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Morde-me, mas pouco - Fonoteca Municipal de Lisboa

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Corrompo <strong>mas</strong><br />

Anger, 82<br />

anos, actuará<br />

no projecto<br />

Technicolor<br />

Skull<br />

(Serralves, dia<br />

6; Palácio <strong>de</strong><br />

Valadares,<br />

dia 9), duo<br />

formado com<br />

Brian Butler ;<br />

em baixo:<br />

Lucifer<br />

tatuado no<br />

peito<br />

Kenneth Anger, o mago do un<strong>de</strong>rground, é o protagonista <strong>de</strong> um ciclo <strong>de</strong> fi l<strong>me</strong>s, concertos, p<br />

exposição que movi<strong>me</strong>ntarão a Cinemateca, a ZDB (<strong>Lisboa</strong>) e Serralves (<br />

Cinema<br />

“Fireworks” (1947) “Inauguration of the Pleasure Do<strong>me</strong>” (1954-1956)<br />

Tem Lucifer tatuado no peito e um<br />

fascínio irresistível por unifor<strong>me</strong>s.<br />

Kenneth Anger, uma das figuras maiores<br />

do cinema in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte, un<strong>de</strong>rground,<br />

norte-a<strong>me</strong>ricano, é o protagonista<br />

<strong>de</strong> um ciclo <strong>de</strong> fil<strong>me</strong>s,<br />

concertos, performances, conferências,<br />

edições <strong>de</strong> livros e uma<br />

exposição, que se inicia,<br />

segunda-feira, dia 4, na Cinemateca<br />

Portuguesa, em <strong>Lisboa</strong>.<br />

O aconteci<strong>me</strong>nto, que prossegue<br />

nos dias seguintes na Fundação<br />

<strong>de</strong> Serralves, no Porto,<br />

conta com a presença do realizador,<br />

personagem mítica da<br />

contracultura, autor dos dois volu<strong>me</strong>s<br />

“Hollywood Babylon” - narra<br />

histórias sórdidas das estrelas da<br />

indústria cinematográfica -, e a<strong>de</strong>pto<br />

confesso do ocultista Aleister Crowley,<br />

omnipresente em muitas das suas<br />

obras. A iniciativa é comissariada por<br />

Natxo Checa, da ZDB, espaço on<strong>de</strong><br />

será apresentada, a partir <strong>de</strong> 8 <strong>de</strong><br />

Maio, a mostra colectiva “Estrela Brilhante<br />

da Manhã”, título que evoca<br />

uma passagem <strong>de</strong> “A Hora do Diabo”,<br />

<strong>de</strong> Fernando Pessoa, assim iniciada:<br />

“Corrompo <strong>mas</strong> ilumino.”<br />

O ciclo arranca com uma retrospectiva<br />

da obra cinematográfica <strong>de</strong> Anger<br />

(Santa Mónica, Califórnia, 1927), uma<br />

sessão formada por alguns dos seus<br />

fil<strong>me</strong>s seminais, como o experi<strong>me</strong>ntal<br />

“Fireworks” (1947), realizado em Los<br />

Angeles, aos 17 anos. Nesta película<br />

a preto-e-branco, o fascínio por unifor<strong>me</strong>s,<br />

neste caso o <strong>de</strong> marinheiros,<br />

torna-se um dos te<strong>mas</strong> centrais<br />

do seu percurso, isto numa<br />

época em que, recor<strong>de</strong>-se, a<br />

homossexualida<strong>de</strong> era ilegal.<br />

Com esta curta, o realizador,<br />

protagonista central <strong>de</strong> uma<br />

história violenta e poética, com<br />

contornos S&M - um “sonho<br />

<strong>de</strong> um sonho” que culmina<br />

num fálico fogo-<strong>de</strong>-artifício<br />

-, venceu, em 1949, o Prémio<br />

da Obra Poética do<br />

Festival do Fil<strong>me</strong> Maldito<br />

<strong>de</strong> Biarritz, presidido por<br />

Jean Cocteau. O escritor<br />

francês enviou uma carta<br />

elogiosa ao cineasta, que <strong>de</strong>cidiu<br />

viajar para França, on<strong>de</strong> viveria<br />

durante mais <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, tendo sido<br />

assistente <strong>de</strong> Henri Langlois, na Cinemateca<br />

em Paris.<br />

No pri<strong>me</strong>iro dia do programa, na<br />

Cinemateca <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>, será ainda possível<br />

assistir a “Inauguration of the Pleasure<br />

Do<strong>me</strong>” (1954-1956), “Invocation<br />

of My Demon Brother” (1969), “Lucifer<br />

Rising” (1980) e “Ich Will!” (2008)<br />

- a sessão é repetida no dia seguinte,<br />

em Serralves. Os fil<strong>me</strong>s realizados até<br />

ao início dos anos 1980 constituem um<br />

corpo <strong>de</strong> trabalho atravessado por<br />

diversos te<strong>mas</strong>, como a magia -<br />

“magick”, na grafia <strong>de</strong> Crowley -, o<br />

paranormal, o psica<strong>de</strong>lismo, associado<br />

ao consumo <strong>de</strong> LSD, a homossexualida<strong>de</strong><br />

e o culto <strong>de</strong> Lúcifer, este entendido<br />

não enquanto representante do<br />

mal, <strong>mas</strong> antes como figura luminosa,<br />

alucinante: o <strong>de</strong>us da luz. As diferentes<br />

obras estão associadas a inú<strong>me</strong>ras histórias,<br />

muitas <strong>de</strong>las obscuras, como a<br />

do roubo, em 1967, do material filmado<br />

<strong>de</strong> “Lucifer Rising” - a película<br />

só seria estreada treze anos <strong>de</strong>pois -,<br />

por Bobby Beausoleil, ex-guitarrista<br />

dos The Grass Roots, num episódio<br />

rocambolesco que iria terminar com a<br />

associação <strong>de</strong>ste à “família” <strong>de</strong> Charles<br />

Manson e a posterior acusação <strong>de</strong> ter<br />

assassinado, em 1969, o hippie, professor<br />

<strong>de</strong> piano e budista zen Gary Hinman,<br />

cumprindo ainda hoje a sua pena<br />

na prisão, on<strong>de</strong> acabou por escrever a<br />

banda sonora <strong>de</strong> “Lucifer Rising”...<br />

“Invocation of My Demon Brother”<br />

tem banda sonora <strong>de</strong> Mick Jagger, composta<br />

com um sintetizador moog<br />

adquirido na época pelo vocalista dos<br />

Stones - há uma outra versão, mais<br />

recente, com música dos Electrophilia,<br />

grupo <strong>de</strong> noise psicadélico formada<br />

por dois artistas, o já falecido Steven<br />

Parrino e Jutta Koether.<br />

“Inauguration of the Pleasure<br />

Do<strong>me</strong>”, título tirado do poema “Kublai<br />

Khan”, <strong>de</strong> Colerig<strong>de</strong>, é <strong>de</strong>dicado a<br />

Aleister Crowley e conta, entre os<br />

intérpretes, com Anaïs Nin e com o<br />

cineasta Curtis Harrington - Anger diz<br />

ter-se inspirado para este fil<strong>me</strong>, atravessado<br />

pela Missa Glagolítica, do compositor<br />

checo Leos Janácek, numa<br />

festa temática <strong>de</strong> Halloween, intitulada<br />

“co<strong>me</strong> as your madness.” O realizador<br />

propôs ainda, em 1966, uma “Sacred<br />

Mushroom Edition” <strong>de</strong>sta obra, tendo<br />

aparecido, no início dos anos 1970,<br />

algu<strong>mas</strong> cópias com a canção “Can’t<br />

Get It Out of My Head”, dos Electric<br />

Light Orchestra. O mais recente e<br />

polémico “Ich Will!” coloca em<br />

paralelo a juventu<strong>de</strong> hitleriana e<br />

um outro movi<strong>me</strong>nto, romântico,<br />

ligado à juventu<strong>de</strong> alemã <strong>de</strong> finais do<br />

século XIX, o Wan<strong>de</strong>rvogel (ave migratória).<br />

Não se <strong>de</strong>ve esquecer que para<br />

Anger “as duas imagens mais populares<br />

do século XX são o rosto do Mickey<br />

Mouse e a suástica.”<br />

Heranças<br />

Se a influência <strong>de</strong> Anger se faz sentir,<br />

hoje, em alguns artistas, músicos e<br />

cineastas contemporâneos, ela não<br />

<strong>de</strong>ve separada da herança <strong>de</strong>ixada por<br />

Crowley (1875-1947), cada vez mais<br />

figura emblemática na cultura actual.<br />

O interesse por esta enigmática personagem<br />

- com uma biografia que se<br />

cruza com a <strong>de</strong> Fernando Pessoa,<br />

nomada<strong>me</strong>nte no célebre episódio da<br />

Boca do Inferno, quando o mago inglês<br />

simulou o seu suicídio - é visível no<br />

nú<strong>me</strong>ro crescente <strong>de</strong> discos, livros e<br />

exposições <strong>de</strong>dicadas não só ao si, <strong>mas</strong><br />

também a toda uma série <strong>de</strong> artistas e<br />

personagens influenciados pela sua<br />

filosofia thelêmica - Jimmy Page, dos<br />

Led Zeppelin, chegou a comprar uma<br />

das casas do mago, on<strong>de</strong> eram praticados<br />

rituais mágicos, a setecentista<br />

Boleskine House, nas margens do Loch<br />

Ness, Escócia. Há outros no<strong>me</strong>s que<br />

têm manifestado profundo interesse<br />

pelo pensa<strong>me</strong>nto <strong>de</strong> Crowley, como<br />

John Zorn - que em sucessivos álbuns<br />

lhe tem prestado ho<strong>me</strong>nagem: “I.A.O.”<br />

(2002), <strong>de</strong>dicado também a Anger,<br />

“Magick” (2004),”Rituals” (2005),<br />

“Moonchild” (2006), etc. -, David<br />

Tibet, dos Current 93, ou Genesis P-<br />

Orridge, que escreve uma das introduções<br />

(a outra é <strong>de</strong> Robert Antom Wilson)<br />

a “Portable Darkness”, uma colectânea<br />

<strong>de</strong> textos <strong>de</strong> Crowley.<br />

Nas artes visuais têm também sido<br />

muitos os autores que <strong>de</strong>monstram<br />

um crescente interesse por Crowley,<br />

po<strong>de</strong>ndo afirmar-se que há um<br />

ambiente criativo particular relacionado<br />

com este universo “mágicko”. A<br />

própria obra

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