As jóias da coroa - Biblioteca Digital da PUC-Campinas
As jóias da coroa - Biblioteca Digital da PUC-Campinas
As jóias da coroa - Biblioteca Digital da PUC-Campinas
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
dirigindo-lhe algumas palavras tranqüilizadoras, e saiu em seguimento<br />
do velho.<br />
O pobre homem, por um incrível esforço, vencia o peso dos anos<br />
e corria como um desassisado para a quinta do duque...<br />
Estava encantador o dia... Uma transparente manhã difundia-se<br />
no ar. A perspectiva <strong>da</strong>s ruas afunilava-se distintamente através <strong>da</strong><br />
limpidez <strong>da</strong> atmosfera. <strong>As</strong> casas ain<strong>da</strong> tinham fecha<strong>da</strong>s as janelas, como<br />
se temessem a inun<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> luz. Sobre os telhados os gatos arqueavam<br />
a espinha nuns demorados espreguiçamentos matutinos. No fundo dos<br />
quintais os galos solfejavam a música risonha dos cacarejos. Nas<br />
árvores dos jardins, pingava o orvalho <strong>da</strong>s folhas. <strong>As</strong> chaminés<br />
começavam a sacudir para o céu uns lenços diáfanos de fumaça<br />
azula<strong>da</strong>. O estômago dessas casas acor<strong>da</strong>va primeiro que o rosto. Pelos<br />
passeios corriam criados e cria<strong>da</strong>s levando nos braços cestos de<br />
compras, enfeitados de molhos verdes de couves e franjas de cebolas;<br />
pelo céu, corriam pe<strong>da</strong>ços de nuvens com as bor<strong>da</strong>s doura<strong>da</strong>s pelo fogo<br />
<strong>da</strong> aurora.<br />
Uma brisa sem rumo passeava à toa ao longo <strong>da</strong>s paredes...<br />
O particular do duque atravessava pelo meio de todo aquele<br />
admirável amanhecer como atravessaria uma tempestade: possuído <strong>da</strong><br />
sua idéia, chegar ao palácio.<br />
An<strong>da</strong>va sem ver, senão o chão que tinha de pisar.<br />
<strong>As</strong> pessoas que estavam na quinta o viram passar apressado<br />
como se fosse acudir a alguém que pedisse socorro. Eram moradores <strong>da</strong><br />
aldeia e trabalhadores do parque. Reconheceram o particular do duque e<br />
o acompanharam.<br />
O particular subiu de um pulo as esca<strong>da</strong>s do palácio e entrou na<br />
sala do armário, na ocasião mesmo em que o mordomo perguntava por<br />
ele.<br />
Entretanto, o boato do roubo se espalhava, e to<strong>da</strong> a gente <strong>da</strong><br />
quinta agrupava-se sob as janelas encontra<strong>da</strong>s abertas, ou procurava<br />
entrar no palácio para ver com os próprios olhos o arrombamento do<br />
móvel.<br />
— O que aconteceu, sr. mordomo? — perguntou o particular,<br />
logo que respirou...<br />
— Veja este armário arrombado!<br />
O particular sentiu que ia cair e agarrou-se ao armário de que se<br />
aproximara, trêmulo, mais morto que vivo.<br />
O silêncio dos circunstantes deixou que se lhe ouvisse um grito<br />
surdo:<br />
— Roubaram as <strong>jóias</strong>!<br />
O mordomo amparou o pobre homem:<br />
— O que diz? — perguntou com susto.<br />
37