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O legado do PAN: uma nova fase para o Rio? - Tribunal de Contas ...

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artigoindigna <strong>de</strong> estadista <strong>do</strong> porte <strong>de</strong> JK.Entre os poucos presentes, nessaocasião, estava Edmun<strong>do</strong> Moniz, meuconterrâneo e velho amigo. Ele emitiuopinião contrária à minha, mais oumenos nos seguintes termos: “Essaé <strong>uma</strong> atitu<strong>de</strong> heróica, mas não é<strong>uma</strong> atitu<strong>de</strong> política. Se o presi<strong>de</strong>ntefor preso estará <strong>para</strong>lisa<strong>do</strong>. Mas,<strong>do</strong> exterior, po<strong>de</strong>rá lutar contra oatual regime. Lembre-se <strong>de</strong> Lênin(Edmun<strong>do</strong> era um <strong>do</strong>s principaisteóricos <strong>do</strong> trotskysmo no Brasil).Ele, por saber-se politicamenteindispensável, escondia-se todas asvezes em que se sentia ameaça<strong>do</strong> porum perigo real e, no exterior, atuoucom a maior eficiência <strong>para</strong> a queda<strong>do</strong> czarismo. Martírio voluntário nãotem senti<strong>do</strong> político.” Não há dúvida<strong>de</strong> que eu ainda tinha <strong>uma</strong> concepçãoromântica da luta política e Edmun<strong>do</strong>via as coisas mais objetivida<strong>de</strong>.Todavia, pelo meu estreito convíviocom Juscelino a partir <strong>de</strong> 1961, eunão po<strong>de</strong>ria imaginá-lo atuan<strong>do</strong>politicamente, no exterior, à maneira<strong>do</strong> gran<strong>de</strong> e implacável revolucionáriorusso.Para mim, não era da conveniência<strong>do</strong> governo a prisão <strong>do</strong> ex-presi<strong>de</strong>nte,a quem até então não se imputaraqualquer crime ou contra quem nãose arguíra ativida<strong>de</strong> conspiratória,mas era <strong>do</strong> seu interesse que elese afastasse <strong>do</strong> país, Faço aqui<strong>uma</strong> digressão. A prisão <strong>de</strong> JK em1968, logo após a <strong>de</strong>cretação <strong>do</strong> AtoInstitucional nº 5, compreendia-se,<strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista <strong>do</strong> governo, pelasua participação na chamada FrenteAmpla, com Lacerda e Jango. Mas aconjuntura política era bem diferenteem 1964, quan<strong>do</strong> a linha dura aindanão imperava soberana.Voltan<strong>do</strong> a minha narrativa: euconsi<strong>de</strong>rava a prisão improvável,contu<strong>do</strong> reconhecia que a minhaavaliação se fazia num planopuramente subjetivo.Percebi que JK optara peloasilo quan<strong>do</strong> ele me disse: “Vejao silêncio que caiu sobre Arraes”(o ex-governa<strong>do</strong>r <strong>de</strong> Pernambucoestava preso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> abril e seunome nunca aparecia nos jornais).A embaixada escolhida <strong>para</strong> oasilo obviamente <strong>de</strong>veria ser ada Espanha, pois a residência <strong>do</strong>embaixa<strong>do</strong>r ficava exatamente noandar acima daquele em que moravaJuscelino. O diplomata Negrão <strong>de</strong>Lima prontificou-se a cuidar <strong>do</strong>assunto. Mas havia <strong>uma</strong> dificulda<strong>de</strong>:a Espanha não reconhecia o direito<strong>de</strong> asilo. Não firmara qualquerpacto ou convenção sobre esseinstituto jurídico. Então, <strong>para</strong> evitarconstrangimentos, Negrão resolveusondar o embaixa<strong>do</strong>r e assim fez.Este ficou <strong>de</strong> ouvir o Ministériodas Relações Exteriores <strong>de</strong> seupaís. Naquele mesmo dia Negrão<strong>de</strong> Lima recebeu um telefonema<strong>do</strong> embaixa<strong>do</strong>r. Falan<strong>do</strong> com agalhardia típica <strong>do</strong>s espanhóis(assim me contou Negrão) disse-lheque, por <strong>de</strong>terminação pessoal <strong>do</strong>Generalíssimo Francisco Franco, aembaixada da Espanha se sentiriahonrada em receber o ex-presi<strong>de</strong>nteJuscelino Kubitschek. Juscelino<strong>do</strong>rmiu <strong>uma</strong> noite na embaixadamas, ao <strong>de</strong>spertar, resolveu tomarcafé no seu apartamento. Nessaocasião eu estava a sós com ele.Apesar <strong>de</strong> todas as suas recentesatribulações, riu muito quan<strong>do</strong> lhecontei tu<strong>do</strong> que ouvira, na noiteanterior, <strong>de</strong> um conheci<strong>do</strong> prócerpolítico. Este me dissera ter sabi<strong>do</strong>que efetivos militares iriam pren<strong>de</strong>rJK, <strong>de</strong> surpresa em sua casa, etrariam inclusive escadas magirus<strong>para</strong> penetrar pelas janelas.A <strong>de</strong>claração <strong>de</strong> Luis VianaFilho, então Chefe da Casa Civil,<strong>de</strong> que a cassação <strong>do</strong> ex-presi<strong>de</strong>ntefora um ato político, representouum alívio <strong>para</strong> o vilipendia<strong>do</strong>estadista e também isentou Castello<strong>de</strong> quaisquer reproches que lhepu<strong>de</strong>sse fazer Negrão. Com efeito,este pedira àquele que permitisseJK <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r-se <strong>de</strong> qualquer acusação<strong>de</strong> corrupção. Mas se a cassação se<strong>de</strong>vera a motivos políticos, Castellonão <strong>de</strong>saten<strong>de</strong>ra ao pedi<strong>do</strong>.Durante os dias da provação <strong>de</strong>Juscelino Kubitschek, eu o vi oratriste e abati<strong>do</strong>, ora indigna<strong>do</strong> ecolérico, mas o que transparecia,nas manifestações <strong>de</strong> sua mágoae <strong>de</strong> sua revolta, era completain capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> odiar mesmoàqueles que tão perversamenteo atingiam. No ex-presi<strong>de</strong>nte amelancolia às vezes toldava seuânimo naturalmente alegre, porém orancor jamais envenenava sua ín<strong>do</strong>leprofundamente generosa.Ouvi <strong>de</strong> um veterano homempúblico: “Ódio não se guarda nocoração – porque ali o faz mal a quemo tem – ódio se guarda na cabeça.”O ódio na cabeça <strong>de</strong>le se revelavapaciente e obstina<strong>do</strong> <strong>de</strong>sígnio <strong>de</strong>aniquilar politicamente o adversárioa quem i<strong>de</strong>ntificava como inimigo.Mas JK não podia odiar nem coma cabeça nem com o coração, eisto, <strong>para</strong> alguns, po<strong>de</strong>ria ser <strong>uma</strong>virtu<strong>de</strong> pessoal, mas era um <strong>de</strong>feitopolítico. Certamente, Juscelino não secomprazeria com as vicissitu<strong>de</strong>s ouos insucessos <strong>de</strong> seus persegui<strong>do</strong>res.Ele viveria bastante <strong>para</strong> assistir semalegria ao malogro <strong>do</strong>s esforços, noplano político institucional, <strong>de</strong> seucassa<strong>do</strong>r que, <strong>para</strong> não cair, teve <strong>de</strong>editar o Ato Institucional nº 2, que,ao proibir sua própria reeleição,elegeu o homem a quem menosqueria como seu sucessor e, por fim,que outorgou <strong>uma</strong> Constituição (a <strong>de</strong>1967) <strong>de</strong>stinada ao estraçalhamentopelo Ato Institucional nº 5, menos <strong>de</strong><strong>do</strong>is anos após sua promulgação.Na noite da partida <strong>de</strong> JK, euestava no carro atrás daquele queo conduziu ao aeroporto e no qualiam, no banco traseiro, ele, D.Sara e o embaixa<strong>do</strong>r da Espanha(que fez questão <strong>de</strong> acompanhálo)e, no dianteiro, Negrão e omotorista. Não pu<strong>de</strong> <strong>de</strong>spedir-me<strong>do</strong> ex-presi<strong>de</strong>nte no aeroporto, on<strong>de</strong>ele foi arrebata<strong>do</strong> e carrega<strong>do</strong> por<strong>uma</strong> multidão <strong>de</strong>lirante que aplaudiae chorava. Perdi-me fisicamentenaquele alvoroço cívico. Mas logo<strong>de</strong>pois viria o seu telegrama a quese seguiu <strong>uma</strong> carta. Guar<strong>do</strong> estes<strong>do</strong>cumentos <strong>para</strong> legá-los aos meusnetos.96 setembro 2007 - n. 36 Revista TCMRJ

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