12.07.2015 Views

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

Do Mestre-Escola ao professor do ensino primário

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

situação de grande dependência face ascomunidades <strong>do</strong>cais, que vão outorgar-se odireito de exercer um controlo social sobreas actividades escolares. Uma das mais importantesquestões educativas <strong>do</strong> final <strong>do</strong>século XVIII é justamente o ((braço deferro)) que os mestres régios e as populaçõesvão travar em torno desta pretensão dascomunidades.Os mestres régios vão reclamar a suacondição de ((especialistas <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>)) e asua dependência exclusiva <strong>do</strong> aparelho deEsta<strong>do</strong> no senti<strong>do</strong> de obstarem a uma intervençãodas populações na «coisa educativa)).As comunidades locais, pelo seu la<strong>do</strong>, vãoafirmar que (4s mestres régios são pagoscom o seu dinheiro (através da cobrança <strong>do</strong>subsídio literário) e que, portanto, estes têmque lhes prestar contas. Se é verdade quevárias vezes os protestos das populaçõessurtiram efeito, não é menos verdade queo movimento de escolarização e de profissionalizaçãofluía num senti<strong>do</strong> diametralmenteopto e as comunidades terão cadavez menos legitimidade (e autoridade) parase imiscuírem nos assuntos escolares.Nesta relação de forças, um preceito legalvai ser decisivo: estamos a pensar na disposiçãoda Reforma de 1772 que obriga to<strong>do</strong>s05. mestres, públicos e priva<strong>do</strong>s, a possuíremuma hrsbilitaçáo legal paru o <strong>ensino</strong>, a qualé concedida após um exame público. Estalicença, que vai funcionar como um suportelegal para o exercício da activiâade âocente,é a arma mais importante que 05 mestresvão utilizar para confirmarem a sua condiçãode especialistas e de profissionais <strong>do</strong><strong>ensino</strong>. Esta arma servir-lhes-á, também,para a denúncia vigorosa, que frequentementedeu origem A prisão <strong>do</strong>s prevarica<strong>do</strong>res,de to<strong>do</strong>s os indivíduos que se dedicavama actividade <strong>do</strong>cente sem para talestarem habilita<strong>do</strong>s pelas autoridades estatais:a repressão <strong>do</strong>s ((mestres clandestinos))é uma das estratégias utilizadas pelos mestresrégios para demarcarem o campo socialda sua actuação e, concomitantemente, paracriarem as condições necessárias i monqolização<strong>do</strong> <strong>ensino</strong> e a melhoria <strong>do</strong> seu estatutosóciwprofissional. A consolidação, nosfinais <strong>do</strong> século XVIII, <strong>do</strong> ((estatuto de exterioridade))das comunidades em relação &instituição escolar é paralelo a entrada <strong>do</strong>smestres régios na órbita <strong>do</strong> aparelho deEsta<strong>do</strong> e <strong>ao</strong> início da cfuncionarização))progressiva <strong>do</strong>s agentes educativos.Na base <strong>do</strong> que Ribeiro Sanches haviadefendi<strong>do</strong> em 1760, a Reforma de 1772estipulava o pagamento de um salário anual<strong>ao</strong>s mestres régios entre 40$W e 9OSOOOrééis, consoante a localização da classe.Tratava-se de uma remuneração miserável,que situava o mestre régio <strong>ao</strong> nível de umpedreiro, de um carpinteiro ou das camadasmais baixas da administração pública;contu<strong>do</strong>, se o salário era muito reduzi<strong>do</strong>,nem por isso os mestres régios deixavam deusufruir <strong>do</strong>s ((privilégios de nobres)), o queconstituía uma importante regalia social.Esta ambiguidade <strong>do</strong> estatuto <strong>do</strong> mestre émuito interessante, pois ela tornar-se-á umadas características sociológicas da profissão<strong>do</strong>cente: por um la<strong>do</strong>, 06 <strong>professor</strong>es têmum nível econbmico muito baixo; por outrola<strong>do</strong>, o diploma e o prestígio liga<strong>do</strong> <strong>ao</strong>«saber» e <strong>ao</strong> ((conhecimento)) situam o corpo<strong>do</strong>cente num nível social bem mais eleva<strong>do</strong><strong>do</strong> que a remuneração deixa supor.Sob a protecção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> assiste-se, portanto,nos finais <strong>do</strong> século XVIII a umforte impulso <strong>do</strong> processo de profissiondizaçãoda actividade <strong>do</strong>cente em Portugal:os exames públicos e os concursos nacionaispara a nomeação de mestres régios definemum corpo de competências necessárias<strong>ao</strong> exercício da profissão <strong>do</strong>cente e traçamo perfil profissional <strong>do</strong>s novos responsáveispela educação da infância. Esboça-se, então,pela primeira vez uma carreira profissionalno <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>.I3 este conjunto de ideias que nos ajudaa compreender a grande estabilidade profissional<strong>do</strong>s mestres régios na transição <strong>do</strong>século XVIII para o século XIX: a duração420


média da vida profissional <strong>do</strong>s mestres régiosé de 19 anos, o que ten<strong>do</strong> em conta ascondições socio-económicas da @oca nãopode deixar de se considerar uma médiabastante alta (zG).A situação descrita pelos mora<strong>do</strong>res daVila das Galveias em 1787, perfatamenteaceitável algumas décadas antes, não é maispossível. O que era permiti<strong>do</strong> <strong>ao</strong> mestre--escola deixa de ser autoriza<strong>do</strong> <strong>ao</strong> mestrerégio que, <strong>ao</strong> ser investi<strong>do</strong> como especialista<strong>do</strong> <strong>ensino</strong> e <strong>ao</strong> assumir-se como profissional,tem que passar a agir em conformidade como seu novo estatuto:((Queixão-se a V. Majestade os Mora<strong>do</strong>resda Vila das Galveias, que eles seacham na ÚItima contemação peIa faltade <strong>ensino</strong> de seus filhos no ministério deler, e esorever, que haven<strong>do</strong> na dita Vilaum $<strong>professor</strong> chama<strong>do</strong> <strong>Do</strong>mingos Jozé,este faz a sua obrigação 'tão insuficientemente,que o mais <strong>do</strong> tempo não dá lição<strong>ao</strong>s discípulos, e por esta falta a dão osmesmas meninos uns <strong>ao</strong>s outros, tu<strong>do</strong> namaior desordem sem adiantamento algumpara os ditos, outras vezes fechan<strong>do</strong> aAula, e fazen<strong>do</strong> jornadas de três e quatrodias, como há tempos fez para uma romagema Nossa Senhora <strong>do</strong> Bonfim; todasas semanas, assim na 6." como no sába<strong>do</strong>,se ocupa em fazer barbas, assim nasmontes, como na terra, em que falta naAula, sem terem os meninos naqueles diasnem <strong>Mestre</strong> nem Substituto. Senhora, éverdade que ele é incapaz deste ministériopelas muitas ocupações que tem; eleé Procura<strong>do</strong>r de Causas, ele é Escrivãode Sisas, ele é barbeiro, sangra<strong>do</strong>r, de écomediante, sen<strong>do</strong> certo que no princípioos Mora<strong>do</strong>res desta Vila mandavam seusfilhos ii dita Aula (pois agora) 05 mandamaprender com .~>esscvas particulares.>) (9Ora, termina um <strong>do</strong>cumento <strong>do</strong> mesmogénero redigi<strong>do</strong> pelos mora<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Barreiro,«quem sofre são aqueles que viven<strong>do</strong>na precisão não têm dinheiro para pagar adiferente <strong>Mestre</strong> o <strong>ensino</strong> <strong>do</strong>s seus filhos,sen<strong>do</strong> obriga<strong>do</strong>s por falta de meios a deixarem-nosentregues a rudez <strong>do</strong> seu pnmeironascimento)) ("").Os <strong>do</strong>cumentos transcritos são bem elucidativosda transição <strong>do</strong> mestre-escola par<strong>ao</strong> mestre régio: o novo mestre, habilita<strong>do</strong>com a 1icen.p estatal, em que exercer atempo inteiro (ou como ocupação principal)a actividade <strong>do</strong>cente. Dito de outro mo<strong>do</strong>:percorridas as duas primeiras etapas <strong>do</strong> processode profissionalização da actividde<strong>do</strong>cente.Em suma:«No final de Setecentos existem emPortugal uma série de escolas régias funcionan<strong>do</strong>segun<strong>do</strong> um modelo relativamenteestável: alunos jovens, de idade homogénea,integra<strong>do</strong>s em classes segun<strong>do</strong> asaquisições escolares anteriores, alunos deque se aguarda uma atitude de receptoresde um saber que é forneci<strong>do</strong> 'por adultos,que têm como função única (ou principal)a actividade <strong>do</strong>cmte. Estes mestressão remunera<strong>do</strong>s pelo Esta<strong>do</strong>, que exerceum controlo sobre as suas actividades eque define os conhecimentos a transmitir,os programas, os méto<strong>do</strong>s e as técnicas de<strong>ensino</strong>, as normas e os processos de avaliação,etc. Numa frase: 06 papéis dealuno e de <strong>professor</strong> estão relativamentenormaliza<strong>do</strong>s no seio de organizações escolaresde uma certa estabilidade.)) tZ9)Uma espécie de diário de Manoel JozéBranco, mestre régio em Beja, data<strong>do</strong> de1801, redigi<strong>do</strong> em forma de diálogo entreos <strong>professor</strong>es e .os alunos, é a melhor confirmaçãodas ideias que acabamos de exportS0).111. MESTRE OU PROFESSORDAS PRIMEIRAS LETRAS:UMA HESITAÇÃO TERMINOLdGICACHEIA DE SIGNIFICADOAs prímeiras décadas <strong>do</strong> sbub XIX sãoalgo indefinidas quanto ii construção da421


profissão <strong>do</strong>cente, o que é naturai ten<strong>do</strong> emconta a instabilidade socioplítica <strong>do</strong> País.Desenha-se, no entanto, de forma nítida atransformação <strong>do</strong> mestre régio em mestreou <strong>professor</strong> das primeiras letras.<strong>Mestre</strong> ou Professor? Eis uma hesitaçãoque atravessa grande parte da literaturapedagógica da primeira metade <strong>do</strong> séculoXIX e que encerra um importantesignifica<strong>do</strong> sociológico. Os mestres, grupoaté aí claramente distinto <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>esde gramática latina, de retórica, de gregoe de filosofia (isto é, <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es <strong>do</strong>((secundário))), começam a afirmar-se comofazen<strong>do</strong> parte integrante <strong>do</strong> grupo social((<strong>professor</strong>es)), ainda que das ((primeiras letras)).Um importante <strong>do</strong>cumento de 1818confirma este movimento de aproximaçãono interior da profissão <strong>do</strong>cente. Trata-sede um abaixo-assina<strong>do</strong> colectivo <strong>do</strong>s mestrese <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es régios da cidade <strong>do</strong>Porto, <strong>do</strong>cumento que seria impensável algunsano6 antes:((Representam a V. Majestade com profun<strong>do</strong>respeito e submissão os Professorese <strong>Mestre</strong>s Régios da Cidade <strong>do</strong> Porto:[...I Que ten<strong>do</strong>-se com o andar <strong>do</strong>s temposaumenta<strong>do</strong> e cresci<strong>do</strong> excessivamenteo preço <strong>do</strong>s géneros e o aluguer de Casas,como é de notoriedade pública, são osseus Ordena<strong>do</strong>s actualmente sobremaneiradiminutos, não só para uma subsistênciacómoda e decente, mas aindamesmo para o que é indispensável <strong>ao</strong>sustento da vida. [...I E como é desejode V. Majestade que to<strong>do</strong>s os Emprega<strong>do</strong>sPúblicos tenham com 01 que se possamsustentar decentemente [...I vêm osSuplicantes requerer o aumento <strong>do</strong>s seusOrdena<strong>do</strong>s.)) (31)Entretanto, <strong>do</strong>is <strong>do</strong>cumentos de 1811 e1814 são dignos de menção nesta evocaçãoda história da profissão <strong>do</strong>cente em Portugal:-0 primeiro, estipula um subsídio especialpara o transporte urgente <strong>do</strong>s párocose <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es para as terrasque foram invadidas 'pelo inimigo: logoque as tropas napleónicas foramrechaçadas, estes <strong>do</strong>is personagens(simultaneamente, adversários e cúmpiices!)são considera<strong>do</strong>s os elementos--chave para a reorganização da vidal~cal(~~).- O segun<strong>do</strong>, aplica unia resolução régiade 1790 e nomeia, finalmente, as trêsprimeiras mestras régias de ler, escrevere contar: Margarida Jesus, MariaProcópia e Teresa Rosa de Jesus sãoas três primeiras <strong>professor</strong>as <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>primário oficial de que há memóriaem Portugal (33).A nova fase da vida <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es corresponde,como já referimos, <strong>ao</strong> aban<strong>do</strong>noprogressivo das múltiplas ocupaçk e actividadesque, até <strong>ao</strong> século XVIII, eramacumuladas com o <strong>ensino</strong>. Mas, como ossalários <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es das primeiras letrasse mantêm a um nível muito baixo, estesvêem-se compeli<strong>do</strong>s a encontrar, no interior<strong>do</strong> exercício <strong>do</strong>cente, os expedientes necessários<strong>ao</strong> equilíbrio <strong>do</strong>s respectivos orçamentosfamiliares. Datam desta época as((lições particulares)), as ((aulas extra)) e outrasactividades que, entre nós, se prolongaramaté há bem pouco tempo. O retrato,sem dúvida caricatura1 e bastante exagera<strong>do</strong>,que Santos Marrocos (<strong>professor</strong> régbde Filosofia) traça, em 1799, <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>esdas primeiras letras não deixa de ter umafun<strong>do</strong> de verdade)):((Pelo que estes <strong>Mestre</strong>s, como bufarinheiroscom ioja de quinquilharia, vendem<strong>ao</strong>s discípulos papel, tintas, penas deescrever e lápis, tabuadas, pautas, regras,e pastas; fazem imposições mensais contribuin<strong>do</strong>cada UM para água de beber,ten<strong>do</strong> mais alto preço sen<strong>do</strong> por um copo,varrer a <strong>Escola</strong>, e o mais que omito: e422


se alguém quer estar com presunção degravidade sepra<strong>do</strong> em uma casa ouquarto particular, e vigia<strong>do</strong> com maisatenção no ler e escrever, a que se chamaAula de horas vagas, satisfará por váriospreços. Porém ainda <strong>ao</strong> mais pobre dachwma, que no fim <strong>do</strong> mês não podecontribuir com 120 réis a quem competeo nome de Discipulo da <strong>Escola</strong> Régia, lásão remeti<strong>do</strong>s os sapatos <strong>do</strong> sr. <strong>Mestre</strong>,e leva<strong>do</strong>s pelo pequeno para serem conserta<strong>do</strong>spelo pobre pai; ou qualquer outrotraste competente a seu ofício.)) v4)<strong>Do</strong>rovante, os mestres de primeiras letrascompensarão a fraca remuneração que usufruem,dedican<strong>do</strong>-se primordialmente <strong>ao</strong><strong>ensino</strong> ou a actividades afins. Este factoacentua a ((especialização)) da profissão <strong>do</strong>centee contribui para uma maior separaçãoentre a função <strong>do</strong>cente e as outras funçõessociais: o fosso entre os <strong>professor</strong>es e asfamílias vai aumentar durante o século XIX,conduzin<strong>do</strong> mesmo a uma ((inversão de pa-]séis)) que levará os <strong>professor</strong>es a outorgarem-seo direito de exercer uma acção devigilância sobre as práticas familiares. Atente-seneste trecho publica<strong>do</strong> em 1822 nojornal O Concilia<strong>do</strong>r Lusitono:((Seria muito intecessante que a sua[<strong>do</strong>s mestres] inspecção não se limitasseàs paredes das escolas. Eles deveriam tercerta autoridade, ou inspecção sobre aeducação <strong>do</strong>méstica <strong>do</strong>s Discíp<strong>do</strong>s, eaté mesmo autorizá-los para aconselharemos Pais de família sobre a educação<strong>do</strong>s seus filhos, e repreender aqueles, quepor maus exemplos, ou por negligênciafizessem perder <strong>ao</strong>s filhos o fruto daInstrução Pública.)) Y5)Durante o século XIX, edwqão torna-sepraticamente sinónimo de escslan'zação.Este facto, conjuga<strong>do</strong> com o papel preponderanteque é concedi<strong>do</strong> <strong>ao</strong> <strong>professor</strong> n<strong>ao</strong>rganização <strong>do</strong> acto educativo, explica queo tema 'central <strong>do</strong>s discursos >pedagógicos daépoca seja a preparação adequada <strong>do</strong> corpo<strong>do</strong>cente, através da institrrição de um sistemade formação de <strong>professor</strong>es. Pois se,como afirma, em 1835, o director <strong>do</strong> JornalMenscd de Educação: ((0s <strong>Mestre</strong>s, mormentequan<strong>do</strong> se trata de lançar os fundamentosda educação pública, são tu<strong>do</strong>: méto<strong>do</strong>sperfeitos que valem, se os <strong>Mestre</strong>ssão inábeis; e de que lhes sorve a aptidãoliterária, se a moralidade lhes falta?)) (36).A primeira metade <strong>do</strong> século XIX é <strong>do</strong>minadapelos debates em torno da instituciondização<strong>do</strong> emino normal, onde os<strong>professor</strong>es aprendam os conhecimentos eas técnicas e integrem as normas e os valeSres próprios a profissão <strong>do</strong>cente. Não cabeno âmbito deste estu<strong>do</strong> uma análise dasprimeiras tentativas de criação de escolasnormais em Portugal; sublinhem-se, todavia,duas ideias: a ligação entre as escolasnormais e a difusão de certos méto<strong>do</strong>s de<strong>ensino</strong>; a preocupação primordial com a((formação contínua)) <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es.O <strong>ensino</strong> normal em Pmtugal na primeirametade <strong>do</strong> século XIX está intimamenteliga<strong>do</strong> a difusão de três méto<strong>do</strong>s de <strong>ensino</strong>,que se foram apresentan<strong>do</strong> sucessivamenteccmo o meio mais adequa<strong>do</strong> para a resolução<strong>do</strong>s problemas educativos nacionais: ométo<strong>do</strong> de <strong>ensino</strong> mútuo, que permitiriasolucionar a questão <strong>do</strong> analfabetismo numcurto lapso de tempo; o méto<strong>do</strong> de leiturarepetina (ou méto<strong>do</strong> portugLcês) da autoriade Castilho, que foi um <strong>do</strong>s pioneiros <strong>do</strong>scursos normais; e a cartilha maternal (ouméto<strong>do</strong> Jazo de Dem), que suscitou acesosdebates nu seio das escolas normais.Por outro la<strong>do</strong>, 06 primeiros esforços comvista A implantação <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> normal centraram-se,fundamentalmente, na preparação<strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es já em exercício e nasua reciclagem em novos méto<strong>do</strong>s. Sem decurara ((formação inicial)), as escolas normaisda primeira metade <strong>do</strong> século XIXpreocuparam-se, sobretu<strong>do</strong>, com a ((formaçãocontínua)) <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es. Esta tradição423


mantém-se até A República e, mesmo após1862, os ahnos-mestres coabitam com os<strong>professor</strong>es-alunos no interior das escolasnormais. Saliente-se ainda que, 1836 umadas justificações ,para abrir escollas normaisem cidades da província era o papel de dinamizaçãoda vida local, nomeadamente <strong>ao</strong>nível cultural, que estas instituições nãopoderiam deixar de desempenhar.IV. PROFESSOR DE INSTRUCÃOPRIURIA: NÃO UM SABIO, MAS UMHOMEM DO POVO ILUSTRADONo dia 21 de Abril de 1862, discursan<strong>do</strong>na inauguração da <strong>Escola</strong> Normal de Marvila(a primeira verdadeira ((escola normal))),afirmava o director Luiz Filipe Leite:«Uma das primeiras necessidades eminstrução pública é iencontrar homensque abracem o Magistério como verdadeirosacerdócio e não como simples indústria;homens cuja inteligência rivalizecom a dedicação; cujos princípios demoralidade não desmitam por duvi<strong>do</strong>sosou perverti<strong>do</strong>s a missão gravíssima quesão chama<strong>do</strong>s a exercer; para que o apostola<strong>do</strong>se lhes não falseie na prática; paraque a palavra se lhes não esterilize desconceituadalpelo exemplo; para que asobras lhes não sirvam de condenaçãoquotidiana.A regeneração moral <strong>do</strong>s povos não seobtém sem um sistema de educação geralque disponha de tais mestres. [...I os homensque o desenvolvimento intelectual emoral <strong>do</strong>s povos reclama não se encontram,formam-se.)) ('7Com esta frase lapidar - «os <strong>professor</strong>esnão se encontram, formam-se)) - Luiz FilipeLeite inaugura simbolicamente a terceiraetapa <strong>do</strong> processo de profissionalizaçãoda actividade <strong>do</strong>cente: a criação de instituiçõesespecíficas para a formação de pro.fessores. Desde esta data, e apesar das inúmerashesitações e retrocessos, jamais osprefessores <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário deixaram depossuir estabelecimentos próprios para a suaformação profissional (com excepção <strong>do</strong>sano5 1936 a 1942 em que as escolas <strong>do</strong>magistério primário estiveram fechadas);.O discurso de Luiz Filipe Leite marcatambém o fim <strong>do</strong> mestre ou <strong>professor</strong> dasprimeiras letras e o nascimento <strong>do</strong> <strong>professor</strong>de instrução primária, designação que setornou <strong>do</strong>minante nesta época e que sóviria a ser aban<strong>do</strong>nada nos últimos anos daMonarquia. O <strong>professor</strong> de imtrqão primáriaviverá num <strong>do</strong>s perío<strong>do</strong>s mais férteis<strong>do</strong> pensamento pedagógico em Portugal enuma época em que a crença nas potencialidadesda escola como factor de regeneraçãonacional e de promoção individual eraquase total.O perfil <strong>do</strong> <strong>professor</strong> de instrução primáriapode ser encontra<strong>do</strong> na intersecçãode quatro componentes, tal como se ilustrano gráfico seguinte.PERFIL DO PROFESSOR DE INSTRUÇÃOPRIMÁRIAIFuncionáriopúblicoSacerdócio1-0 <strong>professor</strong> de instrução primáriadeve ser recruta<strong>do</strong> nos meios sociaisdesfavoreci<strong>do</strong>s, entre os jovens quemanifestam vocação para o <strong>ensino</strong>.João de Andrade Corvo afirma numdiscurso pronuncia<strong>do</strong> em 1866 que((o <strong>professor</strong> de instrução primáriadeve ser um homem <strong>do</strong> povo, umhomem <strong>do</strong> povo ilustra<strong>do</strong>))424


2 - O <strong>professor</strong> de instrução primáriadeve conservar ((os costumes simplesde que não convém jamais desviá--lo»("7: ((modesto funcionário público))co) ele deve cumprir com zeloa sua importante missão social.3 - «A missão <strong>do</strong> mestre primário é formarsimultaneamente o cristão e ocidadão: deste mo<strong>do</strong>, a carreira <strong>do</strong>magistério deve (convidar todas asvocações decididas a adquirirem noseio destas escolas os conhecimentosespeciais de que precisam para o desempenhodeste sacerdócio.)) (")4 - Enfim, «sacer<strong>do</strong>te» e ((funcionário)),o <strong>professor</strong> de instrução primári<strong>ao</strong>cupa-se de ((inocular no coração dainfância, na alma <strong>do</strong>s futuros cidadãos,o amor <strong>ao</strong> trabalho e a práticade todas as virtudes, a obediência àsleis que no5 regem, a sujeição e orespeito <strong>ao</strong>s poderes constituí<strong>do</strong>s, adedicação' A pátria que os viu nascer»e2).Em suma: o <strong>professor</strong> de instrução primáriadeve ter uma origem social modesta,demonstra'r vocação para o magistério, levaruma vida de sacerdbcio e asumir o seupapel de modesto funcionário público, comuma função social claramente definida. Um<strong>professor</strong> com este perfil tem que ser forma<strong>do</strong>em estabelecimentos próprios, as es-colas normais -àsquais «não compete acriação de <strong>do</strong>utores em pedagogia, mas simde bons mestres)) c3)-, pois «se a profissão<strong>do</strong> magistério é uma profissão científica,como qualquer outra, o <strong>professor</strong> precisade um perío<strong>do</strong> de aprendiza<strong>do</strong>, que o habilitea entrar capaz e dignamente no exercíciodas suas funções»(").O <strong>professor</strong> de instruçáo primária viveuno «século da escola)), tão grande era aapta social no modelo escolar: discursoscomo «a indústria desenvolve-se na razãodirecta da instrução)) (J. Andrade Corvo),((abrir uma escola é fechar uma prisão))(Guerra Junqueiro) ou «cada escola que fundardessão muitas famílias que arranca& afome» (D. António da Costa) constituem omotivo central <strong>do</strong>s textos sobre a educaçãoe o <strong>ensino</strong>. E, no entanto, a situação <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário continua adeixar muito a desejar: ausência de umacarreira profissional claramente definida,remunerações a um nível muito baixo, máscondições de trabalho, etc. Este conjuntode problemas vai-se agravar, na óptica <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es, com a Reforma descentraliza<strong>do</strong>rade Rodrigues Sampaio (1878) a qualo corpo <strong>do</strong>cente se opôs em bloco, exigin<strong>do</strong>que os <strong>professor</strong>es continuem a seu funcionáriospúblicos e não sejam transforma<strong>do</strong>sem meros emprega<strong>do</strong>s camarán'os. Surgementão na imprensa notícias «dramáticas» de<strong>professor</strong>es que vivem na miséria ou quemorreram a fome ... tu<strong>do</strong> culpa das autoridadesmunicipais!Estas reflexões pretendem sublinhar aambiguidade <strong>do</strong> estatuto <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es,presente mais <strong>do</strong> que nunca nos finais <strong>do</strong>século XIX: como diz D. António da Costaem 1870, por um la<strong>do</strong>, afirma-se que «o<strong>professor</strong> d tu<strong>do</strong>)), que «o <strong>professor</strong> é a primeirainstituição nacional)), e, por outrola<strong>do</strong>, ((faz-se-lhe a mercê de lhe concedero diploma oficial de morrer & fome»(46).É uma situação que será, de algum mo<strong>do</strong>,resolvida no princípio <strong>do</strong> século XX,sobretu<strong>do</strong> após a Primeira Guerra Mundial,quan<strong>do</strong> as remunerações auferidas pelos<strong>professor</strong>es serão consideravelmente awnen-Sadas. Para que este objectiva fosse atingi<strong>do</strong>,muito contribuiu uma lei que temsi<strong>do</strong> algo ((maltratada)) pelos historia<strong>do</strong>res-que referem, aliás a justo tí,tulo, os aumentossalariais irrisórios e o autoritaTismorepressivo da lei cs)-, a Reforma de 1901,que estipula no seu art. 30.":«- Constitui habilitação para o exercício<strong>do</strong> Magistério Primário a aprovaçãono curso das escolas normais ou de habilitaçãopara o Magistério Primário.)) e')425


Esta disposição legal é fundamental namedida em que ela encerra a terceira etapa<strong>do</strong> processo de profissionalizaçáo da wtividade<strong>do</strong>cente. Na verdade, se as escolasnormais já existiam desde mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> séculoXIX, o curso <strong>do</strong>s liceus ou qualquercurso superior, bem como a aprovação numexame «de habilitação para o magistérioprimário)), continuavam a ser condições suficientespara que qualquer candidato entrasse,em igualdade de circunstâncias comos normalistas, nos concursos de provimento<strong>do</strong>s lugares de <strong>professor</strong> de instrução primária.A partir de 1901 esta possibilidadedeixa de ser autorizada e a obtenção <strong>do</strong>diploma normal passa a ser obrigatória.A relevância desta medida é acentuada pelofacto de, ainda hoje, o <strong>ensino</strong> primário sero único grau de <strong>ensino</strong> em que tal exigênciaé obrigatória: o motivo de uma profissionalizaçãomais precoce <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es <strong>do</strong><strong>ensino</strong> primário em relação <strong>ao</strong>s outros grupos<strong>do</strong>centes reside, em grande parte, nest<strong>ao</strong>brigatoriedade imposta pela Reforma de1901.V. A TRANSICÃO DO «SBCULODA ESCOLA)) PARA O ((SÉCULODA CRIANlÇA)) 'É CARACTERIZADA PELOASSOCIATIVISMO DOS PROFESSORESPRIhURIOSAo situarmos a nova fase da vida <strong>do</strong> <strong>professor</strong>a<strong>do</strong>primário na transição <strong>do</strong> séculoXIX para o século XX pretendemossublinhar a importância <strong>do</strong> movimentoassaciativo <strong>do</strong>cente que adquire nesta épocauma vitalidade que não tinha conheci<strong>do</strong> atéaí: relembre-se que definimos este momentocomo a quarta etapa: <strong>do</strong> processo de profissionalizaçãoda actividade <strong>do</strong>cente.fi evidente que, durante to<strong>do</strong> o séculoXIX se desenvolveram tentativas váriasde associação <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es. Já mencionámosos abaixo-assina<strong>do</strong>s. <strong>do</strong> princípio<strong>do</strong> século; refira-se agora, ainda que deforma passageira ("9):- A Associação <strong>do</strong>s Professores <strong>do</strong> Reinoe Ilhas, fundada em 1854 por iniciativa,entre outros, de Luiz Filipe Leite;- A Associação <strong>do</strong>s Professores Primárimde Lisboa, fundada em 1880 por<strong>professor</strong>es normalist as;- Os esforços em prol da criação de umaFederação <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong> PrimárioPortuguês, sobre a qual escreve Te&filo Ferreira em 1886: (02 tempo dereagir contra todas as prepotências edesconsiderações, sacudin<strong>do</strong> o jugo <strong>do</strong>sque nos aviltam por sistema ou porestupidez.[. . .] Compenetremo-nos da grandeobra da nossa emancipação e auxiliemo-nosreciprocamente para que nasfaces <strong>do</strong>s nossos irmãos não deslizemais uma única lágrima de descon-forto e desespero.[...I Só pela Federação <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong>Primário Português poderemosaspirar às vantagens a que temos. direito,mas que nos são usurpadas; porqueconfiam na fraqueza proveniente danossa desunião.)) (49)- Os três importantes Congressos Pedagógicosde 1892 e de 1897, nos quaisBernardino Macha<strong>do</strong> teve um papelpreponderante.- A Assm'açGo <strong>do</strong>s Socorros Mútuus <strong>do</strong>Praf essora<strong>do</strong> Primário Português, instituídaem 1897, que marca o regressoa uma perspectiva «mutualista» <strong>do</strong>movimento associativo .Todavia, é apenas a partir de 1907, coma Liga Nacional <strong>do</strong> Professor<strong>do</strong> PrimárioPortuguês e, mais claramente, após a implantaçãoda Reptiblica, que os esforçosassociativos <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es ganham umacerta consistência, poden<strong>do</strong> falar-se comlegitimidade da constituição de verdadeirasassociações profissionais de classe. Estefacto não é estranho ií missão que a Repúblicacomete <strong>ao</strong> novo <strong>professor</strong> primário:a Reforma de 1911 começa com esta frase426


célebre - ((0 homem vale sobretu<strong>do</strong> pelaeducação que pwui.)) E, no ano seguinte,Manuel de Arriaga (primeiro Presidenteeleito da República), dirige-se <strong>ao</strong>s participantesno 3." Congresso Pedagógico nestestermos:«Eu desejaria, a cada um <strong>do</strong>s congressistas,individualmente, apertar a mão, edemonstrar, em nome da Nação, a grandeesperança que to<strong>do</strong>s vemos desabrocharna alma popular, confiante no início deuma phtria nova redimida pela instrução.Os grandes mentores, pais espirituais, dageração nova, são os <strong>professor</strong>es. Saú<strong>do</strong>--vos comovidamente. A pátria confia emvós; a minha soberania é a vossa.)) p')Estas citações dão bem o tom <strong>do</strong> que er<strong>ao</strong> <strong>professor</strong> primário da República: um homeminvesti<strong>do</strong> de uma missão social deprimordial importância, um profissionalconvicto de que sem a formação de umhomem novo não poderia haver um mun<strong>do</strong>melhor. I3 claro que este discurso tinha, n<strong>ao</strong>utra face, uma redidade escolar e educativaque continuava a deixar muito a desejar... ou, como escrevia J. Simões Dias:((Quer dizer: imaginamo-nos na Europa eestamos em Marroços.»(51). Por agora importaacentuar que a imagem <strong>do</strong> <strong>professor</strong>primário no princípio <strong>do</strong> século XX é grandementeresponsável pela necessidade sontidapelo corpo <strong>do</strong>cente se organizar (como objectivo de defender e de melhorar estaimagem, bem corno de a sintonizar comuma realidade quotidiana) e pela acção socialinterveniente que caracterizou o comportamento<strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es durante a República.1907 - Liga Nacional <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong>Primário Português191 I - Sindicato <strong>do</strong>s Professores PrimáriosPortugueses1916 - Associação Geral <strong>do</strong>s ProfessoresPrimários de Portugal.Estas foram as três etapas principais percorridaspelos <strong>professor</strong>es primários at6 Aconstituição da mais importante associaçãode <strong>professor</strong>es que existiu em Portugal: aUnião <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong> Primário OficialPortuguês, criada em 1918.A União vai desempenhar um papel fundamentalno desenvolvimento de um espíritoe de um comportamento de corpo profissiolnalpor parte das <strong>professor</strong>es; a suaacção enquanto elemento estruturante deuma identidade profissional foi decisiva éesta constatação que justifica a sua granderepresentatividade: em 1925 a União congregava'cerca de 909'0 <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es primários.Organizada segun<strong>do</strong> um modelo sinâical,e fortemente imbuída das perspeotivas <strong>do</strong>sindicolismo profissional, a União cai encerrardefinitivamente um debate que se tinhainstaura<strong>do</strong> no seio <strong>do</strong> associativismo <strong>do</strong>centedesde as suas origens: o <strong>professor</strong>a<strong>do</strong>deve a<strong>do</strong>ptar um modelo sindical, mais próprio<strong>do</strong>s meios operários, ou um modeloprofissional, h imagem das associações <strong>do</strong>smédicos e <strong>do</strong>s advoga<strong>do</strong>s? A<strong>do</strong>lfo Lima,por exemplo, afirma num importante textode 1915:((0 professolra<strong>do</strong> deve bastar-se a sipróprio e ser exerci<strong>do</strong> exclusivamente 'porindivíduos que façam dele a sua vida, asua única profissão, viven<strong>do</strong> dela e paraela.[...I O recrutamento <strong>do</strong>s professoiI.esnão pode ter por base e critério a caça<strong>ao</strong> emprego público.[...] A própria natureza das coisas está,pois, a indicar que o Esta<strong>do</strong> é incompetentepara tratar de assuntos pedagógicose nomeadamente <strong>do</strong> recrutamento <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es.[...I a, portanto, <strong>ao</strong>s <strong>professor</strong>es, <strong>ao</strong>scorpos <strong>do</strong>centes que cumpre escolher eseleccionar aqueles que devem ser as seusleais e honestos companheiros de traba-427


lho-na luta pela ciência e pela verdade.))c')Trata-se de uma proposta de organizaçãoda profissão <strong>do</strong>cente que não vingará, namedida em que a projissionalização da actividade<strong>do</strong>cente continuou largamente dependenteda intervenção <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, não sedesenvolven<strong>do</strong> de forma autónoma.De 1918 até 1927, data em que os seusprincipais dirigentes foram presos (no quese pode considerar a primeira vaga repressiva<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Novo contra o associativismo<strong>do</strong>cente), a União representou uma associaçãode <strong>professor</strong>es de grande vitalidade,ten<strong>do</strong> da<strong>do</strong> um contributo decisivo a melhoriadas condições socioeconómicas e <strong>do</strong>estatuto profissional <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es primárim.Aliás, desde o Congresso de 1918 queas reivindicaç6es corporativas constituem ofulcro das atenções da ,'União, como é patenteno discurso proferi<strong>do</strong> por CanhãoJúnior:((Temos ti<strong>do</strong>1 fome, muito <strong>do</strong>s nossosfilhos terão mendiga<strong>do</strong> a côdea <strong>do</strong> pão,por essas aldeias fora, a porta de nossoseducan<strong>do</strong>s; um <strong>professor</strong> primário estendeujá a mão a uma esmola junto da portadum cemitério!E...] Avante, pois. A união <strong>do</strong> <strong>professor</strong>a<strong>do</strong>primário português, neste mementcu da história pátria e universal, nãoserá só o despertar de uma classe: serátalvez o despertar de uma pátria! Assimseja.)) (53)desucesso da actividade daser confirma<strong>do</strong> pelo facto de, pela primeiravez (talvez mesmo pela «única vez))!) na suahistória profissional, OS <strong>professor</strong>es primáriosse declararem satisfeitos com o seuestatuto socioeconómico; no Relatório de«A União porém venceu conseguin<strong>do</strong>a situação material de que hoje desfrutamos.))q4)O ano de 1926 termina com um aviso dadirecção da União as autoridades nacionalistas:...I«[ mal <strong>do</strong> governo mais forte se aclasse <strong>do</strong> magistério primário, compostapor 8000 <strong>professor</strong>es espalha<strong>do</strong>s pelo País,com uma esplêndida organização associativapor distritos e concelhos, tu<strong>do</strong> emrelação com um organismo central, entrassede espalhar pelo País o descréditodum ministério.)) v5)Esta «ameaça» não lpassava, já, de um«bluff», como ficou demonstra<strong>do</strong> pela ausênciade reacção da classe <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>esprimários a prisão de um grupo de activistassindicais (nomeadamente, Carvalhão Duarte,A<strong>do</strong>lfo Lima, César Porto, Canhão Júniore Antíinio Augusto Martins) e a disselução da União, em Outubro de 1927.A<strong>do</strong>lfo Lima escreverá uma carta da prisão,onde 'fica bem patente o seu isolamentoe a sua «dessolidarização» face a um movimentopara que tanto tinha contribuí<strong>do</strong>:«Foi uma grande surpresa para to<strong>do</strong>se principalmente para mim a situação emque me encontro. Não sei ainda de quesou acusa<strong>do</strong>, pois, após vinte dias de prisãoainda não fui ouvi<strong>do</strong>. Logo que oseja tenho a certeza de que o equívocodesaparecerá e serei restituí<strong>do</strong> a liberdade.[...I Nunca fui, nem poderia ser <strong>do</strong>scorpos gerentes da União <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong>pimário. sou apenas sb~o da Lutuosa.Nunca fui a sua nunca fui <strong>ao</strong>s seuscongressos e reuniões magnas; nunca escrevino seu órgão.(( (56)1920-1921 da Comissão Executiva pode Esta prisão desencadeará, aliás, algumasler-se:reacções internacionais, a mais conhecida428


das quais é o artigo escrito pelo ({apóstoloda Educação Nova)), A<strong>do</strong>lphe Femère (9.«UN SAVANT PORTUGAIS EMPRISONNÉNotre ami et collaborateur M. Ad. F.,bien plwé pour être renseigné, nous écrit:En vérité, Ia contaigion de Ia dictature,dans les pays latins, Ia suffisance de certainsgrands de ce monde et E’gnoranceimpuissante des peuples abuutissent 6 desrésultats étranges. La Ligue internationdepow I ’édwation nouvelle est fondée- tout le monde le sait - sur Ia scienceet sur le boin sens: scieince qLu est Iapoursuite objective de Ia vérité (même s’ilarrive 6 cem qui Ia cherchent de se tromper)et bon sem qui est Ia mise au pointintuitive de tous les prmédés pur viser6 conserver et 6 accroite chez I’enfant Iapuissmce de son esprit.Or, la section portugaise de Ia Liguevient d’être décimée, sai revue reduemtrette, son chef, M. A<strong>do</strong>lfo Lima, unsavant éminent, emprisonné.La création de cette gection avait étédécidée en principe au Iv” congrès internationdd’édtecation nouvelle, été dernier;elle n’était pas encore officiellementconstitube. Mais Ia réartion, CEU PortugaI,en avait eu vent. On soupçonnait, d tort,ses chefs d’entretenir des rapprts mec laRussie soviétique; on confodait édwationnouzrelle avec édwation archique,Ie congrès de Locarna ayant étudié, avecle sérieux que l’an sait, le problème deIa liberté en édtlcatian; des policiers, vraisembloblementau service de la réactioncatholique, avaient cru devoir taxer, d’immoraleIa pratique de Ia cdducation,alors que les enquêtes les plus ubjectivesont révélé son inocus’té, mieux: sa hautevaleur psychologique et morde, lorsqu’elleest réalisée dans de bonnes conditions.Mçtis qui parle, 12-bas, <strong>do</strong>ns les cerclesdictatoriaux, â’objectivité, de bon sens,de science? Vut-on discuipter avec l’arbitraire,l’ignorance et Ia mauvaise foi? Si1n ’y avait l’emprisionnement d’A<strong>do</strong>lfo Lima,on se contenterait de hnmser lesépaules et de patienter: rien ne peut, d lalongw, résister 6 Ia vérité. Mais qum<strong>do</strong>n voit un savant integre et noble, toutdévoué are bien <strong>do</strong> son peuple et de Iascience, traité comme un criminel dedroit commm, on ne peut se taire: i! fautque l’apinion publique dui mude entiersoit s&ie de ce déni de justice.Ad. F.»Esta referência permite-nos abrir o últimocapítulo deste trabalho, durante o qual proccuraremos evocar a importância <strong>do</strong> Movimentoda Edwqão Nova nu processo deprofissiondizqiio da actividade ducente.Até agora procurámos explicar as quatroetapas deste processo, em articulação como seu eixo central - estatuto social e económico<strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es - e com as suas duasdimensões - corpo de conhecimentos e detécnicas e conjunto de normas e de v<strong>do</strong>raprbprios d profissão <strong>do</strong>cente.De seguida, iremos aprofundar o estu<strong>do</strong>destas duas dimensões, através da argumentaçãode uma tese algo polémica: a Educaçâ;oNova fecha o «ciclo dai morfernidade))da! profisslio <strong>do</strong>cente, aberto pelas ReformasPombdinas, e encerra (simbolicamente) oprocesso de profissionalizqão da actividade<strong>do</strong>cente.VI. A EDUCACÁO NOVANA ENCRUZILHADA DO MODELOESCOLAR: AS NORMAS E OS SABERESPRÓPRIOS A PROFISSÃO DOCENTE((<strong>Escola</strong> Nova!<strong>Escola</strong> Nova. Aurora de um mun<strong>do</strong>novo, beijo nupcial da Humanidade nocoração <strong>do</strong> Infinito; partida <strong>do</strong> Homem429


Livre, cantan<strong>do</strong>, para a jornada <strong>do</strong> Ideal,em demanda <strong>do</strong> seu destino.<strong>Escola</strong> Nova! Asa e norte <strong>do</strong> pensamentonovo, nova epopeia <strong>do</strong>s povos![...] Utopistas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> inteiro! Anjosala<strong>do</strong>s <strong>do</strong> planeta! Sonhai![...]A <strong>Escola</strong> Nova é a marcha ascencional<strong>do</strong> Homem para a Perfeição.»(")Este texto foi publica<strong>do</strong> em 1924, no primeironúmero da revista <strong>Escola</strong> Nova, órgãoda Associaçiío <strong>do</strong>s Professores de Portugal.Ele é bem sintomático da crença que oshomens da Educação Nova depositavam naescola, não só para a educação das crianças,mas também para a transformação dasociedade. Esta crença no modelo escolartal como ele foi concebi<strong>do</strong> no século XVIIIe sistematiza<strong>do</strong> no século XIX deixa perceberque a Educação Nova é mais o jimde um perío<strong>do</strong> da história da educação <strong>do</strong>que o princípio de uma era nova, contrariamente<strong>ao</strong> que incessantemente reclamaramos seus mentores.iÉ verdade que os homens da EducqíoNova se uniram em torno de uma críticacerrada a uma pedagogia a que chamaram((tradicional))(aliás, esta crítica é talvez um<strong>do</strong>s únicos denomina<strong>do</strong>res comuns da EducaçãoNova!)), mas esta atiude nunca osconduziu a uma interrogação fundamentalsobre o modelo escolar ou a uma reflexãosobre a instituição escolar. A escola e acriaqa (J. Dewey), A escola activa (Ad.Ferrière), Uma escola nova na Bélgica(A. Faria de Vasconcelos), As escolas novas(L. Luzuriaga), A escola por medida (Ed.Claparède), Uma escda na vida (O. Decroly),Conceito da escola no trabalho (G.'Ker-schensteiner): poderíamos continuar, quaseindefinidamente, esta citação de títulos deobras <strong>do</strong>s principais arautos da EdlrcqãoNova, que mostra bem a mentração)) <strong>do</strong>discurso destes pedagogos na escola.Aliás, eles assumem claramente esta perspectiva,sublinhan<strong>do</strong> apenas a necessidadede uma transformação da escola e de umaligação da escola a vida. Reportemo-nos aJohn Dewey para mencionar a 5ua «conception de I'école envisagée comme une sociétéreflétant et reproduisant sous une formetypique les principes fondamentaux de lavie sociale)) (") e a A<strong>do</strong>lfo Lima para citarum texto de 1925:«Assim a escola-prisão, a escola-caserna,i escola-convento, A escola-oligárquicae chauvinista, sucede a <strong>Escola</strong> Social.Esta corresponde a <strong>do</strong>utrina de que ocentro <strong>do</strong> sistema escolar é a criança;corresponde a necessidade d0 que a escoladeve preparar para a vida. E o melhormeio de realizar este requisito é fazer daescola um organismo social, em que seencontrem organizadas as instituiçõessociais que são o ideal <strong>do</strong>s seus membrose onde se exercitem, se corrijam e seeduquem na prática da vida social.[...I A escola deve ser considerada,como um laboratório sociológico, comouma estufa.)) (")<strong>Escola</strong> - miniatura da mun<strong>do</strong>, <strong>Escola</strong> -laboratório sociológico: nestas duas expressõesexprimem-se, para<strong>do</strong>xalmente, as potencialidadese os limites da Educação Nova:potencialidades que dizem respeito a vitalidadedeste movimento na transformaçãodas ideias pedagógicas, das práticas escolarese <strong>do</strong> papel <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es; limites quepassam pela incapacidade de pôr em caus<strong>ao</strong> modelo escolar concebi<strong>do</strong> na época modernae de imaginar uma outra forma deeducar. Por isso, afirmámos que a EducaçãoNova encerrava o «ciclo da modernidade))da história da educação.E, no entanto, nas entrelinhas <strong>do</strong>s seusdiscursos os homens da Educqão Nova deixamjá perceber alguma desconfiança emrelação <strong>ao</strong> modelo escolar inauguran<strong>do</strong>,deste mo<strong>do</strong>, a reflexão contemporânea sobrea educação e o <strong>ensino</strong>. O delicioso prólogode A<strong>do</strong>lphe Ferrière <strong>ao</strong> livro Transformemosa <strong>Escola</strong> (cuja tradução portu-430


guesa, datada de 1928, foi uma das primeirasobras proibidas de circular peloregime nacionalista) é o «cúmulo <strong>do</strong> para<strong>do</strong>xo)):a crença e a desconfiança na escolasão totais.Conta Ferrière que um belo dia deu odiabo uma saltada a terra e, não contentecom a sua obra, decidiu criar a escola:«A criança a<strong>do</strong>ra a natureza: encerraram-nadentro de casas. A criança gostade brincar: obrigam-na a trabalhar. Pretendesaber se a sua actividade serve paraalguma coisa: fez-se com que a sua actividadenão tivesse nenhum fim. Gosta demexer-se: condenam-na a imobilidade.Gosta de palpar objectos: ei-la em contactocom ideias.))Não tar<strong>do</strong>u que o regime desse frutos.A criança aprendeu a adaptar-se a estascondições artificiais. Dir-se-ia por uminstante que a escola levava a melhor.O diabo julgava-se vitorioso.Foí então que, de repente, se Viu apequenada fugir para os (bosques, treparas árvores, correr a aventura e até fazercaretas <strong>ao</strong> diabo. Este rangeu os dentes,ameaçou com o punho e eclipsou-se:«E com ele desapareceu a escola que tãosabiamente imaginara.))E Ferrière concluiu desafian<strong>do</strong> os leitoresa acabarem com estas ((gaiolas &moda antiga)) e a construírem ((escolasnovas)) (O1).O pensamento pedagógico em Portugalvai também desenvolver algumas perspectivasque apontam não só na perspectiva deuma escola que deve «conter dentro de sia sociedade)), mas que apontam já a necessidadede uma ((abertura da escola <strong>ao</strong> meio)),pon<strong>do</strong> assim em causa o processo de marginalizaçãodas comunidades <strong>do</strong> acto educativoe a estatuto de exterioridade dasfamilias em relação ?I escolarização dascrianças, consolida<strong>do</strong>s durante o skuloXIX. A este respeito, uma importante autobiografiamanuscrita (que revelamos pelaprimeira vez) de António Sérgio, redigidana Suíça em 1914-1915, é exemplar:Je crois avoir gagné dans ces travaux(où) je suis en contaçt avec des anglo--saxons) un sens assez exwt des réalitéssociales et des besoins smiaux, que jetrouve manquer awez souvent chez lesprofesseurs de la jeunesse, même qmndils sont d’excellents muitres, entrainews,et psychologws; 2 mon sem ik n’ont pasassez vu au travail le monde des usines,des bureaux, des bmquiers, des idtcstriets,des commerçants, des travailleurs. Ce sont12 des points de vue SUY la: vie moderneou i1 est bon de se placer lorsqu’m demande(comrne crn le répète aujourd-hui,et d’ailleur très justement) ulne éducation«pur Ia vie» (6z).Regressemos as duas dimensões <strong>do</strong> processode profissionalizqLb para mostras deque mo<strong>do</strong> a Educação Nova, prolongan<strong>do</strong>uma tendência que tem as suas origens noséculo XIX, vai:-por um la<strong>do</strong>, fundar a ciência (ouciências) da educação, através da reivindicaçãode um estatuto científicopara a pedagogia, isto é, na opiniãode A<strong>do</strong>lfo Lima, «a ciência aplicada,que basean<strong>do</strong>-se no estu<strong>do</strong> sistemáticoda natureza da criança (Pdagogia)estabelece um sistema de leis naturaise de princípios fundamentais em quedeve basear-se a Educação <strong>do</strong> ser humano(Sociologia)))(O’).- por outro la<strong>do</strong>, organizar um conjuntode referências, simultaneamente culturaise científicas, que vão tornar-se<strong>do</strong>minantes no discurso <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es,constituin<strong>do</strong> uma componenteessencial para a sua definição comoprofissionais.431


Os autores <strong>do</strong>s finais <strong>do</strong> século XVIIIinsistem na ideia de arte da educação, queremete para as ideias de intuição, de votaçãoe de habilidade natural, mas tambémpara as aptidões necessárias <strong>ao</strong> exercício deum ofício, que se aprende graças a umaprática continuada(G4). Em mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> séculoXIX começa a encarar-se a pedagogiasobretu<strong>do</strong> como um conjunto de técnicaseducativas: define-se então a pedagogiacomo «a arte e a ciência da educação»(“‘),expressão que confirma as dificuldades sentidasna clarificação deste conceito. Finalmente,no final de Oitocentos, na esteirade Alexander Bain, to<strong>do</strong>s os esforços vãono senti<strong>do</strong> de considerar d’art d’enseignerarcl point de vue scientifiqum (66). Estamosna antecâmara <strong>do</strong> Movimento da EducaçãoNova e no limiar da transição da pedagogiaàs ciências da educa@; em 1906, FrançoisGuex observa com pertinência que de livrede Bain. pouxrait ainsi s’appeler tout awsibien “La Science dans i’éducation” que “LaScience de I’éducation”)) (”). Em Portugal,esta fase da história da pedagogia é marcadapor um importante discurso de M. A.Ferreira-Deusda<strong>do</strong>, em 1891, na lição deabertura da cadeira de ((Psicologia aplicadaa educação)) <strong>do</strong> Curso Superior de Letras:«A pedagogia pode ser consideradacomo uma arte ou como uma ciência:considerada como uma arte consiste essencialmentena acção, e inspira-se sobretu<strong>do</strong>nas clispições naturais <strong>do</strong> educa<strong>do</strong>r. [...IA pedagogia teórica, isto é, o conhecimentoespeculativo da picogenia sob oaspecto da educação, 6 uma disciplinanova entre nós. Herbart não teve emPortugal discípulos que publicamenteapostolassem o estu<strong>do</strong> da psicologia aplicada?i educação. I3 este o nome que nóspreferimos ou simplesmente ciência daeducação, reservan<strong>do</strong> a palavra pedagogiapara o la<strong>do</strong> prático desse <strong>ensino</strong>, istoé, considerada corno arte.)) (O8)A partir <strong>do</strong> final <strong>do</strong> século XIX começaa produzir-se um discurso sobre a educaçãoque procura <strong>do</strong>tar o saber pedagógico deum estatuto científico: de désir de scientificitéa aimi marqué de son ambivcrlencetoute la pédagogie depuis cent anm, afirmajustamente Daniel Hameline (69). No princípio<strong>do</strong> sé.culo XX, a psicologia e a socblogia vão torna-se as referências científicasobrigatórias <strong>do</strong> discurso pedagógico, o qualconsagra já d’exclusion de ka pratique commepouvant constituer le savoir en pédagogieet Ia supériorité du théoricien-spécia-Eiste sur le praticien)) (‘O). A importância <strong>do</strong>Movimento da Educação Nova reside noaprofundamento desta clivagem, ten<strong>do</strong> conduzi<strong>do</strong>a passagem da pedagogia às ciênciasda educação, da arte a ciência da educação.Jean Houssaye descreveu muito bem esteprocesso:«Para<strong>do</strong>xalem en t, 1 ’éd ucation nouvelleest 2 lu fois la consécration et Ia mise 2mort de Ia pédagogie; elle en est la consécrationcar on assiste alors 2 une véritableexphsion des pratiques innovatrices;elle en est la mise 6 mart ccw elle comacreIa référence & Ia science et Ia dén’vevers les sciences de I’édrrçation. Le praticienin<strong>ao</strong>mtew finira par être enterréet renié au num des sciences de I’éducation,ou nom de I’exctusion de ia pratique.))(”)As ciências da educação vão ser socialmentelegitimadas graças a atitude da EducaçúoNova: tal facto não bastará, por sisó, para fornecer <strong>ao</strong>s <strong>professor</strong>es as estratégiase os instrumentos necessários a transformaçãodas suas práticas pedagógicas.A questão epistemológica central das ciênciasda educação (e, também, da EducaçãoNova) reside nesta incapacidade de revivificara prática pedagógica com base nascontribuições teóricas das diferentes ciênciashumanas e sociais. O «melhor)) da EducaçãoNova encontra-se no seu caráctsr mul-432


tiforme e multidisciplinar, na sua capacidadepara integrar diversas abordagenscientíficas, articulan<strong>do</strong>-as com uma reflexãosocialógica e filosófica; mas este movimentorevelou-se incapaz de dar o ((saltoepistemológico)) que teria permiti<strong>do</strong> instituira acção pedagógica em lugar de produçãocientífica, recorren<strong>do</strong> as outras ciências,sem negar o ((irredutível pedagógico)).Esta ideia permite-nos passar <strong>ao</strong> estu<strong>do</strong>da segunda dimensão <strong>do</strong> processo de profissionalizcção.Na verdade, se a influênciadirecta das teses da Educqão Nova naspráticas escolares não foi muito grande, jáo mesmo não se pode dizer no que diz respeitoa sua repercussão no seio <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es.Num certo senti<strong>do</strong>, podemos afirmarque as teses da Educação Nova não constituemum corpo estrutura<strong>do</strong> de conhecimentos,mas antes o reflexo no universo pedagógicode toda uma evolução social ecultural; ora, o que surge a primeira vistacomo uma das suas principais fragilidades,transformar-se-á num trunfo decisivo destemovimento: na verdade, enquanto ((banhocultural)) ninguém pode escapar a sua wontaminação))e a definição <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>escomo profissionais passará pela adesão <strong>ao</strong>sprincípios da Educação Nma.A este propósito a interrogação de A<strong>do</strong>lpheFerri&re em 1934 é bem significativa:((Inovação e tradição: onde estará omeio justo?[Os] bons meios são os dum pai e osduma mãe sensatos e amantes <strong>do</strong>s seusfilhos; são também os da <strong>Escola</strong> Activa.»( 7 * ) 1Eis a Educação Nova ((reduzida)), pelapena de um <strong>do</strong>s seus mais destaca<strong>do</strong>s propagandistas,a uma questão de ((bom senso)),a aplicação da sabe<strong>do</strong>ria da prudência e <strong>do</strong>afecto no <strong>do</strong>mínio educativo. De facto, aEducação Nova é muito mais um sintoma<strong>do</strong> que uma CULEJCI, muito mais o mo de uma((inelutável)) mutação cultural <strong>do</strong> que aconseqtpencia de uma reflexão pedagógica.Estas características explicam que, no princípio<strong>do</strong> século XX, as ida‘m mvas se tenhamtorna<strong>do</strong> nos princípios funda<strong>do</strong>res detodas as relações com as crianças, tantono interior da escola, como no meio comunitárioe familiar. De tal mo<strong>do</strong> que, comodiz Daniel Hameline:((11 n’est pas prussible de tenir le discoursinverse qu’au prix de vastes précautions(comment se déclarer “contre” lu “créativité”sons passer pow un affreux?), ouau prix d’une véritable provocation.)) (73)Difundidas por to<strong>do</strong> o la<strong>do</strong> sem o menorenquadramento teórico, as teses da EducaçãoNova fundem-se numa espécie de amagam<strong>ao</strong>nde não é possível distinguir o discursocientífico e a banalidade (e/ou o lugarcomum). Deste mo<strong>do</strong>, o êxito da EdwqáoNova é também, para<strong>do</strong>xdmente, uma dasrazões <strong>do</strong> seu fracasso. No decurso <strong>do</strong>s anosvinte os princípios da Educdção Nova tornam-se<strong>do</strong>minantes no discurso pedagógico,obrigan<strong>do</strong> os <strong>professor</strong>es a sua a<strong>do</strong>pçãocomo factor de identidade profissional.IÉ evidente que as razões e os motivosque levam os diferentes grupos de <strong>professor</strong>esa aderir às ((ideias novas em educação))não são uniformes. A diversidade <strong>do</strong> estatutoda adesão & Educação Nova conduz-nosa um agrupamento <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es em quatrograndes categorias: ((0s militantes sociaise/ou políticos)), «os militantes pedagógicos)),«OS militantes <strong>do</strong>s valores oficiais)) e ((osmilitantes da indiferença activa)). Esta categorização,que não temos condições paradesenvolver neste estu<strong>do</strong>, pretende acentuara ideia de que não se pode ser prolfissional(sobretu<strong>do</strong>, na profissão <strong>do</strong>cente que historicamentefun<strong>do</strong>u os seus alicerces sobrea «militância») sem aderir a um conjuntode normas e de valores que constituem aimagem de uma identidade profissional.No caso <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es, esta imagem vaiser construída com base nas normas e nos433


valores prbprios & profissão <strong>do</strong>cente que setornarão <strong>do</strong>minantes devi<strong>do</strong> a acção <strong>do</strong>Movimento da Educação Nova. Insista-sesobre a ideia de que este ((conjunto normative))é resulta<strong>do</strong> de <strong>do</strong>is factores: a explicitaçãode toda uma série de valores quesempre estiveram subjacentes <strong>ao</strong> exercícioda actividade <strong>do</strong>cente; e a nova relação iiinfância, a ciência da educação e a profissáo<strong>do</strong>cente instaurada no princípio <strong>do</strong>século xx.Nos anos vinte a definição <strong>do</strong> <strong>professor</strong>profissianal passa inevitavelmente por umareferência (implícita ou explícita) A EdwaçãoNova. fi por isso que este movimento- que coincide com a institucionalizaçãode processos específicos e autónomos deformação <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es e com a consolidaçãode associações de <strong>professor</strong>es, e queatinge o clímax no perío<strong>do</strong> em que os proifessores primários conseguem impor-se socialmentecomo corpo profissiond usufruin<strong>do</strong>de um estatuto socioeconómico de acor<strong>do</strong>com a missão que lhes é confiada-apresentaum tão grande interesse para a análise<strong>do</strong> processo de profissiomlizqlio da wtividade<strong>do</strong>cente.EPILOGOOS PROFESSORES DO ENSINO PRIMARIOHOJE: MILITANTES OU ESPECIALISTAS?Uma vez acabada a evocação da história<strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário entre ofinal <strong>do</strong> século XVIII e o princípio <strong>do</strong> séculoXX, história solidária da ((ideolugia, <strong>do</strong>progresso)) herdada das luzes e impregnadade uma visão optimista <strong>do</strong> ((modelo escolar)),é oportuno lançar algumas pistas de reflexãosobre as encruzilhadas contemporâneas daprofissão <strong>do</strong>cente. Quan<strong>do</strong> a partir da SegundaGuerra Mundial foi desmistifica<strong>do</strong>o discurso que assimilava o progresso .económicoe social a escola, e vicsversa, abriu--se uma «brecha» na profissão <strong>do</strong>cente queainda hoje não foi fechada: as teses defenden<strong>do</strong>uma ((maior profissionalização>> <strong>do</strong><strong>ensino</strong> passaram a ser confrontadas com asideias da ((des-profissionalização)) da actividade<strong>do</strong>cente.A crise de identidade <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es temorigem no ((estilhaçar)), em pleno século XX,<strong>do</strong> modelo escolar, provoca<strong>do</strong> nomeadamentepelas pedagogias nãadirectivas, pelontovimenfo da descolarização e pelas abordagensinstitucionidistas. Se até 2 EdmaçãoNova ninguém põe em causa a essência <strong>do</strong>modelo escolar, a partir de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong> século,desenvolve-se um pensamento que procurainterrogar os fundamentos <strong>do</strong> sistemaescolar e, por consequência, o estatuto eos papéis desempenha<strong>do</strong>s pelos profissionais<strong>do</strong> <strong>ensino</strong>.Paralelamente, assiste-se a uma verdadeira((inflação)) das tarefas cometidas <strong>ao</strong>s<strong>professor</strong>es: detecção de problemas de saúdee <strong>do</strong> foro psicológico, combate a droga,prevenção contra a delinquência, educaçãoro<strong>do</strong>,viária, educação alimentar, etc.; DanielHameline descreve esta situação dizen<strong>do</strong>que a escola se transformou numa criadapara to<strong>do</strong> o serviço:dnvestie de toutes les missions édtrcativesconcevables, I’école, victime d’mvéritable délire inflationniste, se voit, parIa fait même, dépuuillé de la spécificitéd’me éducation définie (c’est-à-dire limitée)comme scdaire. Et c’est précisémentcc qui comrnence 2 mettre mal 2 l’aisenombre d’enseignants, de parents et memed’élèves. 11s ne sment plus ce qu’estune école tant on s’y essouffle 2 minertom les rôles, en position seivile de bonne2 tout fazYe» (“).Hoje em dia, os <strong>professor</strong>es <strong>do</strong> <strong>ensino</strong>primário1 encontram-se submeti<strong>do</strong>s A influênciade duas correntes contraditórias:434


-uma que vai no senti<strong>do</strong> de uma profissionalizaçãocrescente da actividade<strong>do</strong>cente e <strong>do</strong> estatuto <strong>do</strong>s profmores;- outra que, na esteira das ideologias dalibertação da escola e da descolarizaçãoda sociedade, procura confiar ainstâncias extra-escalares toda umasérie de funções pedagógicas e, simultaneamente,atribuir <strong>ao</strong>s <strong>professor</strong>estarefas distintas das que tradicionalmentelhe pertenciam ('7.Hoje, mais <strong>do</strong> que nunca, a interrogaçãode J. Beillerot - os <strong>professor</strong>es: militantesou especialistas? (?O) - deve constituir ummotivo de reflexão para to<strong>do</strong>s os ((profissionais<strong>do</strong> <strong>ensino</strong>)). Mas, independen temente,das vias que a profissão <strong>do</strong>cente irátrilhar no futuro, parece estabelecer-se umlargo consenso em torno da ideia que aprofissão de <strong>professor</strong> <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primáriodeve:-ser objecto de uma formação de nívelsuperior e ter um contacto mais estreitocom as teorias e as disciplinascientíficas;-funcionar segun<strong>do</strong> um grau de autonomiacada vez maior, nomeadamenteno que se refere ii organização <strong>do</strong> trabalhoescolar, A escolha <strong>do</strong>s instrumentospedagógicos *e a selecção <strong>do</strong>s materiaisdidácticos;- estar sujeita a uma regulamentaçãomenos administrativa, no senti<strong>do</strong> buroicrático <strong>do</strong> termo;- assumir-se como uma profissão cadavez menos ((funcionarimda)) e cada vezmais interveniente e criativa, tanto <strong>ao</strong>nível social como <strong>ao</strong> nível pedagógicoe científico (").iÉ esta atitude que consolidará a ideia deque os <strong>professor</strong>es <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário fazemparte integrante <strong>do</strong> grupo social «<strong>professor</strong>es)),detentores de uma folrmaçúo, de umreconhecimento social eprofissional idênticos <strong>ao</strong>sgorias <strong>do</strong> corpo <strong>do</strong>cente.*de um estatutodas outras cate-Cheguei <strong>ao</strong> fim desta digressão despretensiosapela história da profissão <strong>do</strong>centeem Portugal, centrada nos <strong>professor</strong>es <strong>do</strong><strong>ensino</strong> primário. Tentei delinear as grandeslinhas de força deste percurso, sem entrarem análises que obrigariam a um enquadramentoteórico mais consistente. Entreelas merecem referência: o estu<strong>do</strong> da integraçãoprofissional; o estatuto <strong>do</strong>s mestrese <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es particulares; a questão dasactividades que tiveram origem no <strong>professor</strong>a<strong>do</strong>(direcção, inspecção, etc.); a comparaçãoentre as diversas categorias de <strong>professor</strong>es;a comparação entre a profissão<strong>do</strong>cente e actividades afins (educa<strong>do</strong>r, anima<strong>do</strong>r,forma<strong>do</strong>r, etc.); a feminização daprofissão <strong>do</strong>cente.Enfim, das parcas dezenas de mestres--escola da época moderna <strong>ao</strong> meio milharde mestres régios nomea<strong>do</strong>s pela administraçãopombalina, <strong>do</strong>s mil mestres ofu professaresdas primeiras letras <strong>do</strong> Liberalismo<strong>ao</strong>5 cerca de 4500 <strong>professor</strong>es de instruçãoprimária <strong>do</strong> final <strong>do</strong> século XIX, <strong>do</strong>s 8500prrofewwes primários <strong>do</strong> final da PrimeiraRepública <strong>ao</strong>s cerca de 40000 <strong>professor</strong>es<strong>do</strong>i <strong>ensino</strong> primário <strong>do</strong>s nossos dias, é todaa trajectória profissional, é toda a vida deuma profissão que está ainda por escrever.Vida que, corno diz António Sérgio:«não é sler, mas sim devir; não é estar, massim ir sen<strong>do</strong>: e a ideia vitalizante não sehá-de buscar em cousa estática, imóvel,realizada, como o histórico e tradicional;o que dá vida é um plano de acção, oquerer um futuro, o ter uma meta-aideia-força de um prvir que vamos criarem faina estrénua.[...I I3 o amanhã que organiza ohoje)) ('".435


O amanhã da profissão <strong>do</strong>cente - umamanhã que organiza o hoje-não estácertamente numa ((visão idílica)) <strong>do</strong> papelda escola e <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es, cuja ilusão nãoé mais possível neste final tormentoso <strong>do</strong>século XX. Lembre-se, contu<strong>do</strong>, que denunciara ilusão não é renunciar a criar esperançaOs <strong>professor</strong>es não são certamentem ((salva<strong>do</strong>res <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>)), comomuitas vezes se proclamou, mas eles tambémnão são ((meros agentes)) de um poderque os ultrapassa, como por vezes nos quiseramfazer crer. Só reencontran<strong>do</strong> umequilíbrio e uma identidade profissional queperderam em mea<strong>do</strong>s deste século, os <strong>professor</strong>espoderão definir estratégias de acção,que não podem mudar tu<strong>do</strong>, mas que podemmudar alguma coisa. E esta algumacoisa, não é coisa de somenos.sional e no papel social <strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es,ilustran<strong>do</strong>-as através das diferentes designaçõespor que foram sen<strong>do</strong> conheci<strong>do</strong>s:mestre-escola ou mestre de ler (céculo-XVI--XVllI) -+ mestre régio de ler, escrever econtar (finais <strong>do</strong> século XVIIZ) + mestreou <strong>professor</strong> das primeiras letras (princípios<strong>do</strong> século XIX) -+ <strong>professor</strong> de instruçáoprimária ou <strong>professor</strong> primário (finaYs <strong>do</strong>século XIX-princípios <strong>do</strong> século XX) -+ pro.fessor <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário (finais <strong>do</strong> séculoXX).Retoman<strong>do</strong> uma pergunta ((clássica)) deJmky Beillerot - os <strong>professor</strong>es: militantesou especialistas? - o artigo termino comuma reflexão sobre quais os critérios maisadequa<strong>do</strong>s para a definição (e pora a compreensão)da profissão <strong>do</strong>cente.RESUMOAtravés da introdução <strong>do</strong>i conceito deprocesso de profissionalização da actividade<strong>do</strong>cente, que se desenvolve em dum dimensões(corpo de conhecimentos e de técnicase conjunto de nolrmm e de v<strong>do</strong>res própriosda profissão <strong>do</strong>cente) e em quatro etapas(prática a tempo inteiro( da actividade <strong>do</strong>.cente -+ estabelecimento de um suportelegat para o exercício da actividade decente -+ criação de instituições específicaspara a formqáo de prafessores + constituiçãoâe ass‘ociações profissionais de <strong>professor</strong>es),este artigo evoca a história <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es <strong>do</strong> <strong>ensino</strong> primário em Portugal,desde o século XVI até <strong>ao</strong>s nossos dias.Utilizan<strong>do</strong> uma abordagem socio-histórica,o autor mostra de que forma a constituição<strong>do</strong>s <strong>professor</strong>es em ((profissionais<strong>do</strong> <strong>ensino</strong>)) está directamente relacionadacom a produção <strong>do</strong> modelo1 escoilar (EraMaderna) e com a estatizaçáo <strong>do</strong> sistemade <strong>ensino</strong> ($poria Cantemporânea). O artigosublinha a relevância das mudanças operadas<strong>ao</strong> longo <strong>do</strong>s séculos no estatuto profis-A travers I’élaboration du concept deprocessus de professionnalisation de l’activitéenseignaate, qui s’orgmise en deuxdimensions (corps de savoirs et de savoir--faire et ensemble de normes et de valeurspropres d la professian enseignunie) et enquatre étapes (pratique d plein temps del’enseignement + création d’m supportlégal 2 l’exercice de I’enseignement + miseen ptoce de proçédures institutiannaliséesde formation des enseigmnts -f contitutiond’associations professionrrelles d ’enseignants),cet wticle évoqw l’histoire desprofesseurs de I’enseignement primaire (instituteurs)au Portugal, d partir du XVI”siècle.Par le biais d’une upproche saciehisterique, l’auteur adyse Ia constitution desenseignants en professionnels en interactianavec Ia production du modèle scolaire(Temps modernes) et avec l’étatisation dusystème d’enseignement (Epaque contempo.raine). L’article soluligne E ’im portme deschmgements opérés, pendant plusieurs siècles,dans le statut professionnet et dans le436


ole social des enseignants; 2 l'aide des différentesexpressiom qui désignent les pro.f essews de 1 'enseignement primaire, l'auteurillustre le parcours historique de ce groupeprofessionnel: maitre d'école ou maitre delecture (XVI"-XVille dele) + maitre royalde lecture, d'écriture et de cdcul (fin duXVIII" siècle) -+ maitre ou professeur despremières Iettres (débuit du XIX" siècle) -+professeur d'instruction primaiire ONU professeurprimaire (fin du XIP-début du Xx"siècle) -+ professeur de 1 'enseignement primaire(fin du Xx" siècle).En reprenant une interrogation


(") Petição <strong>do</strong>s Mora<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Barreiro: BibliotecaGeral da Universidade de Coimbra, ms.2531, <strong>do</strong>c. 2.p) Cf. Walo HUTMACHER, op. cit. (1981),pp. 1-XII.(30) Manuscrito guarda<strong>do</strong> na Biblioteca Púbiicdde &%ora, códice CXIII/ 1-25.(9 <strong>Do</strong>cumento guarda<strong>do</strong> no Arquivo Geraldas Alfândegas de Lisboa, Livro 174-D, <strong>do</strong>c. 3.("3 <strong>Do</strong>cumento guarda<strong>do</strong> no Arquivo <strong>do</strong> Tribunalde Contas, Erário Régio 3939, fl. 323.c3) Ver a este propósito António NÓVOA,op. cif. (1986), pp. 312-314 e pp. 355-358.(34) Francisco José <strong>do</strong>s Santos MARROCOS -Memória sobre o esta<strong>do</strong> <strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s menoresem Portugal (1799), publicada in Revista deEducação e Ensino, VI1 ano, 1892, p. 541.C5) «Instrução Nacional)), O Concilia<strong>do</strong>r Lusitano,n.9 XVII, vol. I, 30 de Setembro de 1822,p. 262.Te) Cf. António NÓVOA, «Jornal Mensal daEducação: publicada há 150 anos a primeirarevista pedagógica portuguesa)), Jornal da Edu-caqão, Ano VII, n.' 86, Outubro de 1985, pp. 14--15.r) Luiz Filipe LEITE-((Discurso de aberturada <strong>Escola</strong> Normal Primária de Lisboa)),Boletim Geral de Instrução Pública, n.? 13, 30de Abril de 1862, p. 189.C8) João Andrade CORVO - A instruçãopública, Lisboa, 1866, p. 21.(3g) Luiz Filipe LEITE, - art. cit. (1862),p. 193.(40) João Andrade CORVO - op. cit. (1866))p. 21.(") Luiz Filipe LEITE - art. cit. (1862),pp. 194-195.(") J. A. Simões RAPOSO - ConferênciasPedagógicas <strong>do</strong> Porto em 1885, Porto, Typographia<strong>do</strong> Commercio <strong>do</strong> Porto, 1585, p. 6.(43) Luiz Filipe LEITE - art. cit. (1862),p. 195.(") Manuel FERREIRA -«A necessidade depreparação pedagógica <strong>do</strong> <strong>professor</strong>a<strong>do</strong> portuguez)),Revista de Educação e Ensino,, I1 ano.1887, p. 157.(45) D. António da COSTA - A instruçãonacional, Lisboa, Imprensa Nacional, 1870,pp. 195 e 199.(*') Ver a este propósito os trabalho de:Aurea ADÃO - O estatuto sócio-profissional<strong>do</strong> <strong>professor</strong> primário em Portugal (I901-1951),Oeiras, Instituto Gulbenkian de Ciência, 1984.Gomes BENTO, O movimento sindical <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es (finais da Monarquia e I." República),Lisboa, Ed. Caminho, 2." ed., 1972.(") Cf. Reforma da Instrução Primária-Decretada em 24 de Dezembro de 1901, Porto,Liv. Portuense de Lopes & C.", 1902, p. 36.('*)Cf. os trabalhos já cita<strong>do</strong>s de AureaADÃO (1984) e Gomes BENTO (1978).(") Teófilo FERREIRA - {{Necessidade daFederação <strong>do</strong> Professora<strong>do</strong> Primário Portuguez)),O Ensino, n.' 24, Dezembro de 1886, p. 373.(") Discurso de Manuel de ARRIAGA, inTerceiro Congresso Pedagógico (Abril de 1912),Lisboa, Imprensa Nacional, 1913, p. 344.(") J. Simões DIAS - A escola primária emPortugal, Porto, Educação Nacional, 1897, p. 16.(") A<strong>do</strong>lfo LIMA - «O recrutamento <strong>do</strong>s<strong>professor</strong>es)), Revista de Educação, série 111,n.? 4, Abril de 1915, p. 361.(") Canhão JÚNIOR - «Ao Professora<strong>do</strong>Primário Português)), A Federação <strong>Escola</strong>r,n.g 327, 22 de Junho de 1918.(") O Professor Primário, n." 107, 6 de Outubrode 1921.(") O Professor Primário, n.O 365, 28 de Novembrode 1926.(") Carta de prisão de A<strong>do</strong>lfo Lima (Outubrode 1927), gentilmente cedida pela família destepedagogo.(") Artigo de A<strong>do</strong>lphe FERRIÈRE publica<strong>do</strong>no Journal de Genève, de 12 de Novembro de1927.(5*) <strong>Escola</strong> Nova, Ano I, n.Q 1, 25 de Julhode 1924.c*) John DEWEY, L'école et I'enfunt, Neuchâtel,Delachaux & Niestlé, 2.' ed., 1922, pp.143 e segs.(60) A<strong>do</strong>lfo LIMA-«A autonomia <strong>do</strong>s educan<strong>do</strong>s»,Educqão Social, n.? 4, 2.p ano, 15 deAbril de 1925, pp. 106-121.c) A<strong>do</strong>lphe FERRIÈRE - Transformemosa escola, Paris, Truchy-Leroy, s. d. (1928) pp. 11--16.(") Autobiografia manuscrita de António Sérgio(1914-1915): Archives de l'lnstitute Jean--Jacques Rousseau (Genève).(") A<strong>do</strong>lfo LIMA, op. cit., vol. I (s. d., 1929),p. 488.(64) Louis NOT- «Sciences ou Science de'I'Éducation?)), in Une science spécifique pourZ'éducution?, Toulouse, Universidade de Toulouse- Le Mirail, 1984, pp. 17-19.(65) E. M. CAMPAGNE -Dicionário Universalde Educação e Ensino, Porto, Liv. Internacionalde Ernesto Chardron, vol. 111 (1886),p. 208.438


(") Alexander BAIN - La science de l'éduciztion,Paris, Lib. Gemer BailMre, 2.' ed.,1880, p. V.("') François GUEX - Histoire de l'instructionet de l'éducation, Lausanne, Payot & Cie.,1906, p. 601.(") M. A. FERREIRA-DEUSDADO-«Psychologiaapplicada a educação)), Revista de Educaçãoe Ensino, VI1 ano, 1892, pp. 52-53.("? Daniel HAMELINE -«Le statut de Iapédagogie)), in Encyclopaedia Universalis, vol. 12,-980, p. 673.r) Jean HOUSSAYE - ((L'esclave pédagogueet ses dialogues)), Éducation et Recherche,n.' 1, 1984, p. 31.(") Ibidem, p. 47.(") A<strong>do</strong>lphe FERRIhRE - A escola activa,Porto, Educação Nacional, 1934, p. XII.(73) Daniel HAMELINE - op. cit. (1979,p. 172.(") Prefácio de D. HAMELINE e D. PIVE-TEAU A tradução francesa <strong>do</strong> livro de NeilPOSTMAN, Enseigner c'est résister, Paris, LeCenturion, 1981, pp. 16-17.r) Antoine LgON - «La profession enseignante:motivations, recyclage, promotion)), inTraité des Sciences Pédagogiques, Paris PUF,vol. 7, 1978, p. 29.r) Cf. o livro de Jacky BEILLEROT,Idéologie du savair - Militcrnts politiques etenseignants, Paris, Casterman, 1979.C') A.-M. HUBERMAN - ((L'évolution dela formation américaine)), in Traité des SciencesPédagogiques, Paris, PUF, 1978, p. 324.(') António SgRGIO - Virtudes fundamentaisda reforma da educação (Conferência naSociedade de Geografia, em 25-VII-1923) (brochurasem qualquer indicação), pp. 24-25.43 9


CONGRESSOSO 1987 - Julho, 15 a 17 - Bruxelas - BÉLGICA{t 1 O.' Conferência Internacional sobre Avaliação daPersonalidade»(Universidade de Minnesota, Univ. Livre de Bruxelas, Univ.de Antuérpia).1988 - Agosto, 28 - Setembro, 2 - Sidney-AUSTRALIA«XXIV Congresso Internacional de Psicologia»Informações: The Secretariat, XXIV ICP, GPO Box 2609,Sidney, N.S.W., Austrália 2001.O 1989 - Julho, 2 a 7 - Amesterdão-HOLANDA«I? Congresso Europeu de Psicologia»(European Federation of Professional Psychologist Assoc.)Informações: Congress Secretariat, P. O. Box 5362,1007 AJ Amsterdam. The Netherlands.1990 - Julho 22 a 27 - Kyoto-JAPAO«XXII Congresso Internacional de Psicologia Aplicada»Informações: Secretariat, 22nd IAAP Congress, c/o KyotoInternational Conference Hall,, Takara - Ike,Sakyo-Ku 606, Kyoto, Japan.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!