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23-2-2017<br />
INTERNACIONAL 27<br />
Desmantelamento da Previdência contestado<br />
Travar a marcha à ré no Brasil<br />
No âmbito da preparação das jornadas marcadas<br />
para 8 e 15 de Março, nove centrais<br />
sindicais brasileiras promoveram anteontem<br />
um protesto contra o desmantelamento do<br />
sistema de previdência.<br />
De acordo com informações<br />
disponibilizadas no sítio<br />
da Internet da Central<br />
dos Trabalhadores e Trabalhadoras<br />
do Brasil (CTB),<br />
as estruturas sindicais previam<br />
levar a Brasília e às<br />
reuniões solicitadas a todas<br />
as forças com representação<br />
parlamentar a rejeição<br />
do pacote normativo que o<br />
executivo golpista liderado<br />
por Michel Temer pretende<br />
impor.<br />
Daqui até 16 Março será<br />
uma corrida contra o tempo,<br />
admitem as centrais,<br />
uma vez que o presidente<br />
da câmara baixa do Congresso<br />
já fez saber que<br />
pretende que a Proposta<br />
de Emenda Constitucional<br />
(PEC) seja discutida e votada<br />
numa dezena de sessões.<br />
Isto apesar de o hemiciclo<br />
dispor da faculdade<br />
de o fazer em 30 sessões<br />
e, mais importante, de o Supremo<br />
Tribunal Federal do<br />
Brasil ter instado o governo<br />
a sustentar com factos<br />
os argumentos que indicam<br />
que a «reforma» é necessária<br />
devido a um alegado défice<br />
inultrapassável nas contas.<br />
A proposta<br />
representa um<br />
grande<br />
retrocesso,<br />
afirma a CTB<br />
A batalha dos números<br />
está, aliás, a fazer correr<br />
muita tinta no Brasil e deverá<br />
prolongar-se entre deputados<br />
e especialistas, em<br />
comissões e estudos. O fundamental,<br />
porém, é que<br />
subsistem dúvidas muito para<br />
além do razoável acerca<br />
dos dados apresentados pelo<br />
executivo de Michel Temer,<br />
estando mesmo em<br />
causa não apenas a sua fiabilidade<br />
mas uma clara intenção<br />
manipuladora.<br />
Multiplicam-se as denúncias<br />
(de juristas, por exemplo)<br />
que indicam que as dívidas<br />
das maiores empresas<br />
ao sistema público de<br />
Segurança Social são o triplo<br />
do défice apresentado<br />
pelo governo para defender<br />
o desmantelamento da Segurança<br />
Social; que a manutenção<br />
na esfera estatal<br />
de importantes empresas e<br />
Os trabalhadores brasileiros têm contestado a «reforma»<br />
da Previdência, como sucedeu a semana passada em Minas<br />
Gerais, Rio de Janeiro e Porto Alegre.<br />
a exploração de recursos<br />
naturais, que o governo teima<br />
em privatizar, permitiriam<br />
colocar o sistema em<br />
superavit; que os incumprimentos<br />
dos estados estão<br />
na base de situações pontuais<br />
de ruptura financeira<br />
e que do ponto de vista económico<br />
não existem certezas<br />
sobre a insustentabilidade<br />
do sistema.<br />
Todos à rua<br />
«Temos um tempo muito<br />
exíguo», realçou o líder da<br />
CTB, Adilson Araújo, para<br />
quem «a proposta representa<br />
um grande retrocesso para<br />
a classe trabalhadora e<br />
para o país».<br />
Na segunda-feira, 20, a<br />
Comissão Política do Partido<br />
Comunista do Brasil (PCdoB)<br />
divulgou um comunicado<br />
no qual considera o<br />
PEC da Previdência «uma<br />
verdadeira declaração de<br />
guerra do governo ilegítimo<br />
de Michel Temer».<br />
O PCdoB apela a uma<br />
ampla mobilização para as<br />
jornadas dos dias 8 e 15 de<br />
Março convocadas por estruturas<br />
unitárias – movimento<br />
feminista, centrais<br />
sindicais e frentes Brasil Popular<br />
e Povo Sem Medo.<br />
Trabalhar até morrer<br />
O PEC 287 visa desmantelar um sistema orientado<br />
pelos princípios da solidariedade e universalidade,<br />
mudando as disposições em vigor de acesso à<br />
aposentadoria e de cálculo<br />
dos valores a que os<br />
beneficiários terão direito.<br />
Nesse sentido, o governo<br />
brasileiro propõe, entre<br />
outras:<br />
O estabelecimento da<br />
idade mínima nos 65 anos<br />
para todos os<br />
trabalhadores, sem<br />
diferenciação de género,<br />
desconsiderando<br />
actividade penosas e<br />
desgastantes e as enormes<br />
diferenças na esperança<br />
média de vida que se<br />
registam entre as várias<br />
regiões do Brasil. Neste<br />
sentido, os trabalhadores<br />
rurais, os membros das<br />
comunidades originárias e<br />
as mulheres são particularmente penalizados.<br />
Aumento do período mínimo de descontos mensais<br />
de 15 para 25 anos consecutivos num mínimo total<br />
de 49 anos (65 anos menos 16, que no Brasil é a<br />
idade mínima para iniciar actividade laboral<br />
regular). Na prática, tal torna quase impossível<br />
aceder à pensão integral em virtude da precarização<br />
dos vínculos laborais, que colocam a maioria dos<br />
trabalhadores em situação de inactividade ou<br />
informalidade forçadas por diversos períodos ao<br />
longo da respectiva carreira contributiva, mesmo<br />
considerando que se inicia os descontos aos 16<br />
anos, o que não é de todo o mais normal.<br />
Os homens com mais de 50 anos e as mulheres com<br />
mais de 45 são sujeitos a uma transição que os<br />
obriga a acréscimos de descontos de 2,5 anos, ao<br />
que se soma o facto de as regras de cálculo serem<br />
alteradas dos actuais 80 por cento dos melhores<br />
valores médios auferidos para 51 por cento,<br />
levando a que em qualquer situação os<br />
trabalhadores sejam penalizados face ao actual<br />
regime.<br />
«A administração Trump, a situação nos EUA e suas<br />
repercussões na situação internacional» foi o tema de um<br />
debate promovido pelo Conselho Português para a Paz<br />
e Cooperação (CPPC) ao final da tarde de segunda-feira,<br />
20, na Casa do Alentejo, em Lisboa. Mais de uma<br />
centena de pessoas compareceram à iniciativa que teve<br />
como oradores convidados Ilda Figueiredo, presidente<br />
da Direcção Nacional do CPPC, José Goulão, jornalista,<br />
e Pedro Pezarat Correia, major-general (na reserva).<br />
Com este debate, como afirmou Ilda Figueiredo na sua<br />
intervenção inicial, o CPPC procura contribuir para o<br />
aprofundamento da discussão e análise da situação internacional<br />
decorrente da eleição de Donald Trump para<br />
a presidência norte-americana, não esquecendo o contexto<br />
em que tal decorre quer nos EUA quer na Europa,<br />
e considerando ainda a crise económica e social em<br />
resultado da globalização neoliberal e a proliferação de<br />
conflitos, sobretudo no Médio Oriente e em África, que<br />
originam uma situação marcada por grande incerteza e<br />
instabilidade.<br />
Relativamente aos EUA acentuou-se a agudização da<br />
crise naquele país, com o agravamento das desigualdades<br />
económicas e sociais, o crescimento da pobreza. Essa<br />
situação e a utilização de vastos recursos nas guerras<br />
em que os EUA se envolveram, directamente ou através<br />
da NATO, provocou descontentamentos que se reflectem<br />
na eleição de Donal Trump, considerou José<br />
Goulão, para quem esta conjuntura não é muito diferente<br />
do que se está a viver na Europa. Recordou a esse<br />
propósito os muros erguidos contra os refugiados e as<br />
políticas anti-sociais e amputações da democracia, de<br />
que não faltam exemplos na própria União Europeia. Os<br />
casos da Hungria, Ucrânia, e outros países da região,<br />
CPPC levou Trump a debate<br />
não esquecendo a França, foram abordados por outros<br />
participantes no debate.<br />
No plano do militarismo, Ilda Figueiredo recordou o<br />
envio para a Europa (designadamente para a Polónia e<br />
outros países que fazem fronteira com a Federação Russa),<br />
nas últimas semanas da administração Obama, de<br />
milhares de tropas e material bélico pesado de última<br />
geração, o que resultou das decisões da Cimeira da NA-<br />
TO realizada em Varsóvia no Verão de 2016.<br />
Pezarat Correia, por seu lado, salientou a posição imperial<br />
que os EUA têm assumido, com um Conselho de<br />
Segurança da ONU onde, considera, aproveitando o facto<br />
de cinco estados terem direito de veto, a Casa Branca<br />
continuar a dominar. O caso da Palestina foi recordado,<br />
seja pelos anúncios recentes da administração<br />
Trump, seja pelas posições anteriores, lamentando-se<br />
que Obama só no final do mandato tenha aceite a condenação<br />
da política dos colonatos israelitas, ao mesmo<br />
tempo que se assumiu como um grande financiador da<br />
militarização de Israel.<br />
Conquistar a paz<br />
No debate apelou-se à defesa e promoção da paz<br />
No debate que incluiu várias intervenções da plateia,<br />
foi recordado que nos últimos anos os EUA têm vindo a<br />
promover agressões militares baseadas em mentiras e<br />
manipulações para dar cobertura ao saque dos recursos<br />
e riquezas dos países invadidos pelas multinacionais, as<br />
norte-americanas e as dos seus aliados. Particularmente<br />
interessante foi o testemunho de um militar português<br />
que denunciou a crescente mercantilização da guerra<br />
dando como exemplo a experiência no Mali, constatando<br />
que eram as multinacionais que exploravam as riquezas<br />
daquele país quem pagava a missão da ONU.<br />
Como também foi salientado na iniciativa, a incerteza<br />
que se vive não pode ser aproveitada para alimentar o<br />
medo e agravar a corrida aos armamentos na UE. Nem<br />
para o reforço da União Europeia como pilar europeu<br />
da NATO, como alguns defendem, ou para confundir<br />
paz com segurança.<br />
No final, Ilda Figueiredo relembrou vários aspectos do<br />
artigo 7.º da Constituição da República Portuguesa, incluindo<br />
a defesa do desarmamento geral e controlado,<br />
a dissolução dos blocos político-militares e o conceito de<br />
paz que o CPPC também defende, o qual não se restringe<br />
à segurança, insistiu. Realçou, igualmente, que para<br />
construir a paz é necessário liberdade, democracia, desenvolvimento<br />
e progresso social; o reconhecimento do<br />
direito soberano de cada povo escolher o seu caminho.<br />
E os povos lutam e exigem o respeito pelos seus direitos,<br />
merecendo por isso a solidariedade de todos os amantes<br />
da paz.