DEUS - Charles Guimarães Filho

PROSPERIDADE
Fortuna entra com uma maca numa escola ao lado do hospital,
carregando Zeca que está nesta cama em coma. Neste
educandário tem apenas uma luz acesa onde uma velha negra
completamente cegueta, porem muito bem-humorada, sentada
numa mesa com placa escrita indicando ser ela a chefe DOMAR.
DOMAR (sorrindo): Prazer sou a diretora deste colégio. Nascida
e criada em Guiné Bissau e estudei um bacadinho em Serra Leoa.
No que se refere a este educandário ele só funciona durante o dia.
Não vai sozinho querer fazer matrícula há essa hora, não?
FORTUNA (falando para si): Outro guineense, só que é
africano. Ih! Precisamos ficar escondidos aqui por algum tempo.
Ainda bem que ela não enxerga nada. Vou gritar como se fosse
uma fila com bastante gente querendo ser matriculado. (começa a
fazer algazarra e fala): Eu não estou sozinho não, também têm
esses dez meninos atrás de mim. (apontando para o Zeca na
maca): Também tem este aqui na minha frente?
DOMAR (sorrindo): Essa bicha me mata. E o pior é que esses
putos não param de gritar.
ZECA (pensando): Português de Portugal, bicha quer dizer
apenas que ela estava cansada de fila por ser todo dia a mesma
coisa; putos quer dizer meninos.
FORTUNA: Eu exijo mais respeito com o meu amigo deitado,
pois ele não é bicha não, é um baita de mulherengo com cueca
nova, assim como essa sua vestimenta é um fato.
ZECA (pensando): Ih! Mulherengo quer dizer afeminado; cueca
nova é calcinha feminina; fato é roupa masculina.
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