As jóias da coroa - Biblioteca Digital da PUC-Campinas
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O criado titubeou dois segundos e respondeu com uma voz<br />
trêmula:<br />
— Eu...<br />
— E por que deixou abertas as três janelas?<br />
— <strong>As</strong> janelas estavam cerra<strong>da</strong>s... supus que os trincos<br />
estivessem corridos.<br />
— Supôs?... Devia ter verificado...<br />
— Devia! — disse o chefe de polícia.<br />
— Devia!... — gritou o marquês d’Etu, que acompanhava com<br />
grande interesse o interrogatório...<br />
— Suspeito muito desse descuido... — falou o senhor de<br />
Bragantina.<br />
— Eu também... — ajudou o chefe de polícia, como quem diz ora<br />
pro nobis.<br />
— Também eu! — tornou a gritar o príncipe dos cortiços.<br />
— Sr. dr. Louro — disse o duque —, este criado deve ser detido<br />
como suspeito...<br />
— <strong>As</strong>sim me parece...<br />
— <strong>As</strong>sim deve ser... — afirmou o marquês d’Etu. — Já disse ao<br />
sr. Trigueiro que desconfio de todos; desconfio muito particularmente<br />
deste senhor e do tal particular, que nem ânimo tem de apresentar-se.<br />
Em segui<strong>da</strong>, o chefe de polícia ordenou a prisão de Inácio,<br />
confiando-o à guar<strong>da</strong> do delegado presente e disse que estava livre o<br />
primeiro criado interrogado.<br />
Pouco depois de Inácio apresentara-se o criado Joaquim,<br />
encarregado como ele pelo fechamento do palácio. Como, porém, o<br />
serviço do lance esquerdo não correra por sua conta na véspera, foi<br />
inútil interrogá-lo.<br />
Chegou a vez do particular.<br />
O velho sexagenário entrou na sala. Tinha os olhos injetados<br />
ain<strong>da</strong> de choro. O seu an<strong>da</strong>r era trôpego como se houvesse sofrido um<br />
acréscimo de dez anos de i<strong>da</strong>de..<br />
Todos os que se achavam no lugar sentiram no peito um panca<strong>da</strong><br />
de compaixão.<br />
Ser-se severo com aquele homem era uma cruel<strong>da</strong>de!<br />
O particular encaminhou-se trêmulo, cambaleante, para o duque.<br />
Ia pedir perdão. Ia declarar-se culpado, mil vezes culpado,<br />
arremessar aos pés do amo to<strong>da</strong> a sua grande existência de atenções<br />
contínuas para com ele; fazer dos seus cabelos brancos tapete para<br />
to<strong>da</strong>s as iras do fi<strong>da</strong>lgo, rastejar no chão, chato como a humil<strong>da</strong>de, não<br />
para que o não punissem, punissem-no duramente; mas, para que o<br />
duque de Bragantina perdoasse a ofensa que lhe fizera a sua incúria.<br />
O particular tinha pelo amo uma veneração que tocava as raias<br />
do amor.<br />
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