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As jóias da coroa - Biblioteca Digital da PUC-Campinas

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Sentiam-se perfumes, ninguém via as flores; ouvia-se um<br />

chocalhar que fazia sede, ninguém via a cascata; cantavam grilos,<br />

ninguém via os insetos...<br />

Reinava a noite em to<strong>da</strong> a sua majestade. Somente resistiam-lhe<br />

os lampiões, os reflexos do lago, o turbilhão dos astros e uma chusma<br />

brincalhona de pirilampos que cabriolavam no mato como estrelas<br />

fugi<strong>da</strong>s do céu...<br />

O duque errou durante algum tempo pelo parque, embebido em<br />

pensamentos que lhe traziam sorrisos à flor do rosto. Refletia na sua<br />

força que o fazia triunfar dos homens e <strong>da</strong>s mulheres. Era como um rei:<br />

rei pelo dinheiro e rei pelo sangue. Não havia conta para aqueles que o<br />

rodeavam como miríades de satélites, ca<strong>da</strong> qual mais empenhado em<br />

causar-lhe alegria. Tinha visto o curioso espetáculo de to<strong>da</strong>s as coisas<br />

que o comum dos homens apeli<strong>da</strong> sagra<strong>da</strong>s prostituírem-se-lhe aos pés.<br />

Vira a justiça despe<strong>da</strong>çar a ven<strong>da</strong> dos olhos para buscar a que seria<br />

agradável a ele; vira a honra entreguar-se-lhe como uma taverneira<br />

sem vergonha; vira a digni<strong>da</strong>de feita baixeza; a honesti<strong>da</strong>de feita<br />

impudor; a virtude feita hipocrisia; a hipocrisia feita descaramento; o<br />

descaramento feito arma de vitória... Vira o mundo transformado em<br />

torno dele... tudo somente pelo poder do seu nome! Era bem forte!<br />

Contava mais vitórias do que Napoleão. E somente havia uma<br />

diferença entre o conquistador e ele. É que Napoleão triunfara <strong>da</strong> força e<br />

o duque triunfara <strong>da</strong> fraqueza. Os principais feitos do general se haviam<br />

passado no campo <strong>da</strong>s batalhas e os do duque no segredo <strong>da</strong>s alcovas.<br />

Apesar de seus brilhantes precedentes, o fi<strong>da</strong>lgo não estava<br />

totalmente seguro dos resultados dos cometimento que ia levar a cabo.<br />

O Manuel fizera-lhe saber que a caça era arisca; tinha uma<br />

inocência petulante e esquiva, capaz de frustar a mais juanesca<br />

estratégia...<br />

Muitas vezes, é certo, havia encontrado a inocência no seu<br />

caminho, mas conseguira levá-la de venci<strong>da</strong> com palmadinhas e<br />

sorrisos, achando por fim como última resistência algumas lágrimas sem<br />

significação.<br />

Desta vez, contudo, o caso afigurava-se-lhe um pouco mais<br />

árduo; a inocência vinha arma<strong>da</strong> de brejeirice e sarcasmo; com certeza<br />

seria difícil. Há, porém, frutos pelos quais se dá de boa vontade o<br />

incômodo de trepar à árvore. Quantas vezes não se fere a gente em<br />

espinhos para tirar uma rosa?<br />

Impelido por esta idéia, o duque de Bragantina tomou<br />

resolutamente a direção <strong>da</strong> casa do seu íntimo Manuel de Pavia.<br />

De longe, pelo ar, vinham notas de bronze, sonolentas como<br />

bocejos... Marcavam meia-noite...<br />

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