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Josiane Thethê Andrade - Programa de Pós-Graduação em História ...

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funcionavam legalmente, até mesmo cobrar dívidas não era uma tarefa fácil dado os<br />

costumes que permeavam as relações comercias.<br />

O ven<strong>de</strong>iro é um ―comerciante, numa situação <strong>de</strong> pequeno capitalista,<br />

vive entre os que lhe <strong>de</strong>v<strong>em</strong> dinheiro e aqueles a qu<strong>em</strong> ele <strong>de</strong>ve. É um equilíbrio<br />

precário, s<strong>em</strong>pre à beira da <strong>de</strong>rrocada‖ (BRAUDEL, 1998, p.57). Cobrar as dívidas<br />

era ao mesmo t<strong>em</strong>po uma obrigação e uma tarefa difícil, <strong>de</strong>vido os costumes que<br />

envolviam as relações entre ele e seus fregueses. Muitos comerciantes ficavam<br />

constrangidos <strong>em</strong> cobrar, outros t<strong>em</strong>iam que os fregueses ficass<strong>em</strong> ofendidos e<br />

abandonass<strong>em</strong> seus estabelecimentos comerciais, até mesmo, s<strong>em</strong> pagar a conta,<br />

como explicitaram os ven<strong>de</strong>iros, ao se referir<strong>em</strong> as cobranças como ―uma tarefa<br />

muito difícil‖, conforme relata Dona Aurinei<strong>de</strong>; também o Sr. José diz que ―tinha<br />

gente que queria até bater na gente‖, e o Sr. Pedro afirma: ―eu tinha vergonha <strong>de</strong><br />

cobrar‖. Tão <strong>de</strong>licada era a situação da cobrança <strong>de</strong> dívidas que a experiência<br />

marcou Sr. José:<br />

Cobrava, uns dava pra valente, queria até bater na gente, mas a<br />

gente ia atravessando. Teve um dia que aquele Paulo Correia me<br />

escorou na porta da venda porque eu fui cobrar uma conta, ele<br />

escorou com uma espingarda veia, que se eu saísse fora, tinha ele<br />

me atirado (José Gonçalves <strong>de</strong> Oliveira, 87 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>, entrevista<br />

<strong>em</strong> 19/01/2003).<br />

As palavras ―difícil‖ e ―vergonha‖, na fala dos ven<strong>de</strong>iros, expressam como<br />

eles se sentiam constrangidos <strong>em</strong> cobrar as dívidas, já que po<strong>de</strong>ria significar uma<br />

quebra <strong>de</strong> tradição; o que ajuda a enten<strong>de</strong>r a reação violenta do cliente na fala do<br />

Sr. José Gonçalves, ao se sentir ofendido com a cobrança.<br />

Os próprios ven<strong>de</strong>iros esperavam do cliente uma atitu<strong>de</strong> honesta<br />

saldando as dívidas. Portanto, não se po<strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r suas atitu<strong>de</strong>s fora do processo<br />

histórico, pois também faziam parte daquele grupo e compartilhavam seus costumes<br />

e práticas sociais. Muitos ven<strong>de</strong>iros n<strong>em</strong> chegavam a cobrar as contas que<br />

envelheciam junto com o papel on<strong>de</strong> tinham sido registradas, talvez esperando o<br />

pagamento, o cumprimento da palavra dada ou por t<strong>em</strong>er<strong>em</strong> per<strong>de</strong>r o cliente, que<br />

po<strong>de</strong>ria se ofen<strong>de</strong>r com a cobrança e suposto questionamento da sua honestida<strong>de</strong>.<br />

Paradoxalmente, o ven<strong>de</strong>iro po<strong>de</strong>ria optar por práticas <strong>de</strong>sonestas,<br />

recorrendo à malandrag<strong>em</strong> e à esperteza para enganar os clientes no peso, na<br />

medida ou no preço dos produtos. Para Franco (1997, p. 80-81), que pesquisou o<br />

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