ROTEIRO DE FILMES - Charles Guimarães Filho

114. VELÓRIO
Arashi está chorando. O corpo do Yama está sendo velado. Um de
seus filhos, o pai de Bel, está sentado numa cadeira, enquanto, o outro
filho, Yeshua, está sentado no chão, com as pernas abertas, cantando
e acompanhando a melodia com batidas no fundo de uma tigela de
madeira.
ARASHI
Não lhe entendo Yeshua. Afinal seu pai viveu devotadamente contigo
todos esses anos, cuidou de si até torná-lo Presidente de uma nação
tão grandiosa e envelheceu ao teu lado. Não derramares uma lágrima
sobre o corpo dele já é ruim, mas cantares e acompanhares teu canto
batendo numa tigela ... isso é demais!
Yeshua - o agora presidente – nada fala. Uma pessoa cujo rosto,
devido ao ângulo, não se vê direito, se aproxima, abraça-o
carinhosamente. Ao se mexer proporciona o reconhecimento: trata-se
do ROSTO JOVEM, daquele que havia desaparecido sem explicitar qual
seria a sua empresa.
ROSTO JOVEM
Militar, julgas mal. Quando Yama morreu, Yeshua ficou desesperado,
como qualquer outro filho. Mas então ele percebeu que seu pai, antes
de nascer, não tinha corpo e então ficou claro para ele que o mesmo
processo de mudança que o fez nascer acabaria por fazê-lo morrer.
Quando alguém está cansado e quer se deitar, não o perseguimos
com gritos e reprimendas. Aquele a quem ele perdeu deitou-se para
dormir durante algum tempo no aposento entre o céu e a terra.
Gemidos e lamentações enquanto seu querido pai dorme seriam o
mesmo que negar a lei soberana da natureza. Por isso deles ele se
abstém.
ARASHI
(pensando)
Por isso que ele não me respondeu. Quem sabe, como ele, não fala;
quem fala, como eu, não sabe. Meu Deus! Como tenho que aprender.
(falando)
Quem és tu que tanto percebes?
ROSTO JOVEM
Eu sou aquele que vendo os peixinhos se atirando de um lado para
outro à vontade, comento: ―Esse é o prazer desfrutado pelos peixes.‖
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