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Descolonizar_o_Imaginario_web

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ao “extrativismo” e o consequente surgimento do conceito<br />

de “neoextrativismo”, que caracteriza as políticas econômicas<br />

de alguns regimes da região. Dessa maneira, pesquisadoras<br />

e pesquisadores das Ciências Sociais da América Latina<br />

vêm dotando de sólidos fundamentos teóricos a crescente<br />

resistência contra a destruição da Natureza em todo o continente.<br />

Seus estudos e análises reforçam essa posição. 1<br />

Depois de vencer as eleições presidenciais venezuelanas<br />

em 1998, Hugo Chávez proclamou uma ruptura<br />

com os regimes anteriores. Seu fundamento econômico<br />

foi a passagem do extrativismo ao neoextrativismo, assim<br />

denominado e explicado em todas suas dimensões por<br />

intérpretes posteriores. 2 No campo político, uma nova<br />

Constituição marcou também uma ruptura: ampliou a democracia<br />

representativa com muitos elementos de democracia<br />

direta e garantiu maiores direitos às minorias étnicas<br />

da Venezuela. Depois, alguns países latino-americanos<br />

tomaram um rumo parecido: novos líderes chegaram ao<br />

poder pela via eleitoral e iniciaram seu governo com novas<br />

338<br />

1 Refiro-me, entre outras pessoas, a Eduardo Gudynas (Uruguai),<br />

Maristella Svampa (Argentina), Edgardo Lander (Venezuela),<br />

Esperanza Martínez e Alberto Acosta (Equador); e, também, a<br />

Boaventura de Sousa Santos (Portugal), que colaborou nos processos<br />

constitucionais no Equador e na Bolívia e que, com seus trabalhos,<br />

quer construir uma ponte entre Ernst Bloch e o Bem Viver.<br />

2 Um compêndio excelente sobre “extrativismos” é o livro mais<br />

recente de Eduardo Gudynas, Extractivismos: ecología, economía<br />

y política de un modo de entender el desarrollo y la Naturaleza<br />

(Cochabamba: Cedib, 2015). Especificamente sobre Venezuela,<br />

ver Víctor Álvarez, “La transición al socialismo de la revolución<br />

bolivariana: transiciones logradas y transiciones pendientes” (In:<br />

Edgardo Lander, Carlos Arze, Javier Gómez, Pablo Ospina Peralta<br />

e Víctor Álvarez, Promesas en su laberinto: cambios y continuidades en<br />

los gobiernos progresistas de América Latina. La Paz, Quito e Caracas:<br />

Cedla/iee/cim, 2013) e Víctor Álvarez, “Claves para salir de las<br />

trampas del rentismo: Venezuela, post-extractivismo e inserción en<br />

el mercado mundial” (In: Miriam Lang et al. [orgs.], La osadia de<br />

lo nuevo: alternativas de política económica. Quito: Fundação Rosa<br />

Luxemburgo; Abya Yala, 2015).<br />

constituições, que romperam com as “partidocracias”<br />

dos regimes anteriores. 3<br />

Em seu propósito de dar um nome às implicações<br />

dessa mudança de governo, Hugo Chávez optou, primeiro,<br />

por um olhar para o passado, e reivindicou a herança<br />

de Simón Bolívar. Sua luta contra o regime colonial e<br />

sua advertência sobre o perigo de uma nova dependência<br />

dos Estados Unidos foram as razões para usar como<br />

exemplo a figura do libertador e se referir à República<br />

da Venezuela como “bolivariana”. O termo “bolivariano”<br />

podia também ser aplicado aos novos governos do<br />

Equador e da Bolívia, por seus vínculos históricos com<br />

o libertador e por sua proximidade com o “chavismo”.<br />

A vagueza do conceito foi útil, porque permitia encontrar<br />

um denominador comum para governos e correntes<br />

afins, sem fixações dogmáticas prematuras.<br />

No entanto, em 2005, depois de novas vitórias<br />

eleitorais, Hugo Chávez decidiu definir seu movimento<br />

não apenas pela herança de Simón Bolívar, mas também<br />

como um olhar para o futuro e passou a falar, desde<br />

então, em “socialismo do século xxi”. 4 Por distintas<br />

razões, nem todos os partidários ou simpatizantes do<br />

chavismo queriam seguir Hugo Chávez nessa nova<br />

terminologia, demasiadamente ambiciosa. Talvez por<br />

isso tenha surgido um novo termo para denominar os<br />

339<br />

3 Falamos, neste ensaio, de Bolívia e Equador depois da vitória<br />

eleitoral de Evo Morales (2005) e Rafael Correa (2006).<br />

4 Não houve debate prévio que culminou no lema do socialismo<br />

do século xxi. Foi uma decisão de Hugo Chávez que chegou<br />

como surpresa inclusive para seus seguidores. Tenho recordações<br />

pessoais de conversas com militantes destacados do Partido<br />

Comunista da Venezuela (pcv) no momento em que o novo lema<br />

surgiu: os membros do pcv mostraram-se muito contentes porque<br />

se falava outra vez do socialismo, mas preocupados porque<br />

se poderia esquecer que o socialismo real do século xx também<br />

foi muito bom. Não será possível aprofundar a problemática do<br />

socialismo do século xxi neste breve ensaio.

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