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JULHO-agosto-2017

Edição nº: 231 e 232

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16 Lusitano<br />

DIREITO<br />

Divórcio, alimentos<br />

DANIEL BOHREN<br />

ADVOGADO<br />

O Senhor S. divorciou-se por mútuo consentimento<br />

em Portugal da sua mulher. A sua<br />

mulher tinha um advogado; ele não. Ele assinou<br />

um acordo de divórcio, segundo o qual<br />

ele teria de pagar por cada um dos dois filhos<br />

alimentos no valor de CHF 700,00 mensais<br />

acrescidos da metade das despesas. As crianças<br />

vivem junto da mãe na Suíça. O tribunal<br />

português que julgou o divórcio homologou<br />

o acordo. A seguir o Senhor S. verificou que,<br />

com o seu vencimento de CHF 3.700,00, não<br />

se encontra em condições, de pagar para<br />

além do seu sustento os alimentos na íntegra.<br />

O que pode ele fazer?<br />

O caso permite-me esclarecer algumas perguntas<br />

fundamentais relativas ao divórcio, com os seus<br />

efeitos judiciais acessórios e as suas relações internacionais.<br />

O divórcio por mútuo consentimento só é possível<br />

em Portugal, se as partes tiverem chegado a acordo<br />

sobre os interesses das crianças. É por isso necessário<br />

um acordo sobre com quem a criança fica<br />

a viver, de como o contacto com o outro progenitor<br />

é feito e que alimentos são pagos. O acordo entre<br />

os pais tem de ser homologado pelo tribunal de família.<br />

O tribunal examina se o acordo é feito para<br />

o bem superior da criança. No caso do Senhor S. o<br />

tribunal homologou o acordo.<br />

As sentenças de divórcio portuguesas com os seus<br />

efeitos judiciais acessórios (alimentos, etc…) são<br />

basicamente válidos e exequíveis na Suíça. Os alimentos<br />

podem no entanto ser posteriormente reduzidos<br />

(ou levantados), se as condições se tiverem<br />

alterado desde o divórcio, se as alterações forem<br />

duradouras e não surgirem propositadamente. Se<br />

o devedor de alimentos por exemplo perde o seu<br />

emprego e ganha menos no novo posto de trabalho,<br />

pode exigir a redução dos alimentos, não<br />

podendo contudo fazê-lo se decidir livremente só<br />

trabalhar part-time. Também quem é de novo pai,<br />

pode exigir uma redução dos alimentos dos filhos<br />

mais velhos, para que o filho mais novo também<br />

obtenha a sua parte. Regra geral uma pessoa torna-se<br />

livremente pai, mas o tornar-se pai também<br />

é válido como direito de personalidade, pelo que<br />

neste caso pode, apesar de voluntariedade da alteração,<br />

ser exigida uma redução dos alimentos.<br />

O Senhor S. não poderá aliás tirar partido de uma<br />

alteração dos alimentos, porque as condições não<br />

se alteraram desde o divórcio. O seu problema é<br />

a assinatura irreflectida de um acordo. Não é aqui<br />

possível a queixa para alteração.<br />

Pode não obstante haver uma solução para o problema<br />

do Senhor S. exactamente como em Portugal<br />

também na Suíça um acordo entre os pais sobre<br />

os alimentos tem de ser examinado e homologado<br />

pelo tribunal. O Tribunal Suíço também examina,<br />

se o montante dos alimentos estipulado teve em<br />

consideração as condições económicas de ambos<br />

os pais. Para tal o tribunal tem de esclarecer as<br />

condições económicas de ambos os progenitores,<br />

o que o tribunal de Portugal não fez. Segundo uma<br />

decisão do Tribunal de Apelação de Zurique de<br />

2012 encontra-se agora infringida a ordem pública,<br />

quando o tribunal não esclarece antes da autorização<br />

do acordo sobre alimentos para crianças<br />

aprofundadamente as condições económicas dos<br />

pais.<br />

O tribunal português aplicou na autorização do<br />

acordo manifestamente o direito português. A Suíça<br />

e Portugal assinaram aliás a Convenção de Haia<br />

sobre a Lei Aplicável às Obrigações Alimentares<br />

de 1973. De acordo com a Convenção para a obrigação<br />

do sustento de crianças menores deve ser<br />

sempre aplicado o direito do país, onde as crianças<br />

têm de facto a sua residência – no caso do Senhor<br />

S. trata-se do direito suíço. Segundo o direito suíço<br />

a autorização do acordo pelo tribunal sem esclarecimento<br />

aprofundado das condições económicas<br />

infringe a ordem pública. Com estas condições<br />

prévias a sentença de divórcio portuguesa não deverá<br />

ser reconhecida na Suíça, quer dizer a sentença<br />

não seria aqui exequível.<br />

O que significa isto para o Senhor S.? Ele pode reduzir<br />

os alimentos para um valor, que ache adequado.<br />

A mãe das crianças poderia então tentar executar<br />

na Suíça a sentença de divórcio portuguesa. Se<br />

o tribunal competente para a execução recusar o<br />

reconhecimento da sentença, a sentença de divórcio<br />

é lacunar e a mãe das crianças poderia/teria de<br />

apresentar queixa na Suíça quanto à atribuição de<br />

alimentos. O tribunal suíço examinaria então antes<br />

de estipular o montante dos alimentos as condições<br />

económicas de ambas as partes progenitoras<br />

e determinaria depois alimentos apropriados. Se<br />

estes são então mais baixos do que os estipulados<br />

pela sentença portuguesa, é incerto e depende da<br />

totalidade das condições. Garantido seria todavia,<br />

que o tribunal suíço teria de ter em conta o mínimo<br />

de subsistência do Senhor S. Este mínimo é calculado<br />

com base num montante global de subsistência<br />

(CHF 1.200,00 para adultos, que vivem sozinhos),<br />

o montante da renda de aluguer da casa e os prémios<br />

o seguro de assistência médica (Krankenkasse),<br />

assim como as despesas para poder trabalhar<br />

(despesas do transporte para o trabalho, de vestuário<br />

de trabalho). Se S. paga, por exemplo, CHF<br />

1.300,00 de renda de casa, CHF 300,00 para o seguro<br />

de assistência médica e CHF 100,00 para o<br />

autocarro, então o seu mínimo de existência comporta<br />

CHF 2.900,00. O tribunal obrigá-lo-ia, com<br />

um vencimento de CHF 3.700,00, a pagar no máximo<br />

CHF 800,00 de alimentos quer dizer Fr. 400<br />

para cada criança.<br />

Outra coisa seria com uma execução da sentença<br />

portuguesa em Portugal. Aí a sentença seria exequível,<br />

o que se pode tornar num problema, se o<br />

Senhor S. tiver património em Portugal.<br />

Tem perguntas que digam respeito ao direito?<br />

Envie a sua pergunta com a indicação “Lusitano” a:<br />

Bohren Rechtsanwalt, Postfach 229, 8024 Zürich<br />

ou para mail@dbohren.ch

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