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Descolonizar_o_Imaginario_web

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se inscrevendo diferentes sentidos emancipatórios. Nestes,<br />

o comunitário aparece como marco inspirador e núcleo comum,<br />

para além das dificuldades de traduzi-lo em experiências<br />

(não é possível idealizar o mundo comunitário indígena<br />

nem ignorar as diferentes declinações do comunitário<br />

na América Latina) ou de traduzi-lo em políticas públicas<br />

concretas, diante do extrativismo reinante. A ameaça é seu<br />

precoce esvaziamento por conta de retóricas de legitimação<br />

governamental – como acontece de certa forma na Bolívia<br />

– ou sua possível “vampirização” por parte dos organismos<br />

internacionais, como já aconteceu em outras épocas com<br />

outras noções de grande potencialidade política.<br />

154<br />

Direitos da Natureza<br />

Essa perspectiva jurídico-filosófica, baseada na ecologia<br />

profunda, aparece ilustrada na nova Constituição equatoriana,<br />

cujo caráter inovador dá conta do que Eduardo<br />

Gudynas chamou de “giro biocêntrico”, 14 com o objetivo<br />

de destacar o deslocamento de uma visão antropocêntrica<br />

da Natureza para outra, que considera a Natureza como sujeito<br />

de direitos. Nessa linha, se estabeleceriam igualmente<br />

diferentes tipos de cidadania (cidadania ambiental e metacidadania<br />

ecológica), ou dois tipos de justiça independentes:<br />

a justiça ambiental, que exige condições sociais equitativas<br />

e um meio ambiente sadio e não contaminado, e a justiça<br />

ecológica, relacionada à sobrevivência de espécies e ecossistemas<br />

como redes de vida. 15<br />

14 Eduardo Gudynas, “La ecología política del giro biocéntrico en<br />

la nueva Constitución del Ecuador” (Revista de Estudios Sociales,<br />

Bogotá, n.32, p.34-47, 2009).<br />

15 Eduardo Gudynas, “Diez tesis urgentes sobre el nuevo extractivismo.<br />

Con textos y demandas bajo el progresismo sudamericano actual”<br />

(Extractivismo, política y sociedad. Quito: Centro An dino de Acción<br />

Em sintonia com essa visão, uma das maiores<br />

expressões do giro ecoterritorial foi a proposta do<br />

governo equatoriano, em maio de 2007, de não explorar<br />

o petróleo do Parque Nacional Yasuní (no bloco<br />

Ishpingo-Tambococha-Tiputini, conhecido como itt,<br />

onde se encontram reservas estimadas em 900 milhões<br />

de barris), isto é, de manter o petróleo debaixo da terra,<br />

com a ideia de combater a mudança climática, proteger<br />

a biodiversidade e apoiar as culturas isoladas. Enfim, de<br />

promover um tipo de desenvolvimento social baseado<br />

na conservação da Natureza e na promoção de energias<br />

alternativas. A comunidade internacional participaria<br />

com uma compensação financeira, criando um fundo<br />

de capital administrado pela onu, com a participação do<br />

Estado equatoriano, a sociedade civil e os contribuintes.<br />

O Yasuní, situado na Amazônia, é a porção de floresta<br />

mais biodiversa do planeta: “Em um só hectare há<br />

tantas espécies de árvores quanto em todo os Estados<br />

Unidos e o Canadá juntos”. 16 O Parque Nacional<br />

Yasuní é, além disso, habitat dos huaorani e de alguns<br />

dos últimos povos indígenas que ainda vivem em isolamento<br />

voluntário, sem contato com outras culturas.<br />

Organizações de povos originários, como<br />

a Confederação de Nacionalidades Indígenas do<br />

Equador, e ongs ambientalistas, como Acción<br />

Ecológica, muito ativas nesse campo, 17 ilustram o giro<br />

ecoterritorial das lutas no Equador. Isso não apenas<br />

porque estamos falando do país em que se traçaram<br />

importantes inovações jurídicas e constitucionais, como<br />

155<br />

Popular e Centro Latino Ameri cano de Ecología Social, 2009);<br />

Alberto Acosta, “Maldiciones que amenazan la democracia”<br />

(Revista Nue va Sociedad, Buenos Aires, n.229, 2010).<br />

16 Cf. .<br />

17 Alberto Acosta, “Maldiciones que amenazan la democracia”,<br />

op. cit..

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