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Luzes da Civilização Cristã<br />
château de Versailles (CC3.0)<br />
Luís XIV - Museu de História da França,<br />
Palácio de Versailles, França<br />
tuso, sabendo estar tratando com Pasteur, sentiria respeito.<br />
Contudo esse respeito vinha da constatação de seus feitos e<br />
não de uma irradiação de sua personalidade.<br />
Outro exemplo, o Marechal Foch. Sua figura nunca<br />
me pareceu irradiante de respeitabilidade. Se eu o visse<br />
andando à paisana num ônibus qualquer, meu olhar não<br />
se deteria nele nem um minuto, mas se o reconhecesse,<br />
pensaria: “O grande Marechal Foch, vencedor da Primeira<br />
Guerra Mundial!”, e lhe prestaria todo o respeito.<br />
Para dar um exemplo nacional, cito Santos Dumont.<br />
É inegável que ele proporcionou um importante avanço<br />
na Ciência ao inventar a dirigibilidade do avião, pelo<br />
que merece um lugar saliente na consideração das pessoas.<br />
Entretanto quem vê sua clássica fotografia, com<br />
aquele chapelão, não exclama: “Como sua personalidade<br />
irradia superioridade!” Porque não irradia.<br />
Esses exemplos correspondem, sem dúvida, a uma<br />
respeitabilidade autêntica e muito alta, mas incutida pelo<br />
mérito do sujeito e não irradiada por sua personalidade.<br />
Portanto, não é uma respeitabilidade proveniente do<br />
homem inteiro, mas de uma zona de sua alma, de uma<br />
capacidade. A respeitabilidade de Luís XIV, ao contrário,<br />
vinha de sua personalidade e irradiava dele inteiro.<br />
Analogia com a visão beatífica<br />
Então, em face do conceito segundo o qual há uma<br />
forma especial de superioridade que irradia, o que é essa<br />
superioridade?<br />
Em certo sentido, o corpo é o símbolo da alma, e as<br />
propriedades da alma irradiam através dele quando<br />
a pessoa possui certos gêneros de atributos num grau<br />
muito alto, por onde ao ver o aspecto físico de alguém de<br />
alguma maneira se discerne a alma, e se nota, de modo<br />
espiritual, uma realidade que fica por cima da realidade<br />
física. Assim, percebe-se a respeitabilidade na alma.<br />
Trata-se, pois, de um discernimento que vai além do<br />
olhar, e corresponde a um bem de ordem espiritual percebido<br />
através da consideração dos aspectos físicos. Olhando<br />
para a face de Luís XIV, percebo simbolicamente um<br />
bem de sua alma, a majestade de um rei no sentido pleno<br />
da palavra. Assim, através das aparências sensíveis,<br />
apreendo realidades espirituais que os sentidos não atingem,<br />
mas transparecem nos aspectos físicos.<br />
Quem vê o fenômeno espiritual dessa aparência de uma<br />
qualidade moral num homem acaba adquirindo uma ideia<br />
do que é, em si mesma, essa qualidade moral. Mas não é<br />
uma noção oriunda de uma definição; é uma ideia, por assim<br />
dizer, apalpada e sentida. Por mais que alguém definisse<br />
num dicionário ou tratado de Moral o que é majestade,<br />
não teria a noção de majestade que se teve vendo Luís XIV<br />
e, mediante suas feições físicas, a alma do Rei-Sol.<br />
Apalpar assim uma coisa que, entretanto, é abstrata,<br />
leva a outro passo que conduz a Deus. Porque d’Ele não<br />
podemos dizer apenas que é majestoso, mas devemos<br />
afirmar que é a Majestade, pois Deus não somente possui,<br />
mas é as qualidades. De maneira que Ele não é bom,<br />
mas a Bondade; não é sábio, e sim a Sabedoria.<br />
Por conseguinte, se olhando para um homem vi nele a<br />
majestade de sua alma e, através dela, formei uma ideia<br />
do que é a majestade em abstrato, considerada em seu<br />
modo absoluto, eu adquiri algo que tem certa analogia<br />
com a visão beatífica. De fato, mesmo sem explicitar, em<br />
Luís XIV algo da majestade de Deus foi vista.<br />
Isso nos explica<br />
porque aqueles<br />
bandidos recuaram<br />
quando viram<br />
o cadáver de Luís<br />
XIV. Sempre que<br />
um atributo bom e<br />
digno da alma de<br />
um homem aparece<br />
com tanta intensidade,<br />
a ponto<br />
de provocar um<br />
pasmo, uma surpresa,<br />
um entusiasmo,<br />
um enlevo<br />
ou um sentimento<br />
de veneração recolhida,<br />
há uma<br />
transparência de<br />
Alberto Santos Dumont<br />
Museu Paulista da USP (CC3.0)<br />
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