O que importa sublinhar no momento é que as teorias liberal e marxista,enquanto duas das principais correntes <strong>de</strong> pensamento político, social e econômico daMo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, têm em comum o fato <strong>de</strong> incorporarem, mesmo <strong>de</strong> forma conflitiva, a teseda dominação da natureza como fundamental para a realização <strong>de</strong> seus projetosemancipatórios (HARVEY, 1996: 127). A diferença se situa no fato <strong>de</strong> que a dialéticamarxista <strong>de</strong> que nós fazemos a nós mesmos transformando o mundo é simplificadaradicalmente pela da lógica instrumental da economia <strong>de</strong> mercado.No entanto, Harvey i<strong>de</strong>ntifica outras correntes <strong>de</strong> pensamento que se constituempor um dissenso em relação à tese da dominação, mesmo que, como afirma o autor, estedissenso tenha sua origem na própria base do Iluminismo. Assim, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se<strong>de</strong>scobrir as leis naturais, antes <strong>de</strong> permitir o domínio do Homem sobre a Natureza,implicaria em um questionamento do otimismo iluminista ao colocar a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>que o Homem seria na verda<strong>de</strong> um “prisioneiro” da Natureza antes <strong>de</strong> ser seu mestre(HARVEY, 1996: 127). Essa perspectiva engendrou diferentes reações à tese dadominação, suscitando interpretações que se traduziram, entre outras, em uma tensão narelação entre a i<strong>de</strong>ologia da dominação e as políticas <strong>de</strong> emancipação e auto-realização.Segundo Harvey, a idéia <strong>de</strong> “ecoescassez” presente na teoria malthusiana 45 seopôs ao humanismo progressivo dominante da tradição oci<strong>de</strong>ntal capitalista, através daargumentação <strong>de</strong> que o crescimento populacional, <strong>de</strong>rivado da auto-realização 46 , criauma <strong>de</strong>manda pelo uso <strong>dos</strong> recursos naturais que exce<strong>de</strong> a capacida<strong>de</strong> natural <strong>de</strong> provêlos,frustrando o projeto <strong>de</strong> emancipação humana da pobreza, das guerras e doenças(HARVEY, 1996: 139). Mesmo reconhecendo a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um equilíbriodinâmico entre o aumento da população e os meios <strong>de</strong> subsistência através, porexemplo, <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> natalida<strong>de</strong>, ou como propõem osneomalthusianos, pela via das inovações tecnológicas e da adaptação social, cabe<strong>de</strong>stacar que a base do pensamento malthusiano concebe a miséria como o resultado <strong>de</strong>uma lei natural que age in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da regulação humana (HARVEY, 1996: 142).Dessa forma, prover o bem-estar às camadas mais pobres da socieda<strong>de</strong> aumentaria amiséria humana (pelo fato <strong>de</strong> engendrar o crescimento populacional), a redução gradual<strong>dos</strong> padrões <strong>de</strong> vida, o <strong>de</strong>clínio do incentivo ao trabalho e a diminuição da riqueza parao conjunto da população (HARVEY, 1996: 142). Por outro lado, na visão <strong>de</strong> Malthus,45 Segundo Glacken (1967, apud Harvey, 1996: 139), o argumento da ecoescassez possui uma ‘longa préhistória’que inclui uma série <strong>de</strong> pensadores do século XVIII.46 A ‘paixão entre os sexos’ é i<strong>de</strong>ntificada como um argumento da auto-realização (cf. Harvey, 1996:139).40
as classes sociais ausentes do processo produtivo (isto é, latifundiários, funcionáriospúblicos etc.), concentrariam a <strong>de</strong>manda efetiva que possibilita a continuida<strong>de</strong> daacumulação do capital; e o estímulo do consumo para estas classes geraria a expansãodo emprego para as classes mais baixas (HARVEY, 1996: 143). O comérciointernacional também é visto como um meio <strong>de</strong> se solucionar o problema da <strong>de</strong>mandaefetiva, na medida em que a expansão do livre mercado aos países não civiliza<strong>dos</strong>(MALTHUS, 1968 apud HARVEY, 1996: 143) é concebida por Malthus como um <strong>dos</strong>ingredientes do aumento da riqueza <strong>de</strong> um país (HARVEY, 1996: 143). Para Harvey, épatente a perspectiva <strong>de</strong> classe do pensamento malthusiano: existiria umaincompatibilida<strong>de</strong> entre a teoria da <strong>de</strong>manda efetiva e a teoria da população, pela qual obem-estar das classes baixas é preterido pelo aumento da riqueza das classes altas.Contudo, Harvey atribui a crítica mais forte à “i<strong>de</strong>ologia da dominação danatureza” aos teóricos marxistas da escola <strong>de</strong> Frankfurt, cujas idéias influenciaramdiversas correntes <strong>de</strong> pensamento posteriores, incluindo os movimentos contraculturais<strong>dos</strong> anos <strong>de</strong> 1960. Operando uma mudança na ênfase marxista dada à luta <strong>de</strong> classecomo o motor da história (HARVEY, 1996: 133), os pensadores da escola <strong>de</strong> Frankfurt,entre eles T. Adorno e M. Horkheimer, consi<strong>de</strong>ravam existir um conflito maior “entrehomem e natureza” (HARVEY, 1996: 133), cuja origem remonta a antes do capitalismoe cuja continuida<strong>de</strong> e intensificação aparecem antes do seu fim (JAY, 1973 apudHARVEY, 1996: 133).A partir <strong>de</strong> uma análise dialética sobre as conseqüências <strong>de</strong>sta mudança <strong>de</strong>perspectiva, Adorno e Horkheimer (1947) argumentam que a reificação da natureza, suaconstrução como “coisa”, como algo externo ao Homem, implica também na suainternalização pelo próprio Homem, criando uma reversão dialética do princípio dadominação pela qual “o Homem faz <strong>de</strong> si mesmo um instrumento da mesma natureza aqual ele domina” (HORKHEIMER, 1947 apud HARVEY, 1996: 134). Assim,o controle sobre a natureza inevitavelmente se torna um controle sobre oshomens. Um círculo vicioso resulta, aprisionando a ciência e a tecnologiaem uma dialética fatal do aumento do domínio e o aumento do conflito.As atrativas promessas da dominação da natureza – paz social eabundância material para to<strong>dos</strong> – permanecem não realizadas. O perigoreal <strong>de</strong> a frustração resultante possa se virar contra os própriosinstrumentos <strong>de</strong> dominação (ciência e tecnologia) não <strong>de</strong>ve sersubestimado. Como fatores integrantes <strong>de</strong> uma espiral ascen<strong>de</strong>nte dadominação sobre a natureza externa e interna, eles estão liga<strong>dos</strong> àdinâmica irracional a qual po<strong>de</strong> <strong>de</strong>struir os frutos <strong>de</strong> sua própria41
- Page 1 and 2: Universidade Federal de Minas Gerai
- Page 3 and 4: AGRADECIMENTOSGostaria de agradecer
- Page 5 and 6: SMAMA - Secretaria Municipal Adjunt
- Page 7 and 8: 1.INTRODUÇÃOO ponto de vista que
- Page 9 and 10: posicionamento, mais que um simples
- Page 11 and 12: Camargos, devem ser incorporados co
- Page 13 and 14: Figura 1: Mapa de Belo Horizonte, c
- Page 15: Contudo, pode-se atribuir o início
- Page 19 and 20: Passados dois anos desde o início
- Page 21 and 22: entre os temas da saúde, dos direi
- Page 23 and 24: medida em que o discurso científic
- Page 25: Pelo lado do movimento, a inserçã
- Page 28 and 29: (...) consideramos o Parecer Técni
- Page 30 and 31: afirmou que o prazo estabelecido fo
- Page 32 and 33: Figura 7: Vista área do Vale do Ja
- Page 34 and 35: própria idéia de “vitória” -
- Page 36 and 37: cumprir certas condições exigidas
- Page 38 and 39: sobre a natureza, de um lado, e um
- Page 42 and 43: acionalidade civilizadora (LEISS, 1
- Page 44 and 45: conjuntamente a idéia das relaçõ
- Page 46 and 47: crescimento econômico e preservaç
- Page 48 and 49: Na medida em que o ambiente pode se
- Page 50 and 51: as coisas - quanto no subjetivo - d
- Page 52 and 53: empresa SERQUIP no bairro Camargos.
- Page 54 and 55: da empresa no bairro expressa o dir
- Page 56 and 57: abissal composto por modernidade e
- Page 58 and 59: Nesse contexto, a possibilidade de
- Page 60 and 61: REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASACSELRA
- Page 62 and 63: . Acesso em:20/08/2010.COMISSÃO MU
- Page 64 and 65: GRANGEIRO, Cláudia Rejanne Pinheir
- Page 66 and 67: VIOLA, Eduardo & LEIS, Hector. “A
- Page 68: ANEXO 1Parecer da FIOCRUZ68
- Page 81: ANEXO 3Carta dos médicos do Centro