12.07.2015 Views

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

situação de grande dependência face ascomunidades <strong>do</strong>cais, que vão outorgar-se odireito de exercer um controlo social sobreas actividades escolares. Uma das mais importantesquestões educativas <strong>do</strong> final <strong>do</strong>século XVIII é justamente o ((braço deferro)) que os mestres régios e as populaçõesvão travar em torno desta pretensão dascomunidades.Os mestres régios vão reclamar a suacondição de ((especialistas <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>)) e asua dependência exclusiva <strong>do</strong> aparelho deEsta<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> de obstarem a uma intervençãodas populações na «coisa educativa)).As comunidades locais, pelo seu la<strong>do</strong>, vãoafirmar que (4s mestres régios são pagoscom o seu dinheiro (através da cobrança <strong>do</strong>subsídio literário) e que, portanto, estes têmque lhes prestar contas. Se é verdade quevárias vezes os protestos das populaçõessurtiram efeito, não é menos verdade queo movimento de escolarização e de profissionalizaçãofluía num senti<strong>do</strong> diametralmenteopto e as comunidades terão cadavez menos legitimidade (e autoridade) parase imiscuírem nos assuntos escolares.Nesta relação de forças, um preceito legalvai ser decisivo: estamos a pensar na disposiçãoda Reforma de 1772 que obriga to<strong>do</strong>s05. mestres, públicos e priva<strong>do</strong>s, a possuíremuma hrsbilitaçáo legal paru o <strong>ensino</strong>, a qualé concedida após um exame público. Estalicença, que vai funcionar como um suportelegal para o exercício da activiâade âocente,é a arma mais importante que 05 mestresvão utilizar para confirmarem a sua condiçãode especialistas e de profissionais <strong>do</strong><strong>ensino</strong>. Esta arma servir-lhes-á, também,para a denúncia vigorosa, que frequentementedeu origem A prisão <strong>do</strong>s prevarica<strong>do</strong>res,de to<strong>do</strong>s os indivíduos que se dedicavama actividade <strong>do</strong>cente sem para talestarem habilita<strong>do</strong>s pelas autoridades estatais:a repressão <strong>do</strong>s ((mestres clandestinos))é uma das estratégias utilizadas pelos mestresrégios para demarcarem o campo socialda sua actuação e, concomitantemente, paracriarem as condições necessárias i monqolização<strong>do</strong> <strong>ensino</strong> e a melhoria <strong>do</strong> seu estatutosóciwprofissional. A consolidação, nosfinais <strong>do</strong> século XVIII, <strong>do</strong> ((estatuto de exterioridade))das comunidades em relação &instituição escolar é paralelo a entrada <strong>do</strong>smestres régios na órbita <strong>do</strong> aparelho deEsta<strong>do</strong> e <strong>ao</strong> início da cfuncionarização))progressiva <strong>do</strong>s agentes educativos.Na base <strong>do</strong> que Ribeiro Sanches haviadefendi<strong>do</strong> em 1760, a Reforma de 1772estipulava o pagamento de um salário anual<strong>ao</strong>s mestres régios entre 40$W e 9OSOOOrééis, consoante a localização da classe.Tratava-se de uma remuneração miserável,que situava o mestre régio <strong>ao</strong> nível de umpedreiro, de um carpinteiro ou das camadasmais baixas da administração pública;contu<strong>do</strong>, se o salário era muito reduzi<strong>do</strong>,nem por isso os mestres régios deixavam deusufruir <strong>do</strong>s ((privilégios de nobres)), o queconstituía uma importante regalia social.Esta ambiguidade <strong>do</strong> estatuto <strong>do</strong> mestre émuito interessante, pois ela tornar-se-á umadas características sociológicas da profissão<strong>do</strong>cente: por um la<strong>do</strong>, 06 <strong>professor</strong>es têmum nível econbmico muito baixo; por outrola<strong>do</strong>, o diploma e o prestígio liga<strong>do</strong> <strong>ao</strong>«saber» e <strong>ao</strong> ((conhecimento)) situam o corpo<strong>do</strong>cente num nível social bem mais eleva<strong>do</strong><strong>do</strong> que a remuneração deixa supor.Sob a protecção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> assiste-se, portanto,nos finais <strong>do</strong> século XVIII a umforte impulso <strong>do</strong> processo de profissiondizaçãoda actividade <strong>do</strong>cente em Portugal:os exames públicos e os concursos nacionaispara a nomeação de mestres régios definemum corpo de competências necessárias<strong>ao</strong> exercício da profissão <strong>do</strong>cente e traçamo perfil profissional <strong>do</strong>s novos responsáveispela educação da infância. Esboça-se, então,pela primeira vez uma carreira profissionalno <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>.I3 este conjunto de ideias que nos ajudaa compreender a grande estabilidade profissional<strong>do</strong>s mestres régios na transição <strong>do</strong>século XVIII para o século XIX: a duração420

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!