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A Filosofia Explica Grandes Que - Clovis de Barros Filho

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estrita materialidade ou enquanto signo, indicativo de outras coisas. Uma maçã,

por exemplo. É uma fruta. Não há dúvida. Mas indica também alimento, saúde,

pecado, erotismo, dieta e muito mais.

Quando refletimos sobre ética há um complicador. Enquanto no caso da

maçã a materialidade da fruta e a palavra são facilmente distinguíveis, na

ética, o pensamento que se serve da palavra ética e a materialidade da ética se

confundem. Ética é também pensamento. Elucubração intelectiva. Que ganha

completitude na vida, na ação, na convivência.

Pelo fato de ambas remeterem quando enunciadas a alguma

exterioridade e não a outras possíveis – a fruta maçã ao pecado, por exemplo, e

a palavra ética ao valor canalha da conduta – dizemos que todo signo é

ideológico. Seu uso, portanto, não é neutro. Isto é, atende aos interesses

daqueles que deles se servem. Porque significar as coisas do mundo é forma

privilegiada de manifestar o que se pretende. Seja enquanto agente social

singular, seja enquanto membro de um grupo, classe etc.

A título de exemplo. Quando eu digo as palavras “universidade pública”,

confiro-lhes um sentido que me interessa. Cem por cento gratuita, laica, sem

escopo lucrativo, voltada para a pesquisa, para a produção de conhecimento e

para a sociedade como um todo. Mas as mesmas palavras podem querer dizer

muitas outras coisas. E esses múltiplos sentidos têm a ver com os interesses dos

agentes que se servem desta significação. E todos estarão empenhados em

obter a adesão dos demais aos sentidos que lhes convêm. Tornando-os, assim,

legítimos.

Com efeito. Quando relacionamos qualquer coisa a algum significado,

pretendemos que esta coisa queira dizer para os demais o mesmo que quer

dizer para nós. Que todos compartilhem do sentido que a ela estamos

atribuindo. A má notícia é que, na vida em sociedade, nossos interesses podem

ser excludentes dos de outros. Outros que também se servem dos signos. Que

também lhes atribuem sentidos. Sentidos que lhes são convenientes. Alinhados

com suas pretensões.

Por isso, ante interesses contraditórios, haverá luta pela definição do

sentido legítimo, do bom sentido. Considerado óbvio. Porque nomear não é só

dar nome a coisas e a ideias abstratas. É impor uma certa visão do mundo que

convém a quem nomeia. No caso da ética, o troféu é precioso.

Afinal, a todos interessa, em algum momento da vida, participar da

disputa sobre o que se deve e o que não se deve fazer. Na impossibilidade de

propor no quadro deste curso uma história sociológica das noções de ética e

moral e seus interesses correlatos, fiquemos com uma proposta de sentido

aceita e compartilhada por muitos.

Distâncias e tangências

Todo homem – na particularidade de suas trajetórias – vive situações que

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