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VÍDEO POPULAR

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CRITICA & PENSAMENTO<br />

direto cornos deuses. A vida cotidiana tinha reservado, em troca,<br />

um espaço subalterno e sem rosto: o coro. Era formado pelas<br />

mulheres, as crianças, os escravos, os mendigos, os inválidos;<br />

enfim, todos aqueles que ficavam na cidade quando os demais<br />

partiam em busca da aventura, do poder e da glória" (3).<br />

Analisar as características da linguagem em cada um dos<br />

meios (impressos ou audiovisuais) seria uma tarefa excessiva-<br />

mente ampla para ser desenvolvida neste texto. No entanto, é<br />

importante selecionarum destes meios, no caso o vídeo (enten-<br />

dendo-o na sua dimensão maisgeral que abrange tanto a exibição<br />

direta como a emissão por canal aberto), para compreender a<br />

diferença entre o estágio atual, centrado na capacidade organiza-<br />

tiva para exercer um poder de pressão na conquista dos direitos<br />

democráticos na comunicação, e o estágio seguinte onde o<br />

principal desafio é o exercício desse direito. Saber o que fazer<br />

com um canal próprio implica compreender sua linguagem.<br />

A articulação das diversas vertentes do vídeo em torno das<br />

futuras TVs locais, desde as experiências não-narrativas da<br />

vídco-arte até os documentários mais ortodoxos abordando<br />

temáticas sociais, representa um avanço substancial não só na<br />

expressão mais nítida da pluralidade social, masprincipalmente<br />

no processo de construção de uma linguagem própria do vídeo.<br />

Historicamente o vídeo expressa a sua condição híbrida de um<br />

veículo "mestiço", herdeiro do cruzamento de outros meios: é ao<br />

mesmo tempo uma prolongação do cinema, do teatro, do rádio,<br />

da literatura. Arlindo Machado, numa análise bastante minucio-<br />

sa sobre este tema (4), aponta três tendências gerais que se<br />

impõem no universo do vídeo: "Em primeiro lugar (...) a imagem<br />

de vídeo — pelo menos a aíwa/imagem do vídeo, aquela que é<br />

obtida nos níveis atuais de tecnologia — tem uma definição<br />

precária, em função do número de linhas de varredura que ela<br />

comporta. Trata-se de uma imagem inadequada para anotar<br />

informações abundantes, uma imagem que não aceita detalha-<br />

mentos minuciosos e oíHle a profundidade de campo é continua-<br />

mente desmantelada pelas linhas de varredura". Segundo Macha-<br />

do, "a arte do vídeo se presta muito pouco a uma utilização<br />

naturalista"; no entanto, quando destaca como segunda tendên-<br />

cia "a estrutura circular e reiteradva de sua forma sintagmáti-<br />

ca", esta afirmação adquire um outro significado se analisada à<br />

luz do processo histórico no qual o vídeo (e principalmente TV)<br />

se incorporou na vida cotidiana: a reiteração e seqüencialidade<br />

do vídeo evidencia todo umpotencial de interação como real; um<br />

telejomal ou uma telenovela, por exemplo, interagem com o real,<br />

independentemente do universo simbólico do vídeo concorrer<br />

com o ambiente circundante. A questão é como (e a quais<br />

interesses atende) esse reordenamento da realidade é intencio-<br />

nalmente manipulado (a Guerra do Golfo provoca sempre uma<br />

reação de perplexidade).<br />

Ao contrário do discurso hegemônico da mídia, que privilegia<br />

o efeito ao invés da causa ou a descrição à análise, a comunicação<br />

democrática inverte esses mecanismos; a própria horizontali-<br />

dade no acesso dos realizadores à programação se estende à<br />

participação do usuário, transferindo a relação já praticada no<br />

vídeo popular entre produção e uso ou, em outro nível, entre<br />

processo e. produto (5).<br />

10<br />

A terceira tendência apontada por Machado diz respeito à<br />

"meí(7ffto/-/o5e da imagem (...) ela éumavirtualidade,qiiedespon-<br />

ta apenas quando invocada por alguma máquina de 'leitura',<br />

atualizadora de suas potencialidades visíveis (...) Diferente-<br />

mente das imagens fotográficas e cinematográficas, rígidas e<br />

resistentes em sua fatalidade figurativa, a imagem eletrônica<br />

resulta muito mais elástica, diluível e manipulável como uma<br />

massa de moldar". Apesar da imagem videográfica serde baixa<br />

definição e, em princípio, "trata-se de uma imagem inadequada<br />

para anotarinformaçõesabundantes",poroutrolado, a quantidade<br />

ilimitada de recursos de pós-produção e computação gráfica,<br />

acabou incorporando na cultura de massa e principalmente no<br />

vídeo, a leitura simultânea de múltiplas grafias. Se, de um lado,<br />

o marinheiro deprimeira viagemfacilmente se afoga deslumbra-<br />

do no oceano da parafernália eletrônica, de outro, quem domina<br />

o metier tem à mão um imenso e, de certa forma, inusitado<br />

vocabulário videográfico para construir novos discursos e consti-<br />

tuir uma linguagem singular do vídeo. Como diz Machado, "o<br />

que faz um verdadeiro criador éjustamente subverter a função da<br />

máquina, manejá-la no sentido contrário de sua produtividade<br />

programada (...) um dos papéis mais importantes do vídeo<br />

alternativo seja justamente a recusa sistemática de submeter-se<br />

à lógica do instrumento (...) reinventando, em contrapartida, a<br />

sua função e suas finalidades". Mais do que tendências, os três<br />

níveis apontados por Machado são na verdade elementos consti-<br />

tutivos da linguagem do vídeo.<br />

Aevolução dastelecomunicações evidencia a coexistência de<br />

duas tendências opostas: a primeira é a planetarização, confi-<br />

gurando uma rede arterial que irriga desde os grandes centros<br />

urbanos até os recantos mais capilares do tecido social; a segunda<br />

aponta uma ênfase no universo local. Se na primeira a visão<br />

"macro" do planeta se materializa na esfera essencialmente<br />

privada do receptor doméstico, a tendência "micro" da emissão<br />

local valoriza o aspecto orgânico da coletividade. Nãopor acaso,<br />

a proposta apresentada pelo vídeo popular através da ABVP (6)<br />

à L1D integra o telão ao satélite, expressando a necessidade vital<br />

do exercício da democracia num nível amplo, saindo desta forma<br />

da sua condição de marginalidade comunicacional ou periferia<br />

parabólica imposta pelos regimes autoritários.<br />

A Iberto LópezMejía é coordenador da área de Comunicação da<br />

Fase e Coordenador Geral da ABVP.<br />

(3) José Nun; La Rebelión dei Coro: estúdios sobre Ia<br />

racionalidad política y ei sentido común; Ediciones Nueva<br />

Visión/Buenos Aires; 1989<br />

(4) Arlindo Machado; O vídeo e sua linguagem; Revista USP<br />

n Q 16 (dez/92 - fev/93); Universidade de São Paulo<br />

(5) Alberto López Mejía; Umnovo conceito de comunicação:<br />

o destinatário é o sujeito; Revista Proposta/Fase n £ 43; nov/89<br />

(6) Associação Brasileira de Vídeo Popular

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