Revista Eletrônica de Julho - Centrodoscapitaes.org.br
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Prático <strong>de</strong> araque<<strong>br</strong> />
Comte. Ge<strong>org</strong> Maier – CLC<<strong>br</strong> />
gmaier@<strong>br</strong>.inter.net<<strong>br</strong> />
Navegávamos do porto <strong>de</strong> Santos para Paranaguá no “Loi<strong>de</strong> Nicarágua”, ano <strong>de</strong> 1950, sob o comando<<strong>br</strong> />
do C.L.C. João Gonçalves Filho, com chegada prevista na barra (ETA) para as 1600 horas.<<strong>br</strong> />
Havíamos <strong>de</strong>scarregado em Santos o grosso da carga proce<strong>de</strong>nte dos portos do Norte da Europa.<<strong>br</strong> />
Lisboa tinha sido o último porto <strong>de</strong> carregamento para as escalas no Brasil. Era a tradicional linha <strong>de</strong> Hamburgo<<strong>br</strong> />
que tinha esse porto alemão como último porto <strong>de</strong> <strong>de</strong>scarga (northbound) e lá mesmo o primeiro porto <strong>de</strong><<strong>br</strong> />
carregamento para a pernada <strong>de</strong> volta (southbound). Não existia ainda o atual e mo<strong>de</strong>rno sistema <strong>de</strong><<strong>br</strong> />
conteinerização <strong>de</strong> carga. Assim as estadias nos portos eram relativamente <strong>de</strong>moradas, prolongando-se ainda<<strong>br</strong> />
mais no caso <strong>de</strong> condições atmosféricas adversas. Nossos principais produtos <strong>de</strong> exportação como o café,<<strong>br</strong> />
algodão e sisal, por exemplo, não po<strong>de</strong>riam ser expostos à chuva.<<strong>br</strong> />
A linha do norte da Europa era bastante cobiçada pelos marinheiros. Hamburgo, Rotterdam e<<strong>br</strong> />
Antuérpia eram os maiores portos da época. Cada um com suas atrações. Certamente uma das maiores, como<<strong>br</strong> />
muitos se recordam, era uma Avenida em Hamburgo, no bairro <strong>de</strong> St. Pauli, próximo às docas do Rio Elba,<<strong>br</strong> />
mundialmente conhecida, a famosa Reeperbahn. Essa Avenida, com cabarés para todos os gostos, fervilhava<<strong>br</strong> />
durante as noites com público diverso, principalmente marinheiros <strong>de</strong> todas as procedências que assistiam<<strong>br</strong> />
shows variados e se aliviavam do pesado salitre das travessias. A companhia das “meninas” era invariável e<<strong>br</strong> />
danças e risadas <strong>br</strong>otavam do fundo da alma jovem sem maiores compromissos. Com casa e comida<<strong>br</strong> />
garantidos, tudo era motivo <strong>de</strong> graça, até quando o dinheiro acabava.Quem viveu o apogeu da Reeperbahn<<strong>br</strong> />
sabe muito bem do que estou falando.<<strong>br</strong> />
Desculpem a divagação. Acabei me <strong>de</strong>sviando do assunto que me propus contar.<<strong>br</strong> />
Ao nos aproximarmos da barra <strong>de</strong> Paranaguá, no ETA informado, logo avistamos a lancha da<<strong>br</strong> />
praticagem; navio com máquina parada, escada <strong>de</strong> que<strong>br</strong>a-peito a sotavento, sobe o Prático com <strong>de</strong>senvoltura.<<strong>br</strong> />
Eu, 2º Piloto, guarnecia o telégrafo. Naquela época ainda não havia o acesso ao porto pelo Canal da Galheta.<<strong>br</strong> />
Iniciamos a <strong>de</strong>manda do canal e o Prático, entre uma or<strong>de</strong>m e outra, informa ao Comandante que o navio<<strong>br</strong> />
<strong>de</strong>veria fun<strong>de</strong>ar na franquia interna do porto por pouco tempo enquanto aguardaria o berço <strong>de</strong> atracação<<strong>br</strong> />
ocupado por outro navio prestes a ser liberado.<<strong>br</strong> />
Chegamos então na franquia e fun<strong>de</strong>amos para aguardar a atracação. O Prático pediu para que fosse<<strong>br</strong> />
arriada a escada para <strong>de</strong>sembarcar, pois outro colega seu viria fazer a atracação. Despediu-se do Comandante<<strong>br</strong> />
e dos <strong>de</strong>mais oficiais do passadiço. Quando chegou a minha vez, lem<strong>br</strong>ei-lhe que eu precisava do seu talão <strong>de</strong><<strong>br</strong> />
serviço para preencher e dar para o Comandante assinar. O Prático, meio sem jeito, informou que não tinha o<<strong>br</strong> />
talão. Diante dos protestos do Comandante e titubeando nas respostas, mostrou-se apressado para<<strong>br</strong> />
<strong>de</strong>sembarcar. Sentindo-se acuado, o Prático <strong>de</strong>ixou escapar para assom<strong>br</strong>o <strong>de</strong> todos:<<strong>br</strong> />
- Eu não tenho o talão porque não sou Prático e sim Ajudante <strong>de</strong> Cozinha do posto <strong>de</strong> praticagem da<<strong>br</strong> />
barra. Como não fui substituído por falta <strong>de</strong> condução, aproveitei esta oportunida<strong>de</strong> para voltar para o porto.<<strong>br</strong> />
Sentindo que o tempo ficou péssimo para ele, apressou-se em concluir:<<strong>br</strong> />
- Não precisa mandar ninguém me acompanhar. Eu sei o caminho.<<strong>br</strong> />
E disparou em direção ao convés principal <strong>de</strong>scendo a escada <strong>de</strong> que<strong>br</strong>a-peito para a lancha que o<<strong>br</strong> />
esperava.<<strong>br</strong> />
Foi uma lição para todos nós. Por or<strong>de</strong>m do Comandante o procedimento nos portos em relação a<<strong>br</strong> />
praticagem continuou a ser cortês, envolvendo porém o seguinte ritual na recepção:<<strong>br</strong> />
- Seja bem-vindo Sr. Prático. Seu talão, por favor”.<<strong>br</strong> />
A Capitania dos Portos <strong>de</strong> Paranaguá foi cientificada por ofício do ocorrido.<<strong>br</strong> />
Histórias do Mar Homens do mar<<strong>br</strong> />
Recor<strong>de</strong>, divirta-se, coopere e conte também sua história.<<strong>br</strong> />
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