pdf - Alberto Pucheu
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um crítico, para que serve?<br />
Você é bem-sucedido, ferino, deve se achar quase charmoso.<br />
o contemporâneo lhe causa repugnância. Você não vê nada de<br />
relevante sendo escrito nem indícios de que algo digno de respeito<br />
possa vir a aparecer. Você é ressentido. e perigoso. Perigoso porque<br />
ressentido, porque antes de atualizar o grau das lentes dos óculos<br />
para ver o que está à sua frente sem a turbulência da alta miopia<br />
que tem, você deseja que os atuais pretendentes a escritor se joguem<br />
no poço mais próximo. Que se joguem no poço mais perto, é seu<br />
primeiro desejo explicitado. Assusta-me a impudência de uma frase<br />
como essa. ou, igualmente assustadora, é a segunda imagem criada<br />
pelo seu desejo para os escritores contemporâneos, a quem você, em<br />
metáforas repetidamente macabras, lança à morte por afogamento:<br />
um amontoado de corpos devolvidos à praia, pois, na frase de um<br />
escritor quinhentista que você cita, o mar não sofre coisa morta. ou,<br />
então, ainda, em relação aos sobreviventes que, contrariando as suas<br />
expectativas, insistem em não se lançar ao fundo do poço nem em<br />
serem devolvidos, mortos, à praia pelo mar, o seu terceiro desejo:<br />
um ou outro, os melhores, com muita sorte, deixarão de escrever.<br />
eu estou dizendo que você é perigoso porque sua fraqueza é daquelas<br />
que querem avaliar o mundo com a medida do aniquilamento<br />
alheio, do enfraquecimento alheio, da despotencialização do alheio.<br />
talvez por não suportar o excesso de vida que ali existe, você quer<br />
a morte de tudo o que lhe é alheio. A sua aposta é a pior de todas,<br />
a do triunfo da mesquinharia, a da vitória do ressentimento. A sua<br />
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