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Depois, bom...<br />
Varal do Brasil janeiro/fevereiro de <strong>2013</strong><br />
A poesia do imperfeito<br />
Por Ro Furkim<br />
A rosa em botão, logo que brota, é toda enrustidinha, envolta<br />
pelo calículo. Durante um bom tempo só terá de vegetar a serviço da<br />
nutrição para a sobrevivência. Mas a certa altura do tempo as sépalas<br />
do calículo se vão separando, despindo a rosa dessa proteção.<br />
Chegou o momento de atender o destino; para tanto vai se afrouxando<br />
o entrelaçamento das pétalas, estas se espaçando de modo a tornar<br />
acessível o tálamo, onde seu gérmen aguarda.<br />
Então aquelas sépalas, apêndices verdes estéreis, reclamam,<br />
contrariadas por terem sido exoneradas de seu cargo de protetoras,<br />
avessas para baixo, meio encaracoladas, difamam a rosa para o<br />
pedúnculo:<br />
“Agora sim!, estamos inúteis; essa, aí em cima, está dispensando<br />
a nossa proteção, agora deu pra arreganhar aquelas pétalas<br />
desgrenhadas, exibindo pistilo, oferecendo estigma a todo ferrão<br />
que vai passando; veja lá: toda vermelhona, perfume forte!, minando<br />
horrores de néctar, permitindo a qualquer um, qualquer um mesmo,<br />
seja inseto, seja passarinho, chafurdar no seu pólen. Até bicho grande<br />
mete o focinho. Tem mais segredo pra a gente proteger não, perdeu<br />
a vergonha de vez...”.<br />
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