Filosofia e Sociologia
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Mas afinal, o que é o marxismo? É comum observarmos<br />
utilizações indiscriminadas do termo marxismo, de forma<br />
que tais utilizações, intencionais ou não, edificantes ou<br />
pejorativas, acabam tornando-se fontes de preconceitos,<br />
mitos e confusões que criam dificuldades adicionais e<br />
comprometedoras no estudo da obra de Marx. Contra<br />
esse contexto, o filósofo francês Michel Henry escreveu,<br />
com ironia, sobre a necessidade de uma leitura<br />
revolucionária de Marx, no sentido da superação da<br />
ignorância de sua obra e em busca de realidades<br />
perdidas, chegando a afirmar que “o marxismo é o<br />
conjunto dos contrassensos sobre Marx” (HENRY, M.<br />
1976, p. 9).<br />
Para evitarmos confusões acerca do termo m ar x ism o,<br />
vamos compreender um pouco da sua amplitude e<br />
complexidade:<br />
Entendeu-se por “marxismo”:<br />
(I) O pensamento de Marx, seja tomado em seu conjunto,<br />
ou sob o aspecto de sua evolução total, ou visando<br />
principalmente alguma de suas “fases”. Este pensamento<br />
inclui um método, uma série de pressupostos, um<br />
conjunto de ideias de tipos muito diversos e numerosas<br />
regras de aplicação, tanto teóricas como práticas;<br />
(II) Um grupo de doutrinas filosóficas, sociais,<br />
econômicas, políticas, etc. fundadas numa interpretação<br />
do marxismo e tendendo à sua sistematização. Este grupo<br />
de doutrinas tomou forma definida em Engels e foi<br />
transformado por Lênin, dando origem mais tarde ao<br />
chamado “marxismo ortodoxo”;<br />
(III) Uma variadíssima série de interpretações,<br />
procedentes de diversas épocas e formadas segundo<br />
tradições, temperamentos, circunstâncias históricas<br />
distintos etc. Podem ser incluídas neste item as<br />
interpretações de Marx que não se cristalizaram na forma<br />
mais ou menos monolítica que o marxismo adotou<br />
depois de Lênin na União Soviética; as interpretações de<br />
Marx que proliferaram uma vez rompido o marxismo<br />
ortodoxo antes citado; as que receberam o nome de<br />
“marxismo ocidental”; a prática do marxismo no<br />
pensamento de Mao-Tsé-Tung; as tentativas de<br />
revivificação do marxismo com base no retorno às fontes<br />
etc. Em alguns casos foram denominados “marxismo” os<br />
métodos, doutrinas e ideais políticos adotados em vários<br />
países e por numerosos grupos na época da luta contra o<br />
imperialismo e o colonialismo, tendo-se inclusive dado o<br />
nome de “marxismo” a todo programa político<br />
revolucionário. Evidentemente, recorreu-se ao marxismo<br />
de modo tão indiscriminado que com frequência o termo<br />
‘marxismo’ perdeu seu significado. Entretanto, não há<br />
dúvida de que o marxismo é um rio caudaloso, ao mesmo<br />
tempo ideológico e prático, capaz de diversificar-se de<br />
forma considerável e de suscitar constantes<br />
renascimentos e revivificações. Dicionário de <strong>Filosofia</strong><br />
Ferrater Mora, tomo III. pág. 1879 -1880.<br />
M ar x e a E m an cip aç ã o H u m an a<br />
Considerando as formas de alienação e dominação<br />
religiosa, política e econômica, pode-se dizer que a<br />
questão nuclear da filosofia política do Marx é a<br />
emancipação humana e que a consolidação dessa matriz<br />
do seu pensamento se dá através de uma <br />
exigência de que tal busca aconteça, concomitantemente,<br />
no plano das criações conceituais e da ação política<br />
transformadora.<br />
Nos Manuscritos econômico-filosóficos, Marx expressa<br />
com clareza a sua idéia de que a emancipação humana se<br />
daria pelo reencontro do homem com ele mesmo. A<br />
superação da alienação passa, necessariamente, pelo<br />
rompimento dos elos de dominação do sistema<br />
capitalista, da propriedade privada e pela instalação do<br />
comunismo. “O comunismo é a supra-sunção<br />
(Aufhebung) positiva da propriedade privada, enquanto<br />
estranhamento-de-si (Selbstentfremdung) humano, e por<br />
isso enquanto apropriação efetiva da essência humana<br />
pelo e para o homem”. (MARX, K. Manuscritos<br />
econômico-filosóficos. p.105)<br />
A questão de Marx é que a alienação produzida pela<br />
propriedade privada na ideologia e nas formas de<br />
dominação do capitalismo separa o homem, enquanto<br />
indivíduo, da sua condição e consciência genérica e,<br />
portanto, da sua capacidade de construir uma vida<br />
política. Ora, sem a ação política, a liberdade individual<br />
torna-se uma impossibilidade ou, no máximo, toma a<br />
forma de uma ilusão.<br />
A emancipação só pode ser concebida em termos da<br />
conquista da igualdade. Nesse sentido, a liberdade<br />
política significa poder político do povo, em sua<br />
oposição ao poder do Estado de direito burguês.<br />
Marx faz a crítica ao Estado, sobretudo no que se refere<br />
ao formalismo jurídico. A igualdade é garantida na lei,<br />
mas a lei não se efetiva na prática. A objeção de Marx é<br />
que esse formalismo estatal que se apresenta, aliás, como<br />
meio de emancipação política, não passa de uma ilusão,<br />
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