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A Filosofia Explica Grandes Que - Clovis de Barros Filho

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imperfeição de não ser Deus –, o físico – o sofrimento – e o moral – o pecado,

a canalhice. Do primeiro, o mal metafísico, nos ocuparemos nas aulas sobre

Deus. Interessa-nos aqui os dois outros. O físico e o moral.

O mal físico é sofrimento. E ódio pelo mundo que entristece. Que faz

sofrer. Nada disso se confunde com o mal moral. Que é deliberação racional

inadequada sobre a própria conduta. Mesma distância que separa o amor do

bem moral, da virtude. Amor é sentimento. Afeto do corpo. Inexorabilidade

decorrente dos encontros com o mundo. Sensação que se impõem. O amor é

tudo de bom. Ame e faça o que quiser, propõe Agostinho.

Em contrapartida, virtude é amor falsificado. Parece mas não é. Imitação

de amor. Como se amor houvesse. Assim, generosidade é virtude. Deliberação

moral de dar, que supre a falta de amor. Respeito é virtude. Prêmio de

consolação, racionalmente escolhido, para ocupar o lugar de um amor que já

se foi. Gratidão é virtude. Foi tudo que sobrou. Valeu. Valeu pelos momentos de

amor compartilhados e já pretéritos. Gratidão, para quando se é gente fina. E o

amor acaba com dignidade.

Mas a verdade é que não amamos muito. Não amamos muita gente.

Façamos a conta: filhos pequenos, filhos grandes quando não se tornaram

delinquentes, cônjuges, nos primeiros tempos, pais quando não tiranizaram

muito, alguns amigos talvez. Se espremermos, umas dez pessoas. No caso de

alguém particularmente amoroso, quem sabe o dobro.

Admitamos: falta muita gente. E as relações com as pessoas não podem

contar com o amor. Nem esperar que você as ame. Por isso, a moral é tão

importante. Deliberação autônoma. Que pressupõe alguma soberania da razão.

Justamente quando não há amor. Um sucedâneo dele. Já que não ama, delibere

e faça como se amasse. Um amor prático para Kant. Se amássemos mais,

careceríamos de menos moral.

Mas quando o mal é físico, a assimetria é mais que evidente. Hiper-real.

Porque o amor é escasso. E o ódio, abundante. Inesgotável. Assimetria afetiva.

Excesso de mal. Mediocridade de bem. Afinal, um riso nunca compensará um

choro. Um momento de tranquilidade nunca compensará um de depressão. E

uma criança brincando feliz nunca compensará outra, em choque pela morte

dos pais. Enquanto os orgasmos são efêmeros, em conta-gotas, as dores, estas

contamos aos baldes.

E não pretendemos aqui nenhuma negação da vida. Afinal, todo vivente

continuará lutando pela própria potência, buscando gozar o máximo possível e

sofrer o mínimo possível. Princípio freudiano do prazer já presente em

Montaigne. Trata-se de estender a alegria e diminuir – tanto quanto pudermos –

a tristeza. Mas todo este esforço tem limites. Porque gozar sem entrave esbarra

sempre na existência do outro. Questão moral por excelência. Questão

relevante, quando o amor rareia.

Dever moral

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