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VISÃO JUDAICA • outubro 20<strong>06</strong> • Tishrei / Chesvan • 5767<br />
Ali Kamel *<br />
o ano passado, escrevi um artigo<br />
cujo título era “O mesmo<br />
mundo”. Eu dizia que não vivíamos<br />
num mundo pior, cheio de<br />
guerras e desventuras: o mundo<br />
sempre foi assim. Há dias venho criando<br />
coragem para comentar o que se<br />
passa hoje no Oriente Médio, mas, cada<br />
vez que começo a estudar o assunto<br />
mais de perto, a sensação de que tudo<br />
é apenas uma repetição do passado<br />
me deixa prostrado. É impressionante<br />
como ali a História se repete, e não<br />
como farsa, como queria Marx, mas<br />
sempre como tragédia.<br />
Lembremos 1978. A OLP estava<br />
abrigada no Líbano e, de lá, prosseguia<br />
em sua luta para retomar não<br />
apenas as terras que Israel conquistou<br />
na guerra árabe-israelense, mas<br />
para pôr fim ao país inteiro, “varrendo-o<br />
do mapa”, na retórica ainda<br />
viva na boca de muitos. Em março<br />
daquele ano, um grupo de terroristas<br />
ligados ao Fatah seqüestrou um<br />
Imagem obtida por jornal australiano mostra os membros do<br />
Hezbolá usando roupas civis para se misturar rapidamente com<br />
a população, sobre um veículo com arma anti-aérea<br />
ônibus com crianças que faziam um<br />
passeio de um dia ao Norte de Israel.<br />
Seguiram para Tel Aviv e, na entrada<br />
da cidade, ao se depararem com uma<br />
barreira, saltaram do veículo, iniciaram<br />
um tiroteio e lançaram mísseis<br />
contra o ônibus, matando 35 pessoas.<br />
Israel, então, empreendeu um ataque<br />
ao Líbano, invadindo o país dez quilômetros<br />
além da fronteira. O mundo<br />
reagiu em coro contra Israel, o Conselho<br />
de Segurança da ONU passou a<br />
resolução 425, impondo a imediata<br />
retirada das tropas israelenses do Líbano<br />
e criando uma força internacional<br />
de paz. Em junho, Israel deixou<br />
o Líbano, mas, nos quatro anos<br />
seguintes, a força de paz não cumpriu<br />
os seus objetivos, e os ataques<br />
da OLP a Israel e as conseqüentes retaliações<br />
continuaram.<br />
Em 1981, um cessar-fogo foi conseguido<br />
pelos EUA, mas foi apenas<br />
formal: nos 11 meses que se seguiram,<br />
houve 270 ataques a Israel. Em<br />
abril de 1982, uma mina matou um<br />
oficial do exército israelense, e a resposta<br />
veio rapidamente, na forma de<br />
ataques aéreos e bombardeios. Em<br />
junho, houve uma tentativa de assassinar<br />
o embaixador de Israel no<br />
Reino Unido, o que deflagrou nova<br />
invasão do Líbano, com o objetivo<br />
de afastar o perigo da OLP, armada<br />
até os dentes. A história é bem conhecida:<br />
Israel ficou lá por três anos,<br />
as lutas foram cruentas, houve o<br />
massacre de Sabra e Chatila e a OLP<br />
acabou indo, com Arafat e tudo, para<br />
a Tunísia. Reagan acreditou que a<br />
força de paz da ONU não daria jeito<br />
e mandou para lá uma nova força,<br />
Ciclos<br />
composta por marines e soldados da<br />
França e Itália. No fim, os marines<br />
carregaram o maior peso, até que o<br />
recém-fundado Hezbolá, financiado<br />
pelo Irã, reintroduziu, após 900 anos<br />
de hibernação, a prática dos atentados<br />
suicidas: um carro-bomba levou<br />
pelos ares a embaixada americana,<br />
matando 17 diplomatas e 40 funcionários<br />
libaneses, e, meses depois,<br />
outros dois carros-bomba mataram<br />
241 marines, no aeroporto de Beirute,<br />
e 56 soldados franceses, a alguns<br />
quilômetros de distância. Houve<br />
as retaliações de praxe, e Reagan<br />
tirou de lá os marines, apenas quatro<br />
meses depois.<br />
Israel se estabeleceu, então,<br />
numa faixa da fronteira, criando uma<br />
zona de segurança, até que, em<br />
2000, saiu inteiramente do Líbano,<br />
cumprindo integralmente a resolução<br />
425 da ONU.<br />
Como em 1982, quando o presidente<br />
de origem cristã, pró-Israel,<br />
Bashir Guemayel, foi assassinado<br />
numa explosão de carro-bomba atribuída<br />
à Síria, ano passado foi morto<br />
o ex-primeiro ministro do Líbano<br />
Rafik Hariri, não pró-Israel, mas pró-<br />
Ocidente, também numa explosão de<br />
carro-bomba. Como tudo se parece...<br />
O assassinato de Hariri também foi<br />
atribuído à Síria, que acabou deixando<br />
o território libanês, depois de<br />
uma presença de mais de trinta anos.<br />
Bem, hoje a história se repete.<br />
Como a OLP no passado, o Hezbolá<br />
cresceu, dominou o Sul do Líbano,<br />
armou-se com 12 mil foguetes e recomeçou<br />
a atacar israelenses. Quando<br />
um ataque matou oito soldados<br />
e seqüestrou outros dois, Israel invadiu<br />
novamente o Líbano, para pôr<br />
fim à ameaça armada. No momento,<br />
estamos na fase da costura de uma<br />
nova resolução da ONU, que, provavelmente,<br />
criará uma nova força internacional<br />
de paz, e acabará, de uma<br />
forma ou de outra, determinando que<br />
Israel saia do país. Depois, bem, não<br />
quero me arriscar a dizer o que virá<br />
depois para não parecer praga.<br />
Porque não se trata disso. Esse<br />
artigo pode parecer pessimista, mas<br />
não é. Eu o chamaria de realista. Essa<br />
guerra já dura 58 anos, o que parece<br />
uma eternidade. Mas, se olharmos para<br />
trás, veremos que conflitos mais longos,<br />
que pareciam insolúveis, hoje<br />
não passam de História. Nós, seres<br />
humanos, somos assim: uma hora a<br />
gente cansa. Não sou médico, mas sei<br />
que, quando um mal se torna crônico,<br />
a razão é única: a causa não foi<br />
debelada. É o que acontece por lá.<br />
Um bom remédio é que a democracia<br />
alcance os países árabes:<br />
quando os povos tiverem o comando<br />
de seus destinos, duvido que concordem<br />
com grupos fanáticos terroristas<br />
que atiram foguetes em vizinhos<br />
sabendo de antemão que a reação<br />
será um pesado bombardeio sobre<br />
suas cabeças. É também preciso<br />
deixar D-us fora do conflito, porque<br />
sabemos todos que D-us não tem<br />
partido. É fundamental que os dois<br />
lados se aceitem como uma realidade<br />
inamovível e mais fundamental<br />
que cedam naquilo que lhes é mais<br />
caro. Enquanto isso não acontecer,<br />
o conflito persistirá, repetindo-se de<br />
forma monótona. E trágica.<br />
* Ali Kamel é jornalista, editor-chefe do Jornal Nacional, e publicou este artigo em sua coluna no jornal O Globo (http://oglobo.globo.com/jornal/colunas/<br />
alikamel.asp). O artigo foi escrito antes da nova Resolução da ONU, antes da criação da nova força internacional de paz e antes da retirada do exército<br />
israelense do Sul do Líbano. E-mail: ali.kamel@oglobo.com.br<br />
Fatah ameaça matar líderes do Hamas<br />
Palestinos brigam entre si e em quatro dias houve 14 mortos e 150 feridos<br />
esde o dia 1º/10, quando começaram<br />
os confrontos armados<br />
entre o Fatah e o Hamas,<br />
quase 150 palestinos ficaram<br />
feridos em distúrbios na Cisjordânia<br />
e em Gaza, e 14 morreram.<br />
As Brigadas dos Mártires de Al-<br />
Aqsa, facção armada vinculada ao<br />
movimento Fatah, emitiram uma nota<br />
ameaçando matar dirigentes do Hamas,<br />
entre eles Khaled Mashaal, líder<br />
do grupo islâmico que vive no exílio.<br />
Em comunicado enviado aos meios<br />
de comunicação vários dirigentes do<br />
Hamas são responsáveis pela recente<br />
explosão de violência nas ruas palestinas,<br />
que deixou 14 palestinos mortos<br />
e quase 150 feridos.<br />
As Brigadas indicaram que<br />
Mashaal, residente em Damasco, assim<br />
como o ministro do Interior do<br />
Governo palestino, Said Siyam, e<br />
Youssef Zahar, também funcionário<br />
deste ministério, são os responsáveis<br />
pelas recentes mortes.<br />
“Nós das Brigadas de Al-Aqsa<br />
anunciamos, com toda nossa força e<br />
sinceridade, aos que governam o<br />
povo em nossa pátria e na diáspora,<br />
que executaremos os responsáveis<br />
pela revolta: Khaled Mashaal, Said<br />
Siyam e Youssef Zahar”.<br />
Desde o dia 1º, quando começaram<br />
os confrontos armados entre<br />
milicianos do Fatah e membros da<br />
nova força criada pelo Ministério do<br />
Interior e leal ao Hamas, quase 150<br />
palestinos ficaram feridos em distúrbios<br />
na Cisjordânia e em Gaza.<br />
Além disso, vários militantes do<br />
Fatah fecharam na terça-feira, 3/10,<br />
várias escolas no centro da Faixa de<br />
Gaza, e instaram os professores e alunos<br />
a abandonar as salas de aula, sem<br />
dar-lhes mais explicações.<br />
Seguidores do Fatah, presidido<br />
por Mahmoud Abbas, também<br />
bloquearam a estrada Saladino, um<br />
dos principais cruzamentos da Faixa<br />
de Gaza, queimaram pneus, levantaram<br />
barricadas e efetuaram vários<br />
disparos para o ar enquanto gritavam<br />
“Abaixo, abaixo com o Hamas”.<br />
Representantes de ambos os gru-<br />
pos continuaram trocando acusações,<br />
enquanto aumentam os chamados<br />
por eleições antecipadas.<br />
O ex-ministro palestino Sufian<br />
Abu Zaid, do Fatah, pediu a formação<br />
de um novo governo de união<br />
nacional na Autoridade Nacional Palestina<br />
(ANP) ou eleições.<br />
As diferenças entre ambos os<br />
grupos incluem principalmente a<br />
negativa do Hamas de aceitar o<br />
reconhecimento de Israel, para<br />
que se forme um novo gabinete<br />
palestino e se acabe assim com o<br />
boicote da comunidade internacional.<br />
A suspensão da ajuda estrangeira<br />
impediu o pagamento<br />
de 165 mil funcionários públicos<br />
durante meses.