strong>das</strong> <strong>de</strong> se candidatar ao II;<br />

b) a formação mínima exigida era ter cursado no I ciclo um dos cursos que,<br />

como se vê nos relatórios <strong>de</strong> matrícula da época, eram exclusivamente<br />

masculinos, a saber: Marce<strong>na</strong>ria, Carpintaria, Alve<strong>na</strong>ria e Revestimentos,<br />

Cantaria Artística e Pintura.<br />

Como as meni<strong>na</strong>s só frequentavam o curso <strong>de</strong> corte e costura, a elas a<br />

única possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos estava em cursar Artes Aplica<strong>das</strong>,<br />

também aberto aos meninos 125 .<br />

Em tese não havia restrições às matrículas femini<strong>na</strong>s, mas como elas eram<br />

inexistentes em cursos ditos masculinos, enten<strong>de</strong>mos que elas eram veladamente<br />

“impedi<strong>das</strong>” <strong>de</strong> entrar em cursos com pré-requisitos, como foi o caso do curso <strong>de</strong><br />

Decoração <strong>de</strong> Interiores. Este que será ao passar dos anos <strong>uma</strong> <strong>das</strong> poucas<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ingresso <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s, por suas características e relações com<br />

ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> mais apropria<strong>das</strong> ao público feminino, em sua gênese não<br />

tinha suas portas abertas a elas.<br />

Para Machado (2010, p. 173) a divisão sexual do po<strong>de</strong>r e do saber “é um<br />

dos elementos explicativos para enten<strong>de</strong>r o espaço <strong>de</strong> formação <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às<br />

alu<strong>na</strong>s <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1943”. Para ela, os dados <strong>de</strong>monstram<br />

que os espaços <strong>de</strong>marcados faziam parte da gênese da educação profissio<strong>na</strong>l. Ela<br />

chama a organização do sistema <strong>de</strong> ensino da década <strong>de</strong> 1940 <strong>de</strong> “restritivo e<br />

hierárquico”, pois favorecia os alunos do I ciclo do ensino secundário, consi<strong>de</strong>rados<br />

para legitimar o trabalho doméstico como campo exclusivamente feminino, inclusive ao <strong>de</strong>finir qual a<br />

Formação que as alu<strong>na</strong>s <strong>de</strong>sse nível <strong>de</strong> ensino teriam direito” (MACHADO, 2010, p. 180).<br />

124 Para implantar e coor<strong>de</strong><strong>na</strong>r o curso <strong>de</strong> Decoração <strong>de</strong> Interiores foi contratado o professor Emil<br />

Kampf, suíço, que alguns anos <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>ixou a coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção para que assumisse o artífice Antônio,<br />

um dos informantes da pesquisa <strong>de</strong> Machado (2010).<br />

125 Além dos oriundos do curso <strong>de</strong> corte e costura, o §1º do art. 29 permite aos oriundos <strong>de</strong> cursos<br />

como fundição, serralheria, marce<strong>na</strong>ria, cerâmica, joalheria, artes do couro e chapéus, flores e<br />

or<strong>na</strong>tos prestarem exames vestibulares para se candidatar ao <strong>de</strong> técnico em Artes Aplica<strong>das</strong>, por isso<br />

os meninos também tinham livre acesso a este curso.


169<br />

bem preparados para se matricular em quaisquer cursos, e segregava as <strong>mulheres</strong> a<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos campos. E ainda acrescenta que,<br />

Dessa forma, não obstante elas tenham sido contempla<strong>das</strong> <strong>na</strong> organização<br />

do ensino industrial formulada nos anos <strong>de</strong> 1940, essa formação estava<br />

restrita a um saber racio<strong>na</strong>lizado sobre o espaço reservado às <strong>mulheres</strong> – o<br />

espaço doméstico; foi nesse âmbito que se situou o único curso industrial<br />

ao qual as alu<strong>na</strong>s tinham acesso – o <strong>de</strong> corte e costura (MACHADO, 2010,<br />

p. 173).<br />

No ano <strong>de</strong> 1946 o Decreto n. 8.680, <strong>de</strong> 15 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1946, artigo 30,<br />

proibiu os pré-requisitos a matrículas, no entanto, o que se viu <strong>na</strong> prática foi <strong>uma</strong><br />

continuida<strong>de</strong> da segregação, agora firmemente pautada <strong>na</strong>s diferenças físicas e<br />

biológicas entre meninos e meni<strong>na</strong>s. Cursar este ou aquele curso continuava ligado<br />

diretamente ao sexo dos estudantes, seja por escolhas pessoais, influência dos<br />

processos <strong>de</strong> socialização <strong>de</strong> meninos e meni<strong>na</strong>s, pela reprodução da divisão sexual<br />

do trabalho, enfim, dinâmica que vemos ainda hoje em cursos da instituição.<br />

Em 1947 é dado início aos primeiros cursos técnicos – <strong>de</strong>sdobramentos dos<br />

cursos <strong>de</strong> II ciclo: Construção <strong>de</strong> Máqui<strong>na</strong>s e Motores, Desenho Técnico,<br />

Edificações e Decoração <strong>de</strong> Interiores. O ingresso <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s acontecia<br />

basicamente nos dois últimos 126 .<br />

A respeito dos cursos ocupados pelas meni<strong>na</strong>s, Amorim (2004) <strong>de</strong>staca a<br />

fala <strong>de</strong> um dos ex-alunos e futuro professor da instituição:<br />

De todos os cursos, o <strong>de</strong> Corte e Costura era <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do ao público feminino,<br />

que representava a maioria dos alunos do curso Técnico <strong>de</strong> Decoração <strong>de</strong><br />

Interiores, embora <strong>de</strong>va ser ressaltado que não havia turmas mistas. Há que<br />

se registrar ainda a existência <strong>de</strong> um curso obrigatório para to<strong>das</strong> as alu<strong>na</strong>s<br />

da escola, o curso <strong>de</strong> Economia Doméstica, em que estas “aprendiam<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> arr<strong>uma</strong>r a mesa, fazer quitute, tudo, [...] foi feita <strong>uma</strong> sala <strong>de</strong><br />

educação para o lar, as alu<strong>na</strong>s iam lá, fazer os quitutes, os doces, tortas,<br />

bolos, e toda terça-feira, ou quarta-feira à tar<strong>de</strong>, oferecia-se um chá, um<br />

café para pessoas a quem a direção convi<strong>das</strong>se ou a outros professores da<br />

casa, <strong>de</strong>z ou doze pessoas, e era um trei<strong>na</strong>mento para moças, meni<strong>na</strong>s<br />

daquela época, aprendiam receitas e tudo mais, eu mesmo estive lá várias<br />

vezes, como aluno, convidado, [...] toda vez por sema<strong>na</strong> mudava, toda<br />

sema<strong>na</strong> tinha outras pessoas, tinha jor<strong>na</strong>listas, pessoas liga<strong>das</strong> ao diretor<br />

da época, gente da comunida<strong>de</strong> [...]” (AMORIM, 2004, p. 286) 127<br />

126 Machado (2010) <strong>de</strong>staca que recorrentemente o curso <strong>de</strong> Decoração <strong>de</strong> Interiores é apontado<br />

como o mais “apropriado” para as alu<strong>na</strong>s <strong>na</strong> instituição, embora seja facilmente verificável via<br />

relatórios institucio<strong>na</strong>is que ele não era frequentado exclusivamente pelo público feminino.<br />

127 Entrevista <strong>de</strong> Ivo Mezzadri concedida a Gilson Leandro Queluz/NUDHI/CEFET-PR em 1995 apud<br />

AMORIM, 2004.


170<br />

Não obstante o curso <strong>de</strong> Decoração <strong>de</strong> Interiores ser acessível a ambos os<br />

sexos, ele era constantemente reconhecido como mais apropriado para elas,<br />

embora mais frequentado por eles; após a reformulação do curso <strong>na</strong> década <strong>de</strong><br />

1970, passando a Curso Técnico <strong>de</strong> Desenho Industrial, evi<strong>de</strong>ncia-se a prevalência<br />

femini<strong>na</strong>, tanto <strong>de</strong> discentes, quanto <strong>de</strong> docentes, dados que apresentaremos<br />

adiante (LESZCZYNSKI, 1996).<br />

Machado (2010), em sua pesquisa a respeito da Escola entre os anos 1930<br />

a 1960, possibilitou o acesso às opiniões <strong>de</strong> alguns ex-alunos e <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s exalu<strong>na</strong>s<br />

<strong>das</strong> déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 40 a 60 e as conclusões <strong>das</strong> entrevista<strong>das</strong> a respeito da<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> terem frequentado cursos <strong>na</strong> então Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba são<br />

bastante diferentes <strong>das</strong> apresenta<strong>das</strong> pelos ex-alunos.<br />

As ex-alu<strong>na</strong>s frequentemente apontam como <strong>uma</strong> boa oportunida<strong>de</strong> ter<br />

acesso a <strong>uma</strong> formação a<strong>de</strong>quada para serem boas do<strong>na</strong>s <strong>de</strong> casa no futuro. Já os<br />

ex-alunos atestam que a entrada num dos cursos da Escola lhes possibilitou<br />

ascensão social, oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho, continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos. Além disso,<br />

vários <strong>de</strong>les apontaram que as meni<strong>na</strong>s que passavam pelos cursos <strong>de</strong> corte e<br />

costura tinham sorte em po<strong>de</strong>r fazê-lo, já que através <strong>de</strong>les tiveram instrução para<br />

os cuidados do lar, etiqueta, enfim, tudo que seria a<strong>de</strong>quado para aquela época <strong>na</strong><br />

socieda<strong>de</strong>. Vale colocar que o corpus <strong>de</strong> entrevistas da pesquisadora compreen<strong>de</strong>u<br />

7 alunos, 3 alu<strong>na</strong>s, 5 profissio<strong>na</strong>is homens e 2 <strong>mulheres</strong>.<br />

A<strong>na</strong>, professora <strong>de</strong> Economia Doméstica <strong>na</strong> instituição <strong>de</strong> 1943 a 1973, <strong>uma</strong><br />

<strong>das</strong> entrevista<strong>das</strong> em 2008 por Machado, relata sua condição como professora<br />

exclusivamente <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s e a satisfação por ter podido “encaminhar as alu<strong>na</strong>s<br />

para serem futuras do<strong>na</strong>s <strong>de</strong> casa” (MACHADO, 2010, p. 176). O que vemos é <strong>uma</strong><br />

inter<strong>na</strong>lização dos padrões sociais que separava os espaços a<strong>de</strong>quados às<br />

<strong>mulheres</strong> – elas próprias buscavam a<strong>de</strong>quar-se para atendê-los.<br />

Em relação ao quadro <strong>de</strong> funcionários, vale <strong>de</strong>stacar que neste período<br />

houve um aumento significativo no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>; <strong>de</strong> 1942 a 1945<br />

encontramos registros <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> vinte e dois funcionários, dos quais sete eram<br />

<strong>mulheres</strong>, e no ano seguinte dos quarenta e três funcionários, eram <strong>de</strong>z <strong>mulheres</strong>.<br />

Ainda que proporcio<strong>na</strong>lmente elas estivessem em <strong>de</strong>svantagem, temos que


171<br />

consi<strong>de</strong>rar o período e a mudança em relação à implantação <strong>de</strong> cursos <strong>na</strong> área<br />

técnica.<br />

Não só o número <strong>de</strong> funcionárias da docência aumenta, mas também<br />

po<strong>de</strong>mos ver nos relatórios do período o nome <strong>de</strong> funcionárias <strong>de</strong><br />

apoio/administrativas, como serventes, inspetoras, meren<strong>de</strong>iras e bibliotecária.<br />

Anterior a este período, encontramos registros <strong>de</strong> que até o ano <strong>de</strong> 1942 a<br />

prestação <strong>de</strong> serviços como limpeza e lavan<strong>de</strong>ria era feita por prestadoras <strong>de</strong><br />

serviços autônomas; ofícios assi<strong>na</strong>dos pelos diretores autorizavam o pagamento<br />

<strong>de</strong>sses serviços, sem geração <strong>de</strong> vínculo empregatício, o que <strong>de</strong>nota a precarieda<strong>de</strong><br />

dos contratos <strong>de</strong> trabalho oferecidos às <strong>mulheres</strong>. Estas, com interesse em atuar no<br />

mercado formal, aceitavam este tipo <strong>de</strong> contratação em condições precárias talvez<br />

como possibilida<strong>de</strong>s únicas <strong>de</strong> ocupação.<br />

Como exemplo <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> contrata<strong>das</strong> neste sentido citamos: Hypolita<br />

Eupharasia que em 1937 recebera: “180 mil réis pelos serviços prestados no asseio<br />

do edifício, <strong>de</strong>sinfecção e lavagem <strong>de</strong> roupas”; Clotil<strong>de</strong> Eugênia da Costa que foi<br />

responsável em 1938 pela “limpeza e asseio do edifício escolar e lavagem <strong>de</strong><br />

toalhas”; e Semíramis Fonta<strong>na</strong>, cujo nome aparece n<strong>uma</strong> or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> pagamento em<br />

1938 pelo “preparo culinário <strong>das</strong> meren<strong>das</strong>”. As três aparecem cita<strong>das</strong> como<br />

contrata<strong>das</strong> alg<strong>uma</strong>s vezes pela Escola para prestação <strong>de</strong> serviços, no entanto, só o<br />

que sabemos <strong>de</strong>las é que se <strong>de</strong>dicavam ao serviço diário <strong>de</strong> limpeza, asseio geral e<br />

preparo da alimentação dos corpos docente e discente, sem um contrato válido <strong>de</strong><br />

trabalho.<br />

O crescimento da Escola, portanto, após um longo período <strong>de</strong> precarieda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> contratos, vai obrigar a contratação efetiva <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> bastante<br />

significativo, para atuarem em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> apoio, conforme apresentamos no<br />

quadro 6 a seguir.<br />

Conforme po<strong>de</strong>mos observar, nenh<strong>uma</strong> <strong>das</strong> três prestadoras anteriores<br />

aparece no quadro <strong>de</strong> contratação efetiva do período. São <strong>de</strong>z <strong>mulheres</strong> contrata<strong>das</strong><br />

to<strong>das</strong> no mesmo ano para atuarem em áreas com carência <strong>de</strong> profissio<strong>na</strong>is <strong>na</strong><br />

Escola.


172<br />

Nome Ativida<strong>de</strong> Período inicial Período fi<strong>na</strong>l<br />

Alba Ramos Andra<strong>de</strong> (ou<br />

Alba Ramos <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>)<br />

Alice Pereira <strong>de</strong> Queiroz (ou<br />

Alice Pereira Queiroz)<br />

Diair da Silva (ou Diair<br />

Machado da Silva ou Dihayr<br />

da Silva)<br />

Elzira Saldanha <strong>de</strong> Camargo<br />

(ou Elzira Saldanha dos Reis)<br />

Fanny Me<strong>de</strong>iros (ou Fanny<br />

Me<strong>de</strong>iros Ribas)<br />

Inspetora <strong>de</strong> aluno 1943 1964<br />

Servente 1943 1964<br />

Servente 1943 1970<br />

Inspetora <strong>de</strong> aluno 1943 1975<br />

Servente (auxiliar <strong>de</strong> ren<strong>das</strong><br />

e bordados, artífice)<br />

1943 1964<br />

Judith Nobrega Braga Servente 1943 1976<br />

Maria da Luz <strong>de</strong> Oliveira Servente 1943 1964<br />

Maria da Luz Machado Servente 1943 1959<br />

Maria <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s Via<strong>na</strong><br />

Servente 1943 1948<br />

Araujo<br />

Sarah Costa Go<strong>de</strong>froid Bibliotecária 1943 1957<br />

Quadro 6 – Funcionárias <strong>de</strong> apoio contrata<strong>das</strong> em 1943<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

Em relação à média <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que ingressaram como docente <strong>na</strong> década<br />

<strong>de</strong> 1940 foi <strong>de</strong> duas novas professoras por ano. Além disso as contratações tor<strong>na</strong>mse<br />

mais frequentes e aten<strong>de</strong>m à <strong>de</strong>manda da Escola por manutenção, conservação,<br />

ativida<strong>de</strong>s diárias <strong>de</strong> alimentação, etc.<br />

Tabela 7 – Contratação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> 1943 a 1963<br />

Ano <strong>de</strong> contratação Docentes Outras ativida<strong>de</strong>s Total acumulado<br />

1943 2 10 12<br />

1944 1 3 16<br />

1945 3 6 25<br />

1946 1 1 27<br />

1948 1 * 28<br />

1949 2 * 30<br />

1951 * 1 31<br />

1954 1 1 33<br />

1956 2 * 35<br />

1958 3 * 38<br />

1959 1 * 39<br />

1960 1 4 44<br />

1962 * 7 51<br />

1963 1 1 53<br />

Fonte: Arquivo Nudhi. Elaboração própria.<br />

* nenh<strong>uma</strong> nova contratação para esta ativida<strong>de</strong>.


173<br />

Conforme po<strong>de</strong>mos observar <strong>na</strong> tabela 7, <strong>na</strong> qual apresentamos a dinâmica<br />

<strong>de</strong> contratação no período <strong>de</strong> 1943 a 1963, elaborada graças ao acesso às folhas <strong>de</strong><br />

pagamento do período, muitas <strong>mulheres</strong> ingressam em vinte anos, especialmente<br />

para atuarem em ativida<strong>de</strong>s como Bibliotecária, Serventes, Inspetoras, Auxiliar <strong>de</strong><br />

Escritório, diferente <strong>das</strong> déca<strong>das</strong> anteriores. Além disso a contratação <strong>de</strong><br />

professoras segue em números pequenos, porque nesse período <strong>de</strong> consolidação<br />

dos cursos técnicos, sua atuação passava por <strong>uma</strong> reelaboração.<br />

Em relação ao período que se vivia, citamos que em 1959 ocorre a<br />

transformação em Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná, <strong>de</strong>corrente da unificação do<br />

ensino técnico em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l. Nesse momento, além da manutenção <strong>de</strong> um<br />

número médio <strong>de</strong> funcionárias, temos a diversificação <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s para as<br />

docentes.<br />

Registra<strong>das</strong> em relatório, temos professoras atuando <strong>na</strong> chefia da área <strong>de</strong><br />

Corte e Costura, em Ren<strong>das</strong> e Bordados, Canto Orfeônico, Desenho Or<strong>na</strong>mental,<br />

Educação Doméstica, Matemática e Português. Isso significou a abertura para<br />

atuação em outras áreas da docência, o que não se <strong>de</strong>u tão rapidamente quanto se<br />

esperava.<br />

Comparando os dados da tabela 7 com o relatório do ano <strong>de</strong> 1961, temos<br />

<strong>uma</strong> situação diferente. Neste encontramos registrados sessenta e um professores<br />

no total e <strong>de</strong>sses, somente oito eram <strong>mulheres</strong>, o que é um número bastante<br />

pequeno conforme os dados coletados: o total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que passou pela Escola<br />

como docente até este ano – pelo menos <strong>de</strong>zoito.<br />

O mesmo se dá em relação ao número total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> apresentado no<br />

relatório <strong>de</strong> 1961; neste eram ao todo vinte e sete <strong>mulheres</strong>, entre professoras,<br />

funcionárias administrativas e <strong>de</strong> apoio. Nos dois anos seguintes, encontramos<br />

relatórios com o mesmo quadro <strong>de</strong> funcionários. Se a<strong>na</strong>lisamos que até 1961 pelo<br />

menos quarenta e quatro <strong>mulheres</strong> passaram pela Escola, po<strong>de</strong>mos concluir que<br />

muitas não permaneceram por muito tempo.<br />

Machado sugere que a causa do número pequeno <strong>de</strong> professoras no<br />

período estava ligada ao número pequeno <strong>de</strong> matrículas femini<strong>na</strong>s; po<strong>de</strong>mos dizer<br />

então que o número <strong>de</strong> professoras era pequeno em comparação ao número <strong>de</strong><br />

professores justamente porque elas atuavam somente no ensino <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s. Se


174<br />

a<strong>na</strong>lisamos por exemplo o número <strong>de</strong> matrículas femini<strong>na</strong>s no curso industrial no<br />

ano <strong>de</strong> 1953 (quadro 7), vemos como era restrita a atuação docente femini<strong>na</strong>:<br />

Série Alunos Alu<strong>na</strong>s Total<br />

1ª 161 42 202<br />

2ª 59 14 73<br />

3ª 17 3 20<br />

4ª 15 5 20<br />

Total 252 64 316<br />

Quadro 7 – Número <strong>de</strong> alunos/as matriculados/as<br />

nos cursos industriais em 1953<br />

Fonte: Adaptado <strong>de</strong> Machado, 2010, p. 191.<br />

Por causa do número <strong>de</strong>crescente <strong>de</strong> matrículas a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mão-<strong>de</strong>obra<br />

femini<strong>na</strong> também <strong>de</strong>crescia em função do avanço <strong>das</strong> séries. E isso não era<br />

um privilégio <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, já que percebe-se o <strong>de</strong>créscimo no número <strong>de</strong> alunos<br />

matriculados; <strong>uma</strong> <strong>das</strong> justificativas recorrentes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fundação da Escola em<br />

1909 para a evasão era a condição social (MACHADO, 2010). A ignorância e a<br />

pobreza dos pais muitas vezes os levavam a tirarem seus filhos da escola para que<br />

começassem a trabalhar. Há relatos inclusive <strong>de</strong> que donos <strong>de</strong> fábricas incitavam os<br />

pais, com promessa <strong>de</strong> rentabilida<strong>de</strong> imediata, que dispensava a conclusão dos<br />

cursos. Isso aconteceu <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os primeiros anos da Escola e em alguns relatórios do<br />

primeiro diretor, Paulo Il<strong>de</strong>fonso, percebemos seu empenho por tentar diminuir estas<br />

práticas.<br />

Vemos a partir <strong>de</strong> to<strong>das</strong> as funções que são <strong>de</strong>sempenha<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong><br />

aponta<strong>das</strong> até aqui que elas estão quase sempre relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> a ativida<strong>de</strong>s<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> historicamente como ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cuidado. Em relação às discipli<strong>na</strong>s<br />

ministra<strong>das</strong>, percebemos sua relação com as ativida<strong>de</strong>s direcio<strong>na</strong><strong>das</strong> ao público<br />

feminino.<br />

Nessa lógica, <strong>de</strong>staque para o tratamento dado às discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho.<br />

Machado (2010) afirma que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as primeiras déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> existência da Escola,<br />

Desenho Or<strong>na</strong>mental e Desenho Técnico tinham tratamentos diferentes: <strong>mulheres</strong><br />

ministravam a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Desenho Or<strong>na</strong>mental e homens ministravam a <strong>de</strong>


175<br />

Desenho Técnico, trazendo a problemática <strong>de</strong> que para atuação em discipli<strong>na</strong>s em<br />

que se exige qualificação 128 os homens eram os mais preparados.<br />

A autora diz que a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho teve gran<strong>de</strong> importância ao longo<br />

da história da Escola e dos currículos; <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Paulo Il<strong>de</strong>fonso se assumiu que a<br />

matéria serviria como base <strong>de</strong> todos os cursos, sendo visto “como um dos elementos<br />

civilizatórios <strong>na</strong> construção do saber necessário aos trabalhadores” (MACHADO,<br />

2010, p. 2010). Ela acrescenta também que<br />

no <strong>de</strong>senvolvimento da organização do trabalho <strong>na</strong> socieda<strong>de</strong> capitalista, o<br />

“Desenho” é mais um dos elementos que compõem a divisão técnica do<br />

trabalho. Enquanto a dinâmica do ensino <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho acaba por ser mais<br />

um elemento <strong>de</strong> divisão e racio<strong>na</strong>lização, organizando o trabalho em duas<br />

etapas – planejamento e execução – a diferenciação entre as modalida<strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>senho ensi<strong>na</strong><strong>das</strong> também evi<strong>de</strong>ncia <strong>uma</strong> segunda fragmentação<br />

(MACHADO, 2010, p. 225).<br />

A fragmentação está relacio<strong>na</strong>da ao sexo da pessoa, o que <strong>na</strong> verda<strong>de</strong> diz<br />

respeito ao conhecimento que cada um <strong>de</strong>tém nesse período histórico: para<br />

ministrar matérias técnicas os homens eram escolhidos porque eles tinham<br />

formação ou prática obtida no exercício <strong>de</strong> <strong>uma</strong> profissão. Já o conhecimento<br />

necessário para lecio<strong>na</strong>r <strong>uma</strong> matéria como <strong>de</strong>senho or<strong>na</strong>mental, mais voltado ao<br />

estético, ao artístico, não estaria necessariamente ligado ao conhecimento<br />

socialmente reconhecido como qualificado, mas como <strong>uma</strong> prática ligada ao fazer<br />

cotidiano <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> “femini<strong>na</strong>s”. Essa separação entre prérequisitos<br />

necessários para <strong>de</strong>sempenhar <strong>uma</strong> ou outra ativida<strong>de</strong> pressupõe <strong>uma</strong><br />

maior ou menor valorização da discipli<strong>na</strong>.<br />

Des<strong>de</strong> 1930 a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Desenho Técnico era ocupada por concluintes do<br />

ensino secundário ou alunos do ensino superior, ou seja, homens com formação<br />

profissio<strong>na</strong>l não voltada inicialmente à docência; já a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Desenho<br />

Or<strong>na</strong>mental era ministrada por <strong>uma</strong> professora adjunta, cuja formação não está<br />

registrada nos documentos disponíveis 129 .<br />

128 No sentido <strong>de</strong> formação específica para o <strong>de</strong>sempenho da ativida<strong>de</strong>, em oposição ao <strong>de</strong>sempenho<br />

<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> a partir <strong>de</strong> um conhecimento tácito.<br />

129 Alg<strong>uma</strong>s que ocuparam a ca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Desenho Or<strong>na</strong>mental foram as professoras Alay<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Andra<strong>de</strong> Cunha, Alilat Muricy Borges dos Reis e Irene Egle Muzillo Bus<strong>na</strong>rdo.


176<br />

Na década seguinte, 1940, Machado (2010) cita que essa diferenciação<br />

permanece – os professores <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho dos cursos básicos industriais eram<br />

artífices, que po<strong>de</strong>riam ser os egressos da própria instituição; os dos cursos técnicos<br />

eram engenheiros e no <strong>de</strong>senho or<strong>na</strong>mental atuavam professoras sem que<br />

saibamos com qual formação.<br />

Em sua tese, Machado (2010) cita a <strong>na</strong>rrativa <strong>de</strong> Jamile, alu<strong>na</strong> dos cursos<br />

industrial e técnico em Decorações <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1950, que confirma a separação e<br />

hierarquização entre as discipli<strong>na</strong>s <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho. Jamile <strong>de</strong>staca em sua fala que <strong>uma</strong><br />

<strong>de</strong> suas professoras <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho no I ciclo era muito exigente.<br />

Especificamente em 1953 havia a discipli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Desenho Técnico aten<strong>de</strong>ndo<br />

às especificida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada curso, a <strong>de</strong> Desenho Or<strong>na</strong>mental e a <strong>de</strong> Desenho<br />

Especializado e Geometria. Machado (2010) encontrou documentos dos exames<br />

daquele ano em que constavam os testes como sendo dos cursos <strong>de</strong> Corte e<br />

Costura e Decoração <strong>de</strong> Interiores; à época eram coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dores <strong>de</strong>ssas áreas Alilat<br />

Muricy e Emil Kampf, respectivamente.<br />

Observamos nesse ponto a divisão sexual do trabalho e seus reflexos sobre<br />

os caminhos possíveis às <strong>mulheres</strong>. Historicamente <strong>na</strong> agora Escola Técnica<br />

Fe<strong>de</strong>ral do Paraná alg<strong>uma</strong>s ativida<strong>de</strong>s foram <strong>de</strong>sempenha<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong> que<br />

estavam interessa<strong>das</strong> em participar do mercado <strong>de</strong> trabalho formal, ainda que<br />

muitas em condições informais <strong>de</strong> contratação.<br />

Consi<strong>de</strong>rando que a instituição tinha regras fe<strong>de</strong>rais a cumprir, <strong>de</strong>ntre elas a<br />

<strong>de</strong> manter um quadro efetivo <strong>de</strong> funcionários, a situação melhorou em relação às<br />

contratações <strong>de</strong> funcionárias <strong>de</strong> apoio e administrativas. Devido a <strong>uma</strong> <strong>de</strong>manda<br />

criada – muitos cursos, muitos alunos, abrangência <strong>de</strong> ensino, necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

biblioteca etc. – novas funções são agrega<strong>das</strong>, <strong>de</strong>ntre elas a <strong>de</strong> Bibliotecária,<br />

ocupada por <strong>uma</strong> mulher.<br />

Em 1964, temos um aumento consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> funcionárias: o número<br />

chegou a trinta e cinco, e o relatório <strong>de</strong>sse ano apresenta, além do nome e função, a<br />

data <strong>de</strong> <strong>na</strong>scimento e o ano <strong>de</strong> admissão <strong>na</strong> Escola.


177<br />

Nome Ativida<strong>de</strong> Ingresso<br />

Astra <strong>de</strong> Paola Jorge Professora <strong>de</strong> Ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> Costura 1943<br />

Alba Ramos <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Inspetora <strong>de</strong> alunos 1943<br />

Alice Pereira Queiroz Servente 1943<br />

Dihayr da Silva Servente 1943<br />

Elzira Saldanha Gomes Inspetora <strong>de</strong> alunos 1943<br />

Fanny Me<strong>de</strong>iros Servente 1943<br />

Maria da Luz <strong>de</strong> Oliveira Servente 1943<br />

Amalia Zaze Gowslawski Professora <strong>de</strong> Ofici<strong>na</strong> Costura 1945<br />

Maria Amelia Pinto Professora <strong>de</strong> Artes Culinárias 1945<br />

Calorinda Bevenuto Servente 1945<br />

Dinora Machado Marques Servente/Armazenista 1945<br />

Hele<strong>na</strong> Poss Melchiori Artífice <strong>de</strong> Corte e Costura 1945<br />

Noemia <strong>de</strong> Souza e Silva Servente 1945<br />

Aurora Saraiva Professora <strong>de</strong> Canto 1948<br />

Leonti<strong>na</strong> Ferreira dos Santos Soares Servente 1951<br />

Aneri<strong>na</strong> Ressetti Miró Professora <strong>de</strong> Costura 1954<br />

Klei<strong>de</strong> Ferreira do Amaral Pereira Professora <strong>de</strong> Canto 1956<br />

Tatia<strong>na</strong> Bergman Secretária bilíngue 1957<br />

Irene Egle Muzzillo Bus<strong>na</strong>rdo Professora <strong>de</strong> Desenho Or<strong>na</strong>mental 1959<br />

Lucia Soriano <strong>de</strong> Cavalcanti Bibliotecária 1960<br />

Irene Bindo Westphalen Auxiliar <strong>de</strong> Bibliotecária 1960<br />

Maria Teramoto Auxiliar <strong>de</strong> Escritório 1960<br />

Ginuefa Nizio Auxiliar <strong>de</strong> Escritório 1960<br />

Lur<strong>de</strong>s Alice Schnei<strong>de</strong>r Enfermeira 1960<br />

Laurete Rosicler <strong>de</strong> Oliveira Auxiliar técnica <strong>de</strong> Mecanização 1960<br />

Claresdi<strong>na</strong> <strong>de</strong> Assis Pereira Servente 1962<br />

Carmeli<strong>na</strong> <strong>de</strong> Lara Vaz Servente 1962<br />

Neuza Marly Vaz Borges Servente 1962<br />

Maria Benedita Branco Pacheco Servente 1962<br />

Francisca Conceição Rodrigues Servente 1962<br />

Antonia Rodrigues Maciel Servente 1962<br />

Danuta Ceranowicz Carp Secretária bilíngue 1962<br />

Raquel Gugelmin Secretária 1963<br />

Vilma Pires Martins Inspetora <strong>de</strong> alunos 1964<br />

Nely Scolaro Portella Professora <strong>de</strong> Português 1964<br />

Quadro 8 – As <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral em 1964<br />

Fonte: Dados encontrados no arquivo do Nudhi e Arquivo Geral da <strong>UTFPR</strong>.<br />

Elaboração própria.<br />

No quadro 8 elaborado a partir do relatório <strong>de</strong> 1964 po<strong>de</strong>mos observar que<br />

alguns nomes <strong>de</strong> professoras nos são conhecidos. Porém diferente dos quadros<br />

anteriores, neste observamos a <strong>de</strong>scrição <strong>de</strong> outras ativida<strong>de</strong>s exerci<strong>das</strong> por<br />

<strong>mulheres</strong>, como por exemplo: Inspetora <strong>de</strong> alunos, Servente, Servente/Armazenista,<br />

Artífice <strong>de</strong> Corte e Costura, Bibliotecária, Auxiliar <strong>de</strong> Bibliotecária, Auxiliar <strong>de</strong><br />

Escritório, Enfermeira, Secretária, Secretária Bilíngue e Auxiliar Técnica <strong>de</strong><br />

Mecanização. Isso pressupõe mais opções <strong>de</strong> atuação para as <strong>mulheres</strong>, embora


178<br />

estas opções se mantenham em ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> como mais a<strong>de</strong>qua<strong>das</strong> às<br />

<strong>mulheres</strong>.<br />

A respeito <strong>das</strong> relações <strong>de</strong> gênero em sua pesquisa, Machado apresenta<br />

alguns diagnósticos do período que se propôs a<strong>na</strong>lisar (1930 a 1960) que muito se<br />

aproximam do até aqui apresentado nesta segunda fase:<br />

A análise acerca <strong>das</strong> relações <strong>de</strong> gênero <strong>na</strong> Escola Técnica <strong>de</strong> Curitiba<br />

apresentou-se no <strong>de</strong>correr da pesquisa em dois movimentos, o primeiro foi<br />

o da invisibilida<strong>de</strong>, tanto pela dificulda<strong>de</strong> em localizar <strong>na</strong>rradoras, quanto no<br />

fato <strong>de</strong> a presença <strong>de</strong> professoras <strong>na</strong> Instituição ter sido apagada da<br />

memória <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos <strong>na</strong>rradores, exceto o da docente que exercia<br />

a “prática educativa” <strong>de</strong> economia doméstica. Entre as <strong>na</strong>rradoras, os<br />

nomes mencio<strong>na</strong>dos foram os <strong>das</strong> professoras <strong>das</strong> ofici<strong>na</strong>s <strong>de</strong> corte e<br />

costura e <strong>de</strong> bordados. Da mesma forma, foi evi<strong>de</strong>nciado que só havia<br />

professoras no I ciclo (industrial básico), sendo que o quadro docente dos<br />

cursos técnicos era formado somente por professores (MACHADO, 2010, p.<br />

379).<br />

O segundo movimento a que se refere a autora diz respeito ao processo <strong>de</strong><br />

oferta e <strong>de</strong> apropriação da formação oferecida pela instituição por parte <strong>das</strong> alu<strong>na</strong>s;<br />

a Lei e a prática <strong>de</strong>mostram que o que se mantinha era a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> formar para a<br />

administração do lar, aperfeiçoando as qualida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s<br />

(MACHADO, 2010). Embora haja mudanças, o que se vê a respeito da escolha dos<br />

cursos por alunos e alu<strong>na</strong>s é que comumente segue-se <strong>uma</strong> lógica da divisão sexual<br />

do trabalho.<br />

Diferentemente <strong>de</strong> Machado (2010), entretanto, o período a que chamamos<br />

segunda fase, em relação ao período anterior, teve vantagens, já que por meio da<br />

pesquisa bibliográfica foi possível encontrar dados e fazer <strong>uma</strong> reflexão a seu<br />

respeito.<br />

Por outro lado, não po<strong>de</strong>mos negar que a tradição da instituição acabou<br />

sufocando as <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> maneira a mantê-las durante muito tempo invisíveis,<br />

quase como inexistentes. À medida que lhes possibilitou o acesso como alu<strong>na</strong>s,<br />

<strong>de</strong>u-lhes mais <strong>uma</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserção inclusive como professoras no ensino<br />

profissio<strong>na</strong>l. Das poucas que atuaram <strong>na</strong> instituição nos seus primeiros 50 anos <strong>de</strong><br />

história fica o exemplo a ser seguido aqui registrado.<br />

Nesta segunda fase, temos <strong>uma</strong> diferença consi<strong>de</strong>rável em relação a<br />

anterior: mais possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação é sinônimo <strong>de</strong> mais <strong>mulheres</strong>. As histórias e<br />

fotos registrados aqui são <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> reconhecer o valor e a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas


179<br />

<strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> abertura <strong>de</strong> espaços para tantas outras que viriam <strong>na</strong>s déca<strong>das</strong><br />

seguintes.<br />

5.3 TERCEIRA FASE (1970-2005): A EXPANSÃO FAZ O NÚMERO DE MULHERES<br />

CRESCER<br />

Na trajetória <strong>de</strong> mudanças significativas da Escola, em 1969 o Governo<br />

Fe<strong>de</strong>ral autorizou as Escolas Técnicas do Paraná e <strong>de</strong> Mi<strong>na</strong>s Gerais a ministrarem<br />

Cursos Profissio<strong>na</strong>is <strong>de</strong> Nível Superior <strong>de</strong> Curta Duração 130 , sendo então criados os<br />

Centros <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> Operação. Os cursos <strong>de</strong> Engenharia <strong>de</strong> Operação<br />

tiveram gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>staque e o MEC propôs em 1978 a transformação da Escola<br />

Técnica em Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica do Paraná (Cefet-Pr), um fato<br />

<strong>de</strong> extrema importância, já que a partir daí aqueles cursos seriam elevados a cursos<br />

mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> Engenharia Industrial. A Lei n. 6.545 <strong>de</strong> 30 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1978 criou os<br />

Cefets que tinham como objetivo principal o <strong>de</strong> ministrar aulas nos níveis técnico,<br />

tecnológico, formação docente e aperfeiçoamento, e <strong>de</strong>ntre estes o <strong>de</strong> realizar<br />

pesquisas <strong>na</strong> área técnico-industrial – pesquisa aplicada. A partir <strong>de</strong>sse momento<br />

enten<strong>de</strong>-se que a instituição começa a atuar <strong>na</strong> pesquisa científico-tecnológica,<br />

campo que mais tar<strong>de</strong> ganharia força com a criação dos Programas <strong>de</strong> Pós-<br />

Graduação, já nos anos 1980.<br />

A tabela 8 mostra a média <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> em relação ao universo do número<br />

<strong>de</strong> funcionários a partir <strong>de</strong> 1979 até o início dos anos 1990.<br />

Tabela 8 – As <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> – 1979 a 1990<br />

Ano 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990<br />

% 29% 25% 25% 27% 25% 27% 28% 28% 29% * * 31%<br />

Valor<br />

absoluto<br />

136 140 137 154 155 170 183 199 221 * * 299<br />

Fonte: Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos. Elaboração própria com base nos<br />

Relatórios <strong>de</strong> Recolhimento do FGTS dos funcionários.<br />

* dados não disponíveis.<br />

130 No caso da ETF-Pr, foram criados os cursos <strong>de</strong> Construção Civil e Elétrica, especialmente com o<br />

intuito <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s regio<strong>na</strong>is do mercado <strong>de</strong> trabalho.


180<br />

Po<strong>de</strong>-se observar <strong>na</strong> tabela 8 <strong>uma</strong> participação média <strong>na</strong> casa dos 27 e<br />

28%, com o pico <strong>de</strong> 31% em 1990. Isso significa que o crescimento da Escola, agora<br />

Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica, foi em todos os sentidos, incluindo o<br />

aumento <strong>das</strong> contratações.<br />

O valor absoluto <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> alcançado em 1990 representa um avanço<br />

consi<strong>de</strong>rável; após 80 anos <strong>de</strong> história, quase trezentas <strong>mulheres</strong> faziam parte<br />

<strong>de</strong>sse momento em que a Escola, agora Cefet-Pr, se consolidava no cenário<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, inclusive em relação à pesquisa científico-tecnológica, mais um campo<br />

possível <strong>de</strong> atuação para elas. Trataremos <strong>de</strong>sta questão em tópico específico.<br />

Os números em elevação <strong>na</strong> tabela 8 representam para as <strong>mulheres</strong> o<br />

momento em que conseguiria espaços em favor <strong>de</strong> outras que almejassem seguir<br />

<strong>uma</strong> carreira nesta instituição.<br />

Com um número em elevação, ficava praticamente impossível ignorar sua<br />

presença. Para as <strong>mulheres</strong> muitos resultados positivos surgem <strong>de</strong>sta visibilida<strong>de</strong>.<br />

Um dos resultados nesse sentido surge ainda <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1980, mais<br />

especificamente em 12 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1986, quando acontece o III Encontro da<br />

Mulher 131 , com o objetivo <strong>de</strong> “i<strong>de</strong>ntificar e discutir a situação da mulher „cefetia<strong>na</strong>‟, <strong>de</strong><br />

forma a buscar sua integração”. O resultado, segundo os dirigentes, foi eficiente “no<br />

sentido <strong>de</strong> proporcio<strong>na</strong>r segurança no ambiente <strong>de</strong> trabalho feminino e em todo seu<br />

meio social”; <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> visibilizar a questão <strong>de</strong> gênero <strong>de</strong>ntro da instituição que<br />

contava com <strong>uma</strong> média <strong>de</strong> 30% <strong>de</strong> quadro funcio<strong>na</strong>l feminino durante gran<strong>de</strong> parte<br />

<strong>de</strong> sua história (entre funções <strong>de</strong> apoio, administrativas, docente e <strong>de</strong> direção).<br />

Outro acontecimento importante em relação à questão <strong>de</strong> gênero ocorreu<br />

em janeiro <strong>de</strong> 1995: o então Cefet-Pr recebe a incumbência <strong>de</strong> participar em evento<br />

inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l apresentando a situação da mulher no contexto do ensino<br />

profissio<strong>na</strong>lizante. Desse evento resultou a sugestão e oferta <strong>de</strong> parceria da Unesco<br />

em promover um workshop <strong>de</strong> abrangência <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l para tratar do papel da mulher<br />

<strong>na</strong> área técnico-vocacio<strong>na</strong>l.<br />

O evento foi realizado <strong>na</strong>s <strong>de</strong>pendências do então Cefet-Pr em novembro <strong>de</strong><br />

1995, contou com a presença <strong>de</strong> pesquisadoras e pesquisadores da área <strong>de</strong> gênero<br />

e teve organização do Programa <strong>de</strong> Pós-graduação em Tecnologia (PPGTE). A<br />

131 Ainda que seja o terceiro encontro, não encontramos informações dos anteriores nos documentos<br />

a<strong>na</strong>lisados e tampouco a responsabilida<strong>de</strong> pela organização <strong>de</strong> nenhum <strong>de</strong>les.


181<br />

professora Sonia A<strong>na</strong> Leszczynski apresentou dados sobre a questão do acesso <strong>de</strong><br />

moças e <strong>mulheres</strong> à educação técnica e vocacio<strong>na</strong>l. O resultado do workshop<br />

intitulado “O papel da mulher no ensino tecnológico: o estado da arte no Brasil” foi<br />

publicado em número especial da Revista Tecnologia & H<strong>uma</strong>nismo.<br />

Ressaltamos também que o evento foi o embrião do Grupo <strong>de</strong> Estudos e<br />

Pesquisas em Relações <strong>de</strong> Gênero e Tecnologia (GeTec) no Programa <strong>de</strong> Pósgraduação<br />

em Tecnologia, iniciado alguns anos <strong>de</strong>pois.<br />

O grupo com mais <strong>de</strong> <strong>uma</strong> década <strong>de</strong> existência está voltado ao<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> estudos e pesquisas sobre a temática "Relações <strong>de</strong> Gênero e<br />

Tecnologia", e tem como objetivos específicos:<br />

Viabilizar a discussão sobre as relações <strong>de</strong> gênero e tecnologia, através da<br />

promoção <strong>de</strong> encontros, palestras, reuniões, seminários, conferências e<br />

workshops;<br />

Divulgar resultados <strong>das</strong> pesquisas e dos estudos <strong>de</strong>senvolvidos no âmbito do<br />

núcleo;<br />

Estabelecer intercâmbio com outras instituições (públicas, priva<strong>das</strong>,<br />

<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is, inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is) interessa<strong>das</strong> <strong>na</strong> temática gênero e tecnologia;<br />

Desenvolver um banco <strong>de</strong> dados constituído <strong>de</strong> estudos e pesquisas sobre<br />

gênero e tecnologia 132 .<br />

Dentre os muitos objetivos, portanto, e por estar inserido <strong>na</strong> linha <strong>de</strong><br />

pesquisa Tecnologia e Trabalho, o grupo possibilitou o ingresso <strong>de</strong> alu<strong>na</strong>s e alunos<br />

com interesses <strong>de</strong> pesquisa sobre o tema no Mestrado em Tecnologia e mais tar<strong>de</strong><br />

no Doutorado 133 . Isto é muito importante no contexto da instituição, que<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente relegou as <strong>mulheres</strong> a alguns espaços <strong>de</strong> atuação, pois busca<br />

problematizar e <strong>de</strong>s<strong>na</strong>turalizar práticas <strong>de</strong>terministas e discrimi<strong>na</strong>tórias.<br />

132 Informações disponíveis em: Acesso: 20 fev.<br />

2011.<br />

133 A primeira dissertação sobre a temática foi o <strong>de</strong> Maria <strong>de</strong> Lour<strong>de</strong>s Tomio Stein, sob o título Gênero<br />

feminino no contexto do trabalho fabril: setor eletroeletrônico em Curitiba e RM <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 90,<br />

orientado pela professora doutora e coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dora do Getec <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a fundação Marília Gomes <strong>de</strong><br />

Carvalho, <strong>de</strong>fendido em fevereiro <strong>de</strong> 2000. De lá pra cá são <strong>de</strong>ze<strong>na</strong>s <strong>de</strong> dissertações e teses<br />

disponíveis no site do Programa (http://www.ppgte.ct.utfpr.edu.br).


182<br />

O evento e a publicação resultante po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados como um passo<br />

importante para a questão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> educação profissio<strong>na</strong>l brasileira; embora<br />

não tenham sido as primeiras iniciativas e tampouco as últimas, nos remetem a um<br />

contexto que justifica a história prece<strong>de</strong>nte e a que viria <strong>de</strong>pois.<br />

Em relação aos dados publicados por conta do evento, em especial o artigo<br />

da professora Sonia A<strong>na</strong> Leszczynski, eles nos foram bastante úteis para a nossa<br />

reflexão justamente por estarem circunscritos no período que chamamos terceira<br />

fase – dizem respeito ao período <strong>de</strong> 1985 a 1995 e possibilitam conhecer a situação<br />

da distribuição docente por áreas do conhecimento e gênero.<br />

Em 1985 as professoras representavam 15% do total do quadro <strong>de</strong> docentes<br />

do ensino médio (antigo 2º grau), e <strong>de</strong>stas somente 20% atuavam em discipli<strong>na</strong>s da<br />

área técnica, o que aponta <strong>uma</strong> prevalência <strong>na</strong> educação geral (80%).<br />

No ensino superior o número é ainda menor: somente três <strong>mulheres</strong><br />

atuavam nesse nível <strong>de</strong> ensino, representando 2,5% do total.<br />

Em 1990 o percentual <strong>de</strong> professoras do ensino médio chegava a 86%, um<br />

crescimento <strong>de</strong> 43,3% em relação ao período anterior. Em relação ao total <strong>de</strong><br />

docentes do ensino médio, as <strong>mulheres</strong> subiram a um percentual <strong>de</strong> 18%, e <strong>de</strong>stas<br />

27% atuavam em discipli<strong>na</strong>s da área técnica, <strong>de</strong>monstrando também um aumento<br />

em relação ao período anterior, quando era <strong>de</strong> 20% somente.<br />

A<strong>na</strong>lisando o aumento <strong>de</strong> docentes <strong>na</strong> área técnica no ensino médio nos<br />

anos <strong>de</strong> 1985 e 1990, a proporção <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> professoras da área técnica<br />

ficou inferior ao crescimento total; enquanto no total se vê <strong>uma</strong> taxa <strong>de</strong> crescimento<br />

<strong>de</strong> 43,3%, o <strong>de</strong> professoras <strong>na</strong> área técnica foi <strong>de</strong> 35%, o que <strong>de</strong>monstra a maior<br />

dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> inserção <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> nessa área.<br />

Já em relação ao número <strong>de</strong> docentes atuantes no ensino superior o<br />

crescimento foi <strong>de</strong> 100%; em números absolutos passamos <strong>de</strong> 3 para 6 professoras,<br />

conforme vemos <strong>na</strong> tabela 9:<br />

Tabela 9 – Número <strong>de</strong> professoras no Ensino Superior em<br />

1985 e 1990<br />

1985 1990<br />

Ed. Técnica Ed. Geral Ed. Técnica Ed. Geral<br />

1 2 2 4<br />

Total 3 6<br />

Fonte: Leszczynski, 1996. Elaboração própria.


183<br />

Em relação aos dados <strong>de</strong> 1995 as alterações são bastante consi<strong>de</strong>ráveis,<br />

pois houve <strong>uma</strong> diminuição no número total <strong>de</strong> docentes em relação ao ano <strong>de</strong><br />

1990; neste ano o total era <strong>de</strong> 611 docentes e em 1995 baixou para 547. Isso<br />

interferiu no quadro <strong>de</strong> docentes e afetou diretamente o número <strong>de</strong> professores <strong>na</strong><br />

educação geral tanto no ensino médio como no superior, e também no número <strong>de</strong><br />

homens atuando <strong>na</strong> educação técnica:<br />

Na educação geral para o Ensino Médio, em 1990 eram 182 professores e<br />

140 em 1995;<br />

Já <strong>na</strong> educação geral para o Ensino Superior, em 1990 eram 64 professores e<br />

24 em 1995;<br />

Em relação à educação técnica, o <strong>de</strong>créscimo ocorreu somente em relação<br />

aos docentes no nível superior, que caiu <strong>de</strong> 77 para 45.<br />

Já em relação às professoras, nesse período elas foram afeta<strong>das</strong> somente<br />

nos números <strong>de</strong> professoras atuando <strong>na</strong> educação geral para o Ensino Médio, que<br />

caiu <strong>de</strong> 63 em 1990 para 58 em 1995; nos <strong>de</strong>mais níveis e áreas seus números em<br />

1995 aumentaram em relação a 1990.<br />

Segundo os cálculos, em 1995 as <strong>mulheres</strong> representavam 20% do total <strong>de</strong><br />

docentes atuantes no nível médio e <strong>de</strong>stas 38% estavam <strong>na</strong> educação técnica.<br />

O número <strong>de</strong> professoras atuando no ensino superior passou <strong>de</strong> 6 para 13,<br />

um crescimento maior do que 100%. Outro dado em favor <strong>de</strong>las, é que nesse<br />

período eram 7 as professoras no Ensino Superior, e 6 <strong>na</strong> educação geral. Este<br />

número indica <strong>uma</strong> maior representativida<strong>de</strong> em relação aos últimos <strong>de</strong>z anos e<br />

especialmente em relação a todo o histórico da instituição, quando vemos <strong>uma</strong><br />

concentração <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> educação geral e em áreas tradicio<strong>na</strong>is <strong>das</strong> áreas<br />

técnicas.<br />

Para ilustrar estes dados, Leszczynski (1996) mostra a situação em relação<br />

aos <strong>de</strong>partamentos acadêmicos em 1995:


184<br />

Tabela 10 – Número <strong>de</strong> professores(as) no Cefet-Pr em<br />

1995 por Departamento Acadêmico<br />

Departamentos<br />

Masculino Feminino Total<br />

Eletrônica 89 3 92<br />

Eletrotécnica 78 5 83<br />

Desenho Industrial 15 24 39<br />

Mecânica 50 3 53<br />

Construção Civil 45 7 52<br />

Matemática 34 7 41<br />

Física 32 8 40<br />

Química/Biologia 22 11 33<br />

Estudos Sociais 14 3 17<br />

Comunicação e Expressão 14 21 35<br />

Economia/Administração 11 2 13<br />

Educação Física 13 6 19<br />

Informática 24 6 30<br />

Total 441 106 547<br />

Fonte: Leszcynski, 1996, p. 47.<br />

Apesar da gran<strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Desenho<br />

Industrial que até a década <strong>de</strong> 1970 era o Departamento <strong>de</strong> Decorações (origi<strong>na</strong>do<br />

do curso Técnico em Decoração <strong>de</strong> Interiores), e <strong>de</strong> Comunicação e Expressão que<br />

agregava professores e professoras <strong>de</strong> Língua Portuguesa e Estrangeira, há que se<br />

consi<strong>de</strong>rar que o fato <strong>de</strong> termos <strong>mulheres</strong> em to<strong>das</strong> as áreas é um avanço porque<br />

isso atesta as modificações sofri<strong>das</strong> em vários sentidos. Por outro lado em relação<br />

ao caráter prepon<strong>de</strong>rantemente masculino nos quadros discente e docente,<br />

curricular e gestor a mudança foi peque<strong>na</strong>.<br />

Leszczynski (1996) apresenta os dados em relação ao corpo discente, pelos<br />

quais se comprova a tendência mantida em relação à concentração <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s no<br />

curso <strong>de</strong> Desenho Industrial. Entretanto também é possível ver o aumento no<br />

número <strong>de</strong> meni<strong>na</strong>s cursando Construção Civil: <strong>de</strong> 399 meni<strong>na</strong>s em 1985 passou a<br />

513 em 1995, chegando a um pico <strong>de</strong> 527 em 1993. Esses números <strong>de</strong>monstram<br />

que a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso em <strong>de</strong>corrência <strong>das</strong> mudanças nos quadros político,<br />

econômico e social favorece a população femini<strong>na</strong> quando da escolha por que áreas<br />

profissio<strong>na</strong>is seguir, além daquelas tradicio<strong>na</strong>lmente consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> como mais<br />

apropria<strong>das</strong>.


185<br />

Ainda nessa década, outra transformação marcará essa história: a partir do<br />

Decreto n. 2.208 <strong>de</strong> 17 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1997 que regulamentava dispositivos da Lei <strong>de</strong><br />

Diretrizes e Bases da Educação 134 , a oferta dos cursos técnicos integrados ficou<br />

bastante restrita, pois havia previsão <strong>de</strong> que “A educação profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> nível<br />

técnico terá organização curricular própria e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do ensino médio,<br />

po<strong>de</strong>ndo ser oferecida <strong>de</strong> forma concomitante ou seqüencial a este” (Artigo 5º,<br />

Decreto n. 2.208/97).<br />

Esta legislação contribuiu para que a instituição implantasse o Ensino Médio<br />

e cursos superiores <strong>de</strong> Tecnologia, sendo extintos os cursos Técnicos Integrados.<br />

A mudança no período em relação à oferta <strong>de</strong> ensino levou o Cefet-Pr a,<br />

ainda <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 90, expandir-se geograficamente: a instituição chegou ao<br />

interior do Paraná, sendo implanta<strong>das</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>scentraliza<strong>das</strong> <strong>de</strong> ensino. Por<br />

conta do aumento <strong>na</strong> oferta <strong>de</strong> ensino, tivemos também um aumento no quadro <strong>de</strong><br />

pessoal, no número <strong>de</strong> cursos novos criados em todos os níveis, <strong>na</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

formar mais alunos e alu<strong>na</strong>s em diferentes cida<strong>de</strong>s do estado. No entanto, para o<br />

nosso trabalho utilizaremos os dados somente do campus Curitiba.<br />

A tabela 11 apresenta o percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> no período <strong>de</strong> 1995 a 2005<br />

quando ocorrerá a transformação em Universida<strong>de</strong>:<br />

Tabela 11 – As <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> – 1995 a 2005<br />

Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005<br />

% 38% 37% 38% 36% 37% 36% 36% 37% 37% 36% 37%<br />

Valor<br />

714<br />

absoluto<br />

683 655 668 843 808 807 638 659 839 591<br />

Fonte: Dados Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos. Elaboração própria.<br />

A média <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> instituição sobe em relação a períodos anteriores,<br />

chegando a 38%, o que sugere <strong>uma</strong> elevação <strong>de</strong> maneira geral <strong>na</strong>s áreas. Em<br />

números absolutos o aumento é bastante consi<strong>de</strong>rável se comparado com o dado<br />

do ano <strong>de</strong> 1990, quando eram 299 <strong>mulheres</strong>; mais que o dobro somente cinco anos<br />

<strong>de</strong>pois representa a consolidação <strong>de</strong> espaços, reflexo <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> oitenta anos <strong>de</strong><br />

tentativa <strong>de</strong> inserção. Essa transformação numérica segue acontecendo após 2005<br />

134 O Decreto regulamentava o § 2º do artigo 36 e os artigos 39 a 42 da Lei n. 9.394, <strong>de</strong> 20 <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996 (LDB). Alvo <strong>de</strong> várias críticas, a extinção dos cursos técnicos integrados é vista<br />

por muitos como um gran<strong>de</strong> entrave no processo <strong>de</strong> amadurecimento da educação profissio<strong>na</strong>l<br />

brasileira.


186<br />

quando o Cefet-Pr passará a se chamar Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná, o que acarreta em nova filosofia, já a partir da obrigatorieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuar em<br />

Ensino, Pesquisa e Extensão, e em novos campos <strong>de</strong> atuação tanto para homens<br />

como para <strong>mulheres</strong>.<br />

5.4 QUARTA FASE (2005-2011): UMA NOVA FASE PARA A PARTICIPAÇÃO DAS<br />

MULHERES?<br />

Em relação ao processo que <strong>de</strong>u origem à primeira Universida<strong>de</strong><br />

Tecnológica do país, embora se possa pensar que a mudança <strong>de</strong> Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong><br />

Educação Tecnológica para Universida<strong>de</strong> tenha sido fácil, mesmo com toda a<br />

história e tradição do então Cefet-Pr, foi <strong>uma</strong> longa trajetória que se iniciou no fi<strong>na</strong>l<br />

dos anos 1990 e durou sete anos até que o governo fe<strong>de</strong>ral aprovasse como lei a<br />

transformação que ocorreu <strong>de</strong>vido ao projeto <strong>de</strong> expansão do ensino superior no<br />

país.<br />

Em 7 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2005 foi criada então a primeira Universida<strong>de</strong><br />

Tecnológica do Brasil 135 . Muitos se empenharam em <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r essa transformação,<br />

embora os objetivos sejam questionáveis, assim como apresenta Lima Filho (2010):<br />

...o Cefet-Pr, por meio <strong>de</strong> sua direção-geral, vinha pleiteando a<br />

transformação em universida<strong>de</strong> tecnológica <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início da reforma da<br />

educação profissio<strong>na</strong>l, mais precisamente <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1998. Naquela ocasião,<br />

embora a categoria universida<strong>de</strong> especializada já tivesse sido disposta pela<br />

LDBEN, os argumentos apresentados pelo Cefet-Pr em favor da<br />

transformação eram <strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza bem mais pragmática: consi<strong>de</strong>ravam o<br />

processo <strong>de</strong> “cefetização” em curso, a questão da autonomia da instituição<br />

e <strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> filosofia <strong>de</strong> competição do “estar e manter-se à frente”<br />

dos <strong>de</strong>mais. Foi com essa perspectiva e no processo <strong>de</strong> reestruturação da<br />

instituição, pela a<strong>de</strong>são negociada entre direção do Cefet-Pr e a gestão do<br />

Mec para a pronta e ple<strong>na</strong> implantação dos <strong>de</strong>lineamentos do Decreto n.<br />

2.208/97, que o Conselho Diretor aprovou e encaminhou ao Mec e ao<br />

Conselho Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> Educação, em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1998, o Projeto <strong>de</strong><br />

135 Importante <strong>de</strong>stacar relevante acontecimento no ano <strong>de</strong> 2005: após sete anos <strong>de</strong> extinto o ensino<br />

médio integrado à formação <strong>de</strong> nível técnico, o presi<strong>de</strong>nte Luís Inácio Lula da Silva assinou o Decreto<br />

5.154/2004 que recuperava a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> oferta do ensino integrado – alunos e alu<strong>na</strong>s voltaram<br />

a ter a chance <strong>de</strong> fazer um só curso técnico integrado ao ensino médio.


187<br />

transformação do Cefet-Pr em universida<strong>de</strong> tecnológica (LIMA FILHO, 2010,<br />

p. 152) 136 .<br />

Ciavatta (2010) cita que o caminho foi sendo possibilitado porque os Cefets,<br />

quando criados pela Lei n. 6.545/78, receberam o caráter <strong>de</strong> instituição universitária<br />

em termos administrativos e em relação aos objetivos educacio<strong>na</strong>is por eles<br />

expressos e assumidos. Com estatuto e autonomia postos, os Cefets tiveram a<br />

condição <strong>de</strong> ampliar suas funções e promover cursos <strong>de</strong> graduação e pósgraduação,<br />

licenciatura (ple<strong>na</strong> e curta), formar auxiliares e técnicos industriais <strong>de</strong><br />

nível médio, ofertar cursos <strong>de</strong> extensão para a comunida<strong>de</strong> inter<strong>na</strong> e exter<strong>na</strong>, <strong>de</strong><br />

especialização e <strong>de</strong> aperfeiçoamento, além <strong>de</strong> atuar em pesquisas <strong>na</strong> área técnica<br />

industrial (Artigo 2º da Lei n. 5.540/68).<br />

A autora também acrescenta que a re<strong>de</strong> contava<br />

com equipamentos sofisticados <strong>de</strong> tecnologia para o ensino e a pesquisa, e<br />

há evidência <strong>de</strong> que houve um esforço nesse sentido pelo número<br />

crescente <strong>de</strong> professores que fizeram mestrado e doutorado e trabalham <strong>na</strong><br />

implementação da graduação e da pós-graduação em suas instituições <strong>de</strong><br />

origem (CIAVATTA, 2010, p. 165).<br />

Este histórico serve para <strong>de</strong>monstrar como as bases para a constituição <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> instituição universitária estavam sendo postas há alg<strong>uma</strong>s déca<strong>das</strong> e a<br />

concretização acabou acontecendo num período em que as modificações em<br />

relação ao que se espera <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino profissio<strong>na</strong>l estão postas às<br />

vistas <strong>de</strong> toda a comunida<strong>de</strong>, que enten<strong>de</strong> que o fator educação é imprescindível no<br />

processo <strong>de</strong> formação dos cidadãos e cidadãs.<br />

Voltando à questão da caracterização nesta quarta fase, citamos como a<br />

instituição se configura atualmente. Com onze campi, distribuídos <strong>na</strong>s cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

Apucara<strong>na</strong>, Campo Mourão, Cornélio Procópio, Dois Vizinhos, Francisco Beltrão,<br />

Londri<strong>na</strong>, Medianeira, Pato Branco, Ponta Grossa, Toledo e Curitiba, a instituição<br />

136 Lima Filho, no mesmo artigo <strong>de</strong> 2010, argumenta que a instituição <strong>UTFPR</strong> não aten<strong>de</strong> ao que ele<br />

chama “aspectos centrais da universida<strong>de</strong> pública”, pelo contrário, “o mo<strong>de</strong>lo institucio<strong>na</strong>l que vem<br />

sendo conduzido pelos órgãos superiores da <strong>UTFPR</strong> aproxima-se <strong>de</strong> concepções e práticas que têm<br />

como características principais a heteronomia institucio<strong>na</strong>l, o conceito instrumental <strong>de</strong> tecnologia, o<br />

conceito <strong>de</strong> universida<strong>de</strong> como instituição prestadora <strong>de</strong> serviços, a pesquisa e a extensão aplica<strong>das</strong>,<br />

ou seja, foca<strong>das</strong> preferencialmente nos interesses imediatos dos setores empresariais, afastando-se,<br />

assim, dos caminhos da construção <strong>de</strong> <strong>uma</strong> universida<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>iramente pública” (2010, p. 154-<br />

155). Sua crítica suscita várias discussões que não são o foco <strong>de</strong>sse trabalho, entretanto merecem<br />

investigação.


188<br />

expan<strong>de</strong> cada dia mais sua oferta <strong>de</strong> cursos e vagas para discentes,<br />

consequentemente, implicando no aumento <strong>de</strong> vagas para funcionários e<br />

funcionárias, <strong>de</strong>ntre eles mais professores e professoras, engajados <strong>na</strong> e para a<br />

continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssa história. Vale <strong>de</strong>stacar que a instituição tem ampliado os cursos<br />

<strong>de</strong> licenciatura e bacharelados <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Matemática, Física, Química, Educação<br />

Física, Letras, Design, o que po<strong>de</strong> alterar a configuração <strong>de</strong> gênero do seu corpo<br />

docente e discente no âmbito geral. Nos onze campi há a oferta <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> pósgraduação<br />

lato e stricto sensu, graduação, em to<strong>das</strong> as modalida<strong>de</strong>s presenciais –<br />

tecnologia, engenharia, licenciatura e bacharelados, nível médio regular com cursos<br />

técnicos integrados e um técnico subsequente, além da oferta <strong>de</strong> nível médio <strong>na</strong><br />

modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Educação <strong>de</strong> Jovens e Adultos – Proeja.<br />

Em relação ao número <strong>de</strong> docentes os onze campi tinham em 2010 um total<br />

<strong>de</strong> 1393 professores(as), sendo 602 mestres e 340 doutores(as). Além <strong>de</strong>stes, eram<br />

647 técnicos-administrativos e mais <strong>de</strong> 16.000 alunos e alu<strong>na</strong>s.<br />

A respeito do número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s déca<strong>das</strong> <strong>de</strong> 2005 a 2010 elaboramos<br />

a tabela 12:<br />

Tabela 12 – As <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> – 2005 a 2010<br />

Ano 2005 2006 2007 2008 2009 2010<br />

% 37% 36% 37% 38% 38% 42% 137<br />

Valor absoluto 591 776 945 1028 1170 *<br />

Fonte: Dados Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos.<br />

Elaboração própria.<br />

*Dado não disponível.<br />

Em relação ao número <strong>de</strong> funcionárias o que a tabela 12 nos mostra é que<br />

quando da transformação do Cefet-Pr em <strong>UTFPR</strong> (ano <strong>de</strong> 2005) ocorre um<br />

<strong>de</strong>créscimo em relação ao ano <strong>de</strong> 2004 (tabela 11), quando havia 839 <strong>mulheres</strong>,<br />

para posteriormente observarmos um aumento gradativo no valor absoluto <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong>.<br />

Ainda assim no período que vai <strong>de</strong> 1995 ao ano <strong>de</strong> 2009 observa-se<br />

comparando tabelas 11 e 12 que há <strong>uma</strong> participação média no valor percentual <strong>de</strong><br />

137 O percentual foi disponibilizado pelo Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos no mês <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong><br />

2010.


189<br />

<strong>mulheres</strong> no quadro funcio<strong>na</strong>l. E se consi<strong>de</strong>ramos a transformação ocorrida em<br />

2005, elevando a instituição à Universida<strong>de</strong>, vemos <strong>uma</strong> elevação no percentual que<br />

culmi<strong>na</strong> com o maior percentual <strong>de</strong> toda sua história em 2010 – as <strong>mulheres</strong><br />

representavam mais <strong>de</strong> 40% do quadro funcio<strong>na</strong>l. Consi<strong>de</strong>ramos este aumento<br />

como possibilida<strong>de</strong>s efetivas <strong>de</strong> mudanças <strong>na</strong>s configurações <strong>de</strong> gênero <strong>na</strong><br />

instituição.<br />

Os dados encontrados no Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos dos últimos<br />

quinze anos são consi<strong>de</strong>ravelmente maiores que os dados <strong>de</strong> 1979 a 1990 (tabela<br />

8), se comparamos o valor percentual médio <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> – em torno <strong>de</strong> 30% no<br />

primeiro período e <strong>de</strong> 37% no segundo.<br />

Estes números crescentes em favor <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1990 dizem<br />

respeito à abertura <strong>de</strong> inúmeras possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação; conforme indicado, a<br />

instituição ampliou níveis <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> cursos, o que po<strong>de</strong> ter sido o responsável<br />

pelo aumento percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>. Entretanto porque temos o que Leszczynski<br />

caracterizou como “<strong>uma</strong> escola „masculi<strong>na</strong>‟ em suas áreas <strong>de</strong> excelência” (1996, p.<br />

102), que seriam justamente os cursos técnicos masculinos e os cursos superiores<br />

<strong>de</strong> Engenharia, e sabendo que as <strong>mulheres</strong> ainda têm menor concentração nestas<br />

áreas, po<strong>de</strong>-se dizer que o equilíbrio está quando a<strong>na</strong>lisamos a participação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> em <strong>de</strong>partamentos e áreas historicamente ocupados por elas, como é o<br />

caso dos <strong>de</strong>partamentos <strong>de</strong> Comunicação e Expressão e <strong>de</strong> Desenho Industrial,<br />

conforme a<strong>na</strong>lisaremos adiante.<br />

Silva (2000) acrescenta que apesar <strong>de</strong> um aumento consi<strong>de</strong>rável no número<br />

<strong>de</strong> professoras, a concentração está em áreas <strong>de</strong> educação geral e em alg<strong>uma</strong>s<br />

áreas específicas <strong>de</strong> educação técnica. A exceção colocada pela autora diz respeito<br />

ao corpo docente do Departamento <strong>de</strong> Desenho Industrial (Dadin), origi<strong>na</strong>do do<br />

Departamento <strong>de</strong> Decorações, que, conforme já exposto, tem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua origem um<br />

número maior <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

A pesquisadora Marilia Gomes <strong>de</strong> Carvalho em artigo <strong>de</strong> 2008 se <strong>de</strong>teve<br />

sobre os números do corpo docente da <strong>UTFPR</strong>, especificamente do campus<br />

Curitiba, obtidos via Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos, do ano <strong>de</strong> 2007. Sua<br />

análise partiu da separação entre número <strong>de</strong> homens e <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> por<br />

Departamentos, chegando aos dados da tabela 13:


190<br />

Tabela 13 – Distribuição por sexo nos Departamentos<br />

da <strong>UTFPR</strong> em 2007<br />

Departamento<br />

Homens Mulheres<br />

Mecânica 96% 4%<br />

Engenharia Eletrônica 94% 6%<br />

Engenharia Eletrotécnica 85% 15%<br />

Construção Civil 81% 19%<br />

Informática 76% 24%<br />

Matemática 75% 25%<br />

Estudos Sociais 75% 25%<br />

Física 72% 28%<br />

Educação Física 65% 35%<br />

Gestão e Economia 63% 37%<br />

Química e Biologia 58% 42%<br />

Desenho Industrial 33% 67%<br />

Comunicação<br />

e<br />

Expressão 32% 68%<br />

Línguas Estrangeiras 14% 86%<br />

Fonte: Carvalho, 2008, p. 120.<br />

A autora chama nossa atenção para a distribuição <strong>de</strong> gênero nos<br />

Departamentos Acadêmicos; há <strong>uma</strong> visível relação entre áreas<br />

tecnológicas/atuação prepon<strong>de</strong>rantemente masculi<strong>na</strong> e áreas não<br />

tecnológicas/atuação prepon<strong>de</strong>rantemente femini<strong>na</strong> (como por exemplo o<br />

Departamento <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras 138 , Desenho Industrial e Comunicação e<br />

Expressão).<br />

Se a<strong>de</strong>ntrarmos nos dados <strong>de</strong> Carvalho (2008) constata-se que em alg<strong>uma</strong>s<br />

licenciaturas como Química e Biologia o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> está se aproximando<br />

do <strong>de</strong> homens, e <strong>na</strong> licenciatura em Letras Português-Inglês e no curso superior <strong>de</strong><br />

Tecnologia em Comunicação Institucio<strong>na</strong>l 139 o número <strong>de</strong> professoras atuando é<br />

superior ao dos homens, enquanto que em áreas predomi<strong>na</strong>ntemente tecnológicas<br />

como as Engenharias a predominância numérica masculi<strong>na</strong> é indiscutível, e isso se<br />

138 A área <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras foi durante muito tempo vinculado ao Departamento<br />

Acadêmico <strong>de</strong> Comunicação e Expressão – Dacex, no entanto, institucio<strong>na</strong>lmente era reconhecido<br />

como um espaço pedagógico autônomo intitulado Centro Acadêmico <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras<br />

Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>s – Calem. Atualmente o Centro <strong>de</strong> Línguas constitui um Departamento intitulado<br />

Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>s – Dalem.<br />

139 O curso <strong>de</strong> Licenciatura em Letras Português-Inglês e o <strong>de</strong> Tecnologia em Comunicação<br />

Institucio<strong>na</strong>l pertencem ao Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Comunicação e Expressão – Dacex.


191<br />

refletirá inclusive <strong>na</strong> formação <strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> pesquisas e suas respectivas<br />

li<strong>de</strong>ranças, que trataremos em tópico específico.<br />

Na tabela 13 po<strong>de</strong>mos observar <strong>uma</strong> maior participação femini<strong>na</strong> no<br />

Departamento <strong>de</strong> Línguas Estrangeiras, e <strong>uma</strong> menor participação no <strong>de</strong>partamento<br />

<strong>de</strong> Mecânica.<br />

Outro fator a<strong>na</strong>lisado por Carvalho (2008) é em relação à representativida<strong>de</strong><br />

dos <strong>de</strong>partamentos <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong>, conforme observamos <strong>na</strong> tabela 14:<br />

Tabela 14 – Docentes por Departamentos <strong>na</strong><br />

<strong>UTFPR</strong> em 2007<br />

Física 6,10%<br />

Matemática 6,70%<br />

Eng. Eletrônica 13,60%<br />

Informática 5,20%<br />

Desenho Industrial 6,60%<br />

Construção Civil 8,90%<br />

Eletrotécnica 12,20%<br />

Química e Biologia 5,80%<br />

Educação Física 2,60%<br />

Mecânica 12,40%<br />

Comunicação e Expressão 3,40%<br />

Gestão e Economia 2,90%<br />

Estudos Sociais 2,40%<br />

Línguas Estrangeiras 3,40%<br />

Fonte: Carvalho, 2008. Elaboração própria.<br />

Os dados utilizados para compor a tabela 14 foram elaborados por Carvalho<br />

(2008). Optamos por reproduzi-los aqui para <strong>de</strong>monstrar aquilo que Leszczynski<br />

(1996) afirmou a respeito <strong>das</strong> áreas prepon<strong>de</strong>rantes <strong>na</strong> instituição.<br />

Em relação à distribuição <strong>de</strong> professores e professoras <strong>na</strong>s áreas <strong>na</strong><br />

instituição, vemos <strong>na</strong> tabela 14 que a maioria se concentra <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Mecânica,<br />

Engenharias e Matemática, justamente aquelas em que também encontramos maior<br />

concentração masculi<strong>na</strong> (CARVALHO, 2008) – são as áreas consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> “<strong>de</strong><br />

excelência”. Isso acaba mantendo o círculo vicioso: pelo fato <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> serem<br />

minoria em áreas como Mecânica, Engenharias em geral, e sendo estas as áreas<br />

em que se concentra a maioria dos cursos da instituição, elas sempre estarão em


192<br />

menor número, a não ser que se alcance um número mais equitativo com o passar<br />

dos anos.<br />

Conforme o gráfico, portanto, as Ciências Exatas e Engenharias<br />

correspondiam juntas a mais <strong>de</strong> 65% da oferta <strong>de</strong> ensino <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> em 2008, o que<br />

significa que se as <strong>mulheres</strong> se mantiverem somente <strong>na</strong>s áreas tradicio<strong>na</strong>lmente por<br />

elas ocupa<strong>das</strong>, elas dificilmente ocupariam <strong>uma</strong> posição equitativa em relação ao<br />

número <strong>de</strong> homens. Ou seja, atuar <strong>na</strong>s chama<strong>das</strong> áreas “<strong>de</strong> excelência” <strong>na</strong><br />

instituição significa no âmbito geral a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuação em áreas<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente ocupa<strong>das</strong> por homens, e no âmbito específico da instituição<br />

significa fugir daquilo que observamos durante toda a sua história – <strong>mulheres</strong><br />

atuando em <strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s só por serem <strong>mulheres</strong>.<br />

A autora faz questão <strong>de</strong> <strong>de</strong>stacar que não há problema em existir <strong>uma</strong><br />

divisão por gênero <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> atuação, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que esta divisão não representasse<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> e hierarquização, que coloca as áreas “masculi<strong>na</strong>s” em posição <strong>de</strong><br />

maior status, e as “femini<strong>na</strong>s”, por sua vez, em posições inferiores; isso sem falar <strong>na</strong><br />

diferenciação salarial, <strong>de</strong> jor<strong>na</strong>da, enfim.<br />

O gráfico 1 <strong>de</strong>monstra o percentual <strong>de</strong> professores e professoras em cargos<br />

<strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança:<br />

Gráfico 1 – Professores/as envolvidos/as com as<br />

chefias e administração <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong><br />

Fonte: Carvalho, 2008, p. 133.<br />

Segundo a autora, os cargos <strong>de</strong> chefia são exercidos <strong>na</strong> maioria por<br />

homens, o que para ela po<strong>de</strong> representar mais um elemento <strong>de</strong> reforço da<br />

<strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong>, já que o percentual total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> envolvi<strong>das</strong> com a as chefias,


193<br />

que é <strong>de</strong> 23%, está aquém do percentual total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> instituição no mesmo<br />

ano, quando o percentual era <strong>de</strong> 38%.<br />

A este respeito, Carvalho (2008) faz questão <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar que, ainda que<br />

em alg<strong>uma</strong>s áreas as <strong>mulheres</strong> estejam avançando, há um fator que impe<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

pensarmos em equida<strong>de</strong>: o “teto <strong>de</strong> vidro” segue sendo <strong>uma</strong> barreira – “as <strong>mulheres</strong><br />

se <strong>de</strong>senvolvem profissio<strong>na</strong>lmente até um certo ponto em suas carreiras e <strong>de</strong>pois<br />

estacio<strong>na</strong>m, sem chegarem aos postos que representam possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> tomada<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões” (CARVALHO, 2008, p. 133). Isso acontece inclusive quando<br />

consi<strong>de</strong>rado o aumento no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> nos cursos <strong>de</strong> nível superior <strong>na</strong>s<br />

últimas déca<strong>das</strong>, incluindo <strong>na</strong>s Engenharias.<br />

Estes dados acabam por apontar para o fato <strong>de</strong> que, ao olharmos para os<br />

cargos <strong>de</strong> direção <strong>na</strong> instituição, no posto mais alto <strong>de</strong> diretor geral, consi<strong>de</strong>rando o<br />

período anterior à transformação em Universida<strong>de</strong>, quando temos a figura do reitor,<br />

estes postos sempre foram ocupados por homens.<br />

5.5 A PESQUISA CIENTÍFICO-TECNOLÓGICA NA <strong>UTFPR</strong>: PORTAS ABERTAS?<br />

Com a transformação em Universida<strong>de</strong>, amplia-se a obrigatorieda<strong>de</strong> 140 e a<br />

necessida<strong>de</strong> inter<strong>na</strong> e exter<strong>na</strong> <strong>de</strong> atuação <strong>na</strong> produção científica. Inter<strong>na</strong> porque a<br />

comunida<strong>de</strong> escolar já há muito produzia conhecimento, tanto em pesquisas<br />

individuais quanto coletivas, li<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> pelo corpo docente cada vez mais envolvido<br />

com estas ativida<strong>de</strong>s; exter<strong>na</strong> porque, a partir do momento que se enten<strong>de</strong> a<br />

Instituição como universida<strong>de</strong>, como fonte e produção <strong>de</strong> pesquisa, espera-se a<br />

atuação em áreas <strong>de</strong> pesquisas nunca antes vistas <strong>de</strong>ntro da instituição.<br />

Po<strong>de</strong>mos falar n<strong>uma</strong> mudança <strong>de</strong> um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> instituição <strong>de</strong> ensino que,<br />

antes <strong>de</strong> formar profissio<strong>na</strong>is sempre esteve voltado prioritariamente à pesquisa<br />

140 Segundo artigo 207 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral “As universida<strong>de</strong>s gozam <strong>de</strong> autonomia didáticocientífica,<br />

administrativa e <strong>de</strong> gestão fi<strong>na</strong>nceira e patrimonial, e obe<strong>de</strong>cerão ao princípio <strong>de</strong><br />

indissociabilida<strong>de</strong> entre ensino, pesquisa e extensão”. Disponível em:<br />

Acesso em: 05 mar.<br />

2011.


194<br />

aplicada, e em gran<strong>de</strong> medida, aos interesses da indústria, para um mo<strong>de</strong>lo que<br />

<strong>de</strong>ve manter ensino, pesquisa e extensão, e <strong>de</strong>ve promover a pesquisa em diversas<br />

áreas, enfocando outros aspectos, entre eles o social.<br />

Se voltarmos à década <strong>de</strong> 1980 <strong>de</strong>paramo-nos com o seguinte fato: assumese<br />

em relatório trimestral 1984-1987 que até o ano <strong>de</strong> 1984 inexistia <strong>na</strong> instituição a<br />

“preocupação com a pesquisa a nível institucio<strong>na</strong>l e sistematizada”, fato que será<br />

alterado a partir <strong>de</strong> então com a criação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> estrutura que permitisse a<br />

realização <strong>de</strong> trabalhos <strong>de</strong> pesquisa, contando com o auxílio <strong>de</strong> professores e<br />

professoras que voltavam <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> pós-graduação do exterior. A pesquisa<br />

sofreu percalços em relação à mão-<strong>de</strong>-obra e espaço físico, no entanto se<br />

consolidará rapidamente no campo da pesquisa aplicada, <strong>de</strong>senvolvida<br />

especialmente por três setores: o Núcleo <strong>de</strong> Pesquisas Tecnológicas, o Núcleo <strong>de</strong><br />

Engenharia Hospitalar e o Curso <strong>de</strong> Pós-graduação em Informática Industrial.<br />

O Núcleo <strong>de</strong> Pesquisas Tecnológicas se propunha a fazer pesquisa a partir<br />

<strong>de</strong> três objetivos: tor<strong>na</strong>r o Cefet-Pr um centro <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> pesquisa<br />

aplicada;<br />

<strong>de</strong>senvolver e adaptar equipamentos didáticos para uso nos laboratórios e<br />

ofici<strong>na</strong>s do Cefet-Pr e <strong>de</strong> outras instituições <strong>de</strong> ensino, com vista à melhoria<br />

da qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ensino; e <strong>de</strong>senvolver novas tecnologias para uso da<br />

Instituição e <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s e empresas da comunida<strong>de</strong> (Relatório trianual<br />

1984-1987, s.p.).<br />

O Núcleo <strong>de</strong> Engenharia Hospitalar por sua vez tinha como objetivo<br />

Consolidar o Cefet-Pr como um polo regio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> referência em Engenharia<br />

Biomédica, através <strong>de</strong> <strong>uma</strong> atuação eficaz em pesquisa básica, inovação e<br />

adaptação tecnológica e prestação <strong>de</strong> serviços <strong>na</strong> área <strong>de</strong> Engenharia<br />

Hospitalar, <strong>na</strong> forma <strong>de</strong> assessoria técnica e repasse e dissimi<strong>na</strong>ção (sic)<br />

<strong>de</strong> conhecimento à comunida<strong>de</strong> médico hospitalar (Relatório trianual 1984-<br />

1987, s.p.).<br />

Como se observa nos objetivos <strong>de</strong>stes dois núcleos é perfeitamente<br />

reconhecível o caráter aplicado <strong>de</strong> suas pesquisas.<br />

Dois <strong>de</strong>talhes nos chamam atenção: no relatório não há nomes <strong>de</strong><br />

participantes dos núcleos e tampouco a <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>ção <strong>de</strong> lí<strong>de</strong>res <strong>das</strong> pesquisas; no<br />

entanto, quando da divulgação <strong>das</strong> pesquisas em mídia impressa (jor<strong>na</strong>is <strong>de</strong>


195<br />

circulação regio<strong>na</strong>l), havia a i<strong>de</strong>ntificação dos pesquisadores e em sua maioria estes<br />

eram homens (fotos 15 a 17).<br />

Foto 15 – Recorte <strong>de</strong> mídia impressa do ano <strong>de</strong> 1984 A<br />

Fonte: Arquivo Nudhi.<br />

Foto 16 – Recorte <strong>de</strong> mídia impressa do ano <strong>de</strong> 1984 B<br />

Fonte: Arquivo Nudhi.


196<br />

Foto 17 – Recorte <strong>de</strong> mídia impressa do ano <strong>de</strong> 1984 C<br />

Fonte: Arquivo Nudhi.<br />

Na foto 15, conhecemos um projeto coor<strong>de</strong><strong>na</strong>do por três professores e<br />

executado por <strong>uma</strong> equipe <strong>de</strong> quatro alunos. A notícia apresentada <strong>na</strong> foto 16<br />

aponta a coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção <strong>de</strong> um professor e a participação <strong>de</strong> alunos, sem menção <strong>de</strong><br />

seus nomes. Por último <strong>na</strong> foto 17 vemos um projeto <strong>de</strong>senvolvido por um professor<br />

da instituição. Conforme apontamos, estes são exemplos <strong>de</strong> divulgação dos projetos<br />

e pesquisas científico-tecnológicas <strong>de</strong>senvolvi<strong>das</strong> <strong>na</strong> instituição com seus lí<strong>de</strong>res e<br />

colaboradores quase sempre homens. Nota-se o interesse em divulgar as ações da<br />

instituição. Ao tor<strong>na</strong>r públicos dados a respeito <strong>das</strong> pesquisas feitas somente por<br />

homens, po<strong>de</strong>-se questio<strong>na</strong>r se alg<strong>uma</strong> pesquisa foi ou era li<strong>de</strong>rada ou <strong>de</strong>senvolvida<br />

por <strong>mulheres</strong>.<br />

Conforme já apresentado, no ano <strong>de</strong> 1998 encontramos os primeiros<br />

esforços por transformar a instituição em Universida<strong>de</strong>, fato que teria sido aprovado<br />

u<strong>na</strong>nimemente pelo Conselho Diretor em 19/10/1998. Apresentamos neste ponto<br />

trechos do ofício com a proposta protocolada no Mec em 02/11/1998. Nesse<br />

documento en<strong>de</strong>reçado ao Ministro da Educação com vistas à transformação do<br />

Cefet-Pr em <strong>UTFPR</strong>, o diretor geral Paulo Agostinho Alessio, diz:<br />

As poucas <strong>de</strong>ze<strong>na</strong>s <strong>de</strong> docentes dos primeiros anos – quase todos com<br />

baixa escolarida<strong>de</strong> – <strong>de</strong>ram lugar aos 1.219 docentes <strong>de</strong> hoje, dos quais<br />

374 com pós-graduação lato sensu (especialização) e 308 com pósgraduação<br />

stricto sensu. A atuação meramente no ensino abriu espaço<br />

também a um significativo trabalho <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> pesquisa e extensão, com<br />

inúmeros projetos e ações conjuntas com outras instituições e com o setor


197<br />

produtivo, com benefícios para o <strong>de</strong>senvolvimento econômico e social do<br />

Paraná e do país (Relatório <strong>de</strong> Gestão relativo ao exercício <strong>de</strong> 1998, p. 58).<br />

Ele justifica a transformação <strong>de</strong>vido ao número <strong>de</strong> docentes e campos <strong>de</strong><br />

atuação em Ensino, Pesquisa e Extensão. Para o então diretor, portanto:<br />

A oferta <strong>de</strong> um amplo espectro <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> graduação, os programas <strong>de</strong><br />

pós-graduação, a realização <strong>de</strong> pesquisas, não só aplicada como básica,<br />

aproximam o Cefet-Pr muito mais da atuação <strong>das</strong> Universida<strong>de</strong>s que do<br />

mo<strong>de</strong>lo mais restrito previsto pela citada legislação 141 aos Centros <strong>de</strong><br />

Educação Tecnológica (Relatório <strong>de</strong> Gestão relativo ao exercício <strong>de</strong> 1998,<br />

p. 58).<br />

No capítulo VIII do referido relatório temos <strong>uma</strong> expla<strong>na</strong>ção a respeito da<br />

consolidação da pesquisa <strong>na</strong> instituição no ano <strong>de</strong> 1998, tudo para justificar a<br />

transformação já que o caráter <strong>de</strong> universida<strong>de</strong> já estaria sendo atendido.<br />

Especificamente no campus Curitiba, temos um importante papel do Programa <strong>de</strong><br />

Pós-graduação em Tecnologia que contribuiu, conforme explica o próprio<br />

documento, para incrementar o processo <strong>de</strong> pesquisa <strong>na</strong> instituição e para marcar<br />

sua presença <strong>na</strong> produção científica no país. O documento aclara também que<br />

Dirigida para caráter mais aplicado, a Pesquisa no Cefet-Pr é realizada nos<br />

cursos <strong>de</strong> pós-graduação, nos Departamentos Acadêmicos e por intermédio<br />

da Divisão <strong>de</strong> Pesquisa e Produção da Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Curitiba e <strong>das</strong> Seções<br />

<strong>de</strong> Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico <strong>das</strong> Unida<strong>de</strong>s do Interior. Tais<br />

projetos envolvem alunos, mesmo os <strong>de</strong> 2º grau, e docentes dos vários<br />

graus <strong>de</strong> ensino (Relatório <strong>de</strong> Gestão relativo ao exercício <strong>de</strong> 1998, p. 72).<br />

Na sequência ainda se esclarece que, em relação ao caráter aplicado da<br />

produção, gran<strong>de</strong> parte dos projetos <strong>de</strong> pesquisa tem parceria com o setor<br />

produtivo, justamente por requerer <strong>uma</strong> aplicabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> forma a solucio<strong>na</strong>r<br />

problemas <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m técnica <strong>das</strong> empresas, não abrindo mão da melhoria da<br />

qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida <strong>de</strong> toda a comunida<strong>de</strong>.<br />

Citamos que à época, à frente da produção científico-tecnológica estavam<br />

dois programas <strong>de</strong> pós-graduação stricto sensu: em Tecnologia e em Engenharia<br />

Elétrica e Informática. Além disso havia o Núcleo <strong>de</strong> Pesquisa em Engenharia<br />

141 O Decreto n. 2.406 <strong>de</strong> 27 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1997 regulamenta a Lei Fe<strong>de</strong>ral n. 8.948/94, que trata<br />

<strong>de</strong> Centros <strong>de</strong> Educação Tecnológica.


198<br />

Simultânea (Nupes). De caráter multidiscipli<strong>na</strong>r, o núcleo pretendia formar um centro<br />

<strong>de</strong> competência em análise <strong>de</strong> projetos mecânicos e eletrônicos.<br />

Tendo se transformado oficialmente em Universida<strong>de</strong>, a <strong>UTFPR</strong> teve como<br />

gran<strong>de</strong> preocupação dar continuida<strong>de</strong> a projetos <strong>de</strong> Ensino, Pesquisa e Extensão,<br />

iniciados em gran<strong>de</strong> parte quando da sua transformação em Cefet, <strong>na</strong> déca<strong>das</strong> <strong>de</strong><br />

1970. A transformação então acaba por ocorrer a partir da junção <strong>de</strong> inúmeros<br />

esforços, que veem nessa transformação o “atestado” da qualida<strong>de</strong> e li<strong>de</strong>rança da<br />

Escola ao longo da história da educação profissio<strong>na</strong>l-tecnológica. Fruto <strong>de</strong> esforços<br />

<strong>de</strong> várias pessoas, a transformação <strong>na</strong>da mais é que consequência <strong>de</strong> anos <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>dicação <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> e homens – docentes, técnicos administrativos etc., – ao<br />

ensino técnico e tecnológico; além disso, tínhamos muitos <strong>de</strong>fensores <strong>de</strong> que a<br />

instituição estaria apta a se tor<strong>na</strong>r Universida<strong>de</strong> e contribuir para a implementação<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> re<strong>de</strong> <strong>de</strong> educação tecnológica, e enquanto tal, integrada, ampliando a<br />

pesquisa <strong>de</strong> maneira a contribuir para a inserção do país no cenário inter<strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l,<br />

que enxerga a tecnologia como fator prepon<strong>de</strong>rante para a consolidação da<br />

pesquisa científico-tecnológica.<br />

Além dos Programas <strong>de</strong> Pós-graduação em Ciência e Tecnologia Ambiental,<br />

Computação Aplicada, Engenharia Biomédica, Engenharia Civil, Engenharia Elétrica<br />

e Informática Industrial, Engenharia Mecânica e <strong>de</strong> Materiais, Matemática,<br />

Planejamento e Gover<strong>na</strong>nça Pública, Formação Científica, Educacio<strong>na</strong>l e<br />

Tecnológica, conforme já citamos, o Programa <strong>de</strong> Pós-graduação em Tecnologia do<br />

campus Curitiba, constituído há mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, mantém hoje nove grupos <strong>de</strong><br />

pesquisas e <strong>de</strong>ntre eles o Grupo <strong>de</strong> Estudos e Pesquisas sobre Relações <strong>de</strong> Gênero<br />

e Tecnologia (GeTec), que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o ano 2000 concentra esforços em produzir<br />

pesquisas que possam contribuir para as questões <strong>de</strong> gênero e as inter-relações<br />

com a Ciência e a Tecnologia, em diferentes perspectivas. Conforme já citado, o<br />

caráter do GeTec sempre esteve voltado a promover espaços <strong>de</strong> discussões <strong>na</strong><br />

instituição até então não existentes. Até as primeiras iniciativas <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1980<br />

(Encontros da Mulher e o workshop “O papel da mulher no ensino tecnológico: o<br />

estado da arte no Brasil”), pouco ou quase <strong>na</strong>da se encontra <strong>de</strong> registro a respeito<br />

da questão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> instituição. Atualmente consolidado, o Grupo<br />

permanece como referência nesse sentido, engendrando esforços para que a


199<br />

temática esteja sempre em pauta, seja em iniciativas individuais, como <strong>na</strong>s<br />

institucio<strong>na</strong>is e coletivas, no âmbito docente e principalmente discente.<br />

Destacamos a participação <strong>de</strong> professoras e pesquisadoras que <strong>de</strong>ixam a<br />

cada novo trabalho suas marcas tanto em suas próprias histórias, como <strong>na</strong> história<br />

da instituição, o que se traduz em marcas significativas <strong>na</strong> história da Ciência e da<br />

Tecnologia, bem como <strong>na</strong> história da educação profissio<strong>na</strong>l no Brasil.<br />

Alguns dados mais recentes compreen<strong>de</strong>m um grupo bastante importante<br />

<strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> no campus Curitiba em 2010:<br />

Gráfico 2 – Docentes segundo sexo no campus Curitiba<br />

em janeiro <strong>de</strong> 2010<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br<br />

O gráfico 2 caracteriza especialmente o campus Curitiba no ano <strong>de</strong> 2010; ele<br />

aponta um número inferior ao total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> em todo o Paraná que é<br />

<strong>de</strong> 42% (tabela 12). O campus que <strong>de</strong>u origem à Universida<strong>de</strong> tem como<br />

característica manter as Engenharias, programas <strong>de</strong> pós-graduação e inúmeras<br />

pesquisas nestas áreas como suas áreas <strong>de</strong> referência, exatamente <strong>na</strong>s quais<br />

vemos <strong>uma</strong> menor participação femini<strong>na</strong>.<br />

Por área do conhecimento, a distribuição <strong>na</strong> ocasião era a seguinte:


200<br />

Tabela 15 – Docentes por área do conhecimento no<br />

campus Curitiba em janeiro <strong>de</strong> 2010<br />

As <strong>mulheres</strong> estão<br />

distribuí<strong>das</strong>:<br />

Os homens estão<br />

distribuídos:<br />

Sociais/H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s 28% Sociais/H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s 9%<br />

Saú<strong>de</strong>/Biológicas 7% Saú<strong>de</strong>/biológicas 1%<br />

Ciências Exatas 65% Ciências Exatas 90%<br />

Total 100% 100%<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br<br />

Vemos no gráfico 2 que no campus Curitiba em janeiro <strong>de</strong> 2010, os 28% <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> representava do montante <strong>de</strong> 678 professores, o total <strong>de</strong> 188 <strong>mulheres</strong>. A<br />

distribuição <strong>de</strong>stes 28% por área do conhecimento está expressa <strong>na</strong> tabela 15, <strong>na</strong><br />

qual se percebe que, por se tratar <strong>de</strong> um campus em que dos vinte cursos <strong>de</strong><br />

graduação ofertados atualmente treze são em áreas <strong>de</strong> Engenharia e Tecnológicas<br />

(65%), a maioria dos professores são do sexo masculino e estes estão concentrados<br />

<strong>na</strong>s Ciências Exatas, ou como preferem alg<strong>uma</strong>s pesquisadoras, Ciências “duras”,<br />

fato difícil <strong>de</strong> ser modificado consi<strong>de</strong>rando a longa tradição mantida pela instituição.<br />

Por outro lado <strong>na</strong> mesma tabela po<strong>de</strong>mos observar que as <strong>mulheres</strong> que<br />

compõem o quadro docente da instituição estão majoritariamente <strong>na</strong>s Ciências<br />

Exatas, justamente porque comportam o maior número <strong>de</strong> cursos e alunos/as; mas<br />

se percebemos que <strong>das</strong> 188 docentes 28% estão <strong>na</strong>s Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s, ou seja,<br />

52 <strong>mulheres</strong>, isso nos mostra que quase um terço segue ocupando áreas do<br />

conhecimento historicamente a elas atribuí<strong>das</strong>.<br />

Este número somado ao número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> área <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> ou<br />

Biológicas fica ainda maior: eram ao todo 70 <strong>mulheres</strong>, comprovando <strong>uma</strong> divisão<br />

que po<strong>de</strong> estar relacio<strong>na</strong>da à histórica tradição <strong>de</strong> mais <strong>mulheres</strong> seguirem carreiras<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> como mais apropria<strong>das</strong> ao seu gênero. Como se trata <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

instituição que oferta cursos majoritariamente <strong>na</strong>s Ciências Exatas, espera-se que<br />

cada dia mais elas possam ocupar estes espaços.<br />

Os dados mais recentes são <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2011 (gráfico 3):


201<br />

Gráfico 3 – Docentes segundo sexo no campus Curitiba<br />

em janeiro <strong>de</strong> 2011<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br<br />

Os dados <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2011 não ficam muito diferentes <strong>de</strong> um ano atrás – o<br />

percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> aumenta um ponto, chegando a 29%. No total são 697<br />

docentes, 202 <strong>mulheres</strong> e 495 homens.<br />

Em relação ao período anterior o aumento no número <strong>de</strong> docentes do sexo<br />

feminino foi <strong>de</strong> 7% (<strong>de</strong> 188 para 202), enquanto que os homens aumentaram<br />

somente 1% (<strong>de</strong> 490 para 495). Essa mudança reflete os esforços <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> e<br />

os números que apontam que hoje elas são maioria no ensino superior em muitas<br />

áreas do conhecimento (RISTOFF, 2008). Com maior escolarida<strong>de</strong> maiores<br />

oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> inserir-se em áreas antes i<strong>na</strong>cessíveis.<br />

Outra alteração <strong>na</strong> configuração <strong>de</strong> gênero se po<strong>de</strong> observar <strong>na</strong> distribuição<br />

por área do conhecimento se cotejamos dados <strong>de</strong> 2010 e 2011.<br />

Na tabela 16 observa-se que o percentual <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> e <strong>de</strong> homens <strong>na</strong>s<br />

Ciências Exatas teve <strong>uma</strong> queda, já que a perda <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 2010 para janeiro <strong>de</strong><br />

2011 ficou em 9% para elas e 10% para eles. Em contrapartida, os números <strong>de</strong><br />

homens e <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> aumentaram <strong>na</strong>s Ciências Sociais e H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e <strong>na</strong>s da<br />

Saú<strong>de</strong> e Biológicas. Ao compararmos os dados a visualização pretendida é em<br />

relação à taxa <strong>de</strong> crescimento <strong>de</strong> 2010 para 2011.


202<br />

Tabela 16 – Crescimento por área do conhecimento no campus Curitiba em 2010 e 2011<br />

Área do<br />

conhecimento<br />

Sociais/<br />

H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s<br />

Saú<strong>de</strong>/<br />

Biológicas<br />

Ciências<br />

Exatas<br />

valor<br />

absoluto<br />

Homens<br />

2010 2011<br />

%<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br<br />

valor<br />

absoluto<br />

%<br />

crescimento<br />

%<br />

valor<br />

absoluto<br />

Mulheres<br />

2010 2011<br />

%<br />

valor<br />

absoluto<br />

%<br />

crescimento<br />

%<br />

44 9% 52 10% 18% 53 28% 62 31% 17%<br />

5 1% 44 9% 780% 13 7% 29 14% 123%<br />

441 90% 399 81% -10% 122 65% 111 55% -9%<br />

A diferença <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong> e Biológicas foi bastante interessante para<br />

eles e elas, já que chegou a crescimentos <strong>de</strong> 780% e 123% respectivamente, o que<br />

<strong>de</strong>monstra um <strong>de</strong>slocamento <strong>das</strong> outras áreas para estas.<br />

Chama-nos atenção o fato do maior percentual <strong>de</strong> crescimento ter ocorrido<br />

para os homens <strong>na</strong>s Ciências da Saú<strong>de</strong>/Biológicas que chegou a 780%, índice que<br />

<strong>de</strong>monstra novos arranjos <strong>de</strong> gênero acontecendo <strong>na</strong> instituição. Já o menor índice<br />

também foi no número <strong>de</strong> homens exatamente <strong>na</strong>s Ciências Exatas (-10%). Isso é<br />

significativo já que é <strong>uma</strong> área em que eles historicamente prevaleciam. Entretanto<br />

em números absolutos o valor ainda fica bem além do número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

Dados mais recentes dos <strong>de</strong>partamentos acadêmicos, disponíveis no site da<br />

instituição, nos mostram peque<strong>na</strong> alteração em relação ao que Carvalho (2008) nos<br />

mostrou. Por meio da tabela 17 comentaremos a atual distribuição segundo sexo<br />

nos 15 <strong>de</strong>partamentos constituídos atualmente. Para <strong>uma</strong> melhor visualização<br />

apresentaremos os dados atuais ao lado dos dados apresentados por Carvalho<br />

(2008) referentes a 2007.<br />

A tabela 17 tem um diferencial em relação aos dados <strong>de</strong> 2007: <strong>na</strong> ocasião a<br />

pesquisadora não incluiu dados da Coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção do Programa <strong>de</strong> Formação <strong>de</strong><br />

Professores – Cofop. Além disso veremos <strong>uma</strong> peque<strong>na</strong> alteração em relação à<br />

escala percentual do maior para o menor.


203<br />

Tabela 17 – Distribuição por sexo nos Departamentos da <strong>UTFPR</strong> em 2007 e 2011<br />

Departamento<br />

2007 2011<br />

Homens Mulheres Homens Mulheres<br />

Mecânica 96% 4% 95% 5%<br />

Engenharia Eletrônica 94% 6% 94% 6%<br />

Engenharia Eletrotécnica 85% 15% 86% 14%<br />

Construção Civil 81% 19% 81% 19%<br />

Informática 76% 24% 71% 29%<br />

Matemática 75% 25% 68% 32%<br />

Estudos Sociais 75% 25% 71% 29%<br />

Física 72% 28% 70% 30%<br />

Educação Física 65% 35% 72% 28%<br />

Gestão e Economia 63% 37% 62% 38%<br />

Química e Biologia 58% 42% 54% 46%<br />

Desenho Industrial 33% 67% 31% 69%<br />

Formação<br />

Professores<br />

Comunicação<br />

Expressão<br />

<strong>de</strong><br />

e<br />

* * 40% 60%<br />

32% 68% 42% 58%<br />

Línguas Estrangeiras 14% 86% 17% 83%<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br; Carvalho, 2008. Elaboração própria.<br />

Como anteriormente visualizado, há <strong>uma</strong> escala <strong>de</strong> participação <strong>de</strong> mais<br />

homens <strong>na</strong>s Ciências Exatas e Engenharias (Mecânica, Engenharia Eletrônica,<br />

Engenharia Eletrotécnica, Construção Civil, Informática e Matemática), passando<br />

pelos Estudos Sociais, Ciências da Saú<strong>de</strong>/Biológicas, e alg<strong>uma</strong>s licenciaturas<br />

(Física, Química e Biologia), para por último e com menor índice percentual<br />

aparecerem as áreas <strong>de</strong> Desenho Industrial, Comunicação e Expressão e Línguas<br />

Estrangeiras.<br />

Esta or<strong>de</strong>m será alterada nos dados mais recentes. A partir dos dados <strong>de</strong><br />

janeiro <strong>de</strong> 2011, vemos <strong>uma</strong> peque<strong>na</strong> alteração <strong>na</strong> escala <strong>de</strong> participação <strong>de</strong><br />

homens e <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s diversas áreas do conhecimento.<br />

Destacamos <strong>na</strong> tabela 17 as áreas que sofreram alteração em mais <strong>de</strong> 2<br />

pontos percentuais (Informática, Estudos Sociais, Física, Química e Biologia e<br />

Línguas Estrangeiras). Embora não seja um número elevado esta alteração aponta<br />

que em sendo possível ocorrer alterações elas po<strong>de</strong>m representar avanços para<br />

eles e elas, já que um rearranjo pressupõe alteração <strong>na</strong>s configurações <strong>de</strong> gênero e<br />

<strong>na</strong> divisão sexual <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s. Já em três áreas – Matemática, Educação Física e


204<br />

Comunicação e Expressão – a alteração foi <strong>de</strong> 7, 8 e 10%, respectivamente. Esta<br />

leve mas consi<strong>de</strong>rável alteração sugere alterações que po<strong>de</strong>m ser reflexo <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

luta <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> que não é recente, por espaços em áreas antes não ocupa<strong>das</strong>.<br />

Destaque inclusive para o significativo aumento no percentual <strong>de</strong><br />

professores <strong>na</strong>s duas áreas mais ocupa<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong> – Comunicação e<br />

Expressão e Línguas Estrangeiras, ainda que em menor grau nesta última.<br />

Em s<strong>uma</strong>, a distribuição <strong>de</strong> docentes <strong>na</strong>s áreas <strong>na</strong> instituição foi levemente<br />

alterada segundo os dados mais atuais, entretanto permanece <strong>uma</strong> concentração<br />

maior <strong>de</strong> professores <strong>na</strong>s áreas “<strong>de</strong> excelência”: Mecânica e Engenharias, além do<br />

aumento <strong>na</strong> Construção Civil e Educação Física.<br />

Ao mesmo tempo observamos que a maioria <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> ainda se<br />

concentra <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Desenho Industrial, Comunicação e Expressão e Línguas<br />

Estrangeiras. Além disso, nos dados <strong>de</strong> 2011 vemos que a proporção <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> é<br />

bastante significativa no Departamento responsável pela Formação <strong>de</strong> Professores –<br />

Departamento <strong>de</strong> Educação. Estando em número maior <strong>na</strong> área <strong>de</strong> formação <strong>de</strong><br />

professores, as <strong>mulheres</strong> têm a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formar professores para as<br />

várias modalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ensino, inclusive para a educação técnica e tecnológica.<br />

Po<strong>de</strong>-se dizer também que elas têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> agregar seu conhecimento a<br />

um percentual <strong>de</strong> homens para suprir um espaço que ten<strong>de</strong> a crescer, face às<br />

<strong>de</strong>man<strong>das</strong> <strong>das</strong> novas instituições <strong>de</strong> ensino técnico e tecnológico. Isso se mostra<br />

curioso, já que se ao longo da história do ensino profissio<strong>na</strong>l as <strong>mulheres</strong> foram<br />

comumente relega<strong>das</strong> a áreas gerais <strong>de</strong> atuação (educação geral em oposição à<br />

educação profissio<strong>na</strong>l), hoje elas são chama<strong>das</strong> a participar da formação daqueles e<br />

daquelas responsáveis pela educação profissio<strong>na</strong>l.<br />

To<strong>das</strong> essas transformações que aconteceram <strong>na</strong>s últimas déca<strong>das</strong> tanto <strong>na</strong><br />

<strong>UTFPR</strong> como em vários pontos do globo foram possibilita<strong>das</strong> pela luta <strong>de</strong> inúmeras<br />

<strong>mulheres</strong> que, engajando-se ou não nos movimentos sociais, superaram barreiras<br />

para estudar e inserir-se profissio<strong>na</strong>lmente (KELLER, 2006). O reflexo <strong>de</strong>ssas<br />

mudanças po<strong>de</strong> ser visto em vários tópicos <strong>de</strong> análise.<br />

Elevada ao grau <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>, a instituição tem a obrigação <strong>de</strong> oferecer<br />

Ensino, Pesquisa e Extensão: ela oferece Extensão, quando está preocupada em<br />

manter suas portas abertas à comunida<strong>de</strong> e, sobretudo, oferecer seus resultados a<br />

ela. No caso da Pesquisa, po<strong>de</strong>mos dizer que antes <strong>de</strong> ter se transformado em


205<br />

universida<strong>de</strong>, as pesquisas <strong>de</strong>senvolvi<strong>das</strong> em sua maioria concentravam-se <strong>de</strong>ntro<br />

do viés que po<strong>de</strong>mos classificar como aplicado, já que atendia a fins específicos; a<br />

partir da transformação, há <strong>uma</strong> rea<strong>de</strong>quação à filosofia do que se enten<strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

universida<strong>de</strong> – ela <strong>de</strong>ve agora voltar-se a to<strong>das</strong> as áreas do conhecimento. A<br />

pesquisa aplicada continua concentrando um maior número <strong>de</strong> pesquisadores(as),<br />

entretanto a pesquisa pura <strong>de</strong>ve também ser contemplada. Surgem portanto novas<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação em se tratando <strong>de</strong> áreas do conhecimento ou vieses <strong>de</strong><br />

investigação.<br />

Em relação à pesquisa científico-tecnológica, apresentaremos alguns dados<br />

mais recentes a respeito da distribuição por gênero.<br />

A Diretoria <strong>de</strong> Pesquisa e Pós-graduação da <strong>UTFPR</strong> (DIRPPG) mantém<br />

registrados os seguintes grupos <strong>de</strong> pesquisas, divididos em gran<strong>de</strong>s áreas e<br />

subáreas do conhecimento segundo exigência do CNPq. Na tabela 18<br />

apresentamos os dados referentes às áreas, mas apresentamos a tabela completa<br />

ao fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong>ste trabalho (apêndice A):<br />

Tabela 18 – Grupos <strong>de</strong> pesquisas <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> em 2010<br />

Ciências Biológicas 2 2%<br />

Ciências Exatas e da Terra 11 15%<br />

Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s 8 11%<br />

Ciências da Saú<strong>de</strong> 5 7%<br />

Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> 11 15%<br />

Engenharias 35 47%<br />

Linguística, Letras e Artes 3 3%<br />

Total 75 100%<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br. Elaboração própria.<br />

Segundo a tabela 18 são 75 142 os grupos <strong>de</strong> pesquisa certificados pela<br />

instituição. O percentual <strong>de</strong> divisão por gênero por gran<strong>de</strong> área do conhecimento<br />

nos dá os seguintes números:<br />

40% dos grupos (28 grupos) são li<strong>de</strong>rados por <strong>mulheres</strong> – em li<strong>de</strong>rança<br />

individual ou compartilhada: 40% dos grupos, portanto, está representado por<br />

142 São <strong>na</strong> verda<strong>de</strong> 74 grupos consi<strong>de</strong>rados ativos, mas utilizamos aqui o montante relacio<strong>na</strong>do no<br />

site oficial da instituição. Utilizamos portanto o total <strong>de</strong> 75 para fins estatísticos.


206<br />

no mínimo <strong>uma</strong> mulher. Este número é inferior aos do CNPq/MCT (2008) que<br />

apontam <strong>uma</strong> li<strong>de</strong>rança femini<strong>na</strong> nos grupos <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> 45%;<br />

Dos 28 grupos, quase 54% são li<strong>de</strong>rados exclusivamente por <strong>mulheres</strong> (15<br />

grupos) e em quase 46% a li<strong>de</strong>rança é compartilhada com um homem (13<br />

grupos);<br />

Em relação à totalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> grupos (75), a representativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> em<br />

li<strong>de</strong>rança exclusiva é <strong>de</strong> 20%;<br />

Os grupos em que há somente <strong>mulheres</strong> li<strong>de</strong>rando estão mais concentrados<br />

<strong>na</strong>s Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> (33%) e menos concentrados <strong>na</strong>s Ciências<br />

Biológicas e da Saú<strong>de</strong> (7%);<br />

Se <strong>de</strong>smembrarmos para perceber a distribuição <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> gran<strong>de</strong>s áreas<br />

temos as seguintes subáreas li<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> exclusivamente por <strong>mulheres</strong>:<br />

Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> (33%):<br />

o Desenho Industrial (5 grupos)<br />

Ciências Exatas e da Terra (20%):<br />

o Ciência da Computação (1 grupo);<br />

o Matemática (1 grupo) e<br />

o Química (1 grupo);<br />

Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s (20%):<br />

o Antropologia (1 grupo) e<br />

o Educação (2 grupos);<br />

Engenharias (13%):<br />

o Engenharia Elétrica (1 grupo) e<br />

o Engenharia <strong>de</strong> Produção (1 grupo).<br />

Ciências da Saú<strong>de</strong> (7%):<br />

o Saú<strong>de</strong> Coletiva (1 grupo);<br />

Ciências Biológicas (7%):<br />

o Microbiologia (1 grupo).<br />

Informações interessantes surgem <strong>de</strong>ssa visualização dos dados. Dentro<br />

<strong>das</strong> Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> as <strong>mulheres</strong> se concentram <strong>na</strong> subárea Desenho


207<br />

Industrial que pertence ao Departamento <strong>de</strong> Desenho Industrial (Dadin), um dos<br />

mais antigos <strong>na</strong> instituição, origi<strong>na</strong>do do antigo curso <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho oferecido nos anos<br />

iniciais da Escola. Estes dados são bastante diferentes dos dados em relação aos<br />

homens, conforme veremos adiante.<br />

Por outro lado, dois grupos nos chamam atenção: um da Ciência da<br />

Computação e outro da Engenharia Elétrica. Estas áreas foram tradicio<strong>na</strong>lmente<br />

relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> ao masculino, no entanto, as <strong>mulheres</strong> conseguiram inserir-se e li<strong>de</strong>rar<br />

grupos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2009, algo que representa um avanço bastante consi<strong>de</strong>rável. Esse<br />

dado em relação ao montante <strong>de</strong> 75 grupos <strong>de</strong> pesquisas é um número pequeno,<br />

porém significativo, como reflexo <strong>de</strong> mudanças n<strong>uma</strong> trajetória segregatória.<br />

Em relação aos 13 grupos <strong>de</strong> pesquisa em que as <strong>mulheres</strong> compartilham a<br />

li<strong>de</strong>rança com homens, representando 17% da totalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> grupos, temos <strong>uma</strong><br />

maior concentração <strong>na</strong>s Engenharias (44%) e <strong>uma</strong> menor concentração <strong>na</strong>s<br />

Ciências da Saú<strong>de</strong> (14%).<br />

Observamos os seguintes percentuais <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> subáreas com li<strong>de</strong>rança<br />

compartilhada:<br />

Engenharias (44%):<br />

o Engenharia Elétrica (3 grupos);<br />

o Engenharia <strong>de</strong> Produção (1 grupo), e<br />

o Engenharia Civil (1 grupo).<br />

Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> (21%):<br />

o Planejamento Urbano e Regio<strong>na</strong>l (2 grupos); e, <strong>de</strong> novo,<br />

o Desenho Industrial (1 grupo).<br />

Linguística, Letras e Artes (21%):<br />

o Artes (1 grupo);<br />

o Linguística (1 grupo), e<br />

o Letras (1 grupo).<br />

Ciências da Saú<strong>de</strong> (14%):<br />

o Educação Física (1 grupo), e<br />

o Medici<strong>na</strong> (1 grupo).<br />

A <strong>UTFPR</strong>, assim como as primeiras instituições <strong>de</strong> ensino superior, traz em<br />

si características <strong>de</strong> organização baseada <strong>na</strong> divisão sexual do trabalho (HIRATA,


208<br />

2002; HIRATA e KERGOAT, 2007; LETA e MARTINS, 2008), por ter ao longo da<br />

história mantido gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> suas <strong>mulheres</strong> em ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> reprodução –<br />

ativida<strong>de</strong>s associa<strong>das</strong> ao cuidado e <strong>de</strong> apoio – e majoritariamente em alg<strong>uma</strong>s<br />

áreas do conhecimento, como po<strong>de</strong>mos constatar a<strong>na</strong>lisando os percentuais <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> li<strong>de</strong>rando grupos <strong>na</strong>s áreas <strong>de</strong> Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s, Ciências Sociais<br />

Aplica<strong>das</strong> e Ciências Exatas e da Terra.<br />

Curiosamente, quando a li<strong>de</strong>rança é compartilhada com um homem, as<br />

<strong>mulheres</strong> têm aumentada sua participação <strong>na</strong>s Engenharias – <strong>de</strong> 13% com a<br />

li<strong>de</strong>rança exclusivamente femini<strong>na</strong> para 44% com li<strong>de</strong>rança compartilhada. Isso nos<br />

leva a pensar em respostas para este fenômeno; talvez a exigência ou a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas áreas <strong>de</strong>man<strong>de</strong>m mais esforços e aceitar o<br />

compartilhamento seria conveniente para eles e para elas, facilitando as condições<br />

<strong>de</strong> atuação para ambos, já que seria possível dividir responsabilida<strong>de</strong>s. Descobrir o<br />

que motiva cada um dos sexos a dividir a li<strong>de</strong>rança em grupos tão representativos<br />

<strong>de</strong>ntro da instituição seria um campo <strong>de</strong> investigação bastante profícuo.<br />

Os homens <strong>de</strong>têm a maioria <strong>de</strong> li<strong>de</strong>rança nos grupos <strong>de</strong> pesquisas <strong>na</strong><br />

instituição, representando quase 63% do total, ou seja, 47 grupos têm li<strong>de</strong>rança<br />

exclusivamente masculi<strong>na</strong>. As áreas e subáreas em que eles se concentram são:<br />

Engenharias (62%):<br />

o Engenharia Elétrica (9 grupos);<br />

o Engenharia Biomédica (8 grupos);<br />

o Engenharia Mecânica (7 grupos);<br />

o Engenharia <strong>de</strong> Produção (2 grupos);<br />

o Engenharia Civil (2 grupos);<br />

o Engenharia <strong>de</strong> Materiais e Metalurgia (1 grupo).<br />

Ciências Exatas e da Terra (18%):<br />

o Ciência da Computação (4 grupos),<br />

o Física (3 grupos); e<br />

o Matemática (1 grupo);<br />

Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s (11%);<br />

o Educação (3 grupos),<br />

o História (1 grupo); e<br />

o Sociologia (1 grupo);


209<br />

Ciências Sociais Aplica<strong>das</strong> (7%):<br />

o Administração (3 grupos).<br />

Ciências Biológicas e Ciências da Saú<strong>de</strong> (4%):<br />

o Educação Física (1 grupo);<br />

o Ecologia (1 grupo).<br />

Em comparação com os dados <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> vemos alg<strong>uma</strong>s alterações. A<br />

supremacia <strong>na</strong>s pesquisas <strong>na</strong>s Engenharias <strong>de</strong>monstra que as chama<strong>das</strong> “áreas <strong>de</strong><br />

excelência” seguem ocupa<strong>das</strong> majoritariamente por homens. Esta alta concentração<br />

<strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> pesquisas li<strong>de</strong>rados exclusivamente por homens <strong>na</strong> área <strong>das</strong><br />

Engenharias está relacio<strong>na</strong>da ao que Leszczynski (1996) consi<strong>de</strong>ra como fato dado<br />

e ratificado ao longo da história da instituição: por serem as Engenharias suas áreas<br />

<strong>de</strong> excelência e ocupa<strong>das</strong> majoritariamente por homens, vê-se <strong>uma</strong> distribuição não<br />

equitativa em relação à atuação. No entanto, justamente por ter havido vários fatores<br />

já levantados aqui que mantiveram as <strong>mulheres</strong> afasta<strong>das</strong> <strong>das</strong> Ciências Exatas e<br />

<strong>das</strong> Engenharias (ESTÉBANEZ, 2003), sua representativida<strong>de</strong> é relevante, do ponto<br />

<strong>de</strong> vista dos avanços e expectativas para o futuro, consi<strong>de</strong>rando fatores como a<br />

divisão sexual do trabalho, a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> à educação em<br />

todos os níveis, em especial <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> pobres, e a histórica exclusão <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> <strong>de</strong> áreas consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> <strong>de</strong> prestígio, especialmente <strong>de</strong>ntro da instituição<br />

estudada.<br />

Além disso, outro dado po<strong>de</strong> ser observado comparando os percentuais<br />

apresentados que, enquanto os homens participam <strong>de</strong>ntro da gran<strong>de</strong> área Ciências<br />

Sociais Aplica<strong>das</strong> em grupos <strong>de</strong> pesquisas relacio<strong>na</strong>dos à Administração e<br />

Planejamento Urbano e Regio<strong>na</strong>l, as <strong>mulheres</strong> se concentram em pesquisas em<br />

áreas historicamente ocupa<strong>das</strong> por elas <strong>de</strong>ntro da instituição, nesse caso em<br />

Desenho Industrial conforme supramencio<strong>na</strong>do.<br />

É óbvio que muitas modificações ainda precisam acontecer, levando-se em<br />

conta que a instituição concentra suas ativida<strong>de</strong>s nos cursos <strong>de</strong> Engenharia e<br />

Tecnológicos <strong>de</strong> nível superior, e, por sua vez, o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> está <strong>na</strong> faixa<br />

dos 30%, o que as <strong>de</strong>ixa em número <strong>de</strong>sfavorável se a<strong>na</strong>lisamos a produção<br />

científico-tecnológica. Isso se tor<strong>na</strong> prejuízo não somente para a massa <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

mas para os próprios campos da Ciência e Tecnologia, já que, conforme nos


210<br />

chamam atenção Tabak (2002) e Graña (2004), <strong>de</strong>sprezar meta<strong>de</strong> da população, é<br />

<strong>de</strong>sprezar meta<strong>de</strong> da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecimento, tor<strong>na</strong>ndo-se um prejuízo<br />

irreversível.<br />

A Aca<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> Ciências do Terceiro Mundo preconiza que “o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento científico e tecnológico dos países <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da utilização <strong>de</strong> todo o<br />

potencial intelectual <strong>de</strong> sua população, mais especificamente <strong>de</strong> todo o seu potencial<br />

científico e tecnológico” (TABAK, 2002, p. 28), o que significa incluir homens e<br />

<strong>mulheres</strong>.<br />

Levando-se em consi<strong>de</strong>ração que alg<strong>uma</strong>s áreas têm mais prestígio em<br />

C&T, pressupomos que as <strong>mulheres</strong>, estando longe <strong>de</strong>stas áreas, mantêm-se longe<br />

da valorização que as impele a buscar altos postos, longe <strong>de</strong> altos salários e longe<br />

do reconhecimento por seus pares (BOURDIEU, 1983).<br />

Várias autoras coinci<strong>de</strong>m com a opinião <strong>de</strong> que a maioria <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong><br />

concentra<strong>das</strong> em áreas <strong>de</strong>sprestigia<strong>das</strong> socialmente é <strong>uma</strong> reprodução da<br />

segregação (SCHIEBINGER, 2001; VELHO e LEÓN, 1998; HIRATA, 2002) – é<br />

preciso que se altere o entendimento a este respeito, o que consequentemente<br />

alteraria as configurações inter<strong>na</strong>s nos campos da C&T para que elas pu<strong>de</strong>ssem<br />

seguir atuando em áreas já conquista<strong>das</strong>, e consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> menos valoriza<strong>das</strong>, e que<br />

elas pu<strong>de</strong>ssem a<strong>de</strong>ntrar em campos pouco afeitos à sua atuação.<br />

Ainda assim, ser <strong>uma</strong> “minoria” nestas áreas <strong>de</strong> maior prestígio social nunca<br />

foi tão importante, pois só isso garante os espaços conquistados e caminhos abertos<br />

a tantas outras nos próximos 100 anos. Mas ao percebermos que esta minoria não é<br />

tão peque<strong>na</strong> assim, formamos o que Schiebinger (2001) chamou “massa crítica”,<br />

não conformada e disposta a fazer parte dos movimentos <strong>de</strong> transformações,<br />

bastando para isso ter a consciência <strong>de</strong> toda a histórica opressão nos campos da<br />

educação, do trabalho, da Ciência e da Tecnologia.<br />

Segundo Leta (2003) a partir dos anos oitenta e noventa do século passado<br />

as <strong>mulheres</strong> tiveram abertura em áreas até então pouco imagi<strong>na</strong><strong>das</strong> como ocupa<strong>das</strong><br />

por <strong>mulheres</strong>, como foi o caso dos campos da Ciência e Tecnologia, o que nos faz<br />

enten<strong>de</strong>r porque os números em alg<strong>uma</strong>s áreas ainda são pequenos em relação ao<br />

número <strong>de</strong> homens atuando nestes campos <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> instituições <strong>de</strong> ensino<br />

superior, como é o caso da <strong>UTFPR</strong>. Por outro lado, alg<strong>uma</strong>s áreas do conhecimento<br />

vincula<strong>das</strong> a características durante muito tempo consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s mantém


211<br />

um número razoável <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>, quando não maiores que o <strong>de</strong> homens. Isso<br />

reproduz o que Hirata e Kergoat (2007) chamam <strong>de</strong> princípio da separação,<br />

mantendo homens e <strong>mulheres</strong> vinculados a <strong>de</strong>termi<strong>na</strong><strong>das</strong> áreas, atestando a partir<br />

disso o princípio da hierarquização, ao valorar as áreas: ativida<strong>de</strong>s “masculi<strong>na</strong>s”<br />

comumente são mais valoriza<strong>das</strong> que as ativida<strong>de</strong>s “femini<strong>na</strong>s”.<br />

Assim como aponta Leta (2003) referindo-se ao exemplo <strong>de</strong> outras<br />

instituições, o número <strong>de</strong> contratações <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong>s <strong>UTFPR</strong> aumentou, porém<br />

esse aumento não garante mudanças. Exatamente porque as chances <strong>de</strong> sucesso e<br />

reconhecimento para as <strong>mulheres</strong> é menor em comparação com os homens (LETA,<br />

2003), consi<strong>de</strong>ra-se imprescindível que o número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> aumente ainda mais,<br />

para que haja proporcio<strong>na</strong>lmente um aumento <strong>na</strong>s suas chances.<br />

Po<strong>de</strong>-se concluir que fica cada vez mais difícil ignorar a participação <strong>das</strong><br />

<strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> construção da C&T no Brasil, e mais difícil ainda acreditar que elas<br />

permaneçam como operárias <strong>de</strong> campos tão prestigiados pelo restante da<br />

socieda<strong>de</strong> (FOUREZ, 1995).<br />

Uma maior participação femini<strong>na</strong> <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s possibilita que se<br />

mantenham abertas as portas da produção científico-tecnológica. Isso significa que<br />

à medida que se alteram as configurações sociais, altera-se também a concepção<br />

do campo científico e tecnológico. Estas concepções altera<strong>das</strong> favorecem o<br />

pensamento <strong>de</strong> que po<strong>de</strong>m ser alcança<strong>das</strong> mais transformações em busca <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

equida<strong>de</strong> entre <strong>mulheres</strong> e homens como trabalhadoras e trabalhadores da Ciência<br />

e da Tecnologia, bem como trabalhadoras e trabalhadores da educação profissio<strong>na</strong>l.


212<br />

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS<br />

“As <strong>mulheres</strong>, <strong>na</strong>s salas <strong>de</strong> aulas brasileiras e nos outros espaços<br />

sociais, viveram, com homens, crianças e outras <strong>mulheres</strong>, diferentes<br />

e intrinca<strong>das</strong> relações, <strong>na</strong>s quais sofreram e exerceram po<strong>de</strong>r.<br />

Pensá-las ape<strong>na</strong>s como subjuga<strong>das</strong> talvez empobreça<br />

<strong>de</strong>masiadamente sua história, <strong>uma</strong> vez que, mesmo nos momentos e<br />

<strong>na</strong>s situações em que mais se preten<strong>de</strong>u silenciá-las e submetê-las,<br />

elas também foram capazes <strong>de</strong> engendrar discursos discordantes,<br />

construir resistências, subverter comportamentos” (LOURO, 1997, p.<br />

478-479).<br />

Este trabalho objetivou a<strong>na</strong>lisar a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> construção<br />

da história da educação profissio<strong>na</strong>l, em especial da construção da história da<br />

Universida<strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná. Nos interessou a<strong>na</strong>lisar em que áreas<br />

elas atuaram e como se configura a participação atual <strong>na</strong> pesquisa científicotecnológica<br />

<strong>na</strong> instituição.<br />

Para concluir, reiteramos que Ciência e a Tecnologia se constituíram ao<br />

longo da história em campos majoritariamente masculinos, nos quais a participação<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> quando ocorria era encoberta e <strong>de</strong>svalorizada, contribuindo para que<br />

se pensasse que elas não atuaram. No entanto, são muitos os esforços por<br />

visibilizar nomes <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> que se <strong>de</strong>stacaram – as primeiras ou as poucas<br />

<strong>mulheres</strong> encontra<strong>das</strong> tor<strong>na</strong>m-se alvo <strong>de</strong> historiadores e historiadoras, sociólogos e<br />

sociólogas, pesquisadores e pesquisadoras, enfim.<br />

Somos responsáveis por trazer a público aquelas que nos fazem enten<strong>de</strong>r a<br />

Ciência e a Tecnologia como campos que po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem ser concebidos como<br />

equitativos <strong>de</strong> maneira a <strong>de</strong>rrubarmos barreiras consolida<strong>das</strong>.<br />

Durante a coleta <strong>de</strong> dados foi possível perceber que havia <strong>uma</strong> diferença<br />

entre os momentos por que passava a instituição – ora elas eram visibiliza<strong>das</strong> ora<br />

não. Este fato por si só já é importante, pois indica que as <strong>mulheres</strong> sempre<br />

participaram da construção da <strong>UTFPR</strong>; visíveis ou não, elas fizeram parte.<br />

Entretanto, não po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar este fato <strong>de</strong>las serem invisibiliza<strong>das</strong><br />

como um mecanismo <strong>de</strong> opressão, pautado e consolidado a partir da configuração<br />

dos próprios mecanismos <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r da instituição, em relação aos lí<strong>de</strong>res, cursos


213<br />

ofertados, discipli<strong>na</strong>s direcio<strong>na</strong><strong>das</strong> a homens ou <strong>mulheres</strong>, enfim. Consi<strong>de</strong>ramos que<br />

isto ocorria <strong>de</strong>ntro <strong>das</strong> lógicas econômica e política do Brasil do século XX. Por outro<br />

lado a interpretação <strong>de</strong>sse período po<strong>de</strong> se dar justamente a partir da luta <strong>de</strong><br />

inúmeras <strong>mulheres</strong> em toda a história da Ciência e da Tecnologia, bem como<br />

daquelas que lutaram pelo direito à educação e ao trabalho, favorecendo, portanto,<br />

que estivéssemos representa<strong>das</strong> n<strong>uma</strong> instituição feita para homens, volta<strong>das</strong> à<br />

educação profissio<strong>na</strong>l – campo <strong>de</strong> atuação novo para elas. Nossa conclusão, a partir<br />

<strong>de</strong> todos os dados encontrados, é <strong>de</strong> que ela foi feita para homens, mas com a<br />

participação <strong>de</strong> inúmeras <strong>mulheres</strong> – <strong>uma</strong> conquista <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> trabalhadoras em<br />

educação, configurando por sua vez mecanismos <strong>de</strong> resistência e <strong>de</strong> transformação.<br />

To<strong>das</strong> as <strong>mulheres</strong> apresenta<strong>das</strong> neste trabalho representaram <strong>uma</strong> porta<br />

aberta a to<strong>das</strong> aquelas que viriam nos anos seguintes <strong>de</strong> história da Escola. Em<br />

gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong>ssa história elas estiveram presentes e representaram em média<br />

30% do quadro docente geral.<br />

A Escola nunca parou <strong>de</strong> crescer em termos <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> cursos, níveis <strong>de</strong><br />

ensino, corpos docente, discente e administrativo, só que infelizmente o número <strong>de</strong><br />

<strong>mulheres</strong> se manteve praticamente estag<strong>na</strong>do até nossos dias; o número só<br />

ultrapassou a marca <strong>de</strong> 40% em 2010, quando já estava transformada em<br />

Universida<strong>de</strong>. Estes números ratificam a afirmação da professora e pesquisadora da<br />

<strong>UTFPR</strong> Sonia A<strong>na</strong> L. Leszczynski (1996): seja sob o nome <strong>de</strong> Escola <strong>de</strong> Aprendizes<br />

Artífices, Liceu Industrial do Paraná, Escola Técnica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná, Centro<br />

Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica ou Universida<strong>de</strong> Tecnológica, esta instituição se<br />

configurou sob suas áreas <strong>de</strong> excelência, que são as Engenharias, área que,<br />

comprovado por várias pesquisas, historicamente é feita por homens para homens.<br />

Para enten<strong>de</strong>r como se <strong>de</strong>u a dinâmica durante os 100 anos, a divisão que<br />

propusemos em quatro fases teve como objetivo marcar momentos diferentes, com<br />

o foco sobre a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>.<br />

Na primeira fase que vai do ano <strong>de</strong> 1909, criação da Escola, a 1936, quando<br />

as mudanças no cenário fe<strong>de</strong>ral promoveram reformulações, inclusive <strong>na</strong><br />

nomenclatura da Escola, é possível percebermos, conhecendo o histórico <strong>de</strong> cursos<br />

ofertados <strong>na</strong> Escola neste seu primeiro período <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento, que o número<br />

pequeno <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> se justificou pelo fato, <strong>de</strong>ntro da lógica apresentada aqui como<br />

patriarcal, <strong>de</strong> haver somente alg<strong>uma</strong>s ativida<strong>de</strong>s <strong>na</strong>s quais elas po<strong>de</strong>riam atuar,


214<br />

sendo elas: ensi<strong>na</strong>r a contar, ler e <strong>de</strong>senhar, o que significa <strong>uma</strong> separação entre<br />

áreas mais e menos privilegia<strong>das</strong>, do ponto <strong>de</strong> vista dos objetivos da instituição.<br />

Nesta fase felizmente há o fato <strong>de</strong> termos encontrado muitas <strong>mulheres</strong>,<br />

porém infelizmente o que acabou ficando <strong>de</strong>las foram somente seus nomes e seus<br />

exemplos.<br />

O que chamamos segunda fase vai <strong>de</strong> 1937, com a transformação em Liceu<br />

Industrial, até 1970, ano <strong>de</strong> mudanças mais intensas, inicia<strong>das</strong> a partir <strong>de</strong> 1963,<br />

quando já se chamava Escola Técnica. No fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong>sta fase, por exemplo, os<br />

números <strong>de</strong> homens e <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> chegaram à casa da cente<strong>na</strong>, o que significou<br />

avanços e conquistas que se concretizaram <strong>na</strong> fase seguinte <strong>de</strong>vido à fase anterior.<br />

Nesta fase observamos a diversificação <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação,<br />

promovendo o aumento no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>. Porém sua concentração se <strong>de</strong>u<br />

em ativida<strong>de</strong>s ou funções relacio<strong>na</strong><strong>das</strong> com ativida<strong>de</strong>s ou funções associa<strong>das</strong> a<br />

características consi<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> femini<strong>na</strong>s – <strong>de</strong> cuidado e apoio (serventes, aten<strong>de</strong>ntes,<br />

docentes <strong>de</strong> discipli<strong>na</strong>s ou saberes específicos <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>, como língua<br />

portuguesa e corte e costura por exemplo, meren<strong>de</strong>iras etc.). Isso <strong>de</strong>nota que as<br />

funções eram distribuí<strong>das</strong> conforme o sexo da pessoa, ilustrando que a divisão<br />

sexual <strong>das</strong> ativida<strong>de</strong>s era a base constituinte <strong>das</strong> práticas profissio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>ntro da<br />

instituição.<br />

Nesta também pu<strong>de</strong>mos verificar a maior concentração <strong>de</strong> fatos a respeito<br />

<strong>de</strong> muitas <strong>mulheres</strong>. Como os registros são <strong>de</strong>ficientes, tudo o que foi encontrado a<br />

respeito <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> que participaram da Escola entre 1937 e 1963 foi<br />

apresentado.<br />

A terceira fase compreen<strong>de</strong> o período <strong>de</strong> maior expansão da instituição; a<br />

década <strong>de</strong> 1970 marcaria seu ingresso no âmbito do nível superior e a<br />

transformação em Centro Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Educação Tecnológica; já o ano limite, 2005,<br />

representa a transformação que é tomada por nós como um momento único <strong>na</strong><br />

história <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> instituição.<br />

Os números <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> terceira fase, <strong>na</strong> casa da cente<strong>na</strong>, com pico <strong>de</strong><br />

299 em 1990, apontam para um gran<strong>de</strong> crescimento em valores absolutos em<br />

relação à primeira fase quando a média era <strong>de</strong> duas professoras ao ano. Se<br />

a<strong>na</strong>lisamos o crescimento em números percentuais, percebemos <strong>uma</strong> alteração em<br />

relação à fase anterior, já que os números ficam n<strong>uma</strong> média <strong>de</strong> 37% <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong>.


215<br />

Em relação ao montante <strong>de</strong> funcionários, percebemos como a mudança não<br />

foi tão significativa para as <strong>mulheres</strong>, em se tratando <strong>de</strong> espaços ocupados. Por<br />

outro lado, passar <strong>de</strong> um número <strong>de</strong> duas <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 1910 para 299<br />

oitenta anos <strong>de</strong>pois significa que as primeiras conquistaram espaços e estes não<br />

serão perdidos. O que nos interessa problematizar é que espaços são estes? Quais<br />

as ativida<strong>de</strong>s atribuí<strong>das</strong> a elas? Nesse caso, é notório que as configurações nesta<br />

instituição não são diferentes do que encontramos em outras. Assim como <strong>na</strong><br />

maioria <strong>das</strong> instituições <strong>de</strong> ensino, alg<strong>uma</strong>s áreas foram e seguem sendo mais<br />

ocupa<strong>das</strong> por <strong>mulheres</strong> e outras por homens. Essa “distribuição” <strong>de</strong> acordo com o<br />

sexo da pessoa caracteriza <strong>uma</strong> dinâmica pautada <strong>na</strong> reprodução da divisão sexual<br />

do trabalho, quando percebemos que em áreas <strong>das</strong> Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s e Sociais há<br />

predominância femini<strong>na</strong> e <strong>na</strong>s Ciências Exatas e Engenharias, a predominância<br />

segue sendo masculi<strong>na</strong>.<br />

A divisão que po<strong>de</strong>mos observar <strong>na</strong>s universida<strong>de</strong>s é baseada <strong>na</strong> separação<br />

entre as gran<strong>de</strong>s áreas – esta divisão por si só já <strong>de</strong>termi<strong>na</strong> quem serão os agentes.<br />

Para as <strong>mulheres</strong> interessa<strong>das</strong> em a<strong>de</strong>ntrar neste universo alg<strong>uma</strong>s áreas estariam<br />

“abertas”, enquanto outras ainda resistem.<br />

Nesse sentido, po<strong>de</strong>mos afirmar que, apesar <strong>de</strong> a Universida<strong>de</strong> Tecnológica<br />

ter tido caminhos históricos diferentes dos <strong>de</strong> outras universida<strong>de</strong>s, a divisão que<br />

nela encontramos se <strong>de</strong>u <strong>na</strong> mesma lógica – a lógica da divisão sexual do trabalho<br />

que segrega e hierarquiza funções.<br />

Isso se comprova <strong>na</strong>quilo que chamamos quarta fase, que diz respeito<br />

especificamente aos primeiros anos da instituição como Universida<strong>de</strong> (<strong>de</strong> 2005 até<br />

os dias atuais).<br />

Nesse período observamos que o fenômeno da divisão sexual do trabalho<br />

se mantém: as <strong>mulheres</strong> são maioria nos <strong>de</strong>partamentos <strong>de</strong> Comunicação e<br />

Expressão e Línguas Estrangeiras Mo<strong>de</strong>r<strong>na</strong>s, além <strong>de</strong> encontrarmos a permanência<br />

em relação ao número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> num dos <strong>de</strong>partamentos que foi<br />

majoritariamente ocupado por <strong>mulheres</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua criação, como é o caso do<br />

Desenho Industrial. Os homens, por sua vez, estão concentrados <strong>na</strong>s Ciências<br />

Exatas e Engenharias. Esta divisão é centenária – coloca<strong>das</strong> em comparação,<br />

enten<strong>de</strong>-se que as áreas <strong>de</strong> maior prestígio são ocupa<strong>das</strong> por eles e as menos<br />

valoriza<strong>das</strong> socialmente têm livre acesso para elas, mantendo a dicotomia histórica.


216<br />

Enten<strong>de</strong>mos a universida<strong>de</strong> como espaço <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> saberes<br />

científico-tecnológicos, no qual agentes compartilham seus interesses individuais e<br />

coletivos, voltados ao social.<br />

Várias autoras e autores que trataram da questão <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em Ciência<br />

e Tecnologia nos subsidiaram para embasar os dados encontrados <strong>na</strong> <strong>UTFPR</strong> com<br />

exemplos e realida<strong>de</strong>s que muito se aproximam da encontrada aqui. Uma <strong>das</strong><br />

autoras, Tabak (2002), <strong>de</strong>dica-se especialmente a estudar a relação <strong>mulheres</strong>,<br />

Ciência e Tecnologia; seus diagnósticos mais recentes apontam que, assim como <strong>na</strong><br />

<strong>UTFPR</strong>, as <strong>mulheres</strong> concentram-se em áreas “tradicio<strong>na</strong>lmente” femini<strong>na</strong>s,<br />

acarretando em <strong>uma</strong> baixa participação <strong>na</strong> produção <strong>de</strong> C&T.<br />

Nosso trabalho também teve como foco verificar os números da<br />

participação, ou seja, as que estão fazendo Ciência e Tecnologia, em quais áreas,<br />

em que proporção em relação ao universo <strong>de</strong> homens do ponto <strong>de</strong> vista da inserção<br />

<strong>de</strong>stas <strong>mulheres</strong> em grupos <strong>de</strong> pesquisas. A importância <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>rmos esta<br />

dinâmica se dá porque, assim como Stolte-Heiskanen (1998 apud TABAK, 2002),<br />

acreditamos que a representação <strong>de</strong>sigual <strong>de</strong>ntro da ativida<strong>de</strong> científica constitui<br />

<strong>uma</strong> negação dos direitos h<strong>uma</strong>nos, e implica <strong>na</strong> <strong>de</strong>sigualda<strong>de</strong> em relação ao<br />

acesso a posições <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, já que alcançar os mais altos níveis n<strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong><br />

ensino superior significa alcançar postos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> científica, que levam a<br />

toma<strong>das</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões que se revertem para a socieda<strong>de</strong>.<br />

Outro ponto a<strong>na</strong>lisado neste trabalho, que aparece mais especificamente <strong>na</strong><br />

fase quatro, diz respeito à sub-representação femini<strong>na</strong> nos postos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão. O fato<br />

<strong>de</strong> não ter havido um número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> elevado, ou pelo menos equitativo, <strong>na</strong>s<br />

três fases anteriores, não favoreceu que as <strong>mulheres</strong> chegassem a postos <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisões. O que por um lado é <strong>na</strong>tural <strong>de</strong>ntro do cenário apresentado, <strong>de</strong>monstra <strong>na</strong><br />

verda<strong>de</strong> <strong>uma</strong> segregação. Conclui-se que durante gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> sua história, a<br />

<strong>UTFPR</strong> manteve as <strong>mulheres</strong> longe dos postos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, ou seja, <strong>na</strong> condição <strong>de</strong><br />

operárias (FOUREZ, 1995), no fazer <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que seriam em sua maioria<br />

li<strong>de</strong>ra<strong>das</strong> ou <strong>de</strong>cidi<strong>das</strong> pelos homens.<br />

Po<strong>de</strong>mos observar que ainda se mantêm fortes as bases da instituição,<br />

quando, ao ser um espaço predomi<strong>na</strong>ntemente masculino, as <strong>mulheres</strong> eram<br />

excluí<strong>das</strong> <strong>das</strong> toma<strong>das</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisões. Ao longo <strong>de</strong> toda sua história todos os<br />

dirigentes foram homens, representando um espaço político generificado. As


217<br />

<strong>mulheres</strong> estando em números menores têm um peso <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão que já é<br />

numericamente menor em relação aos homens – 23% ainda é um número menor se<br />

comparado ao total <strong>de</strong> docentes só no campus Curitiba em 2010 – 28%, e bem<br />

inferior ao total <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> da instituição no mesmo ano: 42%.<br />

Inúmeras são as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição que produz<br />

Ciência e Tecnologia para a socieda<strong>de</strong>. Uma <strong>de</strong>las é contribuir integralmente para a<br />

História que estamos escrevendo, história essa que, a partir <strong>de</strong> agora, inclua<br />

homens e <strong>mulheres</strong> com igual valor. Nesse sentido, acreditamos que a universida<strong>de</strong><br />

tem vários papéis a <strong>de</strong>sempenhar:<br />

Ensino: voltar-se à formação para o mundo do trabalho, privilegiando a<br />

formação integral do indivíduo, bem como a promoção <strong>de</strong> sua autonomia,<br />

pensada para aten<strong>de</strong>r ao individual e ao coletivo. Nesse sentido, po<strong>de</strong>mos<br />

consi<strong>de</strong>rar a importância <strong>de</strong> participar <strong>na</strong> formação <strong>de</strong> base <strong>das</strong> alu<strong>na</strong>s que<br />

ingressam para o ensino técnico e tecnológico, promovendo a integração<br />

efetiva entre teoria e prática para que elas se sintam chama<strong>das</strong> a conhecer as<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>das</strong> carreiras científicas;<br />

Extensão: integrar-se com a comunida<strong>de</strong>, proporcio<strong>na</strong>ndo o retorno à<br />

socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> todos os insumos provenientes <strong>de</strong>la, especialmente do<br />

conhecimento produzido;<br />

Pesquisa: visar o <strong>de</strong>senvolvimento científico-tecnológico voltado para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento político-social, <strong>de</strong> maneira que a integração entre toda a<br />

comunida<strong>de</strong> universitária fosse o ponto mais alto. Nesse sentido, alg<strong>uma</strong>s<br />

propostas surgem: possibilitar às cientistas da instituição a divulgação <strong>de</strong><br />

seus trabalhos para que mais professoras se sintam capazes <strong>de</strong> se tor<strong>na</strong>r<br />

pesquisadoras atuantes. Além disso a universida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ve se mostrar parceira<br />

<strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> cientistas que compõem seu quadro <strong>de</strong> docentes, já que por<br />

suas mãos passam inúmeros projetos que po<strong>de</strong>m contribuir para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento social esperado.<br />

Acreditamos que neste último tópico está o ponto mais alto <strong>de</strong> nossa<br />

reflexão. Assim como Se<strong>de</strong>ño (2000), julgamos importante compreen<strong>de</strong>r as<br />

questões <strong>de</strong> acesso e equida<strong>de</strong> a to<strong>das</strong> as áreas do conhecimento, pois através<br />

<strong>de</strong>ssas será possível melhorar a situação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> no contexto <strong>de</strong> produção <strong>de</strong>


218<br />

conhecimento, bem como fazer-se reconhecer como conhecimento autorizado ou<br />

certificado.<br />

Em relação à questão do acesso <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> a posições até então pouco<br />

ocupa<strong>das</strong> no mundo do trabalho formal, a perspectiva assumida é <strong>de</strong> que por meio<br />

do aumento no número <strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> no ensino superior é possível mudar cenários<br />

para a atuação profissio<strong>na</strong>l <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong>. Assumimos, portanto, que a universida<strong>de</strong><br />

é peça fundamental que possibilita acesso para a carreira acadêmica, científica e<br />

tecnológica, contribuindo para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>ssas áreas.<br />

Este trabalho é parte <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> projeto que preten<strong>de</strong> <strong>de</strong>svelar a<br />

participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> em diversos âmbitos da socieda<strong>de</strong>. Seu foco esteve<br />

basicamente sobre a participação <strong>das</strong> <strong>mulheres</strong> <strong>na</strong> construção <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição<br />

que, ao chegar a Universida<strong>de</strong>, se viu envolta em novas possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> atuação.<br />

Entretanto, diante do largo período histórico e da escassez <strong>de</strong> dados, as análises se<br />

pautaram em consi<strong>de</strong>rações feitas por outros pesquisadores e pesquisadoras que<br />

anteriormente se propuseram a a<strong>na</strong>lisar o mesmo objeto, bem como sobre <strong>uma</strong><br />

teoria que tentou explicar como se <strong>de</strong>ram ao longo dos anos: o estabelecimento <strong>de</strong><br />

instituições que produzem Ciência e Tecnologia, o estabelecimento <strong>de</strong> um nível <strong>de</strong><br />

ensino que se convencionou chamar profissio<strong>na</strong>l, bem como o estabelecimento <strong>de</strong><br />

dinâmicas que, por serem do mundo do trabalho, se esten<strong>de</strong>m às instituições <strong>de</strong><br />

ensino.<br />

Nesse sentido, as limitações encontra<strong>das</strong> aqui nos servem para indicar<br />

alg<strong>uma</strong>s possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> exploração para aquelas ou aqueles que vejam nestas<br />

possibilida<strong>de</strong>s campos <strong>de</strong> investigação. Muitas perspectivas e caminhos po<strong>de</strong>m<br />

surgir, inclusive pautados sobre outros referenciais teóricos e metodológicos, para<br />

compor mais <strong>uma</strong> parte neste todo que envolve este campo <strong>de</strong> pesquisa. Nesse<br />

momento parece interessante, por exemplo, trabalhos que apresentem entrevistas<br />

<strong>de</strong> <strong>mulheres</strong> e homens que tenham passado pelas transformações junto com a<br />

instituição para tentar saber como eles e elas as enten<strong>de</strong>m diacronicamente. Outra<br />

possibilida<strong>de</strong> seria entrevistar as <strong>mulheres</strong> cientistas concentra<strong>das</strong> em programas <strong>de</strong><br />

pós-graduação stricto sensu para enten<strong>de</strong>r como se dá sua participação<br />

qualitativamente, tentando levantar, por exemplo, quais os temas investigados; além<br />

disso, seria possível também com este universo pesquisado investigar se elas<br />

percebem discrimi<strong>na</strong>ção ou mesmo se há limitação em relação ao acesso a postos


219<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão. Em contrapartida, <strong>uma</strong> análise comparativa da opinião <strong>de</strong> homens e<br />

<strong>mulheres</strong> a respeito <strong>de</strong>ste tema também nos traria dados bastante importantes para<br />

darmos continuida<strong>de</strong> à compreensão <strong>de</strong> um fenômeno que está longe <strong>de</strong> ser<br />

integralmente <strong>de</strong>svelado.<br />

Esta história que foi contada está longe do fim, e estes são ape<strong>na</strong>s alguns<br />

exemplos <strong>de</strong> propostas que po<strong>de</strong>m ser explora<strong>das</strong> para compreensão <strong>de</strong>sse<br />

fenômeno, objetivo para o qual esperamos ter contribuído <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> maneira,<br />

acreditando que os elementos aqui apresentados não se per<strong>de</strong>rão.<br />

E fi<strong>na</strong>lmente, reiteramos que não foi somente <strong>na</strong> história da Ciência, da<br />

Tecnologia e da educação profissio<strong>na</strong>l que as <strong>mulheres</strong> ficaram invisibiliza<strong>das</strong>; isso<br />

se esten<strong>de</strong> a todos os âmbitos da socieda<strong>de</strong>. Consi<strong>de</strong>ramos que campos como o do<br />

trabalho formal e da política, por exemplo, formam instituições que, por serem parte<br />

da socieda<strong>de</strong>, estão imersos em relações <strong>de</strong>siguais <strong>de</strong> gênero. É contra isso que se<br />

preten<strong>de</strong>m os trabalhos que, como este, estão voltados a visibilizar <strong>uma</strong> história<br />

antes não contada.


220<br />

ARQUIVOS E FONTES CONSULTADOS<br />

Arquivos consultados no Núcleo <strong>de</strong> Documentação Histórica, atual Departamento <strong>de</strong><br />

Documentação Histórica:<br />

Caixas com documentação numera<strong>das</strong> por ano ou década <strong>na</strong>s quais<br />

encontram-se todos os relatórios disponíveis <strong>de</strong>s<strong>de</strong> sua fundação em 1909;<br />

Relatório <strong>de</strong> 1910 a 1920;<br />

Relatório <strong>de</strong> 1911;<br />

Relatório <strong>de</strong> 1926, 1927 e 1928;<br />

Boletim <strong>de</strong> Informações do Ministério da Educação e Saú<strong>de</strong> (1935, 1936 e<br />

1938);<br />

Relatório <strong>de</strong> 1960, 1961 e 1962;<br />

Relatório <strong>de</strong> 1964;<br />

Relatório trimestral 1984-1987;<br />

Relatório <strong>de</strong> Gestão relativo ao exercício <strong>de</strong> 1998.<br />

Arquivos consultados no Departamento <strong>de</strong> Recursos H<strong>uma</strong>nos:<br />

Relatórios <strong>de</strong> Recolhimento do FGTS dos funcionários no período <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1979 a <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1990;<br />

Dados <strong>de</strong> funcionários e funcionárias <strong>de</strong> 1995 a 2010.<br />

Arquivos consultados no Arquivo Geral:<br />

Relatório geral <strong>de</strong> controle <strong>das</strong> pastas armaze<strong>na</strong><strong>das</strong>;<br />

Pastas <strong>de</strong> funcionárias (do número 1 a 266 – a mais antiga é <strong>de</strong> 1938).


221<br />

REFERÊNCIAS<br />

ALMEIDA, Jane Soares <strong>de</strong>. Mulher e educação: a paixão pelo possível. São Paulo:<br />

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229<br />

APÊNDICES<br />

1<br />

Gran<strong>de</strong> área Subárea Nome do grupo Lí<strong>de</strong>res<br />

CIÊNCIAS<br />

BIOLÓGICAS<br />

Ecologia<br />

Grupo <strong>de</strong> Pesquisas em<br />

Ecologia e<br />

Desenvolvimento<br />

Thomaz Aurélio Pagioro<br />

e Júlio César R. <strong>de</strong><br />

Azevedo<br />

Ano <strong>de</strong><br />

criação<br />

2006<br />

2<br />

3<br />

4<br />

5<br />

6<br />

CIÊNCIAS<br />

BIOLÓGICAS<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

Microbiologia<br />

Ciência da<br />

Computação<br />

Ciência da<br />

Computação<br />

Ciência da<br />

Computação<br />

Ciência da<br />

Computação<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudo e<br />

Pesquisa em<br />

Microbiologia Ambiental<br />

Engenharia <strong>de</strong> Software<br />

GIVIC - Grupo <strong>de</strong><br />

Pesquisas em Imagens e<br />

Visão Computacio<strong>na</strong>l<br />

Inteligência<br />

Computacio<strong>na</strong>l<br />

MEMENTO<br />

Marlene Soares e Edilsa<br />

Rosa da Silva<br />

Jean Marcelo Simão e<br />

Paulo Cézar Stadzisz<br />

Tania Mezzadri Centeno<br />

e Leyza Elmeri Baldo<br />

Dorini<br />

Celso Antônio Alves<br />

Kaestner e João Alberto<br />

Fabro<br />

Cesar Augusto Tacla e<br />

Gustavo Alberto<br />

Giménez Lugo<br />

2002<br />

2010<br />

2009<br />

2008<br />

2004<br />

7<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

Ciência da<br />

Computação<br />

Tecnologias,<br />

Aprendizagem H<strong>uma</strong><strong>na</strong> e<br />

Organizacio<strong>na</strong>l - TAHO<br />

Hilton José Silva <strong>de</strong><br />

Azevedo<br />

1999<br />

8<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

Física<br />

FotoNanoBio<br />

Arandi Gi<strong>na</strong>ne Bezerra<br />

Junior<br />

2010<br />

9<br />

10<br />

11<br />

12<br />

13<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

CIÊNCIAS EXATAS E<br />

DA TERRA<br />

Física<br />

Física<br />

Matemática<br />

Matemática<br />

Química<br />

Grupo <strong>de</strong> Plasma e<br />

Dinâmica Não-Linear<br />

Radiações Ionizantes e<br />

Física Nuclear<br />

Grupo <strong>de</strong> Pesquisa em<br />

Análise Numérica<br />

Grupo <strong>de</strong> Pesquisa em<br />

Matemática<br />

Controle e<br />

Aproveitamento <strong>de</strong><br />

Resíduos<br />

Diogenes Borges<br />

Vasconcelos e Mário<br />

Sérgio Teixeira <strong>de</strong><br />

Freitas<br />

Hugo Reuters Schelin e<br />

Sergei A<strong>na</strong>tolyevich<br />

Paschuk<br />

2007<br />

1995<br />

Fábio Antonio Dorini 2008<br />

Neusa Nogas Tocha 2010<br />

Josmaria Lopes <strong>de</strong><br />

Morais e Fatima <strong>de</strong><br />

Jesus Bassetti<br />

2006<br />

14 CIÊNCIAS HUMANAS Antropologia<br />

15 CIÊNCIAS HUMANAS Educação<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudos e<br />

Pesquisas sobre<br />

Relações <strong>de</strong> Gênero e<br />

Tecnologia - GeTec<br />

Educação-Ciência e<br />

Tecnologias Educacio<strong>na</strong>is<br />

16 CIÊNCIAS HUMANAS Educação Empreen<strong>de</strong>dorismo no<br />

Trabalho e <strong>na</strong> Escola<br />

17 CIÊNCIAS HUMANAS Educação Estudos Afro-brasileiros e<br />

Indíge<strong>na</strong>s<br />

Marília Gomes <strong>de</strong><br />

Carvalho e Nanci Stancki<br />

da Luz<br />

Joscely Maria Bassetto<br />

Galera e Enil<strong>de</strong><br />

Aparecida Ber<strong>na</strong>rdi<br />

Martins<br />

Denise Elizabeth Hey<br />

David<br />

Ivo Pereira <strong>de</strong> Queiroz e<br />

Mário Lopes Amorim<br />

2006<br />

2005<br />

2005<br />

2006<br />

18 CIÊNCIAS HUMANAS Educação<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudos e<br />

Pesquisas em Ensino <strong>de</strong><br />

Física<br />

Nilson Marcos Dias<br />

Garcia<br />

1999


230<br />

19 CIÊNCIAS HUMANAS Educação<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudos e<br />

Pesquisas em Trabalho,<br />

Educação e Tecnologia -<br />

GETET<br />

20 CIÊNCIAS HUMANAS História Ciências H<strong>uma</strong><strong>na</strong>s,<br />

Tecnologia e Socieda<strong>de</strong><br />

Domingos Leite Lima<br />

Filho<br />

Gilson Leandro Queluz e<br />

Luiz Ernesto Merkle<br />

2005<br />

2007<br />

21 CIÊNCIAS HUMANAS Sociologia<br />

22 CIÊNCIAS DA SAÚDE<br />

23 CIÊNCIAS DA SAÚDE<br />

24 CIÊNCIAS DA SAÚDE<br />

Educação<br />

Física<br />

Educação<br />

Física<br />

Educação<br />

Física<br />

Tecnologia em<br />

Desenvolvimento<br />

Sustentável<br />

Grupo <strong>de</strong> Pesquisa em<br />

Fisiologia, Ativida<strong>de</strong><br />

Física e Saú<strong>de</strong><br />

Motivação no Contexto da<br />

Educação Física<br />

(GEMEF)<br />

Saú<strong>de</strong> da Mulher<br />

25 CIÊNCIAS DA SAÚDE Medici<strong>na</strong> Radiologia Médica e<br />

Odontológica<br />

26 CIÊNCIAS DA SAÚDE<br />

27<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Saú<strong>de</strong><br />

Coletiva<br />

Qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Vida: Saú<strong>de</strong><br />

e Trabalho<br />

Administração Gestão Pública e<br />

Desenvolvimento<br />

Eduardo Leite Krüger e<br />

Christian Luiz da Silva<br />

Ciro Romelio Rodriguez<br />

Añez e Maressa Priscila<br />

Krause Mocellin<br />

Informação não<br />

disponível 143<br />

1999<br />

2010<br />

Informação<br />

não<br />

disponível<br />

Oslei <strong>de</strong> Matos 2009<br />

Charlie Antoni Miquelin e<br />

An<strong>na</strong> Silvia da Rocha<br />

Ganzerli<br />

2005<br />

Leandra Ulbricht 2008<br />

Antonio Gonçalves <strong>de</strong><br />

Oliveira e Christian Luiz<br />

da Silva<br />

2009<br />

28<br />

29<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Administração<br />

Administração<br />

Núcleo <strong>de</strong> Pesquisas em<br />

Energia: Fi<strong>na</strong>nças e<br />

Tecnologia<br />

Paraná Biodiesel<br />

Thulio Cícero Guimarães<br />

Pereira<br />

Thulio Cícero Guimarães<br />

Pereira<br />

2003<br />

2008<br />

30<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Planejamento<br />

Urbano e<br />

Regio<strong>na</strong>l<br />

Prospecção <strong>de</strong><br />

Tecnologia e<br />

Desenvolvimento<br />

Tecnológico Regio<strong>na</strong>l<br />

Decio Estevao do<br />

Nascimento e Marilia <strong>de</strong><br />

Souza<br />

2008<br />

31<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Planejamento<br />

Urbano e<br />

Regio<strong>na</strong>l<br />

Tecnologia e Meio<br />

Ambiente<br />

Eloy Fassi Casagran<strong>de</strong><br />

Junior e Maclovia Corrêa<br />

da Silva<br />

2001<br />

32<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Centro <strong>de</strong> Valorização da<br />

Cerâmica - CVCer<br />

Josele<strong>na</strong> <strong>de</strong> Almeida<br />

Teixeira e Suzete Nancy<br />

Filipak Mengatto<br />

2005<br />

33<br />

34<br />

35<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Design<br />

Design e Cultura<br />

Design, Arte e Cultura<br />

(DArC)<br />

Laís Cristi<strong>na</strong> Licheski e<br />

Rosamelia Parizotto<br />

Ribeiro<br />

Marilda Lopes Pinheiro<br />

Queluz<br />

2008<br />

2003<br />

Maristela Mitsuko Ono 2005<br />

36<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Ergonomia e Design da<br />

Informação em Áreas<br />

Técnicas<br />

Carlo Alessandro Zanetti<br />

Pece e Stephania<br />

Padovani<br />

2009<br />

143 Na relação <strong>de</strong> grupos <strong>de</strong> pesquisas disponibilizada no site da <strong>UTFPR</strong> que faz link com o Diretório<br />

<strong>de</strong> Grupos <strong>de</strong> Pesquisas do CNPq não consta(m) nome(s) <strong>de</strong> lí<strong>de</strong>r(es) e tampouco o ano <strong>de</strong> criação<br />

do grupo. Entretanto optamos por manter <strong>na</strong> relação por não ter sido excluído ainda <strong>de</strong> nenh<strong>uma</strong> <strong>das</strong><br />

duas bases <strong>de</strong> dados.


231<br />

37<br />

CIÊNCIAS SOCIAIS<br />

APLICADAS<br />

38 ENGENHARIAS<br />

39 ENGENHARIAS<br />

40 ENGENHARIAS<br />

41 ENGENHARIAS<br />

42 ENGENHARIAS<br />

43 ENGENHARIAS<br />

Desenho<br />

Industrial<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Programa <strong>de</strong> Ergo<strong>de</strong>sign<br />

Aplicado a Tecnologia<br />

Assistiva<br />

Bioinformática e<br />

Informática médica<br />

Biotelemetria<br />

Eletrocirurgia<br />

Engenharia Biomédica<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudos e<br />

Pesquisas em Si<strong>na</strong>is e<br />

Imagens<br />

Grupo <strong>de</strong> Pesquisas em<br />

Engenharia Biomédica<br />

Sandra Sueli Vieira<br />

Mallin<br />

2006<br />

Heitor Silvério Lopes 1997<br />

Sergio Francisco<br />

Pichorim e Paulo José<br />

Abatti<br />

Bertoldo Schnei<strong>de</strong>r<br />

Júnior<br />

Pedro Miguel Gewehr e<br />

Joaquim Miguel Maia<br />

Miguel Antonio<br />

Sovierzoski e Humberto<br />

Remigio Gamba<br />

Paulo César Borges e<br />

Mauro Batista Albano<br />

2005<br />

2007<br />

1993<br />

2003<br />

1999<br />

44 ENGENHARIAS<br />

45 ENGENHARIAS<br />

46 ENGENHARIAS<br />

47 ENGENHARIAS<br />

48 ENGENHARIAS<br />

49 ENGENHARIAS<br />

50 ENGENHARIAS<br />

51 ENGENHARIAS<br />

52 ENGENHARIAS<br />

53 ENGENHARIAS<br />

54 ENGENHARIAS<br />

55 ENGENHARIAS<br />

56 ENGENHARIAS<br />

57 ENGENHARIAS<br />

58 ENGENHARIAS<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Biomédica<br />

Engenharia<br />

Civil<br />

Engenharia<br />

Civil<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Sistemas <strong>de</strong> Diagnóstico<br />

distribuído e <strong>de</strong><br />

Tratamento <strong>de</strong> Saú<strong>de</strong><br />

Centrado no Paciente<br />

Ultra-som<br />

Materiais Aplicados à<br />

Construção Civil - MCCC<br />

Sistema <strong>de</strong> Produção<br />

Aplicação <strong>de</strong> Quaternions<br />

à Engenharia<br />

Dispositivos Fotônicos e<br />

Aplicações<br />

Eletrônica <strong>de</strong> Potência<br />

Eletrônica Embarcada<br />

Grupo <strong>de</strong> Componentes e<br />

Sistemas para<br />

Telecomunicações<br />

Informática Industrial<br />

Laboratório <strong>de</strong><br />

Microeletrônica da <strong>UTFPR</strong><br />

Qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Energia<br />

Elétrica<br />

Sistemas <strong>de</strong><br />

Comunicação sem Fio<br />

Sistemas <strong>de</strong> Energias<br />

Renováveis<br />

Sistemas Elétricos <strong>de</strong><br />

Potência<br />

Fábio Kurt Schnei<strong>de</strong>r 2008<br />

Joaquim Miguel Maia e<br />

Fábio Kurt Schnei<strong>de</strong>r<br />

Adalberto Matoski e<br />

Julia<strong>na</strong> Machado Casali<br />

Rodrigo Eduardo Catai e<br />

Arildo Dirceu Cor<strong>de</strong>iro<br />

Win<strong>de</strong>rson Eugenio dos<br />

Santos<br />

Hypolito Jose Kalinowski<br />

e José Luís Fabris<br />

Eduardo Félix Ribeiro<br />

Romaneli e Roger Gules<br />

2007<br />

2003<br />

2007<br />

2006<br />

1991<br />

2006<br />

Gilson Yukio Sato 2008<br />

Alexandre <strong>de</strong> Almeida<br />

Prado Pohl e Keiko<br />

Verônica Ono Fonseca<br />

Lucia Valeria Ramos <strong>de</strong><br />

Arruda e Flavio Neves<br />

Junior<br />

2008<br />

1996<br />

Volnei Antonio Pedroni 2001<br />

Joaquim Eloir Rocha e<br />

Antonio Carlos Pinho<br />

Richard Demo Souza e<br />

Anelise Mu<strong>na</strong>retto<br />

Fonseca<br />

Walter Denis Cruz<br />

Sanchez e Roberto<br />

Cesar Betini<br />

Andrea Lucia Costa e<br />

Annemarlen Gehrke<br />

Castag<strong>na</strong><br />

2006<br />

2008<br />

2006<br />

2009


232<br />

59 ENGENHARIAS<br />

60 ENGENHARIAS<br />

61 ENGENHARIAS<br />

62 ENGENHARIAS<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

Elétrica<br />

Engenharia<br />

<strong>de</strong> Materiais e<br />

Metalurgia<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Sistemas Eletrônicos para<br />

Controle e Monitoramento<br />

da Qualida<strong>de</strong> da Energia<br />

Elétrica e Eficiência<br />

Energética<br />

Telemática<br />

Centro <strong>de</strong> Pesquisas em<br />

Materiais - CPqM<br />

Grupo <strong>de</strong> Estudos <strong>de</strong><br />

Superfície em Contato<br />

Fer<strong>na</strong>ndo Cardoso<br />

Castaldo<br />

2010<br />

Walter Godoy Júnior 1987<br />

Sergei A<strong>na</strong>tolyevich<br />

Paschuk e Paulo César<br />

Borges<br />

Paulo César Borges e<br />

Giuseppe Pintaú<strong>de</strong><br />

1998<br />

2006<br />

63 ENGENHARIAS<br />

64 ENGENHARIAS<br />

65 ENGENHARIAS<br />

66 ENGENHARIAS<br />

67 ENGENHARIAS<br />

68 ENGENHARIAS<br />

69 ENGENHARIAS<br />

70 ENGENHARIAS<br />

71 ENGENHARIAS<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

Mecânica<br />

Engenharia<br />

<strong>de</strong> Produção<br />

Engenharia<br />

<strong>de</strong> Produção<br />

Engenharia<br />

<strong>de</strong> Produção<br />

Grupo <strong>de</strong> investigação em<br />

Desenvolvimento e<br />

Manufatura <strong>de</strong> Produtos -<br />

GIDEM<br />

Grupo <strong>de</strong> Soldagem e<br />

Aspersão Térmica<br />

Laboratório <strong>de</strong> Ciências<br />

Térmicas<br />

Núcleo <strong>de</strong> Mecânica<br />

Aplicada e Teórica<br />

Núcleo <strong>de</strong> Prototipagem e<br />

Ferramental - NUFER<br />

Otimização e Análise<br />

Estrutural<br />

Manufatura Integrada<br />

Núcleo <strong>de</strong> Gestão <strong>de</strong><br />

Tecnologia e Inovação<br />

Otimat<br />

Carlos Cziulik e Paulo<br />

André <strong>de</strong> Camargo<br />

Beltrão<br />

Ossimar Maranho e Aldo<br />

Santos Pereira<br />

Cezar Otaviano Ribeiro<br />

Negrão e Admilson<br />

Teixeira Franco<br />

Claudio Roberto Ávila da<br />

Silva Júnior e Hilbeth<br />

Parente Azikri <strong>de</strong> Deus<br />

Neri Volpato e José<br />

Aguiomar Foggiatto<br />

Jucélio Tomás Pereira e<br />

Carlos Alberto Bavastri<br />

Luiz Carlos <strong>de</strong> Abreu<br />

Rodrigues<br />

Hélio Gomes <strong>de</strong><br />

Carvalho e Dálcio<br />

Roberto dos Reis<br />

Angela Olandoski<br />

Barboza<br />

1999<br />

2000<br />

1999<br />

2009<br />

2002<br />

2007<br />

2006<br />

2001<br />

2007<br />

72 ENGENHARIAS<br />

73<br />

74<br />

75<br />

LINGUÍSTICA,<br />

LETRAS E ARTES<br />

LINGUÍSTICA,<br />

LETRAS E ARTES<br />

LINGUÍSTICA,<br />

LETRAS E ARTES<br />

Engenharia<br />

<strong>de</strong> Produção<br />

Artes<br />

Linguística<br />

Letras<br />

Tecnologia da Informação<br />

Aplicada ao<br />

Desenvolvimento <strong>de</strong><br />

Produto<br />

Arte e Tecnologia<br />

Estudos <strong>de</strong> Linguagem<br />

Literatura Luso-Brasileira<br />

e I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> Nacio<strong>na</strong>l<br />

Milton Borsato e Cássia<br />

Maria Lie Ugaya<br />

Lucia<strong>na</strong> Martha Silveira<br />

e Luiz Ernesto Merkle<br />

Paulo Juarez Rueda<br />

Strogenski e Lucia<strong>na</strong><br />

Pereira da Silva<br />

Wilton Fred Cardoso <strong>de</strong><br />

Oliveira e Angela Maria<br />

Rubel Fanini<br />

APÊNDICE A – Grupos <strong>de</strong> Pesquisa Certificados pela <strong>UTFPR</strong> - campus Curitiba<br />

Fonte: www.utfpr.edu.br. Elaboração própria.<br />

2004<br />

2010<br />

2006<br />

2006


233<br />

ANEXOS<br />

Anexo A – Documento relativo ao processo <strong>de</strong> readaptação da professora Hele<strong>na</strong> Poss<br />

Miranda. Disponível no Nudhi.


Anexo B – Documento relativo ao processo <strong>de</strong> readaptação da professora Hele<strong>na</strong> Poss<br />

Miranda. Disponível no Nudhi.<br />

234


Anexo C – Boletim <strong>de</strong> Informações en<strong>de</strong>reçado ao Ministério <strong>de</strong> Educação e Saú<strong>de</strong> Pública<br />

relativo ao ano <strong>de</strong> 1934 – disponível no Nudhi.<br />

235


Anexo D – Detalhe do Boletim <strong>de</strong> Informações <strong>de</strong> 1934: nomes, sexo e ida<strong>de</strong> dos docentes da<br />

Escola <strong>de</strong> Aprendizes Artífices – disponível no Nudhi.<br />

236

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